Redenção do Guerreiro
Redenção do Guerreiro
Por: Lilith Deveraux
Prólogo

A noite caía pesada sobre o vilarejo, as sombras dançando nas paredes de madeira da pequena casa onde Helena se escondia. O vento uivava através das frestas da pequena casa de pedra, carregando consigo o cheiro de chuva e medo. Helena, encolhida atrás de um baú de madeira, pressionava as mãos pequenas contra os ouvidos, tentando abafar as vozes que ecoavam pela casa. Mas era impossível não ouvir.

— Não podemos continuar assim, Wilhelm! — A voz da mãe soava cortante, desesperada. — Essa marca... Essa maldição... Ela vai trazer desgraça para todos nós!

— Ela é só uma criança — retrucou o pai, mas a hesitação em sua voz era evidente. — Não sabemos se... se é mesmo o que dizem.

— Abra os olhos! — A mãe interrompeu, a voz embargada pelo medo. — Todos sabem o que aquela marca significa. O padre Mathias viu! Ele mesmo disse que é obra do demônio. Como podemos manter isso sob nosso teto?

Helena apertou ainda mais as mãos contra os ouvidos, como se pudesse afastar aquelas palavras. Os olhos ardiam, mas as lágrimas não caiam. Mesmo tão jovem, ela entendia que falavam dela. Sabia que aquela marca, a serpente de pele pálida que se estendia por seu braço, era a razão pela qual as crianças do vilarejo se afastavam. Sabia que era a razão para os olhares de desprezo, para os cochichos sufocados quando passava.

O ranger da porta fez seu coração saltar no peito. A luz da vela tremulava na fresta, projetando sombras alongadas no chão de madeira. Os passos se aproximaram lentamente, até a figura da mãe surgir no vão da porta. Os olhos que a encaravam não eram os de uma mãe — eram olhos de medo e desespero.

— Helena... — sussurrou. — Saia daqui. Agora.

A menina não se moveu. Seu lábio inferior tremia, mas ela não ousava chorar. Não ousava implorar.

A mãe se abaixou, segurando o braço marcado da filha com dedos firmes demais para um gesto de carinho.

— Não me obrigue a fazer isso. Apenas vá... E não volte.

— Ela é nossa filha! — O pai tentou, mas sua voz soava fraca, como se a dúvida o consumisse pouco a pouco. — Não passa de uma criança...

— Uma criança amaldiçoada — interrompeu a mãe, fria. — O padre Mathias tem razão. Se ela ficar, trará desgraça para todos nós.

Helena apertou os joelhos contra o peito, segurando o choro. Lá fora, os trovões rugiam, sacudindo as paredes frágeis da casa. Cada palavra que escutava era uma faca cravada em sua alma. Ela queria gritar, dizer que não era bruxa, que nunca faria mal a ninguém. Mas a voz morreu em sua garganta.

Os passos pesados do pai se afastaram, deixando o silêncio pesaroso para trás. A mãe ficou imóvel por um tempo que pareceu infinito, até que o som de soluços abafados preencheu a casa. Mas não havia carinho naquelas lágrimas. Apenas o lamento de uma mulher que renunciou à própria filha.

Então, a mãe se virou abruptamente, avançando até o baú. Helena se encolheu ainda mais, mas os dedos frios a agarraram pelo braço e a puxaram para fora de seu esconderijo.

— Vá, Helena — a voz da mãe saiu firme, mas vacilava na borda do desespero. — Pegue suas coisas e desapareça.

Helena sacudiu a cabeça, o terror em seus olhos de criança. — Mãe... por favor... — sua voz era um sussurro implorante.

— Agora! — o grito cortou o ar, e antes que pudesse reagir, seu pai, com o rosto tomado pelo sofrimento, a ergueu do chão e a carregou até a porta.

A tempestade rugia lá fora. A menina se debateu, agarrou-se ao tecido da camisa do pai, mas foi em vão. Com um último movimento, ele a lançou para fora, e a porta se fechou com um estrondo.

Helena foi deixada na escuridão, com apenas a chuva como companhia. Caminhou sem rumo, soluçando, até que o vilarejo ficou para trás e apenas a floresta sussurrava ao seu redor. Quando encontrou a cabana, meio engolida pelo musgo e pelo tempo, sentiu que não havia sido acolhida... apenas tolerada pela solidão que morava ali.

A partir daquela noite, o mundo não era mais seu lar. E ninguém voltaria a pronunciar seu nome com amor.

A cabana era um reflexo de abandono e esquecimento. O teto de palha estava cheio de buracos, por onde a chuva escorria em filetes gelados, pingando no chão de terra batida. As paredes de madeira estavam apodrecidas, tomadas por musgo e teias de aranha que se estendiam como dedos finos e pegajosos. O cheiro era insuportável—uma mistura de mofo, terra molhada e algo podre que talvez fosse um pequeno animal morto em algum canto escuro.

A pequena Helena tremia, não apenas de frio, mas de medo. Cada estalo das tábuas velhas parecia um monstro escondido na escuridão. O vento fazia as folhas secas se arrastarem pelo chão, como sussurros de vozes invisíveis. Ela se encolheu em um canto, abraçando os próprios joelhos, desejando desaparecer, desejando que tudo não passasse de um pesadelo.

Mas o pesadelo era real.

E agora, ninguém viria salvá-la.

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