Luzes! Há quem diga que as luzes mostram o caminho, no último ano Nick tinha visto muitas, coloridas, brilhantes, desfocadas. A vida noturna esconde beleza e dor, para Nickolas Bianchi nenhuma daquelas luzes o levou para onde queria estar.
O abraço doce e delicado da menina que ele carinhosamente chamava de Ratinha.
Estava mais uma vez em uma casa noturna, olhou em volta e em seguida para o copo de whisky a sua frente.
— Almas perdidas, todas almas sem rumo, assim como eu.
Pensou enquanto retirava o último cigarro do maço, acionou o isqueiro, olhou por alguns instantes para a chama e acendeu a brasa dando um trago forte.
A dor que trazia no peito o dilacerava a cada dia, uma dor com nome de mulher, rosto de menina e a voz mais doce que já tinha ouvido.
Na antiga capital indiana de Deli, há em média cem bordeis de vários andares destinados à diversão masculina. Alguns como a casa 64 eram visitados inclusive por turistas. Nick conhecia cada um deles como a palma da própria mão.
Desde que assistiu impotente a namorada ser arrastada para fora da casa da própria mãe por um indiano, o único nome que ecoava em sua mente era aquele.
— VIKRAM!
O grito de Helena chamando pelo cúmplice a quem tinha vendido a filha de apenas quinze anos ainda estava nítido em sua mente.
Deveria ser apenas um passeio, Nick planejou tudo para que fosse leve e delicado como a namorada. O problema é que os filhos do submundo não podem apenas existir, mas ele cometeu o erro de se esquecer dessa penosa realidade.
O dia em que perdeu Olívia, também foi o começo do seu pior pesadelo. Trezentos e sessenta oito dias depois, ainda sentia doer exatamente como foi enquanto lutava pela consciência depois de ser dopado pela sogra que havia acabado de conhecer.
— Também tem um filme que me faz lembrar de você, Olie.
A menina costumava dizer que Nick se parecia com Thor, o Deus do trovão que foi inspirado na mitologia Nórdica e conquistou os corações dos admiradores da Marvel.
Assistiram A forma da água, um filme diferente que fala sobre uma mulher que se apaixona por uma criatura meio homem, meio peixe.
Um filme e um sorvete, nada além disso, deveria ser apenas um passeio comum e sem consequências, no entanto, foi o começo da dor mais contundente e dilacerante que sentiu.
Passaram horas na praça de alimentação enquanto Olívia compartilhava as suas teorias sobre o filme que tinham acabado de assistir.
— Eles eram iguais, Thor! Ela não se apaixonou por um monstro, enxergou além da aparência e se viu no espelho daquela alma.
Nick associava a própria existência a daquele Monstro, filho de um ex-chefe da máfia, a história dele se misturava à guerra e ao sangue, mas Ollie surgiu e o fez acreditar que poderia haver redenção no inferno.
— Você é especial, sabia?
— Eu?
Olívia deu risada como se estivesse ouvindo uma piada. Ela não se achava especial. Pelo contrário, acreditava ser comum e invisível como um rato. Por isso não se importava com o apelido.
— Acho que amo tudo em você
Nick confessou apesar do pouco tempo em que se conheciam e das circunstâncias em que viviam.
— O que mais me fascina é que você é pura como um anjo.
Enquanto estavam sentados perto da fonte, Olívia aproveitou para contar histórias. Adorava pensar na vida pela ótica da arte, achava que os filmes eram escritos por almas transbordantes e que carregavam mensagens divinas.
— Jane Foster não morreu, ela se tornou eterna, entende? Thor jamais vai esquecer o amor que viveram.
Falou sobre a namorada do herói dos cinemas como se falasse de uma amiga. E ele respondeu com a mesma leveza apesar de não ser um homem comum.
— Eu também nunca vou te esquecer, minha ratinha.
— Você acabou de dizer que ama tudo em mim, senhor Deus do trovão! Acho que posso me considerar a mais nova Jane Foster.
— Ainda vou te fazer Olivia Bianchi.
Olivia ficou paralisada, ele era intenso, tinham saltado de conversas despretensiosas para um quase pedido de casamento, mas estava adorando cada detalhe.
Nick segurou a nuca da menina e se inclinou, os lábios estavam quase se tocando quando ele falou com a voz grossa e sussurrada.
— Eu amo você, ratinha!
Ouvir aquelas palavras fizeram com que Olie fosse tomada por um tipo de emoção desconhecida, o coração parecia querer saltar do peito e dançar com o coração daquele homem que a olhava com aquele brilho tão azul que a hipnotizava.
O sorriso se desfez no beijo e no desejo que nem mesmo sabia existir. O abraço forte e os lábios experientes faziam com que cada movimento parecesse um convite para um universo de descobertas.
