Os primeiros dias no Instituto foram extremamente difíceis para Alex e Elloá. O ambiente, que já era desafiador por si só, se tornou ainda mais hostil devido ao comportamento dos outros alunos. As duas amigas passaram a ser alvo de piadas maldosas e comentários sarcásticos.
O bullying ia muito além das palavras. Em diversas ocasiões, as garotas foram vítimas de pegadinhas cruéis, sempre envolvendo a exclusão por classe. Os trabalhos em grupo também eram um desafio. Os alunos se recusavam a incluir as bolsistas, fazendo questão de deixá-las de lado e os professores eram completamente coniventes com a situação, pois estavam sendo constantemente ameaçados pelos filhos de famílias influentes, que respeitavam apenas os professores veteranos, que não eram muitos. Como Alex e Elloá não tinham muitas aulas juntas, acabavam fazendo os trabalhos sozinhas. Apesar de tudo, as duas se mantinham firmes, sabendo que desistir significaria abrir mão de seus sonhos e perto de todos os grandes objetivos que tinham, aquilo era apenas uma fase ruim.
Ao fim do dia, enquanto os grupos de adolescentes se encontravam na área social de seus alojamentos, Elloá e Alexandra se encontravam no jardim de inverno. O jardim de inverno do Instituto São Bartolomeu era um dos locais mais belos e tranquilos do campus.
Localizado entre dois dos prédios mais antigos, o jardim era um espaço compacto, mas encantador. Protegido por paredes de vidro que iam do chão ao teto, o ambiente era iluminado pela luz natural que entrava suavemente, criando uma atmosfera serena e acolhedora.
O chão era coberto por lajes de pedra natural, que formavam um pequeno caminho em zigue-zague entre as plantas. As espécies ali presentes eram simples e cuidadosamente selecionadas, consistindo principalmente de samambaias, pequenas orquídeas e alguns arbustos de folhas verde-escuras que cresciam ordenadamente ao longo das paredes. Apesar de ser um espaço reduzido, o jardim exalava frescor, com um aroma leve de terra úmida e folhas.
No centro do jardim, uma única fonte de pedra, pequena e discreta, borbulhava calmamente, seu som suave adicionando uma nota de tranquilidade ao ambiente. Ao lado da fonte, havia dois bancos de madeira rústica, colocados de frente um para o outro, criando um pequeno espaço para conversas ou momentos de reflexão.
O teto de vidro era parcialmente coberto por trepadeiras que, ao longo dos anos, haviam crescido e se espalhado, criando uma espécie de toldo verde que filtrava a luz e proporcionava uma sombra agradável. Algumas plantas pendiam em vasos suspensos, adicionando um toque de vida ao espaço.
À noite, pequenas lâmpadas embutidas nas laterais do jardim se acendiam, lançando uma luz suave que destacava as folhas e as pétalas das flores, transformando o pequeno espaço em um refúgio íntimo e acolhedor. O jardim de inverno era um lugar que, apesar de sua simplicidade e tamanho modesto, oferecia um escape tranquilo e revigorante para quem buscava um momento de paz no movimentado campus.
No pequeno e aconchegante local, as amigas faziam a lição de casa e compartilhavam momentos do dia, conversa que também se estendia ao dormitório, mas que se tornava mais agradável ali.
Por dia elas foram as únicas a frequentar o local, chegando a se assustar quando numa certa tarde, foram surpreendidas com a entrada de um pequeno grupo de adolescentes, contendo dois garotos e três meninas. De início logo sentiram desconforto e aguardam por mais um momento de bullying, mas foram surpreendidas pelo tom amigável de uma das garotas presentes no grupo.
— Meninas, tudo bem para vocês se ficarmos aqui também? — ela questionou de forma amigável.
— Claro! — Elloá respondeu sem hesitar com um de seus sorrisos característicos se formando em seu rosto.
Elloá não demorou para se aproximar do grupo, perguntando o nome de todos, a série em que estavam e descobrindo inclusive de quais cidades vieram; em pouco tempo de conversa acabou por descobrir que eram todos bolsistas no segundo ano do ensino médio.
O pequeno grupo era composto por Lucas, Mariana, Guilherme, Bianca e Sara; o quinteto costumava a se reunir na biblioteca desativada de um dos prédios mais antigos do campus, o prédio Cecília Meireles, onde havia salas com oficinas de música, literatura e artes; a biblioteca seria desativada temporariamente para controle de uma infestação de cupins, mas após um ano, continuava vazia, mas recebendo limpeza cotidianamente; o asseio era imprescindível em todo o Instituto.
Após aquele curto encontro no jardim de inverno, as duas foram convidadas a passar tempo com o grupo. O convite veio como um alívio, pois oferecia a chance de socializar com outros que enfrentavam desafios semelhantes. Naquele espaço escondido e longe dos olhares críticos, Alex e Elloá encontraram um pouco de paz, onde podiam ser elas mesmas sem medo de represálias.
