POV CEDRIC
Cedric Bellini não estava tendo um bom dia. Mas sendo sincero consigo mesmo, nenhum dos seus dias no “Centro de reabilitação Boa Esperança” era um bom dia. Na verdade eram todos como o inferno na terra, ao contrário do que o nome sugere.
Pra começar, ele era um alfa. Ou ele tinha sido há muito tempo atrás. Um alfa em uma situação como essa não é algo que se vê todo dia.
Aqui não era e nem nunca seria lugar para alguém como ele, apesar de não ser o único da sua espécie aqui dentro. Se você tem dinheiro e inimigos, no final é aqui que todos vão parar. Era bem mais fácil ser trancado aqui dentro esquecido e largado do que qualquer outra coisa. Você nem precisa ter feito nada de muito errado. Só basta ter um inimigo, esperto o suficiente para armar contra você e pronto, você conseguiria um ingresso só de ida pra essa academia de loucos.
Sendo um alfa de sangue quente 24 horas por dia, sem nada pra fazer a não ser aceitar a vida na qual foi submetido. Bom, “aceitar”. Pois isso não significava que ele só iria ficar sentado e nunca mais fazer nada na vida.
Sentia muita falta da liberdade, mas também sabia que não merecia mais ela desde muito tempo.Não se achava mais digno, Então se torturava o quanto podia com isso.
Se manter na coleira, trancado como um cachorro, sem reclamar nem fazer nada a respeito. Ele sentia merecer todo e qualquer castigo que venha como consequência do seu passado.
Nos dias em que a raiva é demais pra aguentar, como uma maldição que veio junto com seu lobo, quando se mete em brigas e soca a cara de alguém, é sabendo que vai receber de volta, e ele quase nunca revidou uma segunda vez. A não ser, é claro, que a pessoa faça por merecer.
Não era nem um pouco difícil tirá-lo do sério.
E por isso que mais uma vez acaba sendo levado para o que eles gostam de chamar aqui de “castigo”. Só por ter socado a cara de um dos enfermeiros depois de ele arrastar uma das pacientes que não queria sair do quarto porta afora. Injustiças com certeza estavam na lista de coisas que o tirava do sério.
É assim que eles tratavam todos aqui, como animais. O problema é que alguns realmente são como animais, dizendo por ele mesmo. Devia fazer tanto tempo que não falava com ninguém desde que foi trancado aqui. Não fazia questão de ver pessoas, e o local ser bem exclusivo e quase vazio de pacientes, se você considerar seu tamanho, era só um fato que facilitava todo o resto. Ele não precisava falar, não precisava fazer o mínimo esforço para parecer humano.
Ele poderia esquecer do som da sua própria voz que não faria diferença.
É como se voluntariamente estivesse desgastado toda a humanidade que um dia já teve, bem aos poucos sem que perceba. Apenas esquecendo dela e se entregando a uma fera interior que só age por seus instintos. Mesmo que não precise muito deles aqui dentro. Por isso ultimamente vive mais trancado do que solto, realmente como um maldito animal.
Há dois enfermeiros agora, escoltando ele por cada braço para o lugar onde seria casa nos próximos dias. Um lugar em que está acostumado a frequentar desde as pequenas confusões até olhar feio para os superiores. No começo, quando só ficava na dele e de vez em quando escorregava, eles não o mandavam para lá. Agora é diferente, ele é problema e vem dando muita dor de cabeça.
Ninguém aqui dentro gosta de dor de cabeça, então o que você faz? Guarda tudo na gaveta, bem fechada.
Mas diferente das outras vezes, sons altos que ecoam pelo corredor chamam sua atenção.
Ele estava bem longe da confusão que estava acontecendo no corredor logo atrás, e como estava indo pra direção oposta,não conseguiu ver nada, apenas ouvir os gritos vindos da sala de uma das referências, que é como chamam os médicos e terapeutas responsáveis por pacientes de forma individual. São eles que pensam nos tratamentos e são os responsáveis por piorar a estadia de todos aqui o máximo possível, apesar de insistirem que é ao contrário.
-PRO INFERNO TUDO ISSO! VOCÊ PARA O INFERNO, MINHA TIA PRO INFERNO, VOCÊS TODOS PRA MERDA DO INFERNO! FIQUE SABENDO QUE EU NÃO ESTOU FORA DAS MINHAS MALDITAS FACULDADES MENTAIS SEUS DESGRAÇADOS.. EU ESTOU EM MINHAS PLENAS CAPACIDADES E CAPAZ DE FALAR POR MIM MESMA. ESSA VÍBORA ARMOU PRA MIM, VOCÊS DOIS ARMARAM QUE EU SEI, COM LAUDOS FALSOS E TUDO MAIS QUE PODIAM ARRANJAR. E FOI SÓ EU ME DESCONTROLAR UM POUQUINHO EMOCIONALMENTE, EU DAR UMA DESLIZADA E PRONTO. JOGADA AQUI DENTRO PARA APODRECER COMO UM PEDAÇO DE LIXO, ENQUANTO ELA DANÇA E SAMBA POR AÍ COM O DINHEIRO DO MEU FALECIDO PAI..
