Capítulo 2

Kiara Raffaello

Bato na porta a primeira vez, espero uma resposta mas ela não vem.

Bato uma segunda vez, espero um pouco por resposta mas não ouço nada, suspiro e abro a porta devagar colocando minha cabeça para dentro do quarto.

Então eu a vejo, ela está deitada na cama, de olhos abertos olhando para o teto com as mãos ao lado do corpo.

Abro a porta, ela se assusta como se tivesse com a cabeça tão longe que ao menos tinha escutado eu bater na porta.

Assim que ela me vê arregala os olhos e se senta na cama, arrumando o lençol nas suas pernas.

— Oi, tudo bem? Eu me chamo Kiara. — Pergunto mas não obtenho resposta, me aproximo. — Eu trouxe comida, está com fome?

— Sim! — Ela fala me deixando aliviada.

Ando até ela e me sento ao seu lado, coloco o parto e xícara em cima da mesinha de cabeceira.

— Eu espero que você não se importe de dividir essa comida comigo, trouxe para nós duas. — Falo com um pequeno sorriso, tentando soar amigável. — Mas se você estiver com muita fome ou não gostar de algo que esteja nesse prato, eu posso ir lá em baixo e pegar outras coisas.

— Não precisa, tudo o que está no prato eu gosto! — Ela fala calmamente, observo ela pegar o pão e começa a comer.

Assinto e pego um pão com queijo, pão dando uma bela de uma mordida, enquanto ela come analiso a criança.

Meu Deus. É óbvio que ela é filha do Vittorio, a menina é a cara dele. Formato do rosto e a cor dos olhos. Na verdade a cor dos olhos é idêntica, seus cabelos são cacheados e lindos. Ela é a cópia perfeita dele.

Graças ao bom Deus, não me parece uma criança que apanhava ou era maltratada.

— Seu pai me cortou o que aconteceu com a sua mãe, eu sinto muito! — Murmuro e ela continua olhando fixamente para comida. — Eu também perdi a minha mãe, na verdade eu perdi os meus pais no mesmo dia em um incêndio criminoso.

Pela primeira vez desde que estamos uma de frente para a outra, eu vejo a confusão nos seus olhos.

— A mulher que estava com o Vittorio…meu pai ela não é

— A mulher lá embaixo é minha mãe de sangue, mas eu tive uma mãe adotiva. — Falo e vejo seus olhinhos curiosos sobre mim, ela está confusa. — A história é grande e meio confusa, se você quiser saber eu posso contar. — Falo esperando uma resposta, mas ela só volta a olhar para o prato, suspiro pego outro pãozinho.

— Minha mãe falou que você é casada com o meu pai. — Ela fala e me olha outra vez. — Porque vocês não moram juntos?

Jogo minha cabeça para o lado e mordo o canto da minha boca tentando formular uma resposta normal, como essa menina é esperta Jesus.

Olho para ela, em seus olhos eu vejo cansaço, tristeza e dor. Não vale a pena mentir. Ela não merece isso.

— Eu e seu pai já fomos muito felizes, existiu muito amor entre nós dois…mas decidimos que o melhor era cada um ir para o seu lado. — Falo

— Ele é um homem mau? — Arregalo os meus olhos.

— Não! Quem te disse que o Vittorio é mau? — Questiono e ela dá de ombros.

— Minha tia. — Fala e eu nego. — Ela falou que se ele não me quisesse, iria me vender para outro e que todos eles eram mau que nem o Vittorio.

Que mulher mais vagabunda, dissimulada e nojenta. Como alguém tem coragem de falar algo assim para uma criança?

— Vittorio vai ser o melhor pai do mundo. E ser ele não for, eu e minha frigideira iremos ter uma conversa com ele. — Falo e pela primeira vez vejo um pequeno ar de sorriso nos lábios.

Mas logo ela volta a ficar séria, seu sorriso morre e seus olhos enchem de lágrimas.

— Minha mamãe também me falou que ele seria um ótimo pai para mim, também me falou que você seria minha segunda mãe e que ela sabia que vocês dois juntos, iriam cuidar bem de mim. — Engulo em seco com a sua fala.

— Quando a sua mãe morreu? — Questiono.

— Ontem. — Ela fala e eu arregalo os meus olhos. — Ela morreu ontem, eu não me lembro o horário mas já estava de dia e eu não tinha almoçado ainda.

— Na Itália? Sua mãe morreu na Itália?— Questiono confusa.

— Sim. — Ela fala e pega a xícara tomando um gole de chocolate quente.

— E sua tia te colocou em um voo de onze horas sem ao menos deixar você enterrar a sua mãe? — Questiono vendo os seus olhos já cheios de lágrimas quase transbordando.

