Acordei sentindo uma mão calorosa segurando a minha, e me deparei com Carlota dormindo na cadeira ao lado do meu leito numa posição que parecia muito desconfortável enquanto se reclinava sobre o meu leito. Nos conhecemos na faculdade, e como tínhamos muito em comum, nos tornamos grandes amigas.
Depois de um tempo, seus olhos se abriram e quando me encarou, lágrimas começaram a escorrer enquanto me olhava com surpresa, e então, me abraçou.
– Espera... tá me sufocando! Reclamei com minha voz rouca.
– Como está se sentindo? Ela perguntou quando se afastou um pouco.
– Desorientada, eu acho... - Murmurei olhando para as minhas próprias mãos, notando que um dos meus braços estava enfaixado. – Eu tive tanto medo de morrer.
– Consegue se lembrar do que aconteceu? Carlota questionou surpresa, seus olhos chegaram a arregalar levemente.
– Acho que alguém tentou me matar... – Murmurei sentindo meus olhos marejarem somente em lembrar daquele momento horrível. – Eu perdi o controle porque estava tentando fugir de um carro que me perseguia.
– Tem certeza do que está me dizendo? Ela questionou franzindo as sobrancelhas. – Não está confusa por causa da concussão?
– Não foi só um acidente! Eu exclamei exasperada, me defendendo. – Depois que meu carro capotou, um homem se aproximou do carro e tirou uma foto, mas não prestou socorro.
Carlota pareceu concordar, murmurando um: "entendo", em seguida, suspirou, explicando que iria avisar aos médicos que eu havia acordado. Sozinha, fiquei observando ao redor do quarto, minha mente estava enevoada na verdade, porém, quando vi uma jaqueta de Wolfgang deixada sobre uma cadeira ao lado, lembrei de flashes do que havia acontecido no momento do meu atendimento.
Eu não havia sonhado, ele realmente esteve ali comigo.
Uma dupla de médicos chegou ao quarto cerca de dez minutos depois, alguns exames foram feitos, e quando se certificaram que não parecia haver sequelas muito sérias, explicaram que eu poderia ter alta ainda naquele dia.
– Porque você estava sozinha no momento do acidente? Carlota questionou de repente, enquanto descascava algumas maçãs.
– Estamos separados... – Respondi, sentindo um nó se formando em minha garganta, era muito difícil assumir isso.
– Como assim ? Ela perguntou erguendo uma sobrancelha, como se achasse um absurdo o que havia acabado de ouvir. – Ainda mais agora com a gestação.
Não respondi. Até algum tempo atrás, nem eu sabia que uma vida estava se formando dentro de mim, e não era uma notícia feliz, por mais que antes, ouvir isso fosse tudo o que eu mais desejava. Eu sequer queria pensar sobre aquele bebê pois, teria que lembrar do pai dele, e de que não estávamos mais juntos.
Por um milésimo de segundo, pensei que o bebê poderia nos manter juntos, meu coração quase se encheu de esperança, porém, logo, meu cérebro destruiu minha fantasia, me lembrando que com certeza seria tratada como alguém dando o golpe da barriga pela família dele.
O que seria dessa criança sem um pai?
– Não me pergunte... – Respondi num murmuro, tentando segurar o choro. – Eu já não sei de mais nada, você não sabe a zona que a minha vida se transformou.
Logo, as lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto e solucei, me permitindo chorar quando encontrei conforto em seu abraço carinhoso. Carlota apesar de ser uma mulher de personalidade forte, não me afastou, pelo contrário, ficou todo o tempo que precisei acariciando minhas costas e sussurrando que tudo ficaria bem, que me ajudaria com o bebê.
No fim, foi ela quem me levou para casa naquele dia. Cozinhou para nós duas enquanto eu permanecia inerte no sofá – eu nem sabia que ela cozinhava – e quando terminou, veio até a sala me chamar.
– Não 'tô' com fome... – Murmurei enfiando o rosto no travesseiro.
– Coma mesmo sem fome! Carlota praticamente mandou.
Ergui meus olhos para ela, abrindo a boca para rebater, nem sabia o que iria dizer, mas me calei quando encarei seu rosto sério, e acabei fazendo o que ela mandava. No fim, ainda tínhamos aquela distância, ela faria o impossível para proteger as pessoas com quem se importava, mas não aturava drama, e nunca aceitou me ver chorando por um namorado.
– O que você faria no meu lugar? Perguntei entre uma mordida e outra, mesmo que a comida não parecesse ter gosto algum.
