Acordei por volta das onze horas. Não sei como me permiti esse luxo, minha mãe concordou que eu merecia dormir, considerando que dirigi o dia inteiro ontem e estava verdadeiramente exausta. Pelo menos, foi isso que ela acreditou. Meu rosto estava inchado como um balão de festa. Acho que chorei até dormir, não tenho muita certeza, não sei exatamente que horas eram quando finalmente peguei no sono, mas o sol já começava a despontar no horizonte.
Senti como se estivesse entrando de bolsos vazios em uma nova fase da vida. Agora era completamente diferente de se afastar por um tempo da pessoa que você gosta para focar na construção do futuro. Não era uma nova vida; era simplesmente a minha antiga mudando. Olha, Eddie, se isso ainda é um sinal, não estou gostando nada de como está soando para mim.
No almoço, minha mãe preparou macarrão com queijo, e enquanto ajudava com os pratos, fiz o anúncio. Era isso. Eu ia voltar para Darwin. Havia terminado definitivamente com Jesse, e isso definitivamente estava me corroendo por dentro. Mas eu precisava ser firme. Não era como se ele fosse agir como um idiota, e tudo ficaria bem. Por mais que o amasse mais que tudo, uma garota tem seus limites.
— Vou voltar para o campus hoje ainda — Anunciei colocando os pratos na mesa — no sábado eu estarei de volta.
Minha mãe me olhou com aquela sua cara de culpa.
— Olha querida, se fosse por alguma coisa que eu disse ontem à noite...
— Não é nada disso. — suspirei —Além do mais, eu deixei uma porção de coisas no dormitório e eu ainda preciso resolver alguns problemas por lá antes de estar oficialmente de férias.
Meu pai entrou na cozinha com um sorriso no rosto.
— É assim que se diz, querida. É assim que se diz. Não é responsável essa minha Jane? Estou orgulhoso de você, querida.
Isso me parece bom. Então porque será que eu não estou feliz com nada disso?
— Oh Carl, pare de enche-la com tudo isso. Não está vendo no rosto de meu anjinho que ela não está bem?
Esfrego o rosto me perguntando se está tão na cara assim o quanto estou péssima.
— Só estou cansada — Bocejo.
— É claro que está cansada, e por isso mesmo vai ficar aqui por enquanto, conosco. — Disse meu pai dando um tapinha nas minhas costas.
O almoço passou rápido, mas não consegui me concentrar nas perguntas que meus pais faziam. Meu pai tagarelhou o tempo inteiro sobre baseball e jardinagem, assuntos que não me interessavam no momento. Na minha mente, Jesse repetia incessantemente um "tudo bem" antes de partir. Esperava mais dele.
Trazer Ally para tirar Ross da cadeia e participar de um encontro com um empresário estúpido? Desde quando Ross e Jesse se tornaram amigos? Talvez eu tenha ignorado toda essa loucura por tempo demais. Não consigo imaginar Jesse em uma banda, mas Ross, com certeza, era o tipo de rebelde bonito com um aviso de "não se aproxime" escrito na testa. Ele era um cara legal.
Após o almoço, fui até a casa de Ally, causando protestos do meu pai. No entanto, ela não estava lá, segundo a mãe dela, que informou que Ally estava na delegacia desde cedo.
Se eu disser que ela está estudando para ser advogada, com certeza você cairia para trás. É o tipo de reação que qualquer um teria. Está fazendo o que os pais querem, pois estão pagando por isso. Compreensível que não esteja nem aí para a ideia de estudar. Fazer algo que não quer, não é excitante, e Ally só fazia o que lhe dava na telha.
Lá estava ela, sentada com um jeans surrado e uma camiseta de banda, cabelo vermelho preso, reclamando sobre direitos constitucionais violados. A garota que chuta esquilos estava na delegacia tentando arrancar o seu ex namorado da prisão e eu nem mesmo entendia ao certo quais eram suas motivações.
A encontrei em meio à confusão, discutindo com um policial sobre registros, ciente de que estava apenas ganhando tempo.
Jesse também estava lá, o que me deixou desconfortável.
— Isso é um absurdo. — Ela falou quando me aproximei — São todos uns imprestáveis. O advogado da defensoria pública só trabalha aqui depois das duas da tarde! Não vou conseguir tirar ele daqui até amanhã!
Jesse se levantou. Por alguma razão desconhecida, estava usando um terno azul de festa, e sapatos pretos bem polidos. Fiquei me perguntando para onde ele achava que estava indo vestido de um modo tão antiquado para um dia particularmente quente.
Quando ele me viu, tudo que ele fez foi dar de ombros. Parecia estar empenhado em ignorar a minha presença e tudo o que havia acontecido entre nós.
— Vou pegar um café. — Falou depressa, e então sumiu.
