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Capítulo 6 – meu ex-namorado é um idiota

Era incrível o empenho de Jesse em fazer qualquer outra coisa absurda só para que não tivéssemos uma conversa. Sério. Era irritante.

Era mais irritante ainda pensar que eu estava a mercê dele.

Então, ninguém sentiria minha falta, pois tecnicamente eu já havia retornado a Darwin e me despedido de todos. Ninguém presenciou quando Jesse entrou no carro e partiu comigo, tampouco notaram quando ele arremessou meu celular pela janela. Ninguém se importaria se eu não ligasse; afinal, não faço ideia de para onde Jesse está nos conduzindo, trajando aquele terno ridículo em um dia escaldante. Quero dizer, em um momento você pensa que conhece alguém, e no seguinte, essa pessoa te sequestra, levando para um possível covil secreto, onde retém garotas contra a sua vontade.

Certo, essa última parte talvez fosse invenção minha. Mas tudo era possível, dado ao fato de que ele não tinha me dado nenhuma informação útil sobre o que pretendia fazer até aquele momento.

— Isso é ridículo — eu disse pela milésima vez — Você poderia me deixar na beira da estrada, eu nem vou contar a polícia ou qualquer coisa assim. Vamos Jesse, eu preciso mesmo voltar para a faculdade.

Ele me olhou com o canto dos olhos como se fosse eu quem tivesse enlouquecido.

— Quero dizer, eu nem sou o tipo de garota sequestrável. Sou muito magra, então tecnicamente se você precisasse de um escudo humano, isso não ia rolar. Viraria peneira. — Coloquei meus pés sobre o painel do carro — E eu não acho que vou conseguir segurar tanto tempo para ir ao banheiro. Tem banheiros na estrada? Porque eu preciso mesmo fazer xixi antes que ocorra um acidente.

— Cale a boca Jane.

— Não me mande calar a boca. Estou sendo boazinha, se eu quiser eu jogo esse carro em um penhasco. — Cruzei os braços contra o corpo — Achou mesmo que fosse me sequestrar e que eu aceitaria isso calada?

Ele revirou os olhos.

— É impossível fazer qualquer coisa com você falando. Calma. Estou pensando.

— Sabe o que é ótimo? Nós terminamos, você não tem obrigação nenhuma de me ouvir falando. Pare bem ali no acostamento e me deixe em qualquer canto. Eu ainda tenho as provas finais, e você está estragando tudo. Você sabe, se eu não aparecer no sábado, as pessoas obviamente vão começar a sentir a minha falta e...

Ele bateu no volante visivelmente irritado.

Olá, este é o meu carro, e pretendo mantê-lo em ótimo estado, pois dependo dele. Apesar de sua beleza e tudo mais, não desejo ser compelida a fazer algo que não queira, especialmente agora que não estamos mais juntos como casal. Não havia mais razão para ele exercer qualquer tipo de controle sobre mim.

Não seria mais sensato para ele lidar com a dor de um coração partido como qualquer outra pessoa, em vez de me envolver em uma jornada absurda? Afinal, tomei a decisão de encerrar nosso relacionamento precisamente por causa dessa imprevisibilidade.

— Tudo vai dar certo, só preciso dessa noite. — Ele assegurou, quase como se dissesse aquilo para si mesmo.

Foi nesse instante que as lágrimas começaram a rolar pelos meus olhos. Tornou-se óbvio que, se a intenção dele se resumisse a apenas aquela noite, minha existência se limitaria a algumas poucas horas. O crepúsculo se aproximava, e as vastas e áridas estradas de Nevada se estendiam à frente. A ideia de ser descoberta por um farejador no fundo de algum desfiladeiro era assustadora. Eu valorizo a minha vida, admito que talvez tenha reclamado demais até agora. Será que Jesse tinha a intenção de me matar? Caramba, eu amava aquele desgraçado, mas não ia permitir que as coisas chegassem àquele ponto e...

— Jane? — Jesse me olhou preocupado, seus olhos castanhos brilhando sobre os últimos raios de sol, suas pupilas dilatadas como duas esferas escuras. — O que há de errado com você?

Mas eu não consegui responder, porque acontece que eu estava chorando demais. Eu não queria mesmo morrer, já tinha planejado cuidadosamente toda uma vida. Cada passo, cada detalhe. Eu gosto de ser meticulosa.

Foi então que ele pareceu mesmo aborrecido, o que me deixou ainda mais chorosa.

— Eu não me despedi da minha mãe. Além do mais está muito quente para cavar qualquer buraco e me enfiar lá, vai estragar o seu terno ridículo. — eu dei uma fungada.

Ele soltou uma risada, mas era tão alta que tenho certeza de que todo o meu corpo vibrou. Quero dizer, ei, estou sendo sequestrada; será que ninguém percebeu que eu parecia uma prisioneira? Eu estava começando a ficar ofendida.

— Eu não vou matar você — Ele disse naturalmente — de onde você tirou isso?

— Não vai?

Ele sacudiu a cabeça.

— Então eu exijo que você pare esse carro nesse exato momento, eu quero descer.

— Não vai rolar.

— O que você está fazendo é crime federal. — Insisti — você não pode me levar à força para lugar nenhum, seu idiota imbecil.