– Começaria secando as lágrimas... – Ela respondeu sincera, e fez uma pausa, talvez procurando as palavras certas. – Então, seguiria com a minha vida, porque um divórcio não é o fim do mundo.
– Diz isso porque não amava o seu ex-marido... – Resmunguei, me sentindo ofendida. – Não pode entender esse sentimento.
– Tem certeza? Ela perguntou, e vi um brilho estranho em seu olhar.
Enquanto dizia isso, procurava por algo em seu celular, e quando achou, o entregou para mim. Observei a tela e vi que era uma foto dela junto a um homem que eu não conhecia, ergui a cabeça confusa e então, esperei que ela continuasse.
– O nome dele é Lorenzo... – Murmurou com um sorriso doce, pela primeira vez, demonstrando alguma emoção. – Nem todas as almas gêmeas estão destinadas a ficar juntas.
– Você nunca me falou sobre ele... – Respondi em minha defesa, mas me encolhi ao pensar na possibilidade dele ter morrido.
– Que diferença faria? Ela perguntou de volta, e soltou um suspiro enquanto erguia-se, pegou os pratos e os levou para a cozinha. – E não, ele não morreu.
Antes que eu pudesse perguntar o porquê de não terem levado o relacionamento adiante, ela simplesmente, virou-se em minha direção e fixou os olhos em mim, com muita seriedade.
– Descanse, eu voltarei à noite! Exclamou checando seu relógio de pulso, deu alguns passos, encurtando a distância e me segurou pelos ombros. – Não pense bobagem, durma o quanto puder e se realmente precisar, me ligue.
Depois disso ela foi embora, talvez não quisesse continuar aquela conversa, ou apenas tivesse compromissos naquele momento. Qualquer que fosse o caso, acabei ficando sozinha novamente, tentei ao máximo não pensar naquele estranho quebra-cabeças, ou no bebê que se desenvolvia em meu ventre, e tentei dormir como ela havia sugerido, mas como já esperava, meus olhos estavam secos.
Os papéis do divorcio chegaram na manhã seguinte. Eu não assinei nenhum deles de imediato, na verdade, passava o tempo sentada apenas olhando para eles. Li e reli aquelas malditas folhas algumas dezenas de vezes, as cláusulas eram claras e não havia espaço para nenhuma reivindicação, muito menos a possibilidade de conciliação, o tipo de documento redigido pela mente fria e calculista de uma advogado. Em resumo, eu ficaria com o apartamento, que inclusive já havia sido transferido para o meu nome, alguma quantia considerável de dinheiro, e mais nada, não poderia recorrer aos danos morais do abandono, muito menos, entrar em contato com ele ou sua família. Basicamente, eu era um problema do qual eles queriam se livrar o mais rápido possível. Isso eu já havia entendido, porém, havia algo de estranho nessa situação pois, Wolfgang continuava sem se pronunciar, e mesmo que eles tivessem total poder sobre a mídia, ela estava muito quieta. Não era como se eu fosse uma pessoa difícil de encon
O lugar estava exatamente como eu me lembrava. Pelo campo a fora, podia ver algumas poucas macieiras que resistiram ao tempo, carregadas de maçãs vermelhas que despontando por entre as folhas esverdeadas, caminhei naquela direção e peguei uma delas, mordendo-a depois de lavar, relembrando com nostalgia seu sabor doce."É bom estar em casa novamente..." Pensei comigo mesma, suspirando.De repente, me lembrei de uma única amiga que tive naquela época, seu nome era Júlia e éramos praticamente unha e carne, mas havíamos perdido o contato de alguma forma. Fiquei me perguntando como ela estaria, imaginando que provavelmente pela idade, já estaria casada e talvez até com filhos.Sorri, pensando
Wolfgang Encarei os documentos à minha frente, que precisavam ser assinados, mas não conseguia me concentrar, ainda mais depois que uma comoção começou do lado de fora do escritório. Troquei um rápido olhar com minha irmã, que parecia alheia a isso, e senti meu maxilar se contraindo por causa do estresse. Quando eu estava prestes a me levantar e descobrir o que estava acontecendo, Gisela irrompeu pelas portas de vidro de maneira ruidosa, seguida da minha secretária que tentava a acalmar. – Não se atreva a me segurar! Ela exclamou séria, beirando a grosseria. – Tudo bem, Rosely, vamos deixá-los a sós...– Marjorie, minha irmã, respondeu por mim, saindo da sala e levando a secretária consigo, mas não antes de destilar um pouco de seu veneno. – Cuidado que ela morde! – O que disse? Lívia questionou, seu rosto fervendo de raiva, e virou-se para encarar a "cunhada". Diferente dela, Marjorie continuava com seu rosto inexpressivo, e aproximou alguns passos, fitando a outra mulher de cima
ChristineQuando cheguei à casa de Júlia, fui apresentada ao marido dela. Era um homem gentil e parecia ter a nossa idade, além disso, estava embalando a menininha que parecia sonolenta. Sorri para ela enquanto me aproximava e ergui a mão, tocando suas bochechas macias.Nesse momento, sua mãozinha agarrou meu dedo indicador e eu caí de amores na hora, ela era linda e sorria bastante, mostrando seus únicos dois dentinhos. Então meus olhos começaram a marejar quando lembrei que um anjinho como aquele estava se formando dentro do meu útero, e por todo aquele tempo, eu estava apenas ignorando sua existência. Nem eu podia acreditar em como estava sendo desumana, e pensar nisso fez eu me sentir um lixo.