— Ela disse que não tinha dinheiro, que comprou o voo mais barato que tinha. — Ela murmura. — Ela disse que deixaria o corpo da minha mãe para ser enterrado como o indigente.

— Sua mãe não vai ser enterrada como indigente e você irá se despedir dela, ok? — Questiono e ela assente. — Falarei sobre isso com o seu pai, tenho certeza que ele concordará comigo.

— E se ele não for o meu pai? — Questiona e eu nego. — Minha tia me disse que minha mãe era uma mulher ruim e

— Sua tia mentiu, meu amor! Ela mentiu, sua mãe era a melhor pessoa do mundo, tenho certeza que ela te ama e vai cuidar de você lá no céu para sempre. — Falo e ela continua me olhando com atenção. — Esquece tudo o que a sua tia falou, Vittorio é sim o seu pai.

— Tem certeza? — Questiona e eu assinto com firmeza.

— O que sua mamãe falou sobre mim ou do seu pai para você? — Questiono.

— Falo ele é um homem bom, que quando ela fosse embora eu iria ficar com o meu pai, que eu devia contar tudo o que aconteceu com ela e ele iria cuidar de mim. — Ela fala e eu assinto. — Ela me mostrava fotos dele, eu vi fotos do casamento de vocês em todas as revistas.

— Sério,você achou meu vestido bonito? — Questiono tentando descontrair e ela assente.

— Você parecia uma princesa! Eu e mamãe adoramos o daquela mulher, que é sua amiga. — Ela fala e eu assinto.

— Ela é minha melhor amiga, mãe dos seus primos e mulher do Rocco, irmão do seu tio. — Falo e ela assente.

— Eu fiquei com tanto medo, pedi para mamãe não me deixar, todo mundo fala que madrasta é ruim. — Ela fala e eu nego.

— Eu jamais faria algo de ruim contra você, princesa! — Falo e ela assente e boceja, deve agora que está alimentada deve ter dado sono novamente. — Dorme, irei descer e falar com o seu pai para irmos até a Itália, pegar os seus documentos e enterrar a sua mãe. Ok?

— Tá bom, Kiara! — Ela fala.

Então eu pego o prato, me levanto e vejo ela se deitar e fechar os olhos, o remédio deve ser bem forte mesmo.

Saio do seu quarto, ando pelo grande corredor e desço as escadas, vou direto para a cozinha encontrando os três, coloco o prato vazio em cima da mesa e olho para Vittorio.

— Aquela criança precisa de você, Vittorio. Você não pode em hipótese alguma a jogar na porra de um colégio interno ou convento. — Falo com seriedade. — E cadê a vadia da tia dela? Preciso ensinar para ela que é bom ter respeito aos falecidos e cuidado com a sobrinha dela.

— Você acha que eu deixaria aquela vadia viva? — Ele fala e eu vejo sua mandíbula travada. — Ela queria me vender a menina, disse que se eu não aceitasse, venderia para outro que tivesse interesse em crianças.

— Nojenta! — Escuto a voz da Olívia. — Espero que esteja no colo do capeta!

— Também temos que voltar para a Itália, a vadia da tia ao menos deixou a menina se despedir da mãe dela. — Falo com seriedade. — Temos que enterrar ela em um lugar bom, para que no futuro sua filha possa visitar a mãe e levar os filhos para conhecer a avó.E se você não quiser fazer isso, eu farei!

— Onde aquela criança for, eu irei! — Ele fala e eu assinto.

— Ok. — Falo e relaxo, olho para o lado vendo Vladimir e Olívia me encarando, engulo em seco e volto a olhar para Vittorio.

— Eu já estou indo, fiz a reservar em um hotel e irei dormir nele esta noite. — Falo e vejo ele arquear a sobrancelhas. — Amanhã cedo venho para tomarmos café e falamos sobre a sua filha, irei agilizar tudo sobre o velório e a documentação dela com os meus contatos na Itália.

— Filha, não faça assim… você pode dormir lá em casa e nós podemos conversar, comer bolo e tomar chá. — Olívia fala e eu nego a encarando.

— O filho de vocês é o Vittorio e não eu, Olivia. — Falo e ela morde os lábios, acho que segurando as lágrimas.

Me viro e saio da casa do Vittorio, vou até o carro que já estava me esperando e entro nele novamente, falo o nome do hotel para o motorista e ele começa a dirigir.

*****

Estou na hidromassagem sentindo a água quente aquecer a minha pele, relaxo com a água quentinha e quando me dou por satisfeita saiu da água e entro no meu quarto somente de roupão.