Ele nem olhou pra mim. Nem por um segundo. Aquilo foi um tiro cego, senti até meu estômago se contrair. Eu quis ficar do tamanho de uma formiga e sair correndo. Ally se aproximou de braços cruzados e com uma carranca, ela segurou o meu braço e franziu o cenho.
— Desembucha, o que aconteceu com vocês dois? — Ally perguntou estreitando seus olhos — O ar ficou tão tenso que eu quase podia corta-lo com uma faca. Não me venha dizer que nada aconteceu, isso não vale.
Eu soltei um longo suspiro cansado.
— Eu terminei tudo entre nós.
Ela assentiu.
— Ah. Problemas no paraíso?
— Você estava certa, talvez eu não o conheça tão bem como eu pensava.
— Eu só estava te irritando, eu não falei a sério. Você sabe, não é?
— Estou te dando razão pela primeira vez Ally, me dê um credito — Eu suspirei — Talvez eu seja mesmo uma ingênua. Você acredita que ele largou a faculdade para criar uma banda?
— Isso não é maneiro? — ela disse. — Não me deixaram ver Ross ainda, mas assim que eu o vir ele vai saber disso da melhor forma.
Sacudi a cabeça tentando não pensar sobre isso, há falhas demais nessa descrição para que ela não seja perturbadora. Ally não é realmente um exemplo de responsabilidade.
— De qualquer forma, eu só vim me despedir. Vou voltar par ao campus.
— Vai voltar agora? — Perguntou Jesse com aquela sua cara de nada, segurando um copo de plástico quando apareceu bem na nossa frente.
— Eu não sei — eu disse secamente — Talvez eu arrume um emprego de verão por aí. Eu não tenho mais nada pra fazer nesta cidade.
Mais silêncio constrangedor.
— Mande lembranças para Ross — completei antes de dar de ombros.
Ally concordou com um aceno, ainda um pouco confusa.
— Jane — ela falou com seus lábios pretos de batom barato — Eu acho que... Bem, eu acho que vou ficar por aqui, com ele. Eu não quero voltar. Aquele lugar, aquele dormitório... Tudo sobre Darwin me dá coceira.
Ela soou bastante séria. Eu sei, ela nunca quis ter ido de verdade por todo esse tempo. Vai ser difícil viver sem a minha única melhor amiga por perto a todo tempo, mas eu vou sobreviver. Como vou sobreviver sem Jesse. Eu sei que isso significava que ela não ia mais voltar comigo, e talvez começasse a fazer o que realmente quisesse fazer.
Eu a abracei e sorri.
— Vai dar tudo certo. Eu sempre imaginei que hora ou outra fosse fazer isso.
Ela acenou positivamente.
Jesse permanecia com o olhar distante, ignorando-me com uma habilidade que já se tornara sua marca registrada. O motivo dessa atitude ainda me escapava, mesmo que toda a culpa estivesse claramente em seus ombros.
Decidi me retirar da delegacia, deixando para trás o tumulto que preenchia o ambiente. Com as mãos nos bolsos do meu short, desci as escadas da entrada, passando pela fila de viaturas que brilhavam sob as luzes. Surgiu em minha mente a ideia de procurar um emprego de verão, me afastar por um tempo e conduzir as coisas do meu jeito.
Ao alcançar meu carro, tirei as chaves do bolso. No momento em que abri a porta do motorista, uma mão se interpôs no meu caminho, interrompendo meus planos de escape.
— Entra no carro — Jesse disse bastante sério — Precisamos conversar.
— Olha, eu não acho que talvez seja uma boa ideia.
Mas ele apenas continuou me encarando com seus olhos cor de mel, mãos inquietas no seu terno azul fora de hora. Entrei pela porta do passageiro e fechei-a cedendo a ele devagar. Ele sentou no banco do motorista e pegou as minhas chaves.
— Ei! O que você está fazendo? — perguntei, mas ele já estava colocando a chave na ignição e a girando — Você enlouqueceu?
Começo a me arrepender. Jesse continua me ignorando, apenas liga o carro e acelera, nos tirando dali bem depressa. Não estou gostando nada disso.
—Jesse o que você está fazendo? Pare esse carro agora mesmo!
— Não está vendo? — Ele sorriu com o canto dos lábios — Estou sequestrando você.
Eu olhei para ele não muito certa sobre isso. Só podia ser brincadeira, afinal de contas, ele fazia esse tipo de piada estúpida a todo momento.
— Se você não parar este carro, eu vou pular. Não estou brincando.
Ele travou as portas.
— Ótimo, pode tentar se quiser.
Eu soltei um suspiro exasperado. Eu não acredito que ele estava realmente fazendo isso.
— Já chega, eu não estou brincando Blackburn, eu pensei que você soubesse bem o significado de “estar tudo acabado”. Você disse que queria conversar, isso que estamos tendo agora não é uma conversa.
