O Sr. Molina quase deu um pulo ao ouvir aquela revelação. Arregalou os olhos, seu coração se alterou e ele suspirou. O pecado da cobiça se alastrou profundamente em sua alma.
Ele lembrou que poucas semanas antes o engenheiro havia pedido a mão da sua filha Felícia em casamento e ele negara incondicionalmente. Naquela altura, o Sr. Molina não escutava mais a prosa do amigo. A sua mente não saia da burrice que ele tinha feito. O Barão continuou a revelar o seu segredo sem perceber a aflição do amigo tratante: “No passado, a mãe dele trabalhou em minha fazenda. Ela era novinha, tivemos um caso e eu a engravidei. No final, a expulsei da fazenda quando descobri que estava buchuda.” O Sr. Molina já estava agoniado para ir embora. “Depois que vi o meu filho bem criado e transformado num homem robusto, inteligente e bem instruído, me arrependi do erro que cometi no passado e senti vergonha de procurá-lo. Damião já registrou tudo, o engenheiro ficará com setenta por cento dos meus bens. Amanhã ele levará para registrar no cartório.” O Sr. Molina adiantou a sua partida, despediu-se do Barão, montou em seu alazão e se foi apressado preparar o terreno para casar de imediato a sua filha caçula, Felícia, com o engenheiro Raul Trajano, herdeiro do império do amigo. No caminho, ele planejava ansioso os benefícios que iria receber com a união da filha com o engenheiro. O fazendeiro Molina possuía dívidas acumuladas com o Barão. Eles eram amigos e o Barão era generoso, emprestava dinheiro para o amigo pagar no final do ano com a safra de milho, sem juros. Ele devia muito dinheiro ao Barão Gregório. O velho fazendeiro chegou em casa ansioso e estressado com a descoberta. Intimamente, arquitetou um plano para casar a sua filha com o engenheiro de imediato. A princípio, não revelou a sua descoberta para ninguém, nem mesmo para a família, com medo que alguém estragasse seus planos. No raiar do outro dia, ele pegou sua caminhonete e foi para Santa Rita procurar o engenheiro. Chegou na venda da praça e ficou por ali espiando, ansioso em encontrar o futuro genro. Não demorou muito para ele ver o engenheiro passando pela praça dirigindo a sua caminhonete ao voltar de um trabalho numa fazenda do povoado vizinho. O velho levantou-se e caminhou ligeiro, acenando com o chapéu para o que o engenheiro parasse. “Bom dia, Sr. Molina, a que lhe devo a honra? Meu serviço deu certo no combate às pragas das suas lavouras?” O engenheiro falava já descendo da caminhonete, sem ao menos imaginar o que lhe esperava. “Bom dia, engenheiro! Hoje não vim tratar de trabalho, tenho outro assunto para conversar com o senhor.” O engenheiro escutava curioso. “Eu estava ali na venda, você pode acompanhar-me?” “Mas é claro, fazendeiro.” Os dois acomodaram-se numa mesinha no canto do boteco. “Deseja uma dose de pinga?” “Aceito, por favor.” Ansioso, o engenheiro apressou-se em perguntar: “Então, Sr. Molina, o que o senhor tem de tão importante para conversar comigo?” “Jovem engenheiro, sem rodeios, vou direto ao ponto... sei que o senhor é um homem esforçado e de princípios. Há algumas semanas, manifestou o seu desejo de se casar com a minha filha. Também sei que o senhor tem sentimentos por ela, mas lhe neguei a sua mão.” O velho fazendeiro falava quase murmurando, alongando as palavras em um suspense tenebroso e se esforçando para esconder o nervosismo, com medo do engenheiro negar se casar com a sua filha. “Mas... me arrependi e andei pensando... decidi permitir que o senhor se case com a minha menina Felícia, ela tem dezoito anos e já está em boa idade para casar.” O engenheiro tomou um susto, abismado quando escutou aquelas palavras. Era como se tivesse ganhado na loteria. “Agora eu lhe pergunto se o senhor ainda tem interesse em casar com a minha Felícia.” Ele reagiu surpreso e chocado, com a voz embargada e uma expressão satisfeita: “Minha nossa senhora! Sr. Molina, estou tão desconcertado com essa conversa, mas antes queria entender o que aconteceu. Por que essa mudança tão repentina de opinião?” “Moço... já falei, você é um homem inteligente e responsável, vai longe na sua carreira profissional. Tem uma ocupação relevante e promissora. Agora me fale, ainda tem interesse em se casar com a minha filha?” “Mas é claro que eu tenho, fazendeiro. Felícia é uma menina de ouro, sorte a minha em tê-la como esposa.” “Só peço que o senhor prometa cuidar da minha filha, fazê-la feliz e me dar muitos netos. Porque o outro filho que eu tenho em casa, até agora, depois de dois anos casado, não me deu nenhum.” “Pode deixar fazendeiro, eu prometo. Vou me esforçar mais ainda no meu trabalho para oferecer o melhor à sua filha.” “Então vamos começar os preparativos para o casório, quero que seja o mais rápido possível e que seja algo simples. Também quero que o senhor compareça para jantar na minha fazenda no final de semana e acertamos os