Gabriel despertou de repente, como se tivesse escutado alguém o chamar. Mas ninguém o acordaria num domingo à uma hora dessas, ele pensou, olhando a escuridão lá fora e por um instante pensou ter visto um movimento na árvore de frente para a janela de seu quarto, mas estava escuro demais e sua miopia muitas vezes lhe pregava peças.
Vasculhou a mesa de cabeceira em busca de seus óculos e seu smartphone, com o intuito de olhar que horas eram, mas estranhou ao ver que em seu aparelho marcavam oito da manhã.
— Deve haver algum erro de rede ou algo parecido — disse para si mesmo.
Seu quarto não tinha cortinas, e às oito, o sol já estaria batendo diretamente na sua janela.
— Que horas são? — disse ao aparelho, enquanto pressionava a tecla de pesquisa e, em resposta, recebeu a confirmação de que eram oito da manhã.
Levantando-se de sobressalto, foi até a cozinha e, abrindo a geladeira, pegou uma garrafa com água e bebeu avidamente do bico.
— Que loucura está acontecendo? — perguntou a si mesmo e se dirigiu ao quarto da mãe.
— Mãe, a senhora já acordou? — gritou batendo de leve na porta. Tá tudo escuro lá fora e já passam das oito.
— Mãe? — chamou e bateu novamente depois de não obter resposta, mas novamente em vão.
Preocupado com a falta de respostas, Gabriel tentou abrir a porta, mas estava trancada por dentro, então a forçou até arrombá-la.
Entrando no quarto avistou a cama desarrumada, mas sem sinal de sua mãe e vasculhou também o banheiro, mas não havia ninguém.
Vendo que as janelas também estavam trancadas por dentro, ele entrou em estado de alerta. Não tinha como sua mãe ter saído daquele quarto. Será que isso tinha a ver com a escuridão que estava lá fora?
Precisava se acalmar e pensar, então se sentou na cama de sua mãe e ligou a televisão. No noticiário imagens de satélite mostravam o momento em que o sol simplesmente deixou de brilhar, como uma lâmpada que apagamos. A apresentadora do telejornal alertava também para outro fenômeno, que estava acontecendo em escala global — o misterioso desaparecimento de pessoas, que simplesmente sumiram, como se tivessem evaporado, deixando as roupas intactas no lugar em que estiveram por último.
Gabriel então observou que em meio às roupas de cama de sua mãe, estava também o pijama que ela usava na última vez que a viu na noite anterior. Sentiu o desespero crescendo em seu interior, mas lembrou do que sua mãe dizia:
"Na vida, como na matemática, devemos racionalizar os problemas, tentando achar soluções viáveis a cada caso"
Respirando fundo, eliminou a bolha de desespero em seu peito e levantou-se. Pegando o telefone, tentou ligar para o celular do pai, mas chamou até cair. Digitou então o número do laboratório e, depois de tentar várias vezes, uma voz feminina atendeu.
— Por favor — disse a moça do outro lado da linha, com um tom de urgência na voz —, eu preciso de ajuda! Muitos cientistas desapareceram, inclusive a minha mãe. Só sobraram os jalecos espalhados pelo laboratório. Eu não sei mais o que fazer!
— Fique calma — respondeu Gabriel tentando seguir seu próprio conselho, mesmo com o coração querendo sair pela boca —, respire fundo e me diga o seu nome.
— Raguel. — ela disse pausadamente, e depois de respirar fundo continuou — Meu nome é Raguel Williams e sou filha da doutora Jodi Williams. Eu recebi uma mensagem dela pedindo para encontrá-la aqui, mas chegando aqui só encontrei uniformes e crachás espalhados pelo chão. Muitos cientistas desapareceram, os seguranças e demais funcionários fugiram e eu estou perdida aqui.
— Raguel, — disse Gabriel, mantendo a calma, mesmo quase explodindo por dentro — Meu nome é Gabriel Rashford, e meu pai é o engenheiro químico chefe deste laboratório. Também estou assustado, mas isso não aconteceu só aí. Está acontecendo no mundo todo e eu preciso falar com ele.