Assim como cada canto daquele imenso lugar, a biblioteca tinha seu encanto e elegância. O chão de madeira escura, polido até brilhar, refletia a luz suave que entrava pelas janelas altas e arqueadas. As prateleiras, embora vazias e com sinais de desgaste ao longo dos anos, estavam livres de poeira.
As grandes janelas, algumas delas adornadas com vitrais coloridos, deixavam entrar uma luminosidade natural que iluminava o ambiente de maneira quase mágica. Não havia teias de aranha nos cantos, e as paredes de madeira escura, que revestiam todo o espaço, estavam impecavelmente limpas, preservando a dignidade e a elegância do local.
No centro da biblioteca, as mesas de leitura antigas permaneciam dispostas de forma organizada. As cadeiras, de madeira esculpida e estofadas com um tecido vermelho escuro, estavam em bom estado, prontas para serem usadas. As poucas pilhas de papéis e livros restantes estavam empilhadas com cuidado, sugerindo que, apesar de não ser mais frequentado oficialmente, o espaço ainda era respeitado por aqueles que o conheciam.
O ar dentro da biblioteca era fresco, sem o cheiro de mofo que se esperaria de um local tão antigo. Em vez disso, havia um leve aroma de madeira polida, misturado com o perfume sutil das flores que cresciam do lado de fora, e cujos aromas invadiam o espaço através das janelas abertas em dias mais quentes.
Tendo um grupo de amigos, as provocações e o bullying já não tinham o mesmo impacto e ao fim do dia relaxavam de toda a tensão de um dia de estudos integral, rindo, brincando e compartilhando conhecimentos na realização de atividades e trabalhos, que mesmo após apenas duas semanas de aula, colecionavam uma pilha de deveres.
No meio de tantas atividades e trabalhos que deveriam ser em grupo, mas acabava por ter de fazer individualmente, Alexandra não teve muito tempo para ligar para suas amigas e namorado, a única ligação que fazia religiosamente, era uma curta para seus pais, onde sempre fingia uma voz alegre, omitindo as situações que passava. Naquele fim de semana, após tensos minutos encarando o programa de texto do computador e sem forças para digitar mais um carácter sequer, decidiu que precisava relaxar. Após salvar o documento e fazer logoff no computador, abandonou a sala de estudos, caminhando pelo imenso Campus em busca de um lugar tranquilo, optando pela biblioteca do prédio Cecília Meireles. Naquele sábado, o terceiro que passava ali, era a primeira vez que Alex permanecia tanto tempo longe de sua família e após desligar o cérebro de todas as suas atividades acadêmicas, sentiu o peso da distância sob os ombros. Quando se sentou no parapeito de uma das janelas abertas e encarou o vasto jardi
Professor Arthur se aproximou de Elloá na biblioteca enquanto ela fazia pesquisas para uma atividade em seu horário vago da tarde. Ele se sentou na mesa dela e começou a puxar assunto sobre o terço que ela sempre mantinha no pescoço, um presente da falecida avó; a conversa acabou com uma troca de telefones em que passaram uma noite toda conversando; no sábado em que Alex fumara com Guilherme, foi a primeira vez em que saíram juntos; ele a levava para conhecer pontos turísticos da cidade e também a ajudava com as atividades curriculares.— Então vocês não estão… Você sabe, fazendo…— Não! — Elloá a interrompeu, causando certo alívio tanto pela resposta quanto por não precisar completar a frase. — Você sabe que sou cristã, e ele preza muito por minha inocência, disse que é o meu maior atrativo! — Legal, eu acho — na verdade, Alexandra achava um pouco bizarro, mas passeios casuais eram melhores que um professor tirando vantagem sexual de uma aluna. — E o que fizeram de legal hoje?— Só
Ao fim das aulas da tarde, Alex foi direto para a biblioteca desativada, esperando encontrar todo o seu grupo de amigos. No entanto, ao entrar no local, encontrou apenas Guilherme e Lucas, ambos sentados no parapeito da mesma janela onde, dias atrás, ela havia fumado seu primeiro cigarro junto com Guilherme. Ao perceberem sua presença, os dois levantaram a cabeça, recebendo-a com sorrisos amigáveis.— Também não tem pesquisa acumulada para fazer na sala de estudos? — brincou Guilherme, gesticulando para que ela se aproximasse. — Somos definitivamente os mais inteligentes do grupo!— Ou os com menos vida social, eu diria, se você não estivesse aqui! — acrescentou Lucas, lançando um olhar malicioso para Guilherme antes de apagar o cigarro e descer do parapeito da janela. Ele caminhou até a mesa de estudos, onde algumas latas de refrigerante e uma garrafa de água mineral sem rótulo estavam dispostas. — Sem querer ofender! — Ele sorriu para Alexandra, que se sentou ao lado dele na mesa.—
