Depois da conversa, trocamos mais algumas palavras e então, ambos seguimos nossos rumos. Quando finalmente me vi dentro do meu carro, sentei no banco do motorista e fechei os olhos enquanto jogava a cabeça para trás. Eu não conseguia parar de pensar nas palavras daquele homem grosseiro, tentava encontrar algum sentindo a mais nelas, mas somente chegava à conclusão de que vivi uma mentira todo aquele tempo.
De repente, lembrei do monopólio que havia saldado a nossa dívida, e resolvi pesquisar sobre eles na internet. Era óbvio que toda a informação contida naqueles artigos passava por uma espécie de censura, que escolhia o que era ou não útil para eles na mídia, como de praxe para famílias tão ricas. Depois de ler um pouco, encontrei uma entrevista recente com o diretor executivo, e quando ouvi sua voz, o reconheci como a pessoa que me ligou antes.
E para a minha surpresa, era o mesmo homem que vi no hospital. Chegava a ser ridícula a semelhança entre ele e meu marido, com certeza eram irmãos. Eles eram tão parecidos que poderiam ser confundidos com facilidade, se não fosse pelos cabelos e olhos que tinham um tom levemente diferente.
Além disso, as personalidades eram diferentes, ou pelo menos era o que Wolfgang havia transparecido nos anos que passamos juntos, pois, sempre foi muito gentil mesmo com os funcionários. Mas, se ele estava fingindo, era a troco de que? Não havia resposta.
Enquanto dirigia de volta para casa, ainda com a cabeça longe, fui tirada dos meus devaneios quando percebi que um carro preto atrás de mim parecia estar me seguindo, olhei pelo retrovisor e imaginei que ele quisesse ultrapassar, então, resmungando um: "pode ir", diminui um pouco a velocidade e dei sinal de luz para que ele seguisse, porém, o motorista não o fez. Na verdade, agora que estávamos quase na mesma velocidade, o carro praticamente colou na parte traseira do meu.
Foi quando percebi que ele estava me seguindo, não havia percebido antes por que estava distraída, mas agora que quase não havia outros carros na pista, tive certeza. Com medo de suas intenções, apertei o pé no acelerador, tentando ganhar alguma distância dele, mas só consegui, aparentemente, deixar a situação mais divertida para aquele lunático, pois, logo, ele estava acelerando também, além disso, buzinava colocando pressão em mim.
Estava difícil manter o controle, e como uma tempestade começava a se formar sobre nós, a pista ficava úmida, me fazendo derrapar. Eu prendia a respiração e apertava o volante com força a cada freada brusca que eu era obrigada a fazer, depois de um tempo, resolvi buzinar também para mostrar a ele que aquela brincadeira já estava indo longe demais, mas não pareceu surtir efeito.
No fim, o que eu mais temia acabou acontecendo, a chuva forte e o repentino breu na estrada escureceram a minha visão, e quando o carro derrapou outra vez, acabei saindo da pista, entrando em um terreno arenoso. Havia algum tipo de desnível no chão, não deveria ser muito grande, mas foi o suficiente para o carro virar, capotando algumas vezes antes de ser parado pelo que imaginei ser uma árvore.
Fiquei desorientada por uns dois ou três minutos, e quando recuperei os sentidos, estava de cabeça para baixo, presa pelo cinto de segurança. Algo estava pingando do meu rosto para o chão, presumi que fosse sangue pois, minha cabeça doía muito. Um de meus braços parecia preso em algo, eu não conseguia movê-lo, então precisei me virar com uma única mão para tentar sair daquela situação.
De repente, ouvi passos de alguém se aproximando. Havia alguma fonte de luz próximo, os faróis de um carro talvez, então consegui vê-lo, ou melhor, seus sapatos, eram escuros e de aparência cara, como os usados por empresários e advogados. Ele parou ao lado da porta, há centímetros da minha cabeça e então, ouvi um 'clic', uma foto talvez, depois disso, continuou parado, parecendo estar analisando a situação.
E então, seus pés giraram nos calcanhares, indo embora em seguida.
– Socorro! Eu estou viva! Gritei apavorada ao vê-lo se afastando. – Por favor, não me deixe aqui... por favor.
