Ao fim das aulas da tarde, Alex foi direto para a biblioteca desativada, esperando encontrar todo o seu grupo de amigos. No entanto, ao entrar no local, encontrou apenas Guilherme e Lucas, ambos sentados no parapeito da mesma janela onde, dias atrás, ela havia fumado seu primeiro cigarro junto com Guilherme. Ao perceberem sua presença, os dois levantaram a cabeça, recebendo-a com sorrisos amigáveis.
— Também não tem pesquisa acumulada para fazer na sala de estudos? — brincou Guilherme, gesticulando para que ela se aproximasse. — Somos definitivamente os mais inteligentes do grupo!
— Ou os com menos vida social, eu diria, se você não estivesse aqui! — acrescentou Lucas, lançando um olhar malicioso para Guilherme antes de apagar o cigarro e descer do parapeito da janela. Ele caminhou até a mesa de estudos, onde algumas latas de refrigerante e uma garrafa de água mineral sem rótulo estavam dispostas. — Sem querer ofender! — Ele sorriu para Alexandra, que se sentou ao lado dele na mesa.
— Não ofendeu! — respondeu Alex, devolvendo o sorriso com um toque de ironia.
Lucas era um garoto alto e esguio, com pele parda, cabelo cacheado e óculos que sempre pareciam escorregar pelo nariz. Sob as finas lentes, seus olhos verdes brilhavam com inteligência e um senso de humor afiado, que frequentemente fazia os amigos rirem de suas piadas sarcásticas. Ele estava no segundo ano e vinha de uma pequena cidade do interior.
— Aceita um drink da felicidade? — sugeriu Lucas, mas Guilherme logo interveio.
— Não começa, Lucas! — Guilherme retrucou, juntando-se ao pequeno grupo na mesa.
— Qual foi? Você não sabe se ela curte ou não beber! Você curte? — provocou Lucas, lançando um olhar curioso para Alex.
— Até meus treze anos, minha família não considerava cerveja como bebida alcoólica, cresci tomando como se fosse refrigerante! Então, eu diria que não sou fácil de abalar com álcool! — Alex respondeu com um tom de provocação, olhando diretamente para Guilherme, que arqueou a sobrancelha, mantendo um sorriso no rosto. — O que vocês têm aí?
Guilherme deu uma risadinha enquanto Lucas, satisfeito com a resposta, abriu a garrafa de água mineral.
— Vodka! Misturamos com refrigerante, assim ninguém percebe! — explicou Lucas, servindo os copos.
Enquanto fumavam e conversavam, Lucas começou a contar como driblavam as regras rígidas da escola, carregando bebidas e outros itens proibidos sem serem pegos.
— Acredite se quiser, mas são os adolescentes ricos que trazem isso para cá. As malas e mochilas deles nunca são revistadas quando voltam para a escola nos fins de semana. — Ele comentou, olhando para Alex, que parecia chocada com a revelação.
— Sério? — Alex perguntou, ainda assimilando a informação. — Nunca imaginei que fossem eles...
— Pois é. A vida tem suas surpresas! — Lucas respondeu, brindando com ela antes de tomar um longo gole de seu copo.
Os três beberam os 500ml de vodka misturada com refrigerante sem nem perceber o tempo passar. A conversa fluía tão naturalmente que nem notaram que o toque de recolher já havia passado.
Depois de algum tempo, Guilherme se levantou, dizendo que precisava ir ao banheiro.
— Já volto, gente! — disse ele, saindo da biblioteca.
No entanto, dez minutos se passaram, e Guilherme não retornou. Lucas e Alex ficaram a sós, e a conversa tomou um rumo mais pessoal.
— A Elloá mencionou um namorado... — começou Lucas, com um tom casual. — Ela disse que ele está te ignorando. O que está acontecendo?
Alex suspirou, sentindo um peso no peito ao falar sobre o assunto.
— Não sei ao certo... Nos primeiros dias, enquanto eu tentava me adaptar à rotina aqui, mandei menos mensagens. Um dia, acabei não respondendo nenhuma das mensagens dele, e depois disso, ele parou de responder as minhas. Não atende às minhas ligações, nada. Pedi para as minhas amigas descobrirem o que estava acontecendo, mas elas disseram que ele parecia normal. Não entendo...
Lucas escutou com atenção, assentindo enquanto ela desabafava.
— Isso é complicado, Alex. Mas talvez ele só esteja dando um tempo... Ou pode ser que ele esteja esperando que você entre em contato de novo, de forma mais insistente.
— Talvez... — Alex respondeu, mordendo o lábio inferior. — Só não sei mais o que fazer.
Lucas, sempre o amigo compreensivo, colocou a mão no ombro dela.