Quase caiu para trás quando vejo Vittorio bem ali no meio do quarto, sentado em uma cadeira perto da varanda fumando a porra de um charuto fedido para um caralho.

— Ah, não. Pelo amor de Deus, o que você está fazendo aqui, Vittorio? — Questiono parada, me mantendo bem longe dele.

— Temos que conversar, Afrodite! — Ele fala e eu nego veementemente. — Temos sim, meu amor!

— Não me chame de “meu amor, você perdeu esse direito a maldito dois anos, porra! — Falo com seriedade. — Tudo o que temos que conversar pode ser falado amanhã, agora eu estou com sono e

— Você irá voltar para a nossa casa comigo e agora! — Vittorio fala com seriedade, suspiro negando.

— Ou Vittorio, eu não quero travar essa guerra com você agora, mas se for preciso eu posso pegar a minha munição e te garanto que não é pouca. — Falo cortante.

Vittorio fuma a porra do charuto, traga e solta a fumaça aos poucos, seus olhos ainda estão fixos em mim.

— Eu não assinarei o pedido de divórcio, se é isso o que você acha que temos que conversar. — Fala e eu dou de ombros.

— Tá bom meu requerido, o juiz assinará por você! Agora sai do meu quarto e vá embora. — Falo e ele solta a fumaça abrindo um sorriso cretino.

— Se esse juiz desejar ser morto, ele com toda certeza irá mexer nisso. — Fala e eu nego rindo. Vendo que a minha risada mexe com ele o desestabiliza.

— Você é o Don na Rússia, mas seu irmão é o Dom da Itália e adivinha só? Lá na Itália é o Alessandro que manda e obedece quem tem juízo, ele já falou que irá me ajudar a ter o meu tão sonhado divórcio. — Falo, vejo pela sua mandíbula trincada que isso o incomoda, mas o desgraçado disfarça bem.

— Uma porra que ele vai, Alessandro não é doido! — Ele fala e sua voz fica mais sóbria.— Eu sou capaz de esquecer que ele tem meu sangue e cometer uma chacina, naquela porra de país.

Engulo em seco, pois pelo seu tom de voz ele não demonstra brincadeira. É triste pensar que esse Vittorio eu não reconheço mais e no final, meu pai conseguiu o Don que ele sempre quis.

— Eu não me importo, Don Vittorio. — Falo com a maior frieza do mundo, não lhe dando brecha para ver as minhas emoções. — Vai lá, mata todo mundo só para me ter ao seu lado, te odiando e desejando a sua morte. Eu posso te dar as balas e munição.

Eu vejo que a minha fala faz com que pela primeira vez ele oscile e deixe sua emoção reaparecer.

Respiro fundo e ando até a minha cama onde está a minha mala e pego um conjunto de moletom.

— Não é justo como você está tratando a sua mãe. — Ele fala e eu sorrio ironicamente. — Ela te ama e seu pai também.

— Os meus pais que nunca me abandonam, nunca abriram mão de mim e sempre estavam do meu lado mesmo eu sendo uma filha da puta, morreram queimados e eu tive que ir até o Brasil reconhecer os corpos, eles sim nunca me abandonaram. — Falo com seriedade.

— Você sabe muito bem que você foi sequestrada e tivemos que

— Chega! Não aja como se eu fosse a menina inocente que precisou que todos se colocassem em riscos. — Falo e solto uma risada irônica. — Você caiu na pilha do Vladimir, deixou ele entrar na sua cabeça e olha só no que deu.

Olho para a roupa em minha mão, ele já me viu nua um milhão de vezes, então eu simplesmente deixo a toalha cair.

Com rapidez visto a calça rapidamente e depois a blusa, sem olhar para ele eu vou até a porta e abro vendo três seguranças e me viro olhando para Vittorio.

— Estou cansada, preciso dormir e você está atrapalhando, pode se retirar!? — Falo olhando em seus olhos.

Vittorio se levanta, anda até mim calmamente e seus olhos transmitem um ar sério, do tipo

“eu sou a presa”

Quando ele está tão perto de mim que nossas respirações se misturam, eu me recuso dar um passo para trás.

— Amanhã, às 9h o motorista estará aqui para te buscar e levar você até mim, esteja lá em casa com todas as suas malas e não teste a porra da minha paciência, Kiara! Você não sabe o que eu sou capaz de fazer. — Ele fala com seriedade.

Engulo em seco e ele sai, eu bato a porta e travo com o trinco, pau no cu dele!

Me afasto da porta, ando até a cama e me jogo nela me enrolando no lençol, ele que lute! Porque ele também não sabe o que eu sou capaz de fazer.

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