Por algum motivo, depois de me mudar para a casa da minha infância, tenho tido pesadelos todas as noites. Na maioria das vezes não lembro dos detalhes, somente de pequenos recortes em flashbacks, e, de alguma forma, eu sentia que não eram apenas sonhos, mas sim, lembranças que esqueci com o passar do tempo. Tive certeza disso quando relembrei de algumas coisas que aconteceram durante o acidente de carro, mais especificamente, os sapatos de couro masculinos da pessoa que pareceu vir verificar se eu ainda estava viva.Tudo ainda parecia muito obscuro e, além disso, as outras lembranças pareciam mais antigas, da minha adolescência talvez.Naquela noite, eu tive mais um daqueles sonhos. Nele, eu estava deitada na grama junto a mais duas garotas adolescentes, uma delas era Júli
No dia seguinte, acordei com vontade de fazer uma corrida matinal pela trilha da montanha, era relaxante e poderia usar aquele tempo para refletir, então, coloquei roupas confortáveis, calcei meus tênis esportivos e sai porta a fora. Nesse meio tempo, enquanto seguia no "pique", percebi que havia algumas poucas casas praticamente escondidas por entre o ambiente arborizado, uma delas me chamou a atenção, parecia muito familiar, e tive quase certeza de que já havia estado ali.Uma senhorinha passou por mim, de cabeça baixa, distraída em seus próprios pensamentos, e em suas mãos, carregava grandes sacolas de supermercado que pareciam pesadas. Cortei rapidamente a distância entre nós, e murmurou um "bom dia", perguntando em seguida se poderia ajudá-la. Ela, ao me ouvir, ergueu a cabeça e se
Carlota estava certa: ambas obras de arte eram de fato pertencentes a Giovanni Diono, e, de repente, foi como se uma bolsa cheia de moedas de ouro tivesse caído sobre meu colo. Ainda não havia uma explicação coerente para aquelas pinturas estarem escondidas numa cidadezinha do interior, mas os compradores também não pareciam se importar o suficiente para tentar descobrir, No fim, elas foram vendidas rapidamente, nem tive tempo para pensar no apego emocional que minha avó poderia ter por elas, e da noite para o dia, havia dinheiro em minha conta suficiente para comprar uma mansão.Era uma situação tão atordoante que eu não soube o que fazer de imediato, contudo, de uma coisa eu tinha certeza: era suficiente para construir um império para o bebê que crescia em meu ventre, de modo que jam
Em um tempo recorde de quatro meses, recomecei do zero, minha linha de cosméticos voltados à cultura naturalista – ideia que tive enquanto caminhava por entre as montanhas –, os batons veganos eram nosso maior destaque, e como eu tinha apenas mulheres trabalhando na linha de produção, a fofoca corria solta, mas era útil no momento. Encarei meu reflexo no espelho, satisfeita com o vestido preto de ombros nus que deixava minha barriga de sete meses discreta, e completei o visual com uma gargantilha cravejada de diamantes e bolsa schutz. Era noite, e eu estava participando de um evento privado apenas para a comemoração do aniversário de Richard, o que seria um momento interessante para formar fortes alianças, além de rever meus antigos amigos do meio. Caminhei a passos lentos pelo salão ricamente decorado e observei os outros convidados, reconhecendo alguns políticos influentes, vez ou outra, eu lhes lançava um sorriso educado que era retribuído, principalmente pelos homens. Por mais