— Não se preocupe tanto. Se ele realmente se importa com você, vai entender o que está acontecendo. Às vezes, a vida aqui dentro consome a gente, mas não deixe que isso te afaste dele.
Havia um clima no ar, quase romântico, que fez Alex sentir-se estranhamente confortada e confusa ao mesmo tempo. Antes que qualquer coisa pudesse acontecer, Guilherme voltou à biblioteca, carregando um saco de salgadinhos.
— Trouxe um lanche! — anunciou ele, quebrando o clima. Alex sentiu um alívio imediato.
Os três passaram o restante da noite na biblioteca, rindo, conversando e fumando, esquecendo-se das preocupações por um breve momento.
O trio finalmente decidiu retornar aos seus respectivos dormitórios por volta das três da manhã. O ar estava frio e silencioso enquanto Alex caminhava sozinha em direção ao seu prédio. Sentia o álcool ainda pulsando em suas veias, mas uma estranha sensação de ser observada começou a crescer dentro dela. Seus passos se tornaram hesitantes, e um arrepio percorreu sua espinha, fazendo-a quase parar no meio do caminho.
Ela tentou manter a calma, continuando a caminhar como se nada estivesse errado, consciente das câmeras de segurança que a vigiavam. Mesmo sabendo que naquele horário ninguém estaria monitorando as imagens, a sensação de vulnerabilidade era difícil de ignorar. Cada sombra parecia se mover, e cada som era amplificado pelo silêncio da madrugada. Finalmente, chegou ao seu prédio e respirou aliviada ao entrar.
Ao abrir a porta do quarto, Alex se deparou com uma cena inesperada: Elloá estava acordada, concentrada em seu computador, digitando furiosamente. Um lampejo de constrangimento passou por Alex ao perceber que, logo após criticar Elloá, também havia quebrado as regras. No entanto, em vez de confrontá-la ou fazer algum comentário sarcástico, Elloá apenas lançou um olhar cheio de significado, que Alex pareceu captar, mas ignorou.
Sentindo-se cansada, mas também estranhamente tranquila por causa do álcool, Alex decidiu tomar um banho rápido e energizante. A água quente ajudou a dissipar parte da tensão acumulada durante a noite, e quando finalmente se deitou na cama, sentiu que o sono a envolvia rapidamente. Apesar de tudo, foi um sono tranquilo, livre das preocupações que costumavam assombrá-la.
No dia seguinte, Alex decidiu quebrar a rotina. Ao invés de vestir o uniforme de fim de semana, optou por uma das suas camisetas surradas, combinando-a com seus inseparáveis coturnos. Sentia-se mais confortável assim, mais autêntica. Mesmo caminhando lado a lado com Elloá até o refeitório para o café da manhã, nenhuma das duas disse uma palavra sequer. O silêncio entre elas era imenso, refletindo a tensão que havia crescido desde a noite anterior.Na mesa com os amigos, Alex, Lucas e Guilherme trocaram olhares cúmplices, recordando a noite anterior enquanto os outros reclamavam sobre os trabalhos acumulados. Elloá, por outro lado, comentou de forma ácida:— Acabei tudo durante a madrugada. Inclusive, consegui ouvir pessoas chegando após o toque de recolher.Antes que Alex pudesse responder, Camila, a garota popular, se aproximou mais uma vez, convidando Elloá para se juntar aos seus amigos. Sem hesitar por um segundo, Elloá aceitou o convite e se levantou, deixando o grupo.— O sonho
O céu noturno era iluminado por algumas estrelas e a lua minguante quase não aparecia no céu; aquela era uma das coisas deprimentes de estar na cidade, o céu nunca estava limpo como o do interior.Quisera Alexandra que aquela fosse a única coisa deprimente naquele dia. O cigarro entre seus dedos foi aceso após alguns minutos de contemplação; do telhado de seu alojamento, sentada a borda da construção, o Instituto São Bartolomeu, mesmo à noite, ainda ostentava beleza e imponência. Ela nunca se sentira tão pequena quanto naquele momento.Aquele sempre foi seu sonho, mas estando ali, tudo estava sendo diferente e da pior maneira possível. O pior é que haviam passado apenas 30 dias. Um mês dentro de um ambiente da nata da sociedade, e Alex já não aguentava mais um segundo.No entanto, todo seu drama e autopiedade se esvaíram de seu corpo em segundos quando ela viu claramente a garota correndo pelo pátio, fugindo de algo invisível.De repente, uma pres
