capítulo 03

|Bruna Pinheiro|

O carro estava se movimentando devagar, Nicholas permanecia em silêncio, preso a cadeirinha no banco de trás do carro Henry.

Ele havia se oferecido para nos levar até o cemitério onde daríamos o nosso último adeus ao homem mais incrível que eu já tive a oportunidade de ter na minha vida.

O silêncio ensurdecedor se propagou durante todo o trajeto, Henry abriu a porta para que Nic pudesse descer, e sai logo em seguida, segurando sua pequena mão com a minha.

Caminhamos lentamente até onde os outros se encontravam. Algumas poucas pessoas que não compareceram à minha casa vieram na minha direção para me desejarem as condolências.

Nicholas estava quieto ao lado do caixão, suas duas mãos estavam juntas na frente do seu corpo, dentro do seu pequeno terno que ele exigiu usar e seus óculos escuros.

Lembro-me de um enterro de um amigo próximo de Thomas, antes da internação. Thomas estava parado com essa mesma pose, enquanto Nic tentava se mostrar tão sério quanto o pai.

- Mãe! - Ele puxou a barra do meu vestido e eu o olhei. - pode me levantar?  Quero ver o meu pai.

Assenti e sorri fraco, o segurando nos meus braços. Me aproximei um pouco, e Nicholas o olhou atentamente, antes de sorrir:

- Me dê os óculos do papai. - Ele pediu. Heather os tirou da bolsa, dando nas pequenas mãozinha de Nicholas.

Ele os abriu sem jeito e se esticou um pouco, colocando o par de óculos no rosto gelado de Thomas.

- Agora ele está pronto. - Ele sorriu, e se agarrou ao meu pescoço. Ouvi ele fungar um pouco e acariciei suas costas.

- Vamos ficar bem, meu amor. - Eu sussurrei.

- Porquê o papai tem que dormir para sempre? - Ele perguntou para nós duas.

- Querido, existem coisas que não há explicação, nós só temos que aceitar. - Heather explicou. - somos apenas nós três agora, prometo nunca deixar que você se esqueça de Thomas.

- Eu nunca esqueceria o meu pai. - Ele fez uma cara séria.

Meu menino era tão pequeno e ainda assim, tão maduro. Eu me orgulhava do trabalho que havia feito, sabendo que Thomas tinha lutado muito para transformar o nosso menino na pequena pessoa que é hoje.

O enterro passou tão rápido quanto começou, as lágrimas voltaram a molhar meu rosto novamente enquanto a areia era jogada sobre o caixão gelado. Me perguntei o motivo de tudo isso diversas vezes e concluí que o mundo não o merecia.. Thomas era bom demais para esse plano.

Voltando para casa no carro de Henry, Nicholas acabou pegando no sono no banco de trás. Retirei meus saltos, na intenção de pegá-lo no colo e levá-lo para dentro. Mas Henry foi mais rápido, com uma facilidade, retirou Nich do carro e o apoiou no seu ombro, sorri fraco, enquanto caminhávamos para dentro a passos rápidos. Era uma cena adorável.

Girei a chave na fechadura e empurrei a porta para dentro, dando passagem para que ele pudesse entrar.

‐ Vamos levar ele para o quarto. - Falei baixo, subindo as escadas lentamente.

Henry me acompanhou, andamos até a segunda porta do corredor e eu a abri devagar. Estava tensa. Henry passou ao meu lado e posicionou Nich na cama. Liguei o ar condicionado e retirou seu smoking minúsculo e seu tênis. Ele acordaria a qualquer momento e se livraria da blusa e das calças. Eu conhecia meu menino.

Descemos em silêncio, me sentei no sofá e puxei meus cabelos em um rabo de cavalo. Respirei fundo, enquanto relaxava sobre o estofado.

- Como você está se sentindo? - Ele perguntou calmamente.

- Bem, eu acho. - O encarei.

- Podemos conversar sobre Nicholas? - Ele perguntou e eu encarei o lustre por alguns segundos antes de assentir.

- Podemos. - Mordi o canto da boca e desviei os olhos.

- Ele é meu, não é? - Ele perguntou baixo, levei meus olhos até ele e fiquei em silêncio por algum tempo, antes de conseguir falar qualquer coisa.

- Sim. - Eu disse por fim.

Senti como se um peso enorme tivesse saído das minhas costas, quase como se eu tivesse me livrado de todos os meus problemas. Thomas deveria estar orgulhoso.