Ele continuou me ignorando. Meu Deus, era extremamente irritante quando fazia isso. Apenas olhou para frente e continuou dirigindo a droga do meu carro. Em dois minutos, estávamos na interestadual, e eu não estava gostando nem um pouco de nada disso.
As linhas da estrada se estendiam diante de nós, e o silêncio no carro era quase ensurdecedor. A tensão pairava no ar, e eu me sentia desconfortável na presença dele. Queria perguntar o que estava acontecendo, mas algo em sua expressão me impedia. Olhei para fora da janela, observando as luzes da cidade se afastando à medida que nos aproximávamos da estrada deserta. A incerteza do destino e a falta de comunicação me deixavam apreensiva.
— Vou ligar para os meus pais — Digo tirando o celular do boldo — Se isso for uma brincadeira, eu...
Então, Jesse pegou o celular da minha mão e jogou pela janela. Não estou brincando, ele lançou meu celular pela janela. E foi aí que eu fiquei assustada de verdade.
— O QUE VOCÊ ACABOU DE FAZER?
— Aproveite a viagem, amorzinho.
Ele deu uma risada
Era incrível o empenho de Jesse em fazer qualquer outra coisa absurda só para que não tivéssemos uma conversa. Sério. Era irritante.Era mais irritante ainda pensar que eu estava a mercê dele.Então, ninguém sentiria minha falta, pois tecnicamente eu já havia retornado a Darwin e me despedido de todos. Ninguém presenciou quando Jesse entrou no carro e partiu comigo, tampouco notaram quando ele arremessou meu celular pela janela. Ninguém se importaria se eu não ligasse; afinal, não faço ideia de para onde Jesse está nos conduzindo, trajando aquele terno ridículo em um dia escaldante. Quero dizer, em um momento você pensa que conhece alguém, e no seguinte, essa pessoa te sequestra, levando para um possível covil secreto, onde retém garotas contra a sua vontade.Certo, essa última parte talvez fosse invenção minha. Mas tudo era possível, dado ao fato de que ele não tinha me dado nenhuma informação útil sobre o que pretendia fazer até aquele momento.— Isso é ridículo — eu disse pela milé
— Eu não acredito que você me trouxe a Las Vegas — Eu disse, cruzando os braços. — Eu quero voltar, agora!Carros buzinavam ao nosso redor, enquanto Jesse estacionava meu carro em frente a um hotel menor. Ele desceu sem dizer nada, as luzes do letreiro piscando no meu rosto, me deixando nauseada e tonta. De repente, Jesse abriu a porta e me puxou para fora pelo braço, de forma brusca.— Ei, amor, você é sempre tão gentil! — exclamei, irônica.Ele me lançou um olhar vazio e trancou o carro, escondendo a chave em algum lugar incomum em sua roupa. Não era no bolso, era literalmente dentro da roupa, em um lugar onde eu definitivamente não colocaria a mão em público.— Vem — ele disse, subindo as escadas. — Estou atrasado por sua culpa.Minha culpa? Ele que me arrastou à força para essa cidade, no MEU CARRO, para uma cidade no meio do deserto.— Você não vai deixar meu carro aqui, vai? — perguntei.— Vai ser só por um momento. Mexa-se e vamos logo — respondeu ele, com impaciência.Encarei
Sentada no meio-fio, abracei meus joelhos, me sentindo completamente perdida e desorientada.— O que nós vamos fazer agora? — minha voz soou fraca, quase um sussurro.Jesse, com uma expressão desesperada, andava de um lado para o outro na calçada, as mãos enterradas nos cabelos, como se estivesse à beira de um colapso.— Vamos ter que esperar até amanhã — disse ele, a voz embargada pela frustração.— Esperar não vai adiantar nada! Eu não tenho 400 dólares para pagar a multa, e, adivinha — gritei, a raiva transbordando nas palavras zangadas — Você jogou a merda do meu celular pela janela!Revistei meus bolsos freneticamente, encontrando apenas um papel de bala e uma nota de 20 dólares amassada. Tirei a nota, sacudindo-a na direção de Jesse, que tinha olhos cor de mel cheios de angústia.Ele revirou os bolsos e puxou a carteira.— Só tenho 50 dólares.— Isso não cobre nem uma noite num hotel. Estamos em apuros.A realidade da situação me atingiu como um soco no estômago. Jesse me arrast