Quando ele ouvisse, os cantos de sua boca começaram a se levantar quase sozinhos e automaticamente com a diversão. É estranho sentir graça de alguma coisa de forma tão espontânea aqui dentro. Não que ele tenha chamado a raiva e amargura desse discurso engraçados, pelo contrário. Um desconforto também lhe subiu à garganta quando ouviu essa voz de uma forma que não sabia explicar o motivo. Talvez seja empatia? Mas seria estranho sentir isso por alguém desconhecido. De toda forma, não conseguiu evitar o sentimento de que, seja lá com quem essa mulher estivesse gritando, ele mereceu muito, e ele desejou poder ser uma mosquinha pra entrar dentro daquela sala e ver o que estava acontecendo.
Ele não deveria conseguir entender o que ela disse a essa distância, mas a sua audição um pouco melhor do que a maioria das pessoas ou de outros lobos era uma de suas aliadas, e ele também ouviu quando ela manda seu terapeuta enfiar o castigo no rabo.
Depois disso, veio uma cascata, e seu sorriso se transformou em risadas, que ele tentou disfarçar e engolir de volta. Os dois enfermeiros putos começam a empurrá-lo pra eu andar mais uma vez. Nunca tem nada de interessante acontecendo aqui dentro, então é sempre um espetáculo quando tem alguém que faz as coisas esquentarem. Ninguém aqui dentro responderia nada com um fogo como esse. A maioria das pessoas só escolhem desistir, se entregar e dançar conforme a música. Ele não vê o rosto da mulher que falou aquelas coisas, nem vê ela sendo arrastada aos gritos e chutes para fora da sala, apesar de querer muito, de uma forma até estranha.
Mas com isso, chega também a forte sensação de que as coisas estão prestes a ficar muito interessantes por aqui, e sua torcida é para que os dois possam se esbarrar, seja lá quem ela seja.
Depois disso, ele é apenas levado para o seu quarto particular, sem portas e janelas, como um grande e branco armário de limpeza. Por algum motivo, não esquece o que aconteceu nesse dia mais cedo.
POV ODETTE E pronto, depois disso acho que já dá pra imaginar o que aconteceu, não é? O homem berrou e berrou, e de repente tinha enfermeiros me arrastando pelo corredor. É óbvio que eu me debati, o máximo que pude, afinal, mesmo que eu soubesse que eles não me soltariam assim, não podia deixar ser levada tão facilmente. Questão de orgulho. Mas quando eu fui trancada naquele quarto branco que seria minhas acomodações pelos próximos não sei quanto tempo, não pude deixar de pensar que valeu a pena quando vi a cara de espanto do homem e seu rosto ficando cada vez mais vermelho, como se ele fosse explodir em milhares de pedacinhos depois de ter sido irritado. Mas depois disso, tudo foi só ladeira abaixo. Eu podia listar a quantidade significativa de coisas que eu passei as últimas semanas tentando evitar e que simplesmente aconteceram praticamente fora do meu controle. Minha Tia havia me internado em um hospital psiquiátrico. Pra que? Ora, ficar com a droga do dinheiro que eu tenho d
Já no dia seguinte, oficialmente meu primeiro dia desde que eu havia chegado aqui, não estava mais suportando olhar um segundo sequer para essas paredes brancas e sem graça que me cercavam no quarto em que me colocaram. Eu estava realmente, realmente enlouquecendo. Deixando cada vez mais, sem ter escolha, esse castigo que me colocaram me subir a cabeça. É como aquelas vezes quando somos crianças e nossas mães, pais, tias e até professores nos colocam de castigo para “pensar no que fizemos” enquanto olhamos pra parede, e você nunca quer pensar no que fez pois na sua cabeça, você não está errada. Mas acontece que olhar pra parede é chato, e você não tem escolha a não ser pensar em tudo que te vier na mente. Eu também fiquei andando de um lado pro outro, alonguei todos os meus músculos, joguei minha maldita bolinha de uma parede a outra e tentei, tentei muito me concentrar em um dos livros que eu havia trago, mas a falta do que fazer me deixava agitada, com energia acumula até as bor
POV CEDRICOs dedos ansiosos de Cedrik batucavam incessantemente na parede. Suas pernas estavam pro alto totalmente descontraídas no seu familiar quarto branco. E não era o quarto branco tradicional em que era obrigado a passar seus dias, mas sim outro quarto branco. O que colocavam os que passavam da linha.Nesse lugar esquecido,só tinha um colchão e aquelas paredes que te encaravam de volta quando você as encarava por muito tempo. Ele já tinha tido muitas chances de sair de lá, tantas oportunidades que no final valeram menos que nada, mas decidiu aceitar o destino a qual foi encaminhado, e se tivesse que passar seus dias apodrecendo aqui por causa desse destino, é isso mesmo que ia fazer. Essa era a sua punição e ele já tinha aceitado ela há muito tempo. Mesmo que enlouqueça de verdade por nunca encontrar sua companheira fora daqui, mesmo que nunca mais sinta o vento da liberdade ou possa assumir sua forma de lobo, e fazer tudo que ele tinha sido feito pra fazer. Fazia 5 ano
