Virei-me para pegar os copos e quase dei um pulo ao perceber que o peito de Grady O’Neil estava bem diante dos meus olhos.— Eu enxugo — ele disse, pegando o pano da bancada.— Não se preocupe. Eu consigo fazer sozinha.Grady me olhou e tentou esboçar um sorriso, mas algo em sua expressão parecia diferente.— Minha avó costumava dizer que o motivo para não olhar os dentes de um cavalo dado é que ele pode acabar mordendo você.Minha resposta saiu no mesmo tom defensivo de sempre.— Ela também dizia que, muitas vezes, esses cavalos dados são apenas mulas disfarçadas.O semblante dele ficou sério, quase pensativo, como se estivesse decidindo algo importante.— E ela também dizia que não se pode julgar um homem até caminhar um quilômetro com os sapatos dele. É a única forma de perceber que o pé dele pode não ser tão grande quanto você imaginava.O significado das palavras me atingiu em cheio, como um soco no estômago, e senti um nó se formar na garganta.— Grady, eu...— Não diga nada, Ho
Mesmo quando finalmente me deitei naquela noite, o sono parecia um luxo distante. Grady tinha ido embora logo após ajudar com a louça, mas o clima entre nós ainda carregava certa tensão. Apesar da conversa leve durante o jantar, nada sobre nossa última discussão foi mencionado. Eu tinha quase certeza de que ele não aprovava o fato de eu ter vendido alguns objetos para conseguir dinheiro.Suspirei, pensando na possibilidade de ele ter esquecido o convite para a reunião de família. Parte de mim sentia-se aliviada com isso, mas outra parte... Bem, eu não sabia ao certo como lidar com esses pensamentos.No sábado de manhã, Mugger me chamou para cobrir um turno no coffee shop do hotel. Quando cheguei em casa, Tammy estava na porta da frente, com um semblante indecifrável.— Oi. Como foi a manhã? — ela perguntou.— Normal. E aqui, tudo bem?Ela ergueu as sobrancelhas e respondeu:— Mais ou menos. Você quer primeiro as boas ou as más notícias?Joguei a bolsa no sofá, já cansada antes mesmo d
Eu tentava esconder a ansiedade enquanto segurava a mão de Megan, esperando Grady e os meninos se juntarem a nós. Meu estômago estava um nó, e o desejo de estar em casa, lavando roupas ou limpando o fogão, era quase irresistível. Qualquer coisa parecia mais fácil do que enfrentar o que estava por vir.A porta da frente se abriu antes que eu alcançasse os degraus, e uma mulher grisalha apareceu. Bastou um olhar para perceber que ela era a mãe de Grady. A semelhança entre eles era inegável — o mesmo sorriso caloroso, os mesmos olhos vivos.— Já estava começando a pensar que vocês haviam se perdido! — disse ela, envolvendo Grady em um abraço tão acolhedor que senti uma pontada de saudade de algo que nunca tive. Ela deu um beijo em seu rosto e, sorrindo, continuou: — Por que será que você sempre me parece mais alto do que da última vez?— Talvez eu ainda esteja em fase de crescimento — respondeu ele, rindo. Seu tom era descontraído, mas cheio de carinho. Então ele se virou para mim. — Hol
Assim que Megan respondeu um tímido "sim" ao elogio, eu percebi como Grady tinha o dom de acalmar os corações ao seu redor. Ele colocou a mão no ombro da menina e a puxou gentilmente para perto, como se prometesse protegê-la de qualquer coisa.— Vamos lá para dentro ver o que tem de bom? — ele perguntou.Os olhos de Megan brilhavam de empolgação, e ela aceitou a mão dele com um sorriso discreto. Eu os segui, observando aquele pequeno gesto que me tocou mais do que deveria. Era uma cena que eu sabia que ficaria gravada em minha memória.Trevor e Ryan, por sua vez, levaram apenas alguns segundos para se misturarem ao grupo barulhento de meninos. Megan, porém, precisou de um pouco mais de tempo. No início, os garotos mais velhos franziram a testa diante da ideia de ter uma menina entre eles, mas não demorou muito para que sua determinação suave conquistasse a todos.Joanne teve a ideia de reunir as crianças na sala e, em questão de minutos, estavam todos assistindo a um filme na Netflix.