Tudo bem. Talvez eu estivesse mesmo um pouco fora de mim. Na verdade, provavelmente gritei com Jesse por ter desperdiçado todo o nosso dinheiro, e também com os seguranças do cassino que, ironicamente, gritavam para que eu parasse de gritar. Os efeitos dos Dry Martinis que consumi não eram exatamente propícios para a lucidez, e eu sabia disso. E sim, talvez, em um momento de pura loucura, tenha apontado o dedo na cara do chefe de segurança. A última imagem que tenho do Cassino é a dura realidade do chão frio da calçada, sentindo minha dignidade tão destroçada quanto meu traseiro após sermos expulsos de forma humilhante. — Eu te disse que era uma péssima ideia! — resmunguei, sacudindo a poeira do meu short com um misto de raiva e frustração. — Mas claro, você tinha que ser tão teimoso. Jesse me ignorou completamente, continuando a caminhar pela calçada com passos firmes e apressados. — “Eu sei o que estou fazendo, Jane” — imitei sua voz com sarcasmo, balançando as mãos no ar. — E
Nossa fuga frenética nos levou por uma rua lateral, e viramos na primeira esquina. A dor lancinante em meus pés, ainda aprisionados nos saltos altos, era quase insuportável. Correr com aqueles sapatos era um desafio, especialmente sem o suporte adequado para o arco do pé.Finalmente, paramos em uma área mais isolada, longe das luzes cintilantes dos cassinos e boates. Ofegante, comecei a rir incontrolavelmente, uma risada espontânea e libertadora. Jesse, por outro lado, me observava com uma expressão carrancuda. Ele colocou seu paletó sobre meus ombros novamente, como se só então percebesse minha indumentária de stripper.— O que há de errado com você? — perguntou ele, limpando o suor da testa com o dorso da mão.Encostei-me na parede, vestindo o paletó azul de Jesse e abotoando-o. Vegas realmente era a cidade do pecado, e eu definitivamente não queria ser confundida com uma stripper novamente. A noite estava quente, e eu só conseguia pensar em um banho refrescante e numa cama para des
Parecia uma brincadeira de mau gosto. Eu estava lá, em uma situação quase inacreditável, e agora descobria que só havia um quarto disponível na Pousada da tia Mae - um quarto de funcionários, não menos. A explicação era um congresso de caminhoneiros que ocupava metade dos quartos do que carinhosamente chamavam de pensão. Tia Mae, que mais parecia ter idade para ser minha avó do que tia de alguém, circulava pelo local com sua pele curtida pelo tempo e um sorriso amarelado. A cada dois minutos, ela aparecia, inquirindo se Jesse precisava de algo, o que me deixava incrivelmente irritada.A única vantagem era que o jantar estava incluído no preço da estadia, que me custou apenas 70 dólares. Diante da nossa situação financeira, essa notícia era um alívio. Além disso, o aroma da comida, embora gorduroso e longe de ser saudável, era inegavelmente tentador. Eu estava ansiosa para saciar minha fome, apesar da atmosfera estranha e um tanto sufocante da pensão.Enquanto me sentava para jantar, n
A noite em Las Vegas tem sua própria magia, um espetáculo deslumbrante de luzes cintilantes que parecem dançar contra o pano de fundo do deserto escuro. A grandiosidade dos cassinos na Strip, com seus shows luminosos e arquitetura imponente, atraem os olhares de todos que passam. Por um instante, enquanto caminhava pelas calçadas movimentadas, eu me deixava hipnotizar pela beleza das fontes do Bellagio e pela imponente réplica da Torre Eiffel no Paris Las Vegas. Era fácil se perder nesse transe de luzes e esquecer do mundo ao redor.No entanto, a realidade logo se impunha, lembrando-me de que estávamos em uma situação desafiadora. A cidade brilhante e fervilhante à minha volta parecia um contraste cruel com nossa atual condição – sem um lugar para ficar, sob o calor abrasador de quarenta graus no meio da noite. Por um momento, me perguntei se aquilo era algum tipo de purgatório, uma seção do inferno feita para testar minha sanidade.Uma garota normal talvez estivesse aproveitando as f
Ally nunca está no quarto as três da manhã, eu sinceramente não entendo o que ela faz para se manter de pé, já que parece nunca dormir. Ela faz muito isso, some quando eu mais preciso dela. Ai meu deus Ally, eu vou matar você.— Oi Ally, sou eu de novo. Se ouvir essa mensagem por favor atenda a droga do telefone ou vou ligar para a polícia.Enfio a cabeça debaixo do travesseiro e grito apertando o telefone contra a orelha. Rolo cama sentindo os caroços do colchão mais do que gasto, olho para o teto encarando as rachaduras escuras na tinta branca. Quando está quente sempre caem lascas de tinta gasta no meu cabelo, o que é péssimo, porque parece mais que eu tenho um sério problema com caspa.Na maior parte das vezes, este alojamento velho e apertado me irrita, eu não sei bem o porquê, talvez seja somente a terrível saudade de casa que me assola todas as noites solitárias. Não há uma só manhã que eu não acorde com as costas tortas e me encaro no espelho, questionando a mim mesma se eu fi