Para começo de conversa, a aberração literária que estavamos sendo obrigados a ler era uma espécie de alto ajuda para crianças, sobre dois ratos que perdem o seu queijo precioso e não sabem o que fazer a respeito disso. Um dos livros mais chatos e entediantes disfarçados de conto juvenil que eu vi na minha vida. Só a mínima discussão sobre a proposta inicial me faz bocejar, rolar de um lado pro outro na cadeira extremamente desconfortável e balançar os pés inquietamente querendo ir embora. Passei mais tempo prestando atenção nos arredores do que na explicação da senhora alta que estava na ponta da roda,comentando sobre a proposta do grupo, da leitura e todo o blábláblá que parece que não acaba. Ela passa um tempo desnecessariamente longo repetindo palavras e falando frases que pra mim são a mesma coisa, como por um exemplo: “a mudança é uma coisa crucial para nós como seres humanos”, “devemos lidar com isso”e mais blá blá blás que passei anos ouvindo de terapeutas medíocres.Eu mud
POV CEDRICDepois de mais de um dia trancado, Cedric estava em fim sendo levado pro seu quarto. Horas infernais que ele jurava ter se acostumado, mas descobriu do pior jeito que não.A m*****a “sala de repouso” ou o quarto branco como chamavam por aqui.Tinha tido a sua prova final. Era pra ser mais um dia comum, mais uma passagem de tempo como qualquer outra, mas nada era mais como antes, nem nunca mais seria. Se ele se concentrasse um pouco, ainda conseguia sentir aquele cheiro, que mudou tudo.Agora ele olha pra todos os lados dos corredores enquanto segue, procurando. Tudo sempre continua tão igual, mas de repente se tornando tão diferente.Ele sabia que a essa hora a maior parte do pessoal estava lá fora aproveitando um dia de sol, ou dentro dos quartos esquecendo que existe um lado de fora, ou qualquer outra coisa além daqui. Mas mesmo assim, era uma tarefa impossível pra ele, parar de esperar que em algum lugar vá sentir de novo aquele aroma, e que ao virar um corredor vai enc
Quando fecho os olhos naquela noite e me deixo ser levada pelo sono, estou em um jardim. Um jardim que no fundo da minha mente tenho a lembrança de já ter o visto antes em outros sonhos, mas algo está diferente. Reconheço campânulas, rosas e não-me-esqueças. Há outras variedades, e libélulas voam pela grama alta, que roça meu tornozelo e eu sinto cócegas. Sinto cócegas? Não se pode sentir cócegas enquanto sonha. Mas eu sinto. Independente disso tenho certeza que estou sonhando, com cócegas ou sem cócegas.Sabe quando se olha para um objeto dentro de um sonho? Ele não parece real. Não tem detalhes, e sua forma não é muito parecida a como ela é na realidade. Às vezes a textura até se mexe enquanto você está olhando. Causa uma sensação esquisita, mas é crucial que exista esses pontos para que haja diferença do sonho pra realidade.Quando eu olho para uma das não- me-esqueças, é isso que acontece. Uma hora ela tem 5 pétalas, mas logo depois tem 6, depois 7, e depois 5 de novo. Sua cor
Algo tinha ficado claro pra mim: Para o Dr. LeClerc, eu não era mais do que um insetinho e algo pra que ele pudesse se vangloriar, mostrar poder e dominância, além de todo aquele discurso chato de “Sou eu que mando aqui e você não decide nada.”.Como ele é o responsável pela minha internação em partes, e foi com certeza o responsável por forjar um laudo fraudulento que foi a minha porta de entrada pra cá, então ele sabe mais do que ninguém que, por ser um laudo FRAUDULENTO, eu com certeza não precisava estar aqui, e muito menos fazer qualquer uma das atividades propostas.Isso só aumenta a minha raiva. Eu não vi a cara dele ainda depois da minha cusparada. Mas ainda assim, ele deixa claro que cada pontinho de liberdade que eu ganho &ea
A minha missão foi um sucesso no fim das contas, depois de muito analisar e escolher uma pessoa com o maior cuidado que pude, Comecei dizendo um “oi” e agradeci aos céus quando a menina de cabelos rosa da aula do livro, não saiu correndo de mim ou me olhou como se eu tivesse duas cabeças. É uma reação que eu esperaria de algumas pessoas daqui, então eu só prova que eu tive sorte.O universo estava do meu lado. Melody era uma graça.Ela foi simpática comigo, se apresentou quando eu perguntei se poderia me sentar com ela para o almoço e a conversa só fluiu. Ela tem 23 anos e não está aqui de forma voluntária. Entupida até o talo de antidepressivos, ela não pode sair pois sua mãe trata depressão como se fosse uma doença contagiosa que ao mínimo descuido poderia passar para seu filho de ouro, o caçula da família. Com medo de Melody influenciá-lo negativ