– Por favor espere um pouco... - A enfermeira pedia exasperada, parada em frente à porta do quarto. – A senhora não pode sair assim, não nesse estado.
Tudo o que ela falava apenas entrava num ouvido e saia pelo outro, estava mais interessada em enfiar minhas coisas dentro da minha bolsa, incluindo os exames que nem foram abertos. Depois, me virei para a encarar com seriedade, uma expressão que dizia: "ou você sai, ou te tiro daí a força", vi seus joelhos tremerem e então, ela se afastou, me deixando ir embora do hospital.
Estava furiosa e indignada, não podia acreditar em como todo mundo estava lidando com aquela situação. Não bastava aquele bastard* esnobe ter me tratado como uma vagabund* ao telefone, mas também, percebi que o hospital continuava resistente em me dar informações sobre meu próprio marido.
Segui a passos firmes pelos corredores até chegar ao estacionamento, mas quando entrei no carro, e me vi sozinha novamente, irrompi em outra crise de choro, batendo no volante e gritando cheia de raiva. Minha vontade era de quebrar alguma coisa, ou alguém para saciar todo o ódio que eu estava sentindo naquele momento.
De repente, tive uma epifania.
Lembrei do que Wolfgang havia dito sobre a falência da empresa. Era outro problema que eu precisava resolver, já que ele continuava internado em algum hospital que desconheço, e para piorar, estava muito angustiada por não ter notícias do estado de saúde dele.
Sequei meu rosto, dizendo a mim mesma que não poderia ficar caída numa poça das minhas próprias lágrimas daquela forma. Então, decidida a resolver aquilo, voltei para casa e me arrumei. Refiz a maquiagem já dentro do carro novamente e enquanto dirigia, liguei no viva-voz para nosso contador, questionando sobre a dívida e logo descobri que um dos sócios tinha saldado.
– Dona Christine, as informações sobre o sócio-contribuinte são sigilosas, mesmo para mim... – Ele explicou fazendo barulho de papéis como se estivesse verificando os documentos naquele momento. – Somente o senhor Ludwin tem essa informação, ele não disse nada?
"É claro que ele não disse nada... " Pensei comigo mesma, percebendo que Wolfgang me escondia muito mais segredos do que sequer imaginei.
Quando cheguei à sede do banco, ainda tive que esperar um pouco para ser atendida, era óbvio que o gerente, Thomas, não queria conversar comigo, porém, depois de algum tempo me enrolando, finalmente ele teve que me atender. Sentei diante de sua mesa e cruzei as pernas enquanto o fitava com seriedade, esperando por uma resposta.
– A senhora precisa marcar um horário antes... – Ele explicou com um sorriso amarelo enquanto me entregava uma xícara de café, em seguida, sentou-se atrás de sua mesa, remexendo nos papéis entre seus arquivos impressos. – Aliás, como tem passado?
– Quando a dívida foi liquidada? Questionei ignorando sua tentativa de me enrolar e o fitei com uma sobrancelha erguida. – Foi você quem fez a transação, com quem?
– Não devia te entregar essas informações... – Thomas murmurou olhando para os lados como se tivesse algo a esconder. – L&W Corporation está envolvida, é tudo o que sei.
– L&W Corporation? Questionei, bebendo um pouco do café, estava quase surtando de nervosismo. – O que esse conglomerado tem a ver com a nossa pequena empresa?
Nesse momento, me lembrei do comentário que aquela funcionária havia feito sobre a empresa ter sido vendida e associei ao tal sócio confidencial, estava na cara que ele era o novo dono da minha empresa.
Thomas engasgou ao ouvir minha pergunta, afrouxou um pouco a gravata que parecia estar o sufocando, seus olhos correram ao redor do ambiente, e como alguém que está prestes a contar um segredo, apoiou o corpo na mesa, ficando com o rosto próximo do meu.
– Eu não deveria te contar isso... - Ele sussurrou me olhando fixamente, pegou um envelope de papel pardo dentro da gaveta e me entregou. - Não consta mais nenhum débito, e estes são os atuais documentos sobre o apartamento...
Olhei para o envelope em minhas mãos, puxei as folhas e percebi que era uma escritura em meu nome, era a explicação para as palavras daquele homem arrogante, na cabeça dele, eu era esse tipo de pessoa que pode ser comprada apenas com bens materiais.
Eu não podia acreditar naquilo, que ódio, como alguém poderia ser tão nojento?