Nunca imaginou que as coisas com Nick aconteceriam tão rápido. Na verdade, achava que nunca aconteceria nada. Ele era bonito como um Deus nórdico, guerreiro e perfeito demais para notar alguém tão invisível como ela.
— Sim
Ela respondeu baixinho assim que os lábios se separaram.
— Siiiim? O quê?
Apesar da confusão ele perguntou sorrindo, com aquela menina tudo parecia perfeito e a vida cheia de dores, inseguranças e frustrações, um passado que não lhe pertencia mais.
— Você disse no bilhete que, se eu dissesse sim, queria beijar só a minha boca pelo resto da vida. Então sim!
Dois dias! Foi o tempo que tiveram entre o primeiro beijo e o último. E ainda assim, olhando para aquele copo de Whisky enquanto dava seu último trago no cigarro já consumido pela brasa ardente. Nick ainda se lembrava daquele SIM.
Ela dormiu na cama do rapaz, acompanhada apenas de um bilhete escrito com a caligrafia perfeita e recheado de promessas não cumpridas.
Boa noite, minha ratinha. Vou sonhar com você, amanhã tomamos café juntos e se você disser sim, quero beijar só a sua boca, tipo para o resto da vida. Obrigado por não desistir de mim.
Ele a enxergava como uma menina que estava se entregando a um homem e estava decidido a agir como um. Esperaria até que ela estivesse pronta para se tornar mulher em seus braços.— Vai ser uma honra para mimUma honra que Nick não alcançou, mas ainda sonhava com o dia em que a teria de volta e pudessem simplesmente recomeçar como se o tempo não tivesse passado, porque para ele, nada, absolutamente nada tinha mudado desde o último beijo.— Quero conhecer sua mãe, dizer a ela que quero namorar a filha dela e prometer que vou cuidar de vocês duas para sempre.Decisões certas surtem efeitos contrários com pessoas erradas e foi exatamente assim que Nick viu sua paz ser roubada.Quando chegaram à casa de Helena, a mulher os observou com um interesse nada inocente para uma sogra.— Olívia! Que saudade!A mulher de pouco mais de trinta e cinco anos exclamou, fingindo entusiasmo e abraçando a filha.Viu pela janela a forma como Nick tratava Olívia. Ele abriu a porta do carro esportivo escandal
O dono da casa 64 havia comprado a garota depois de uma noite intensa, se apaixonou pelo que ela tinha a oferecer, mas em especial pela personalidade.— Como é seu nome, menina?— JaneA loira mascarada respondeu ajoelhando em frente a Omar e oferecendo o que foi apenas o início de uma noite sensacional, no entanto assim que ele tentou tirar do pescoço delicado a coleira que ela usava, Jane segurou a mão masculina e o encarou com ódio.— Não, milorde. Está aí para te lembrar, que para você sou um brinquedo emprestado. Tenho um dono.Omar não estava ali buscando conversas, então apenas aproveitou cada parte do corpo feminino, no entanto, quando já não tinha mais forças, se encontrou com um outro lado da mulher que o serviu.— Qual o seu luto, milorde?O dono do melhor núcleo de diversão masculina da Índia achava não possuir lutos, estava acostumado ao poder e a pegar absolutamente tudo o que queria, quando queria.— Gosta de conversar, Jane?— Um dia, um homem sem coração disse que a v
Já nem se lembrava quantas vezes precisou tomar antibióticos para as mais diversas doenças que adquiriu servindo aqueles homens. Nada importava, nada mesmo.— Está aqui o seu dinheiro, agora some volta para o salão e escolhe outra menina.O homem saiu satisfeito, tinha provado a joia da casa e teria dinheiro para usufruir de pelo menos outras quatro garotas, se quisesse.— Com ciúme, Visão?Jane perguntou sorrindo para Omar, não imaginava o que estava por trás daquela reação exagerada do seu benfeitor.Ela era a única que tinha um quarto no último andar, a cama de casal enfeitada, banho quente e comida fresca. O dono da atual casa em que estava trabalhando representava proteção e ela fazia questão de pagar por isso.Beijou o pescoço de Omar e colocou uma das pernas na cintura masculina.— Quer brincar com a sua Priya?Era assim que ele a chamava quando estava tomado pela lascívia.— Tem um cliente novo, vai gostar dele.— Não quero atender seus amigos, Omar. Temos um acordo.Jane se r