— Gabriel — ela disse, interrompendo-o —, eu conheço o Dr Rashford, ele era chefe da minha mãe e eu encontrei seu uniforme e crachá também. Sinto muito!
Gabriel fez silêncio por segundos que pareceram uma eternidade. Em seu peito crescia o desespero. Desde que foi adotado aos três anos de idade, não sabia o que era estar sozinho. Por mais que o Dr e a Dra Rashford não se vissem muito, devido ao trabalho de ambos, eles nunca o deixavam sozinho e, quando um não estava presente, o outro estava.
Ele foi criado em meio às pesquisas de seus pais que eram importantes cientistas. Ela, uma renomada doutora em matemática e ele, um engenheiro químico conhecido no mundo todo.
Ambos eram chamados pelo governo para o gerenciamento de crises internacionais, e se saiam muito bem.
— Mas e essa crise agora — perguntou a si mesmo —, quem resolveria?
Ele era um jovem de dezoito anos, que sempre teve apoio dos pais para tudo e agora estava só e perdido.
— Como sua mãe reagiria? — refletiu, e então decidiu ser forte, por eles.
— Raguel, ainda está aí? — continuou, tentando passar calma e confiança.
— Sim, estou.
— Ótimo! — continuou ele — Preciso que você faça o seguinte: Procure por cientistas que não tenham sido afetados por "isto" seja lá o que "isto" for. Eu estou indo para aí e nós vamos procurar uma solução juntos. Posso contar com você?
— Ok, combinado! — assentiu ela — Mas venha rápido, por favor!
Dito isso, ambos desligaram os aparelhos, e Gabriel, pegando as chaves do carro de sua mãe, saiu apressadamente rumo ao laboratório.
— Eu vou descobrir o que está acontecendo, mamãe — disse o jovem para o vazio, como se acreditasse que ela pudesse ouvi-lo de outro plano, ou talvez quisesse apenas encorajar a si mesmo.
Mikael acordou abruptamente com o barulho de vidraças se quebrando, e ainda sonolento sentou-se na cama, perguntando-se que diabo estava acontecendo. Um segundo som, agora mais próximo, o despertou de vez e o pôs em estado de alerta, uma vez que lá fora ainda era noite, e a escuridão o impedia de ver através do vidro.Levantou-se, pegou o taco de baseball atrás da porta e seguiu silenciosamente em direção à sala, de onde havia vindo o barulho.Enquanto descia as escadas, precisou proteger-se quando uma pedra atravessou o vidro da sala, seguida de várias outras pedras que destruíram todos os vidros do cômodo, como se fosse uma chuva horizontal de pedras.Assustado ouviu vidros sendo quebrados também no andar de cima, mais
Depois de mais uma noite cansativa no hospital municipal, Raphael contava as horas para ir para casa. Independente como sempre foi, ele aprendeu cedo a cuidar de si mesmo e dos outros. No orfanato onde cresceu, enfrentou a difícil situação de não ser adotado e sabendo que precisaria se virar sozinho na vida, tratou de aprender tudo o que poderia aprender.Aos dez anos começou a trabalhar como auxiliar da enfermeira do orfanato, onde aprendeu a amar o ofício, e agora, aos dezoito anos, era técnico em enfermagem no hospital municipal da cidade.Seu plantão ia até às seis da manhã, mas olhando para a programação diária percebeu que já tinha feito quase tudo, e mesmo ainda faltando pouco mais de uma hora e meia para ir embora, faltava apenas a última ronda nos l
Sem saber por onde começar, Raguel saiu à procura de outros funcionários do laboratório, sendo que a dor de saber que poderia nunca mais ver sua mãe, ainda martelava em seu peito.Saber que alguém como Gabriel, que estava passando pela mesma situação, estava a caminho para ajudá-la a entender aquilo tudo a confortava, e mesmo não o conhecendo, algo em sua voz dizia que podia confiar nele.Passou por várias salas e olhando dentro delas, avistou mais jalecos e crachás espalhados pelo chão, além de vários armários de arquivos e alguns computadores, mas nenhum funcionário.Chegando a um pátio com janelas, pode ver que a escuridão ainda reinava lá fora e então, sentando-se, sentiu o