Quando percebi que ele realmente havia ido embora, me deixado para morrer sozinha naquela rodovia, comecei a gritar cada vez mais alto por socorro, gritei tanto que senti minha garganta se ferir e o gosto de sangue inundou a minha boca.
De repente, lembrei do meu celular, tateei à minha volta e quando o encontrei, meus olhos se encheram de lágrimas de alegria. Fiz um esforço para desbloquear a tela quebrada e percebi que não havia mais do que 5% de carga na bateria. Tentei discar o número da emergência, mas eles estavam escurecendo, a tela estava prestes a queimar, então, apenas retornei para o último número que havia ligado, e pedi por socorro, antes de desmaiar de exaustão.
No meu estado de semiconsciência, as coisas pareciam estar apenas no campo dos sentidos, havia luzes coloridas e vozes exaltadas ao meu redor. Não senti quando o meu corpo foi retirado do carro, mas gritei alto de dor ao ter meu braço movido, olhei para cima, havia dois homens jovens se entreolhando, presumi que fosse paramédicos.
Quando acordei novamente, pensei ter visto o rosto de Wolfang enquanto era levada na maca, pelo clarão branco, provavelmente já dentro do hospital.
– Preparem a sala de cirurgia... - Alguém gritava exaltado.
– Christine, meu amor... seja forte, por favor... - A voz chorosa de Wolfgang pediu e senti o toque conhecido de suas mãos apertando as minhas, mostrando que ele era real, não uma alucinação. – Por favor, Deus, não tire-a de mim.
– Preparar avental plumbífero para tomografia! Outra voz gritou, e ouvi o som de portas metálicas se abrindo. – Chamem a doutora Sullivan também.
– Gestante doutora? Outra voz perguntou.
Nesse momento, uma máscara de oxigênio foi colocada sobre o meu rosto, provavelmente contendo algum sonífero também, pois, logo em seguida, o sono me tomou e acabei desmaiando, mas não antes de ouvir a resposta positiva da médica.
– Sim. – Ela disse. – E está em risco.
Acordei sentindo uma mão calorosa segurando a minha, e me deparei com Carlota dormindo na cadeira ao lado do meu leito numa posição que parecia muito desconfortável enquanto se reclinava sobre o meu leito. Nos conhecemos na faculdade, e como tínhamos muito em comum, nos tornamos grandes amigas.Depois de um tempo, seus olhos se abriram e quando me encarou, lágrimas começaram a escorrer enquanto me olhava com surpresa, e então, me abraçou.– Espera... tá me sufocando! Reclamei com minha voz rouca.– Como está se sentindo? Ela perguntou quando se afastou um pouco.– Desorientada, eu acho... - Murmurei olhando para as minhas
Os papéis do divorcio chegaram na manhã seguinte. Eu não assinei nenhum deles de imediato, na verdade, passava o tempo sentada apenas olhando para eles. Li e reli aquelas malditas folhas algumas dezenas de vezes, as cláusulas eram claras e não havia espaço para nenhuma reivindicação, muito menos a possibilidade de conciliação, o tipo de documento redigido pela mente fria e calculista de uma advogado. Em resumo, eu ficaria com o apartamento, que inclusive já havia sido transferido para o meu nome, alguma quantia considerável de dinheiro, e mais nada, não poderia recorrer aos danos morais do abandono, muito menos, entrar em contato com ele ou sua família. Basicamente, eu era um problema do qual eles queriam se livrar o mais rápido possível. Isso eu já havia entendido, porém, havia algo de estranho nessa situação pois, Wolfgang continuava sem se pronunciar, e mesmo que eles tivessem total poder sobre a mídia, ela estava muito quieta. Não era como se eu fosse uma pessoa difícil de encon
O lugar estava exatamente como eu me lembrava. Pelo campo a fora, podia ver algumas poucas macieiras que resistiram ao tempo, carregadas de maçãs vermelhas que despontando por entre as folhas esverdeadas, caminhei naquela direção e peguei uma delas, mordendo-a depois de lavar, relembrando com nostalgia seu sabor doce."É bom estar em casa novamente..." Pensei comigo mesma, suspirando.De repente, me lembrei de uma única amiga que tive naquela época, seu nome era Júlia e éramos praticamente unha e carne, mas havíamos perdido o contato de alguma forma. Fiquei me perguntando como ela estaria, imaginando que provavelmente pela idade, já estaria casada e talvez até com filhos.Sorri, pensando
