Fellipo virou uma máquina de destruição.Qualquer missão, qualquer problema, qualquer ameaça que surgisse, ele era o primeiro a se voluntariar montar as equipes e sair para a missão. Não importava o nível de risco, não importava se ele saía inteiro ou não. Na verdade, parecia que ele procurava ser machucado, como se cada ferimento fosse uma punição que ele achava merecer.Fernando já tinha costurado o braço dele três vezes. E, na última, perdeu a paciência.— Por que você não se mata de uma vez, então? que porra nós estamos aqui — gritou, jogando a gaze ensanguentada no chão do galpão. — Porque, do jeito que tá indo, é questão de tempo!Fellipo riu, mas o riso foi vazio.— Que dramático, Fernando.— Dramático é você se enfiar na linha de tiro como se fosse de ferro! — Fernando estava vermelho de raiva. — Você acha que eu não sei que isso é por causa da Cecilia? Porque é óbvio! e não adianta negar .O nome dela bateu como um soco.Fellipo desviou o olhar, mordendo o lábio até sentir g
Nos dias seguintes, Fellipo virou uma sombra do que já foi.Ele saía para as missões mais brutais, caçando qualquer um que ousasse atravessar o caminho da Trindade. Se não houvesse inimigos suficientes, ele inventava. Se não houvesse sangue para derramar, ele provocava até que houvesse.Fernando teve que costurar Fellipo mais vezes, cada corte mais profundo que o outro.— Qual é o seu problema? — Fernando explodiu uma noite, jogando a agulha na mesa com raiva. — Tá difícil se matar?Fellipo só riu, com o cigarro pendurado no canto da boca e o sangue escorrendo pelo braço.— Eu tô me mantendo vivo — respondeu, com uma expressão vazia. — Do meu jeito. por que assim eu penso menos.Ele não voltava mais para a mansão só as vezes ou no café da manhã ou almoço pegava sua dose diária do perfume dela eia embora. Ficava no apartamento imundo, bebendo até desmaiar, acordando com pesadelos da mãe chorando no banheiro, as palavras cruéis do pai ecoando na mente dele.E, mesmo assim, o pior de tu
Fellipo saiu do bordel com os punhos cerrados, o peito arfando de raiva. O cheiro do cigarro barato e do perfume enjoativo das mulheres ainda grudava na roupa, como se quisesse esfregar na cara dele o quão quebrado ele estava.Ele subiu na moto e arrancou pelas ruas escuras, o ronco do motor abafando os gritos das mulheres assustadas que ainda tentavam se recompor do surto dele. A cada curva, ele acelerava mais, o vento cortando sua pele como navalhas.Ele queria se sentir vivo. Queria sentir alguma coisa.Mas tudo o que sentia era um vazio que o corroía por dentro.Parou a moto numa área abandonada da cidade, perto do porto, onde os ratos disputavam espaço com os corpos que a máfia descartava. Sentou-se mais a frente olhando para o mar , encostado numa parede descascada, e acendeu um cigarro com as mãos tremendo.A imagem dela não saía da cabeça.Cecilia.O sorriso, os olhos, a maneira como ela mordia o lábio quando estava nervosa.O jeito como ela gemia o nome dele como se ele foss
Fellipo virou um fantasma.Ele parou de voltar para casa ou para o apartamento — ou para qualquer lugar que pudesse chamar de lar. Depois do bordel, depois do fracasso, ele só precisava de uma coisa: Cecilia.Não para falar. Não para tocar.Ele só precisava vê-la.Nas madrugadas, quando Cecilia saía para passear com Thor, ele a seguia pelas ruas escuras. Ficava nas sombras, o cigarro apagado tremeluzindo no escuro, enquanto ela caminhava, fones nos ouvidos, ouvindo seus romances.Ele via quando ela sorria para o cachorro, abaixava-se para brincar com ele. Quando seus olhos brilhavam ao observar o céu estrelado — como se ela ainda acreditasse que havia algo bonito para acontecer na vida dela.Fellipo ficava parado, a respiração pesada, o peito comprimido.Ele sabia que era doentio. Que era errado.Mas era o único momento em que ele se permitia existir perto dela.Às vezes, ele ficava tão próximo que quase podia sentir o cheiro dela trazido pelo vento. O coração dele batia descompassado
