Fellipo saiu do bordel com os punhos cerrados, o peito arfando de raiva. O cheiro do cigarro barato e do perfume enjoativo das mulheres ainda grudava na roupa, como se quisesse esfregar na cara dele o quão quebrado ele estava.Ele subiu na moto e arrancou pelas ruas escuras, o ronco do motor abafando os gritos das mulheres assustadas que ainda tentavam se recompor do surto dele. A cada curva, ele acelerava mais, o vento cortando sua pele como navalhas.Ele queria se sentir vivo. Queria sentir alguma coisa.Mas tudo o que sentia era um vazio que o corroía por dentro.Parou a moto numa área abandonada da cidade, perto do porto, onde os ratos disputavam espaço com os corpos que a máfia descartava. Sentou-se mais a frente olhando para o mar , encostado numa parede descascada, e acendeu um cigarro com as mãos tremendo.A imagem dela não saía da cabeça.Cecilia.O sorriso, os olhos, a maneira como ela mordia o lábio quando estava nervosa.O jeito como ela gemia o nome dele como se ele foss
Fellipo virou um fantasma.Ele parou de voltar para casa ou para o apartamento — ou para qualquer lugar que pudesse chamar de lar. Depois do bordel, depois do fracasso, ele só precisava de uma coisa: Cecilia.Não para falar. Não para tocar.Ele só precisava vê-la.Nas madrugadas, quando Cecilia saía para passear com Thor, ele a seguia pelas ruas escuras. Ficava nas sombras, o cigarro apagado tremeluzindo no escuro, enquanto ela caminhava, fones nos ouvidos, ouvindo seus romances.Ele via quando ela sorria para o cachorro, abaixava-se para brincar com ele. Quando seus olhos brilhavam ao observar o céu estrelado — como se ela ainda acreditasse que havia algo bonito para acontecer na vida dela.Fellipo ficava parado, a respiração pesada, o peito comprimido.Ele sabia que era doentio. Que era errado.Mas era o único momento em que ele se permitia existir perto dela.Às vezes, ele ficava tão próximo que quase podia sentir o cheiro dela trazido pelo vento. O coração dele batia descompassado
Na noite seguinte, Cecilia saiu para sua caminhada habitual, com Thor trotando ao seu lado. Ela passava a mão na barriga de vez em quando, respirando fundo, como se o ar fresco ajudasse a aliviar o mal-estar que a perseguia nos últimos dias.Mas algo estava estranho.Thor, que normalmente corria à frente, parava a cada poucos metros e olhava para trás, as narinas dilatando como se captasse um cheiro familiar.Fellipo estava ali, escondido na escuridão, mais uma vez. As mãos tremiam dentro do bolso da jaqueta, e o coração batia tão forte que ele achava que Cecilia conseguiria ouvir. ele se tornou um drogado em abstinência e sua droga era Cecilia.Ele nunca se cansava de olhar para ela.Mas, dessa vez, Thor não o ignorou.O cachorro parou de repente, olhou fixamente para onde Fellipo estava escondido, e latiu baixo, mas firme.Cecilia franziu o cenho e puxou a coleira.— Thor? O que foi? — Ela olhou ao redor, mas não viu nada além das sombras da noite.Fellipo cerrou os dentes e sussurr
Cecilia caminhava lentamente pela rua, os olhos vasculhando cada canto escuro, o coração batendo forte no peito. Ela sabia que não estava ficando louca. Sabia que sentira o cheiro dele.Fellipo.Ela apertava a coleira de Thor, que estava inquieto, fungando o ar como se tivesse certeza de que o homem estava ali por perto.— Thor, para... — sussurrou, a voz embargada. — Não tem ninguém aqui.Mas Thor não desistiu. Ele puxou a coleira, indo direto para um carro estacionado no final da rua, latindo e arranhando a porta com as patas enormes.Cecilia franziu a testa, se aproximando devagar. O vidro estava embaçado, e a escuridão do interior do carro não deixava ver nada com clareza.Ela colocou as mãos sobre o vidro, tentando espiar para dentro.— Fellipo? — chamou, a voz quase um sopro.Silêncio.Dentro do carro, Fellipo estava com o corpo tenso, o coração disparado. Suas mãos tremiam no volante, e ele apertava os olhos com força, como se isso o tornasse invisível.Ele não podia deixar ela