Jesse revirou os olhos com impaciência.

— Você já disse isso nas últimas horas. — ele disse estalando a língua — Pelo menos umas trezentas vezes. É. Trezentas vezes. Pode me chamar de idiota o quanto quiser, Jane. Eu não vou parar a droga do carro.

— Jesse, estou falando sério, preciso ir ao banheiro.

Ele pegou uma garrafa de água vazia que eu havia deixado debaixo do banco no último domingo e a entregou pra mim.

Encarei-o perplexa.

— Eu não vou fazer xixi nisso — dei um tapa no seu ombro — eu não sou um garoto, seu imbecil. Não tenho como fazer xixi nesta coisa.

— Você não é um cara? Eu nunca notei. — Ele resmungou, revirando os olhos — Pare de tentar complicar as coisas, Jane. Eu sei que pode segurar um pouco mais. Só um pouco mais.

— Como assim segurar? Está maluco? — Cruzei os braços furiosa, minha bunda já estava dando câimbras. — Eu não estou interessada em ter uma infecção urinária por sua culpa. Eu não pedi nada disso. Está me deixando cansada de tudo isso, assim que parar esse carro eu vou direto para a polícia.

— Faça o que quiser. Eu só preciso mesmo de cinco minutos do seu tempo. Quando chegarmos ao destino, você entenderá. Enquanto isso, se puder apenas ficar quieta por cinco segundos e me deixar pensar, eu serei eternamente grato.

Virei para o lado, encarando os carros que passaram e as lojas à beira da estrada. Encostei minha cabeça no banco e relaxei.

Ele não ia mesmo me ouvir. Eu o conhecia bem o bastante para ter certeza disso.

Droga. Não me parecia muito segura dormir ali, ficando completamente vulnerável ao lado de Jesse, mas eu ainda o daria pequeno voto de confiança. Eu sabia que ele nunca me machucaria de fato, e o cansaço acabou falando mais alto.

Acho que realmente adormeci depois de algum tempo. Se ele não fosse me matar, talvez quisesse terminar de me enlouquecer.

Já fui em uma porção de terapeutas. Quando o meu melhor amigo se matou na minha frente, foi o que meus pais sabiam fazer: empurrar-me para terapeutas para garantir que minha mente não estivesse arruinada. Se eu disser que a dor já não existe, estarei mentindo. Penso nele todos os dias, e tenho quase certeza de que metade de mim ficou presa em um loop infinito no ensino médio depois daquilo. Não é fácil lidar todos os dias com a culpa de ter desencadeado toda essa droga.

Jesse me ajudou, é claro. Ele esteve comigo desde o dia que acordei no hospital, esteve comigo por todo o tempo em que meu coração doía tanto que eu mal era capaz de me levantar da cama, Jesse esteve comigo todos os dias daquele verão que pareceu durar para sempre. E assim nós nos apaixonamos, ele foi a única pessoa a compreender que tudo que eu mais precisava era de tempo.

Você pensa de verdade que isso pode durar para sempre, até descobrir que seu namorado mentiu para você e escondeu coisas que a cidade inteira sabia, menos você.

Ele não conseguia deixar de ser um imbecil às vezes, acho que todos os garotos são assim. Eu o amava mais do que tudo, mas ainda me irritava o fato de que ele era extremamente imprevisível. Nunca sabia o que aconteceria em seguida, nunca sabia o que ele estava pensando, e nunca sabia se ele realmente me amava até que ele dissesse.

Agora, a única coisa que sei, é que não estou realmente certa sobre todo esse lance de amor, porque, veja bem, eu estava sendo sequestrada. E não era algo exatamente romântico.

— Jeannie — Jesse me falou cutucando a minha costela com um canudo, que, por acaso, eu não fazia ideia de onde tinha vindo.

Esfreguei os olhos, um pouco incomodada com toda aquela claridade repentina refletindo nas janelas do Chevy, e pisquei confusa. Parecia um daqueles sonhos loucos, só que eu não estava mesmo sonhando; as luzes eram reais, e olhe só, era noite completamente escura lá fora. As placas brilhantes tinham brilhado sobre os holofotes, havia neon por toda parte, e eu tinha certeza de que nós tínhamos acabado de passar por uma versão menor da droga da Torre Eiffel.

Inclinei-me para frente no mesmo instante, meio confusa, e vi um saco colorido do McDonald's sobre o painel. Limpei a baba seca no canto da minha boca com a barra da minha blusa e puxei meu cabelo desgrenhado para trás.

— Você deve estar com fome. — Ele disse.

Eu quis dizer a ele que não tinha sido realmente necessário, pois eu já havia guardado barras de cereal no porta-luvas para casos de emergência, e que não havia colocado toda aquela porção de gordura saturada no meu corpo. Claro, não que eu tivesse compartilhado minha comida com ele até então. Nem pensar. Encostei meu rosto no vidro da janela, observando todos aqueles hotéis de luxo, fontes iluminadas e ruas completamente lotadas. Vegas Strip.

Ai meu Deus.

Era exatamente como se via na TV. 

— Você só pode estar brincando... — Eu murmurei.

— Bem vinda a Vegas.

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