Na noite seguinte, Cecilia saiu para sua caminhada habitual, com Thor trotando ao seu lado. Ela passava a mão na barriga de vez em quando, respirando fundo, como se o ar fresco ajudasse a aliviar o mal-estar que a perseguia nos últimos dias.Mas algo estava estranho.Thor, que normalmente corria à frente, parava a cada poucos metros e olhava para trás, as narinas dilatando como se captasse um cheiro familiar.Fellipo estava ali, escondido na escuridão, mais uma vez. As mãos tremiam dentro do bolso da jaqueta, e o coração batia tão forte que ele achava que Cecilia conseguiria ouvir. ele se tornou um drogado em abstinência e sua droga era Cecilia.Ele nunca se cansava de olhar para ela.Mas, dessa vez, Thor não o ignorou.O cachorro parou de repente, olhou fixamente para onde Fellipo estava escondido, e latiu baixo, mas firme.Cecilia franziu o cenho e puxou a coleira.— Thor? O que foi? — Ela olhou ao redor, mas não viu nada além das sombras da noite.Fellipo cerrou os dentes e sussurro
Cecilia caminhava lentamente pela rua, os olhos vasculhando cada canto escuro, o coração batendo forte no peito. Ela sabia que não estava ficando louca. Sabia que sentira o cheiro dele.Fellipo.Ela apertava a coleira de Thor, que estava inquieto, fungando o ar como se tivesse certeza de que o homem estava ali por perto.— Thor, para... — sussurrou, a voz embargada. — Não tem ninguém aqui.Mas Thor não desistiu. Ele puxou a coleira, indo direto para um carro estacionado no final da rua, latindo e arranhando a porta com as patas enormes.Cecilia franziu a testa, se aproximando devagar. O vidro estava embaçado, e a escuridão do interior do carro não deixava ver nada com clareza.Ela colocou as mãos sobre o vidro, tentando espiar para dentro.— Fellipo? — chamou, a voz quase um sopro.Silêncio.Dentro do carro, Fellipo estava com o corpo tenso, o coração disparado. Suas mãos tremiam no volante, e ele apertava os olhos com força, como se isso o tornasse invisível.Ele não podia deixar ela
Em uma noite silenciosa, depois que todos na mansão já haviam se recolhido, Leonardo e Fernando se reuniram no escritório. Eles já estavam preocupados com Fellipo há dias — o amigo parecia cada vez mais destruído, mais sombrio, como se carregasse o inferno nos ombros.Foi Fernando quem teve a ideia.— A gente precisa arrancar isso dele. — disse, cruzando os braços. — Se continuar assim, ele vai acabar se matando numa dessas missões.Leonardo assentiu, o olhar firme, mas carregado de preocupação.— Eu vou chamar ele agora.Eles não deram escolha a Fellipo. Fernando foi até o apartamento dele e praticamente o arrastou para a mansão, empurrando-o para dentro do escritório.Fellipo estava acabado. Olheiras profundas, rosto pálido, os dedos tremendo levemente. Ele já nem tentava disfarçar.Leonardo fechou a porta e apontou para a poltrona.— Senta.Fellipo revirou os olhos.— Se for pra ouvir sermão...— Cala a boca e senta. — Fernando rosnou, empurrando-o para baixo até que ele caísse na p
Leonardo olhou para Fernando, e Fernando deu um meio sorriso — aquele sorriso de quem estava pronto para cutucar a ferida para ajudar a curar.— Então, você ama a Cecília, mas tá fugindo dela pra não machucar? — Fernando começou, recostando-se na cadeira. — Que engraçado, porque até umas semanas atrás, você tava cuidando dela melhor do que qualquer pessoa.Fellipo levantou a cabeça, os olhos ainda vermelhos, confuso.— Do que você tá falando?Leonardo cruzou os braços, com um olhar sério.— Acha que a gente não sabia? Que vocês estavam dormindo juntos?Fellipo empalideceu.— Não era assim... a gente só...— Só se cuidava — Leonardo completou, com um tom calmo. — Eu via quando você saía do quarto dela de manhã. E, honestamente, nunca me preocupei. Porque você era o único que ela deixava chegar tão perto. e ela é da familia e sabemos que você é de responsabilidade.Fernando riu baixo, balançando a cabeça.— E o Seu Pietro? Acha que a Cecília não sabe que é você que paga o tratamento de