Antes que eu percebesse, já estava amassando as folhas sem querer, joguei os papéis sobre a mesa à minha frente e cobri o rosto com as mãos, soluçando em lágrimas. Era muito difícil, eu não conseguia lidar com tudo aquilo. Minha cabeça estava uma bagunça, nada fazia sentido e para piorar, a única pessoa que poderia me dar alguma resposta, meu marido, havia simplesmente desaparecido.
– Obrigada... - Murmurei enquanto me levantava, mas parei quando senti uma nova onda de tontura que quase me derrubou.
– A senhora está bem? Ele perguntou enquanto me olhava levantar com preocupação, e não parecia estar fingindo se importar. – Seu rosto ainda parece um pouco pálido, quer que eu chame a emergência?
– Eu preciso ir... – Murmurei balançando a cabeça numa negativa e arrumei meus cabelos, colocando os fios atrás da orelha, escondendo a cicatriz em minha têmpora, imaginando que estivesse visível. – Obrigada, Thomas!
– Ah... Deus! Ele exclamou sério. – Precisamos conversar em outro lugar.
Não soube o que responder, acabei apenas concordando com um aceno e seguimos para fora do escritório. Depois disso, entramos numa cafeteria que ficava no mesmo prédio, ele fez os pedidos e eu apenas continuei sentada entorpecida por tudo o que estava acontecendo.
– Eu com certeza vou perder meu emprego, mas não é justo que você fique inocente quanto a isso! Thomas exclamou enquanto entregava um dos copos de café expresso para mim. - L&W Corporation, significa Ludwin e Weschenfelder Corporation, e não, não é uma coincidência.
Foi impossível não me engasgar com o café quando ouvi aquela informação, Thomas havia jogado aquela bomba sobre mim sem sequer me preparar. Coloquei o copo de lado, pegando um guardanapo para limpar minha boca e ergui as mãos em frente ao corpo, gesticulando um pedido de pausa.
– Espera, o que você está me dizendo?! Arfei arregalando os olhos, não conseguia acreditar que por mais de dois anos, ambos esconderam isso de mim. - Porque ele esconderia isso?
– Eu também não sei, mas faz alguns anos que ele cortou laços com a família, sou seu gerente desde então... - Thomas explicou soltando um suspiro, parecia que esconder aquele segredo por tanto tempo havia sido muito cansativo para ele.
– Então ele apenas parou de fingir ser o filho rebelde, é isso? Perguntei sorrindo com amargura e senti meu estômago se revirando.
Thomas ouviu tudo com um olhar compadecido, mas não ousou dizer nada, talvez soubesse que nada iria me consolar naquele momento.
Depois da conversa, trocamos mais algumas palavras e então, ambos seguimos nossos rumos. Quando finalmente me vi dentro do meu carro, sentei no banco do motorista e fechei os olhos enquanto jogava a cabeça para trás. Eu não conseguia parar de pensar nas palavras daquele homem grosseiro, tentava encontrar algum sentindo a mais nelas, mas somente chegava à conclusão de que vivi uma mentira todo aquele tempo.De repente, lembrei do monopólio que havia saldado a nossa dívida, e resolvi pesquisar sobre eles na internet. Era óbvio que toda a informação contida naqueles artigos passava por uma espécie de censura, que escolhia o que era ou não útil para eles na mídia, como de praxe para famílias tão ricas. Depois de ler um pouco, encontrei uma entrevista recente com o dir
Acordei sentindo uma mão calorosa segurando a minha, e me deparei com Carlota dormindo na cadeira ao lado do meu leito numa posição que parecia muito desconfortável enquanto se reclinava sobre o meu leito. Nos conhecemos na faculdade, e como tínhamos muito em comum, nos tornamos grandes amigas.Depois de um tempo, seus olhos se abriram e quando me encarou, lágrimas começaram a escorrer enquanto me olhava com surpresa, e então, me abraçou.– Espera... tá me sufocando! Reclamei com minha voz rouca.– Como está se sentindo? Ela perguntou quando se afastou um pouco.– Desorientada, eu acho... - Murmurei olhando para as minhas
Os papéis do divorcio chegaram na manhã seguinte. Eu não assinei nenhum deles de imediato, na verdade, passava o tempo sentada apenas olhando para eles. Li e reli aquelas malditas folhas algumas dezenas de vezes, as cláusulas eram claras e não havia espaço para nenhuma reivindicação, muito menos a possibilidade de conciliação, o tipo de documento redigido pela mente fria e calculista de uma advogado. Em resumo, eu ficaria com o apartamento, que inclusive já havia sido transferido para o meu nome, alguma quantia considerável de dinheiro, e mais nada, não poderia recorrer aos danos morais do abandono, muito menos, entrar em contato com ele ou sua família. Basicamente, eu era um problema do qual eles queriam se livrar o mais rápido possível. Isso eu já havia entendido, porém, havia algo de estranho nessa situação pois, Wolfgang continuava sem se pronunciar, e mesmo que eles tivessem total poder sobre a mídia, ela estava muito quieta. Não era como se eu fosse uma pessoa difícil de encon