Wolfgang Encarei os documentos à minha frente, que precisavam ser assinados, mas não conseguia me concentrar, ainda mais depois que uma comoção começou do lado de fora do escritório. Troquei um rápido olhar com minha irmã, que parecia alheia a isso, e senti meu maxilar se contraindo por causa do estresse. Quando eu estava prestes a me levantar e descobrir o que estava acontecendo, Gisela irrompeu pelas portas de vidro de maneira ruidosa, seguida da minha secretária que tentava a acalmar. – Não se atreva a me segurar! Ela exclamou séria, beirando a grosseria. – Tudo bem, Rosely, vamos deixá-los a sós...– Marjorie, minha irmã, respondeu por mim, saindo da sala e levando a secretária consigo, mas não antes de destilar um pouco de seu veneno. – Cuidado que ela morde! – O que disse? Lívia questionou, seu rosto fervendo de raiva, e virou-se para encarar a "cunhada". Diferente dela, Marjorie continuava com seu rosto inexpressivo, e aproximou alguns passos, fitando a outra mulher de cima
ChristineQuando cheguei à casa de Júlia, fui apresentada ao marido dela. Era um homem gentil e parecia ter a nossa idade, além disso, estava embalando a menininha que parecia sonolenta. Sorri para ela enquanto me aproximava e ergui a mão, tocando suas bochechas macias.Nesse momento, sua mãozinha agarrou meu dedo indicador e eu caí de amores na hora, ela era linda e sorria bastante, mostrando seus únicos dois dentinhos. Então meus olhos começaram a marejar quando lembrei que um anjinho como aquele estava se formando dentro do meu útero, e por todo aquele tempo, eu estava apenas ignorando sua existência. Nem eu podia acreditar em como estava sendo desumana, e pensar nisso fez eu me sentir um lixo.
Por algum motivo, depois de me mudar para a casa da minha infância, tenho tido pesadelos todas as noites. Na maioria das vezes não lembro dos detalhes, somente de pequenos recortes em flashbacks, e, de alguma forma, eu sentia que não eram apenas sonhos, mas sim, lembranças que esqueci com o passar do tempo. Tive certeza disso quando relembrei de algumas coisas que aconteceram durante o acidente de carro, mais especificamente, os sapatos de couro masculinos da pessoa que pareceu vir verificar se eu ainda estava viva.Tudo ainda parecia muito obscuro e, além disso, as outras lembranças pareciam mais antigas, da minha adolescência talvez.Naquela noite, eu tive mais um daqueles sonhos. Nele, eu estava deitada na grama junto a mais duas garotas adolescentes, uma delas era Júli
No dia seguinte, acordei com vontade de fazer uma corrida matinal pela trilha da montanha, era relaxante e poderia usar aquele tempo para refletir, então, coloquei roupas confortáveis, calcei meus tênis esportivos e sai porta a fora. Nesse meio tempo, enquanto seguia no "pique", percebi que havia algumas poucas casas praticamente escondidas por entre o ambiente arborizado, uma delas me chamou a atenção, parecia muito familiar, e tive quase certeza de que já havia estado ali.Uma senhorinha passou por mim, de cabeça baixa, distraída em seus próprios pensamentos, e em suas mãos, carregava grandes sacolas de supermercado que pareciam pesadas. Cortei rapidamente a distância entre nós, e murmurou um "bom dia", perguntando em seguida se poderia ajudá-la. Ela, ao me ouvir, ergueu a cabeça e se
Carlota estava certa: ambas obras de arte eram de fato pertencentes a Giovanni Diono, e, de repente, foi como se uma bolsa cheia de moedas de ouro tivesse caído sobre meu colo. Ainda não havia uma explicação coerente para aquelas pinturas estarem escondidas numa cidadezinha do interior, mas os compradores também não pareciam se importar o suficiente para tentar descobrir, No fim, elas foram vendidas rapidamente, nem tive tempo para pensar no apego emocional que minha avó poderia ter por elas, e da noite para o dia, havia dinheiro em minha conta suficiente para comprar uma mansão.Era uma situação tão atordoante que eu não soube o que fazer de imediato, contudo, de uma coisa eu tinha certeza: era suficiente para construir um império para o bebê que crescia em meu ventre, de modo que jam