E mulheres como elas nunca seriam vistas com amor, ainda tinha nítido em sua mente as palavras de Nick sobre Olívia, a menina que não existia mais.— Acho que amo tudo em você, mas entre todas as coisas o que mais me fascina é que pura como um anjo.E Olívia realmente era pura, mas Jane não! Tinha se tornado mulher no chão, sentindo as costas serem cortadas pelas agulhas deixadas por usuários de heroína. Aquela foi a sua primeira vez, mas houve outras, tão dolorosas e desesperadoras quanto a primeira.Lembrava dos detalhes, do barulho da cama de ferro que rangia com o movimento do outro homem que usufruía do corpo de outra garota. No mesmo quarto sujo de dois por dois, três garotas foram oferecidas como pagamento de uma dívida de Ibrahim.O indiano estava negociando várias toneladas de haxixe e precisava pagar pelo transporte.Muitas rotas secundárias podiam ser usadas, contudo Dawood Ibrahim nunca foi conhecido por sua paciência, gostava de manter suas casas de diversão abastecidas c
Sentiu, sentiu muitas coisas, mas o que mais a feriu foi se deixar morrer. Demorou muito até entender que a morte de Olívia podia dar vida a outra pessoa, assim como a morte de Jane, trouxe a poderosa Thor.Assumiu esse nome e aceitou o destino exatamente como Jane aceitou o câncer, porque na verdade, tanto uma quanto a outra estavam condenadas a uma doença sem esperança de cura.Foram várias casas, vários homens, muitos corpos. Durante a noite era a Guerreira, durante o dia a faxineira. Era acordada com chutes para que pudesse lavar o chão e trocar os lençóis muitas vezes sujos de sangue, fezes e outras imundices humanas.Ainda assim, todas as manhãs olhava o sol e se enchia de esperança, a primeira vez que recebeu a visita de um médico foi quando bolhas estranhas se espalharam justamente na parte do corpo que era comercializada por aquelas casas. Já estava suportando a dor e a febre há meses quando um dos clientes apareceu para reclamar que tinha sido contaminado por ela.Foi espanca
Omar abraçou a garota e a levou de volta para o quarto, precisaria se justificar com o cliente que estava esperando, mas apesar disso, Jane tinha o dom de deixá-lo encantado, em alguns momentos ela era forte como Durga e em outros tão frágil e assustada que dono da casa 64 sentia vontade de protegê-la.— O que aconteceu, Jane? Preciso saber ou não posso te ajudar.Ela estava com a mão no pingente que ganhou, segurou com tanta força que a argola se desprendeu da coleira e Jane ficou com aquela pequena marreta na mão. As lágrimas caíram sobre o metal deixando um brilho diferente.Jane fechou a mão e segurou a única coisa que a lembrava da sensação de ser humana, de ter uma vida, do sonho que viveu e que foi tão lindo que, às vezes, ela sentia como se realmente tivesse sido beijada por um Deus.Os soluços da garota eram tão desesperados que Omar se assustou, Jane era forte, tão forte que ela cuidava das meninas que chegavam, as fazia entender que não era uma escolha e que lutar seria pior
Havia um homem, alguém que entre todos, Nick confiaria a sua vida, alguém que esteve com ele nos momentos mais dolorosos da sua vida, e como tal, também não o abandonou naquela noite.— Que você fez moleque?Sombra não era apenas o padrinho de Nick, ele era o início, a raiz da máfia americana. O homem que traiu o primeiro capô e se aliou a um desconhecido para criar uma era, onde o código realmente fosse seguido e eles pudessem esquecer o tempo em que o medo gritava antes da lealdade.O senhor de meia idade chegou até a casa 64 procurando pela menina que Nick chamava de ratinha, uma pista o levou até aquele lugar, não imaginou que o rapaz que foi treinado pelos melhores, agiria como uma criança.Os passos relaxados de Sombra não geraram desconfiança, mas a tentativa de entrar em um bordel, sim.— O que você quer aqui?— Não é conversar com você!O segurança da casa 64 avaliou cada um dos detalhes do homem que se aproximou, o conhecia! No submundo, todos se conhecem, mas ninguém fala so
Nick estava sentado no banco do passageiro, não sentia doer, ao menos não os cortes e hematomas. A incerteza é muito mais dolorida do que qualquer surra.Entrou na hospedagem sem olhar para os lados, sem se incomodar com nada. Passou na frente de Sombra, olhou para o lugar precário, tudo naquele país parecia ser um encontro bizarro de extremos, os pobres não tinham nada e os ricos tinham muito mais do que precisavam.Uns, tomavam banho com água suja que escoava dos telhados, outros em banheiras de hidromassagem e usavam tantas joias que chegava a ser difícil erguer os braços.Nick foi até um móvel de madeira entalhada, pegou uma garrafa de destilado e virou na boca.Gargarejou, jogou o líquido de um lado para o outro sentindo o álcool queimar os cortes. Cuspiu no chão como se já fizesse parte daquele universo sem alma. Virou a garrafa de novo e dessa vez engoliu o líquido que se misturou ao sangue.Se sentou no pequeno sofá ainda segurando a garrada, justamente ele que nunca poderia te