No dia seguinte, Alex decidiu quebrar a rotina. Ao invés de vestir o uniforme de fim de semana, optou por uma das suas camisetas surradas, combinando-a com seus inseparáveis coturnos. Sentia-se mais confortável assim, mais autêntica. Mesmo caminhando lado a lado com Elloá até o refeitório para o café da manhã, nenhuma das duas disse uma palavra sequer. O silêncio entre elas era imenso, refletindo a tensão que havia crescido desde a noite anterior.Na mesa com os amigos, Alex, Lucas e Guilherme trocaram olhares cúmplices, recordando a noite anterior enquanto os outros reclamavam sobre os trabalhos acumulados. Elloá, por outro lado, comentou de forma ácida:— Acabei tudo durante a madrugada. Inclusive, consegui ouvir pessoas chegando após o toque de recolher.Antes que Alex pudesse responder, Camila, a garota popular, se aproximou mais uma vez, convidando Elloá para se juntar aos seus amigos. Sem hesitar por um segundo, Elloá aceitou o convite e se levantou, deixando o grupo.— O sonho
O céu noturno era iluminado por algumas estrelas e a lua minguante quase não aparecia no céu; aquela era uma das coisas deprimentes de estar na cidade, o céu nunca estava limpo como o do interior.Quisera Alexandra que aquela fosse a única coisa deprimente naquele dia. O cigarro entre seus dedos foi aceso após alguns minutos de contemplação; do telhado de seu alojamento, sentada a borda da construção, o Instituto São Bartolomeu, mesmo à noite, ainda ostentava beleza e imponência. Ela nunca se sentira tão pequena quanto naquele momento.Aquele sempre foi seu sonho, mas estando ali, tudo estava sendo diferente e da pior maneira possível. O pior é que haviam passado apenas 30 dias. Um mês dentro de um ambiente da nata da sociedade, e Alex já não aguentava mais um segundo.No entanto, todo seu drama e autopiedade se esvaíram de seu corpo em segundos quando ela viu claramente a garota correndo pelo pátio, fugindo de algo invisível.De repente, uma pres
No dia seguinte, foi difícil levantar-se da cama, mas Alexandra sabia que não tinha outra opção. Por mais que quisesse justiça pela amiga, denunciar toda aquela situação absurda, sabia que não podia fazer alarde. Já havia sido ameaçada e sabia que seus pais não poderiam arcar financeiramente com um processo de uma instituição como aquela. Mesmo que mal tivesse forças, Alex se levantou, tomou um banho e vestiu seu impecável uniforme, indo em direção ao refeitório, apesar de não sentir um pingo de fome. No cômodo, todos a encaravam com julgamento, alguns rindo sem reservas e poucos preocupados. Guilherme foi em sua direção , ajudando a amiga na caminhada da vergonha, sem medo de ser julgado junto dela. Na mesa junto de seus amigos, todos começaram a lançar-lhe palavras de conforto, mas nenhum deles citaram Elloá. Todos agiam como se Alexandra tivesse passado por um episódio de sonambulismo, era inclusive o assunto que rodava por toda a escola, como se simplesmente tivessem se esqueci
Naquela semana, Alex tentou retomar sua rotina acadêmica, ainda que o ar estranho entre ela e Elloá permanecesse. Elloá agia de forma normal, mas algo em seus gestos e olhares parecia diferente, como se uma sombra pairasse sobre ela. Isso deixava Alexandra inquieta, mas ela se esforçou para não deixar seus medos dominarem. As aulas e os trabalhos se acumularam, e Alex tentou se concentrar neles, usando o cansaço como desculpa para não pensar demais.Na sexta-feira, a professora de inglês ainda não havia retornado, e Arthur continuava a assumir suas aulas. Mesmo após algumas aulas com ele, Alex ainda notava algo estranho no professor. Durante as aulas, ele fazia questão de fazer perguntas diretas a ela, e havia uma sensação incômoda de que ele queria dizer algo mais, algo que sempre ficava nas entrelinhas.Após o fim da última aula, Arthur pediu que Alexandra ficasse um pouco mais na sala. A sala estava quase vazia, com apenas alguns alunos que ainda organizavam seus materiais. Arthur
Apesar do ar de curiosidade que pairava no café, Alexandra e Lucas decidiram prosseguir com o passeio. Eles caminharam pelas ruas da cidade, conversando sobre coisas triviais, até que decidiram ir ao cinema. Era a primeira vez que Alexandra visitava um cinema, e o local era realmente encantador. Com uma arquitetura antiga e uma decoração que remetia aos clássicos do cinema, o lugar exalava charme.— Uau, Lucas, isso aqui é incrível! — exclamou Alexandra, seus olhos brilhando de emoção enquanto observava o ambiente ao redor.Lucas sorriu, contente em vê-la tão animada. Alexandra, movida pela excitação do momento, o abraçou de maneira espontânea e apertada, surpreendendo-o.— Obrigada por me trazer aqui, — ela disse, com a voz cheia de gratidão.— Fico feliz que você esteja gostando, — respondeu Lucas, um pouco sem jeito, mas visivelmente satisfeito.Os dois compraram ingressos para uma animação que estava em cartaz, uma escolha que Alexandra fez de maneira impulsiva. Ela estava ansiosa