Passei no balcão de entrada da Vanderbilt Enterprise para fazer minha identificação. Não acredito que eu iria para uma entrevista naquele estado deplorável. Até na foto de cadastro ficou registrada a blusa toda manchada de café. Que vergonha!
Brenda foi entrando na frente porque já estava atrasada, depois daquela confusão que causei. Acho que ela nunca mais vai me perdoar, mesmo eu insistindo em dizer que CEO não costuma conhecer seus funcionários e nem devia saber que ela trabalhava lá. Brenda afirmou que ele conhecia todo mundo da empresa, mesmo não sabendo exatamente os nomes. Acho muito difícil um cara com a responsabilidade e falta de tempo dele se importar em saber quem são as pessoas que trabalham para ele.
Recebi o crachá para entrar e fui direto para o quarto andar. Será que isso foi um castigo do meu pai por eu estar aqui tentando uma vaga na empresa do seu inimigo? – pensei comigo. Não viaja, Sara. Seu pai tem mais o que fazer agora do que vir aqui só para te castigar por algo que tenha feito – falou uma voz na minha cabeça. Respirei fundo para acalmar meus nervos. Eu precisava muito daquela vaga ou não teria dinheiro algum para começar a dar ao agiota.
Sentei na sala de espera, aguardando minha vez de ser chamada. Uma vontade de chorar estava presa na minha garganta. Eu não aguentava mais ser aquela mulher forte o tempo todo. Às vezes, eu sentia falta de ser só a menininha do papai, que deitava a cabeça no colo dele para chorar enquanto ele passava a mão pelo meu cabelo e dizia que tudo ia ficar bem. Meus olhos marejaram, e eu engoli o choro mais uma vez. Eu só queria a certeza de que tudo ficaria bem de novo. A morte de papai acabara com toda a convicção que eu tinha de que venceria na vida. Ele era meu maior incentivador. E agora eu estava sozinha.
Uma moça morena, com traços elegantes, cabelo com tranças afro, muito bem-vestida, parecendo uma modelo de meia-idade, se aproximou de mim e pediu que a seguisse. Achei que estava me levando para a entrevista, mas chamou o elevador. Será que a entrevista seria em outro andar? Mas todos os meus concorrentes estavam sendo apenas chamados pelo nome e entrando em uma salinha logo após o corredor que ficava de frente para a sala de espera.
Já sei! Ela deve estar educadamente me levando para fora da empresa, pois não estou vestida adequadamente, e ela não quer alarde. Ai, que vergonha! Aquele desgraçado me paga! Estava tão distraída em minha briga interior com o cara do café que nem reparei o elevador andar, só vi quando ele abriu em outro andar. Também não percebi qual era, mas, sem dúvida, era muito mais bonito que o anterior. Tinha uma vista de tirar o fôlego. Ufa! Ela não estava me expulsando da empresa.
A moça elegante parou diante de uma mesa e pegou uma caixa de tamanho médio e me entregou.
– Aquela segunda porta é o banheiro. Você pode se trocar lá – afirmou sem mais rodeios a mulher.
Uau! Essa empresa deve ser incrível! Viram que eu estava suja de café e estão me oferecendo trocar de roupa antes da entrevista. Que máximo! – pensei entusiasmada. Peguei a caixa, dei um sorriso animado para a moça e fui.
Meu Deus! Não podia ser verdade. Dentro da caixa tinha um lindo vestido vermelho de marca, caríssimo e de muito bom gosto. Era exatamente o meu número. Fiquei confusa. Que empresa doida é essa? Mas coloquei o vestido, porque mulher nenhuma se negaria a vestir aquela beldade. Ele vestia perfeitamente no corpo e realçava tudo o que ela tinha de melhor. Parecia um vestido mágico, feito pela fada madrinha da Cinderela para me deixar ainda mais bela. Fiquei de boca aberta ao me olhar no espelho. Nunca me sentira tão linda! Até esqueci a tristeza que havia me tomado há pouco.
A tal moça estava me esperando bem na porta do banheiro.