- Porquê não me contou? Porquê não foi atrás de mim? - Ele estava nervoso.

Henry se levantou e passou as mãos pelos seus cabelos, andando para os dois lados da sala. Parecia que abriria um buraco sobre o tapete a qualquer momento.

- Eu não tive coragem, você estava tão feliz com a Sofia, não queria te atrapalhar. - Falei baixo.

- Você ignorou todas as minhas cartas ou está fingindo que não sabe de nada? - Ele disse um pouco alto.

- Não fale alto comigo, Henry. - Disse no mesmo tom que o seu. - E não, eu não li. Não sabia da existência dessas cartas até ontem de manhã..  eu acabei de perder o meu marido, o único homem que me amou de verdade na droga desse mundo, pare de ser um egoísta mimado, pare de olhar só para o seu umbigo. Eu estou sofrendo, droga!

Henry ficou estático no lugar algumas vezes. Ele passou suas mãos freneticamente sobre o rosto, antes de se sentar ao meu lado e me agarrar em um abraço.

Desabei em seus braços, sentindo todo o meu corpo relaxar enquanto eu liberava a tristeza.

- Eu só queria ter feito para da vida dele. - Ele disse baixo e eu me afastei, olhando para os seus olhos.

- Henry, me desculpa, eu.. - ele me interrompeu.

- Não julgo sua atitude, eu fui um babaca com você, eu fui egoísta e idiota.. pensei somente em mim, e em mais nada. - Ele começou a falar rapidamente. - eu não  vou te odiar, eu não vou brigar com você.. mas, você tem noção de como eu me sinto quando ouço Nicholas falar que Thomas é o pai dele?

- Ele não tem culpa. - Eu sussurrei.

- Ninguém tem, você só queria cuidar do nosso pequeno.. - ele fungou um pouco. Eu nunca tinha visto Henry chorar assim. - Eu te entendo, Bruna. - Ele sorriu fraco.

A porta foi aberta repentinamente,  Heather entrou com uma mochila e sorriu quando nos viu:

- Último desejo do Thomas? - Heather sorriu fraco e jogou sua bolsa na poltrona.

- Último desejo. - Eu completei.

- Vai ficar, Henry? - Ela perguntou, levantando uma sobrancelhas.

- Não, eu preciso ir. - Ele se levantou, secando as mãos na calça. - Cuide bem dele, amanhã eu volto para vê-lo. 

Apenas assenti, o acompanhando até a porta. Já era noite, a lua estava alta no céu. Entrei e tranquei a porta.

Heather estava jogada sobre o sofá, jogando um jogo qualquer e entretida demais. Alguns segundos depois, Heather jogou seu celular para o lado, antes de tirar um bolo de cartas velhas, com folhas amareladas de dentro da mochila.

- Eu sai do hospital antes de você chegar para buscar isso, Thomas pediu esse favor.. - Ela segurou o choro. - Era um dos seus últimos favores.

- Obrigada. - Disse com um sussurro. - Acho que vou dormir.

Heather assentiu, me aproximei e dei um beijo casto na sua cabeça, antes de subir e ir para o banheiro. Tomei um banho rápido, e sai com o meu roupão do cômodo. 

Olhei para as cartas sobre a penteadeira e decidi pegá-las sobre a mão. Se minha contas estivessem certas existiam setecentas e trinta cartas embrulhadas.

Peguei a última, imaginando que tipo de despedida existia ali. Rasguei o envelope, era fino. Apenas uma folha.

"Bruna,

Hoje, desisto oficialmente de uma resposta sua. Após 730 cartas, 730 dias, 17,520 horas e alguns longos minutos, eu finalmente, decidi deixar que você fosse livre.

Eu sei que você está com Thomas agora, não tenho muitas notícias de você..  As pessoas comentam sobre o quão forte e decidida você é. Eu soube do seu trabalho impecável na empresa, inclusive, que negou um convite de jantar de negócios.. eu estaria lá, mas disso, você já sabia, não é?

Eu só queria te lembrar uma última vez o quanto eu te amo e como você é tudo para mim. Eu não sei como eu te perdi, mas eu daria tudo para te ter de volta. A saudade está me matando.

Eu te amo, Bruna V. Coleman, mesmo que você esteja nos braços de outro. Seja feliz, meu amor, por nós dois.

Para sempre seu,

Henry C."

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