Em uma noite silenciosa, depois que todos na mansão já haviam se recolhido, Leonardo e Fernando se reuniram no escritório. Eles já estavam preocupados com Fellipo há dias — o amigo parecia cada vez mais destruído, mais sombrio, como se carregasse o inferno nos ombros.Foi Fernando quem teve a ideia.— A gente precisa arrancar isso dele. — disse, cruzando os braços. — Se continuar assim, ele vai acabar se matando numa dessas missões.Leonardo assentiu, o olhar firme, mas carregado de preocupação.— Eu vou chamar ele agora.Eles não deram escolha a Fellipo. Fernando foi até o apartamento dele e praticamente o arrastou para a mansão, empurrando-o para dentro do escritório.Fellipo estava acabado. Olheiras profundas, rosto pálido, os dedos tremendo levemente. Ele já nem tentava disfarçar.Leonardo fechou a porta e apontou para a poltrona.— Senta.Fellipo revirou os olhos.— Se for pra ouvir sermão...— Cala a boca e senta. — Fernando rosnou, empurrando-o para baixo até que ele caísse na
Fellipo 38 anos nasceu com o destino traçado dentro da máfia, e isso nunca o incomodou — pelo contrário, ele amava a vida que levava. A adrenalina de caçar traidores ou inimigos o fazia se sentir vivo, e ver o medo nos olhos de suas vítimas lhe trazia uma satisfação sombria. Filho do antigo subchefe, ele cresceu sob a sombra de um pai que era um exemplo de liderança e perfeição na máfia, mas um marido cruel e destrutivo em casa.O pai de Fellipo humilhava a esposa constantemente, comparando-a com prostitutas, menosprezando sua aparência e minando sua autoestima. A mãe de Fellipo, desesperada para agradar o marido, fez inúmeras cirurgias plásticas, tentando alcançar um padrão impossível, mas nada era suficiente para conquistar o respeito ou o amor dele. Aos poucos, ela foi se tornando apenas uma sombra de si mesma, perdendo a vontade de viver.Fellipo foi a única fonte de conforto da mãe, salvando-a em vários momentos de tentativas de suicídio, implorando para que ela largasse a arma e
Cecília era o tipo de pessoa que iluminava o ambiente sem nem perceber. Meiga, divertida e inteligente, ela tinha uma doçura natural, mas também um jeito forte, moldado pelas dificuldades que enfrentava. O amor pelo pai doente a fazia amadurecer um pouco mais a cada dia, mas ela nunca perdia o brilho nos olhos, especialmente quando estava cercada por duas de suas paixões: os livros de romance e seu fiel companheiro de quatro patas.Sempre que tinha um tempo livre, Cecília se refugiava nas páginas de seus romances favoritos. Gostava das histórias intensas, daquelas que arrancavam suspiros e faziam o coração acelerar. E quando não estava perdida nos livros, era com Thor, seu enorme rottweiler, que ela passava os dias.Apesar da aparência intimidadora, com seu porte robusto e olhar sério, Thor era um verdadeiro amor. Cecília costumava brincar que ele tinha "coração de filhote", pois bastava um carinho para ele deitar de barriga para cima, pedindo mais.— Seu brucutu mimado — ela dizia, r
Após conseguir o emprego como assistente pessoal da esposa do Dom, Cecilia se dedica ao trabalho enquanto continua cuidando do pai doente. Durante o primeiro dia de trabalho na hora de ser apresentada a alta cúpula da TRINDADE, sua chefe descobre sobre a condição de seu pai e, sensibilizada, promete que o Dom providenciaria ajuda para o tratamento. Mais do que isso, ela convida Cecilia a morar na mansão, garantindo que assim seria mais fácil conciliar as responsabilidades profissionais com os cuidados com o pai.após observar a dedicação da jovem e ouvir sua história, a esposa do Dom a chamou para uma conversa. Quando Cecilia contou sobre o Alzheimer do pai e como isso afetava sua rotina, sua chefe ficou visivelmente emocionada. Sem hesitar, prometeu que o Dom providenciaria todo o suporte médico necessário para Pietro e, com carinho, sugeriu que Cecilia fosse morar na mansão. Assim, ela poderia estar sempre perto, tanto do pai quanto do trabalho, sem se desgastar nos deslocamentos.C