– Uau! Ficou lindo em você. Foi uma excelente escolha. Agora vamos para sua entrevista – falou empolgada. – Ah, e eu, na pressa, acabei não me apresentando. Sou Karoline Sanders, mas pode me chamar de Karol. Sou a gerente de finanças da Vanderbilt Enterprise.
– Peraí… Você disse “finanças”? Então tem algo errado, Karol. Eu vim fazer entrevista para a vaga de assistente do gerente de marketing.
– Sim, eu fiquei sabendo. – Ela riu como se soubesse de alguma piada interna que eu estava de fora. – Mas houve algumas mudanças de plano. Pode entrar.
Ela abriu uma sala muito ampla, toda de vidro, mostrando de cima uma vista linda de toda a cidade. Aquele andar devia ser muito alto. E o dono daquela sala tinha muito bom gosto. A decoração era bem masculina, mas realmente de ótimo gosto. Os móveis eram de madeira em tom caramelo, assim como o sofá de couro e a cadeira giratória que ficava por trás de uma mesa toda de vidro. Apesar de muitos itens de escritório, a mesa estava impecavelmente organizada.
Karol fechou a porta e fui me aproximando aos poucos da mesa principal, maravilhada com todo aquele luxo. De repente, a cadeira giratória, que antes estava virada para a paisagem, se virou para ela. Ah, não! Não pode ser!
– Ficou muito bem em você o vestido. Eu realmente tenho bom gosto – proferiu em tom acolhedor, mas com uma cara muito séria e intimidadora. – Pelo menos, ficou muito melhor do que aquela camisa cheia de café.
– Fo-foi você o ve-vestido? – questionei gaguejando, sentindo a raiva subir pela minha garganta. – Não acredito! O que você quer de mim? Não sei com que tipo de mulher você está acostumado, mas eu não sou assim! Não quero vestidos caro nem nada de luxo em troca de…
– Em troca de quê? – perguntou ele. Eu sabia que tinha um sorrisinho sarcástico por baixo daquela máscara de seriedade. Ele se levantou e estava vindo em minha direção. – Vamos, me diga. Em troca de quê? Para que você acha que te chamei em minha sala e te dei um vestido caro? Vamos lá, me conte o que sua mente maldosa pensou sobre mim.
Agora ele estava muito perto. Eu queria gritar com ele, mas meu corpo não correspondia. Fiquei muda, estática, com o coração acelerado e as mãos suando frio. Ao ouvir suas palavras fui sentindo um calor tomando todo o meu corpo. Senti meu rosto ardendo e ficando vermelho, certamente ressaltando minha vergonha no meu rosto tão branco. O que aquele homem estava fazendo comigo? Eu precisava sair dali correndo. Foi andando ao meu redor, muito perto do meu corpo, me analisando. Me senti uma manequim em uma vitrine.
– O que você quer de mim? – consegui repetir de forma ríspida.
– O que você acha? – sussurrou tão perto da minha orelha que senti todos os pelos da nuca e do rosto se arrepiarem. Aquele era o homem mais lindo que já vira, e ele estava sussurrando em seu ouvido, brincando com as sensações do seu corpo. Aquela pele bronzeada, ressaltando os olhos muito verdes, os braços musculosos... Sacudi a cabeça para tirar ele do pensamento.
Ele saiu abruptamente de perto de mim e quase senti minhas pernas falharem. Aquele homem tinha um poder sobre mim que eu nunca tinha visto acontecer. Também eu nunca tive um namorado para despertar certas sensações em mim.
De repente, um sinal de alerta gritou em minha cabeça: ele é um Vanderbilt! Recobrei minha sanidade imediatamente.
– Se eu soubesse, não precisaria perguntar, não acha? – respondi de forma rude e determinada.
– Justo. Você está certa.
– Só para você saber, eu estou sempre certa. – Pela primeira vez, vi um sorriso se estampar naquele rosto de deus do Olimpo.
Então, ele apenas jogou uma bomba no meu colo:
– Eu te chamei aqui para te contratar como minha assistente.