PREFÁCIOO céu noturno era iluminado por algumas estrelas e a lua minguante quase não aparecia no céu; aquela era uma das coisas deprimentes de estar na cidade, o céu nunca estava limpo como o do interior.Quisera Alexandra que aquela fosse a única coisa deprimente naquele dia. O cigarro entre seus dedos foi aceso após alguns minutos de contemplação; do telhado de seu alojamento, sentada a borda da construção, o Instituto São Bartolomeu, mesmo à noite, ainda ostentava beleza e imponência. Ela nunca se sentira tão pequena quanto naquele momento.Aquele sempre foi seu sonho, mas estando ali, tudo estava sendo diferente e da pior maneira possível. O pior é que haviam passado apenas 30 dias. Um mês dentro de um ambiente da nata da sociedade, e Alex já não aguentava mais um segundo.No entanto, todo seu drama e autopiedade se esvaíram de seu corpo em segundos quando ela viu claramente a garota correndo pelo pátio, fugin
A manhã seguinte se iniciou com as colegas de quarto sendo despertadas pelo sinal. Naquele dia, um sábado, não era necessário acordar cedo, mas durante a semana o despertar naquele horário, às 5 da manhã, era obrigatório. Dali meia hora, haveria a oração matinal na capela e até às seis e meia, serviam o café da manhã. No fim de semana não havia atividades e a instituição permitia a saída dos estudantes, desde que retornassem até às 19. A biblioteca, piscina e quadra de esportes também ficavam abertas; havia muito o que fazer ali mesmo.Alex se levantou e iniciou a organização de seus pertences, enquanto Elloá continuou deitada, usando o celular. Antes de saírem para o café, faltando vinte minutos para encerrar a distribuição, Alex ligou para os pais; Lucca não atendeu, ainda não estava acordado.Para as amigas, no grupo de mensagens intitulado “Bests”, Alex enviou uma foto retirada no espelho do banheiro, onde ostentava seu uniforme de dia não letivo. O uniforme consistia em uma cami
Os primeiros dias no Instituto foram extremamente difíceis para Alex e Elloá. O ambiente, que já era desafiador por si só, se tornou ainda mais hostil devido ao comportamento dos outros alunos. As duas amigas passaram a ser alvo de piadas maldosas e comentários sarcásticos.O bullying ia muito além das palavras. Em diversas ocasiões, as garotas foram vítimas de pegadinhas cruéis, sempre envolvendo a exclusão por classe. Os trabalhos em grupo também eram um desafio. Os alunos se recusavam a incluir as bolsistas, fazendo questão de deixá-las de lado e os professores eram completamente coniventes com a situação, pois estavam sendo constantemente ameaçados pelos filhos de famílias influentes, que respeitavam apenas os professores veteranos, que não eram muitos. Como Alex e Elloá não tinham muitas aulas juntas, acabavam fazendo os trabalhos sozinhas. Apesar de tudo, as duas se mantinham firmes, sabendo que desistir significaria abrir mão de seus sonhos e perto de todos os grandes objetivos
No meio de tantas atividades e trabalhos que deveriam ser em grupo, mas acabava por ter de fazer individualmente, Alexandra não teve muito tempo para ligar para suas amigas e namorado, a única ligação que fazia religiosamente, era uma curta para seus pais, onde sempre fingia uma voz alegre, omitindo as situações que passava. Naquele fim de semana, após tensos minutos encarando o programa de texto do computador e sem forças para digitar mais um carácter sequer, decidiu que precisava relaxar. Após salvar o documento e fazer logoff no computador, abandonou a sala de estudos, caminhando pelo imenso Campus em busca de um lugar tranquilo, optando pela biblioteca do prédio Cecília Meireles. Naquele sábado, o terceiro que passava ali, era a primeira vez que Alex permanecia tanto tempo longe de sua família e após desligar o cérebro de todas as suas atividades acadêmicas, sentiu o peso da distância sob os ombros. Quando se sentou no parapeito de uma das janelas abertas e encarou o vasto jardi
Professor Arthur se aproximou de Elloá na biblioteca enquanto ela fazia pesquisas para uma atividade em seu horário vago da tarde. Ele se sentou na mesa dela e começou a puxar assunto sobre o terço que ela sempre mantinha no pescoço, um presente da falecida avó; a conversa acabou com uma troca de telefones em que passaram uma noite toda conversando; no sábado em que Alex fumara com Guilherme, foi a primeira vez em que saíram juntos; ele a levava para conhecer pontos turísticos da cidade e também a ajudava com as atividades curriculares.— Então vocês não estão… Você sabe, fazendo…— Não! — Elloá a interrompeu, causando certo alívio tanto pela resposta quanto por não precisar completar a frase. — Você sabe que sou cristã, e ele preza muito por minha inocência, disse que é o meu maior atrativo! — Legal, eu acho — na verdade, Alexandra achava um pouco bizarro, mas passeios casuais eram melhores que um professor tirando vantagem sexual de uma aluna. — E o que fizeram de legal hoje?— Só