O lugar estava exatamente como eu me lembrava. Pelo campo a fora, podia ver algumas poucas macieiras que resistiram ao tempo, carregadas de maçãs vermelhas que despontando por entre as folhas esverdeadas, caminhei naquela direção e peguei uma delas, mordendo-a depois de lavar, relembrando com nostalgia seu sabor doce."É bom estar em casa novamente..." Pensei comigo mesma, suspirando.De repente, me lembrei de uma única amiga que tive naquela época, seu nome era Júlia e éramos praticamente unha e carne, mas havíamos perdido o contato de alguma forma. Fiquei me perguntando como ela estaria, imaginando que provavelmente pela idade, já estaria casada e talvez até com filhos.Sorri, pensando
Wolfgang Encarei os documentos à minha frente, que precisavam ser assinados, mas não conseguia me concentrar, ainda mais depois que uma comoção começou do lado de fora do escritório. Troquei um rápido olhar com minha irmã, que parecia alheia a isso, e senti meu maxilar se contraindo por causa do estresse. Quando eu estava prestes a me levantar e descobrir o que estava acontecendo, Gisela irrompeu pelas portas de vidro de maneira ruidosa, seguida da minha secretária que tentava a acalmar. – Não se atreva a me segurar! Ela exclamou séria, beirando a grosseria. – Tudo bem, Rosely, vamos deixá-los a sós...– Marjorie, minha irmã, respondeu por mim, saindo da sala e levando a secretária consigo, mas não antes de destilar um pouco de seu veneno. – Cuidado que ela morde! – O que disse? Lívia questionou, seu rosto fervendo de raiva, e virou-se para encarar a "cunhada". Diferente dela, Marjorie continuava com seu rosto inexpressivo, e aproximou alguns passos, fitando a outra mulher de cima
ChristineQuando cheguei à casa de Júlia, fui apresentada ao marido dela. Era um homem gentil e parecia ter a nossa idade, além disso, estava embalando a menininha que parecia sonolenta. Sorri para ela enquanto me aproximava e ergui a mão, tocando suas bochechas macias.Nesse momento, sua mãozinha agarrou meu dedo indicador e eu caí de amores na hora, ela era linda e sorria bastante, mostrando seus únicos dois dentinhos. Então meus olhos começaram a marejar quando lembrei que um anjinho como aquele estava se formando dentro do meu útero, e por todo aquele tempo, eu estava apenas ignorando sua existência. Nem eu podia acreditar em como estava sendo desumana, e pensar nisso fez eu me sentir um lixo.
Por algum motivo, depois de me mudar para a casa da minha infância, tenho tido pesadelos todas as noites. Na maioria das vezes não lembro dos detalhes, somente de pequenos recortes em flashbacks, e, de alguma forma, eu sentia que não eram apenas sonhos, mas sim, lembranças que esqueci com o passar do tempo. Tive certeza disso quando relembrei de algumas coisas que aconteceram durante o acidente de carro, mais especificamente, os sapatos de couro masculinos da pessoa que pareceu vir verificar se eu ainda estava viva.Tudo ainda parecia muito obscuro e, além disso, as outras lembranças pareciam mais antigas, da minha adolescência talvez.Naquela noite, eu tive mais um daqueles sonhos. Nele, eu estava deitada na grama junto a mais duas garotas adolescentes, uma delas era Júli
No dia seguinte, acordei com vontade de fazer uma corrida matinal pela trilha da montanha, era relaxante e poderia usar aquele tempo para refletir, então, coloquei roupas confortáveis, calcei meus tênis esportivos e sai porta a fora. Nesse meio tempo, enquanto seguia no "pique", percebi que havia algumas poucas casas praticamente escondidas por entre o ambiente arborizado, uma delas me chamou a atenção, parecia muito familiar, e tive quase certeza de que já havia estado ali.Uma senhorinha passou por mim, de cabeça baixa, distraída em seus próprios pensamentos, e em suas mãos, carregava grandes sacolas de supermercado que pareciam pesadas. Cortei rapidamente a distância entre nós, e murmurou um "bom dia", perguntando em seguida se poderia ajudá-la. Ela, ao me ouvir, ergueu a cabeça e se