Entrei na loja e me deparei com um lindo vestido vermelho em uma manequim que estava bem no centro da loja de luxo. Uma vendedora loira, magra, com uma maquiagem leve, apenas para realçar sua beleza de 20 e bem poucos anos, veio em minha direção.– Posso lhe ajudar, Senhor Theodore?Ela me conhecia das outras tantas vezes que eu fora lá para comprar um presente para alguma namorada. O fato é que eu trocava tanto de namoradas que eu estava sempre por lá comprando algum presente para a mais recente felizarda. Apesar de já estar aflorado em mim o desejo de construir uma família, não conseguia encontrar uma parceira com quem eu realmente almejasse o tal “para sempre”.– Olá, Lorena! Vou querer este para presente. – Indiquei o manequim com o exuberante vestido vermelho.Pensar naquela pequena Pinscher vestindo aquela peça fez meu membro latejar. Fazia tempo que meu amigo não era usado. Eu havia desistido de ficar saindo com essas modelos que só estavam interessadas no meu status e dinheiro
Pensei que eu fosse desmaiar bem ali. Minhas pernas ficaram fracas e senti o sangue sumir do meu corpo. Tudo o que eu menos precisava era virar assistente do filho do grande inimigo do meu pai. Tom Vanderbilt tinha acabado com a vida da gente. Ele fez meu pai perder o sonho da sua vida e se manter para sempre como um simples professor de empreendedorismo inovador, que nem um negócio próprio tinha – quanta hipocrisia! Isso o revoltou ainda mais. Deixou-o com “uma mão na frente e outra atrás” logo no momento mais importante de sua vida. Tom fechara negócio com os empresários e o deixara de fora do esquema, recebendo sozinho a mais do que generosa comissão pelo contrato firmado de fornecer transporte de qualidade e a baixos custos para facilitar a importação de produtos da Itália, projeto que tinham elaborado juntos nos últimos anos. Era um contrato milionário, e seu sócio o excluíra por puro egoísmo e ambição. Tom, que se dizia o seu melhor amigo, simplesmente virara as costas para ele
Meu pai continuou contando sobre aquele dia fatídico. Disse que acordara animado para a reunião. Diana foi para uma entrevista de emprego, e ele estava se aprontando para ir para a reunião que poderia mudar tudo para eles. Chegaria mais cedo do que o acordado com Tom, pois estava ansioso e não aguentaria ficar mais tempo naquele apartamento vazio, sem ter ninguém com quem desabafar seu nervosismo.Valter foi pegar o celular, que deixara carregando a noite toda. Droga! Viu que o fio não estava encaixado direito e restavam só 10% de bateria. Mas, não tinha problema. Levaria o carregador e carregaria lá no coworking quando chegasse. Até a hora da reunião, já estaria com a bateria cheia.Nesse momento, seu telefone tocou. Atendeu rápido com medo de a bateria acabar e ser algo importante. Era do Lawrence Memorial Hospital. Sentiu a espinha gelar. O que poderia ter acontecido?– Por favor, fale logo do que se trata, a bateria do meu celular está acabando – suplicou Valter.– Sr. Walker, aqu
Senti as mãos grandes e braços musculosos me segurarem por trás e me levarem até o sofá, que ficava em um canto do escritório. Fiquei grata internamente por aquele suporte, pois achei que realmente desmaiaria bem ali, na frente do CEO. Apesar de arrogante, ele até que foi gentil neste momento. Bati os olhos num porta-retrato que estava bem em cima da mesinha de centro, de vidro, que ficava em frente ao sofá de couro caramelo onde Theodore a havia sentado. Meu coração parou por um instante, junto com minha respiração. Era uma foto de Tom Vanderbilt ao lado de uma versão mais jovem de seu filho. Nesta, ele não estava com os olhos furados, mas dava para identificá-lo muito bem. Theodore puxara os olhos dele, agora podia perceber. De repente, caiu em si.– Tire suas mãos de mim! – vociferei, ainda sentindo muito de perto o calor daqueles braços torneados.– Sua ingrata raivosa! Eu estava tentando te ajudar. Você estava prestes a cair dura bem no meio da minha sala – explodiu ele e se afast