Megan entrou na sala exatamente quando me sentei entre Luke e Grady. Ela se aproximou dele e entregou-lhe uma lata de blocos de armar.— Você abre a tampa para mim? — ela pediu, com um sorriso tímido.Grady colocou sua xícara sobre a mesa e tirou a tampa de metal com facilidade.— Está se divertindo, querida? — ele perguntou, com uma voz suave.— Estou, mas os meninos fazem muito barulho. Era nítido que Megan parecia estar cada vez mais cansada. Grady então afastou-se um pouco, criando espaço no sofá.— Sente-se aqui ao meu lado e brinque com os blocos no braço do sofá. — Ele a convidou, de maneira gentil.Megan não hesitou e rapidamente se acomodou no espaço que ele preparou para ela, seu pequeno corpo quase desaparecendo entre os estofados. Eu os observava, o rosto sério, uma sensação desconfortável apertando meu peito. A aproximação de Megan a Grady parecia tão natural, mas, por alguma razão, não conseguia deixar de me sentir insegura.Levantei os olhos para ver Joyce me observand
A casa se erguia solitária no meio de um amplo terreno abandonado, onde o mato atingia mais de um metro de altura. A pintura branca, gasta pela contínua exposição ao tempo, estava descascando por toda a extensão das paredes, e a porta de tela, solta das dobradiças, estava caída na varanda. A madeira envelhecida dos batentes das janelas ainda revelava restos de tinta verde, e, de frente para a rua, um vidro quebrado brilhava como uma teia de aranha prateada sob o sol de fim de tarde. Apesar do mato, eu conseguia distinguir uma calçada de cimento em torno da residência, com plantas crescendo pelas rachaduras, revelando os vários meses de total negligência. Apenas as quatro grandes árvores alinhadas no fundo do terreno se salvavam da atmosfera de destruição e descaso que permeava todo o local.Apertei as mãos úmidas e respirei fundo antes de descer do caminhão, tentando disfarçar a profunda decepção que me invadiu. Por um breve instante, uma onda de pânico quase me dominou, mas consegui
Assim que a recém-chegada acenou para mim, abriu um sorriso ainda maior ao se aproximar. Era como se já nos conhecêssemos, e sua energia era quase contagiante. — Oi! Você é a Holly, certo? Eu a reconheci pelas fotos que sua avó me mostrava. Já estou aqui esperando desde cedo e achei que vocês não viriam mais! — Ela estendeu a mão quando chegou perto o suficiente. Seu rosto irradiava uma alegria genuína, refletindo sua natureza extrovertida. — Sou Liz Crawford, moro a duas casas daqui, descendo a rua. Seja bem-vinda a Jennings. — Obrigada — respondi, devolvendo o sorriso. — Também achei que não chegaríamos mais. Foi uma viagem longa. — Imagino, ainda mais com crianças, não é? — Liz riu, parecendo entender perfeitamente o que eu passara. — Os meus brigam, discutem e reclamam até estarmos a uns dez quilômetros de casa. Só então encostam a cabeça no banco e dormem. — Os meus passaram os últimos mil e duzentos quilômetros brigando pela janela. — Suspirei, lembrando da jornada exaustiv
Eu nunca me senti tão pressionada como no dia em que fui conversar com o advogado. Precisava urgentemente arranjar uma babá para as crianças. Não era justo continuar dependendo da boa vontade de Liz por muito tempo, mesmo sabendo que minhas condições financeiras estavam longe de permitir isso. Mas como eu pagaria? Acabara de gastar uma quantia considerável para instalar um telefone, e minhas economias estavam acabando depressa. Depois de comprar mantimentos e outros produtos essenciais para a casa, restaram-me exatamente quinhentos e quarenta dólares. Se eu controlasse rigorosamente cada centavo, poderia manter a família por mais umas seis semanas.— Sra. Simpson, o Sr. Brown vai recebê-la agora — avisou a secretária.Respirei fundo e, tensa, peguei a bolsa antes de me dirigir ao escritório que ela indicou. O homem magro, parado junto à escrivaninha abarrotada de papéis, levantou-se ao me ver entrar e estendeu a mão com um sorriso amistoso.— Sou Ned Brown. Seja bem-vinda à nossa cida