A Igreja Da Consolação Divina ficava no centro de Miraculous Clearing, e em meio a escuridão que pairava no local, suas luzes iluminavam todo o perímetro da grande praça central, que em um domingo como esse, se o sol estivesse aparecido, estaria tomada de crianças, idosos e jovens namorados, mas agora estava deserta e sem vida.Mikael deixou a moto em frente à grande escadaria da igreja, e seguiu para dentro. Da entrada do grande salão pode avistar o altar e lá estava seu pai, sentado nos degraus sozinho. Ao se aproximar, o jovem viu que ao lado do pastor, tinha uma garrafa de uísque com mais da metade do conteúdo faltando.A cena lhe trouxe a lembrança de dias ruins, quando sua mãe descobriu o câncer. Seu pai, que já era pastor, passou por um grave momento
Raphael abriu os olhos e se assustou ao ver que estava caído no chão de um dos quartos do hospital onde trabalhava. Sua cabeça doía e por um instante permaneceu sentado, tentando entender por que estava naquela situação.Levantou-se lentamente e enquanto ajeitava o jaleco, reparou que havia sangue em sua roupa, na parede e chão onde estava encostado á pouco. Alarmado, ele vasculhou o corpo à procura de ferimentos, mas não encontrou sequer um arranhão, exceto por um corte em sua calça branca, na altura do joelho, em cima de uma mancha de sangue ainda meio úmida. Seu rosto e cabelo também tinham sangue, mas olhando no espelho, também não viu corte algum, e um objeto que viu no reflexo deste espelho trouxeram-lhe à lembrança, tudo o que acontecera ali.Era o li
A placa indicando os limites de Miraculous Clearing já havia ficado para trás a alguns quilômetros, mas agora que ela estava tão perto, já não sabia se seguia em frente ou desistia. Atrás da montanha que ela agora subia em sua moto através da rodovia estadual, estava a cidade que um dia foi sua casa, e tinha sido obrigada a abandonar.Há oito anos, quando ainda era apenas uma criança de dez anos, ela foi levada da cidade por sua mãe, que decidiu separar-se de seu pai, para aceitar a proposta de ser curadora de um famoso museu em Londres. Não podia culpar seus pais pela separação, pois ambos eram apaixonados pelas respectivas profissões, mas nunca os perdoou por fazê-la escolher com quem ficaria.Ela amava muito os dois, desde que a adotaram, e ela optou por
Gabriel guiou Raguel até a sala de monitoramento. Ele nunca se interessou pela profissão do pai, mas, simpático como era, nunca recusou um convite para visitar o laboratório e conhecia bem suas dependências. Sempre fora mais inclinado para a matemática da mãe que para a química do pai, mas nunca disse nada, para não correr o risco de magoá-lo.O doutor Rashford, era conhecido mundialmente por seu trabalho com química quântica, e se tornou notável por suas descobertas nos campos da Química Nuclear, Astroquímica, Sonoquímica e Hidrodinâmica quântica, e era procurado por físicos do mundo todo para ministrar palestras e seminários.Miraculous Clearing era um campo muito fértil de grandes mentes, e havia exportado para o mundo muitos “gênios” em diversas áreas di
Mikael passou apressadamente pela entrada do hospital carregando seu pai nos braços. A mancha crescente e úmida na faixa improvisada mostrava que a hemorragia aumentava e ele precisava urgente de auxílio médico.A recepção e os corredores estavam vazios. Cadeiras, vasos de planta e papéis revirados e espalhados por todos os lados, davam a impressão de que um furacão ou algo parecido tinha passado por ali.— Alguém me ajude! — o jovem gritou desesperado, e desesperou-se ainda mais por receber em retorno apenas o eco de sua voz pelos corredores desertos.Colocando o pastor cuidadosamente no chão, ele retirou sua jaqueta suja de sangue e improvisou uma almofada, onde pousou a cabeç