Apesar de não querer tocar em Sara devido ao turbilhão de sensações que ela me causava, foi inevitável. Se eu não a segurasse, cairia bem no meio do meu escritório. Apoiei-a com uma mão em suas costas e outra segurando sua mão, direcionando-a ao sofá, para que pudesse repousar. A pele nua das costas em contato com minha mão fazia-me queimar de desejo, querendo descer e tocar seu corpo inteiro. Precisava ser rápido ao colocá-la no sofá, caso contrário, ela acabaria vendo o tamanho do meu desejo através da minha calça, que agora pulsava. Ao sentá-la, fiquei muito próximo do pescoço de Sara, pois o cabelo dela estava preso em um coque formal. Aquele pescoço à mostra me fazia querer beijá-lo de leve, até que todo o corpo dela se arrepiasse em antecipação. Podia ficar horas naquele pescoço, beijando-o e sentindo aquele perfume doce que era só dela. Depois subiria meus dedos por sua nuca, por debaixo dos cabelos e os puxaria para trás, gentilmente, mas com firmeza, fazendo-a arquear o corpo
Aaaargh! Que homem insuportável e mandão! Não acredito que acabou de me obrigar a aceitar ir visitar o pai dele, o maior inimigo de seu pai, única família que lhe restara e que acabara de deixá-la. Valter, definitivamente, devia estar se revirando no túmulo de tanta decepção da filha. Eu sentia como se estivesse traindo a única pessoa que nunca me abandonou, que esteve ao meu lado em tudo, momentos bons ou ruins. Como eu odiava aquele Vanderbilt filho, do mesmo modo como cresci odiando o pai e o avô dele. Deus me livre lhe passar meu endereço. Aí ele, no mínimo, desconfiaria de quem eu era filha, meu segredo seria revelado e perderia o único emprego que me permitiria pagar mais rápido as dívidas deixadas pelo pai. Era uma família de esnobes, que achava que podia comprar as pessoas.O próprio pai do Tom, depois da traição toda, quis recompensar meu pai com algumas migalhas de dinheiro. Meu pai, orgulhoso demais, jamais aceitou. Naquele dia em que ligou para o amigo, para contar o motiv
Era tarde da noite quando meu celular tocou. Quem seria a uma hora dessas? Ninguém nunca me ligava, muito menos à noite. Corri para atender. Podia ser alguma emergência com meu pai. Olhei o visor: Sara. O que, diabos, ela queria assim tão tarde? Será que queria cancelar a viagem de amanhã? Ah, mas isso ela não ia fazer mesmo. Atendi já com a raiva à flor da pele.– Alô – rosnei.– Sr. Vanderbilt? – ouviu-a dizer, com a voz trêmula de quem estava com medo. Seu corpo inteiro gelou.– Sara? O que houve? – questionei em tom mais acolhedor, mas ela teve uma crise de choro e não conseguia mais falar. Do outro lado do telefone, eu só conseguia ouvi-la se debulhando em lágrimas. Me senti completamente impotente. Um senso protetor me dominou e quis ir correndo tirá-la de qualquer sufoco que estivesse passando. Colocaria Sara em seus braços e não permitiria que nada a atingisse.– Me envia sua localização, Sara. Estou indo para aí agora.Ela devia estar mesmo desesperada, porque assim que desli
Me escondi entre uns cilindros de metal gigantes que ficavam no terraço. Coloquei minhas sacolas no chão e me sentei, apoiando meus braços e cabeça em minhas pernas dobradas. Estava difícil respirar. Tentei manter a calma, mas eu só conseguia visualizar minha sala toda revirada. Meu abajur preferido espatifado no chão. Cola nenhuma conseguiria resgatar meu fiel amigo de leituras noturnas.Assim que desliguei com o Sr. Vanderbilt, enviei a localização e me senti um pouco mais calma. Algo na voz dele me passou muita segurança. Estou indo para aí agora, dissera assim que percebeu meu desespero. Era bom saber que tinha alguém que se preocupava comigo, mesmo que fosse alguém como ele. Até deixei um pouco, só um pouco, a rivalidade de lado. Mas foi por puro desespero mesmo.Ouvi um estrondo quando a porta do terraço se abriu e gritei. Que ótimo! Agora saberiam onde eu estava escondida! Outra onda de desespero começou a me dominar e a querer impedir minha respiração. Me preparei para correr.