preparativos.” “Perfeito, estarei por lá, sábado à noite.” Os dois finalizaram a conversa e se despediram. O Sr. Molina entrou na sua caminhonete e retornou para casa, já o engenheiro permaneceu ali, quase em estado de choque, perguntando-se se aquilo era verdade. Eventualmente, ele também pegou a sua caminhonete e partiu para a casa, todo bobo em contar a notícia para a mãe e as irmãs.Dona Quitéria percebeu de longe o entusiasmo do filho ao adentrar em casa. “O que aconteceu? Que alegria é essa, meu filho?” Ele tirou as botas antes de entrar e abraçou a mãe como de costume. “Eu consegui, mãe! Vou casar com a filha do fazendeiro Molina.” “Minha Santa Rita! E ela aceitou?” “O pai dela me procurou e marcou um jantar para sábado à noite. Vou conversar com a família e pedir a mão dela formalmente.” “Tomara que ela aceite, filho.” Catarina manifestou-se insatisfeita: “Raul, como você vai casar com essa mulher que te rejeitou o tempo todo?” “Ela mudou de ideia, agora ela quer casar, irmã.” “E Yelena, minha amiga? Você prometeu que queria conhecê-la, até já liguei e marquei com ela.” “Então a dispense, o meu coração agora tem dona! O nome dela é Felícia Molina”, ele respondeu sorridente, ignorando os planos da irmã. Depois da conversa com a família, fez questão de procurar o seu amigo Vicente para compartilhar seu triunfo. “Eu não te fa
Sr. Molina desceu e recebeu o genro cheio de cerimônia. “Boa noite, meu futuro genro!” “Boa noite, Sr. Molina!” “Venha, sente-se, vamos tomar um vinho antes de jantar." Depois da conversa, o velho fazendeiro gritou de longe: “Salete, o jantar já tá pronto?” Dona Salete chegou perto, cumprimentou o engenheiro e respondeu: “Está sim, vamos para a mesa.” Durante a refeição, o velho fazendeiro e o engenheiro Trajano conversavam a todo o tempo sobre as lavouras, as inovações no mercado agrícola e o trabalho de Raul. Raul tinha um olho no sogro e o outro na futura esposa, se esforçava para se concentrar na prosa do sogro, observava Felícia quieta. Senhor Molina por fim, entrou na parte do casamento: “Então, vamos fazer o seguinte: o casório será realizado aqui na capela da fazenda em três semanas. Felícia já vai ter terminado a escola, é o tempo de nos prepararmos para a celebração.” “Por mim tudo bem, Sr. Molina”, Raul concordou de imediato. No final da refei
Os dois saíram de carro e Felícia permaneceu a noite e o dia escondida no quarto de Sarah. Ela fugiu e se escondeu na casa dos amigos, esperando o trem para capital. O trem só saía uma vez na semana, no domingo de manhã, dia de seu casamento. Os primeiros raios de sol começou a surgir. Dona Salete se levantou cedo, pois era sábado, dia dos preparativos para festa de casamento da filha. “Felícia, filha, acorde! A gente precisa adiantar a arrumação para o seu casório amanhã.” Ela entrou no quarto e viu a cama da filha arrumada. Dona Salete procurou a filha por toda a casa, porém não a encontrou. Movida pelo desespero, não viu outra alternativa a não ser falar com o marido: “Dante, Dante, a nossa filha sumiu! Felícia não está aqui.” O Sr. Molina se levantou nervoso da mesa do café da manhã. “Tem certeza, mulher? Já procurou por toda a casa?” “Já sim, velho, ela sumiu!” O Sr. Molina pediu que os empregados procurassem nas redondezas. Em seguida, pegou sua caminhonete e, junto de
O engenheiro morava em Santa Rita com a mãe e a irmã mais nova num sobrado modesto e aconchegante de três quartos com um quintal extenso. A irmã mais velha, Catarina, vivia na capital estudando enfermagem. Já em casa, a sogra Dona Quitéria apresentava a moradia para a nora: “... E esse será seu quarto e do seu marido. Lá na frente é o banheiro. Amanhã, lhe apresento o quintal.” “Obrigada, Dona Quitéria, agora vou tomar um banho, estou muito cansada.” Na simplicidade do seu novo lar, Felícia olhava tudo com desgosto, lembrando do luxo da sua vida na fazenda. Já no quarto, ela não estava com nenhuma disposição de ter a sua primeira noite numa cama velha e num colchão duro. Enquanto mexia na sua mala, Raul entrou no quarto. “Você pode usar essa parte do armário e o que precisar pode me solicitar, farei de tudo para que se sinta feliz aqui.” Ela só respondeu “Obrigada”, bem baixinho. “Agora você pode sair, pois vou me trocar.” “Não precisa ter vergonha, agora somos casados, vamo
“Agora preciso trabalhar, volto meio-dia para o almoço. Espero que fique bem.” “Vou ficar sim, bom trabalho!”, ela falou com afago, esboçando um sorriso discreto, porém carregado de docilidade e gentileza. Raul prestou serviço numa fazenda durante a manhã e voltou para casa para almoçar e matar a saudade da esposa. Quando passava pelo centro da cidade com sua caminhonete, foi abordado por seu amigo Vicente. “Bom dia, camarada, você está com tempo? Preciso falar com você, tenho algo importante para conversar. A gente pode ir ali no boteco do seu Zé?” “Só vou porque fiquei curioso, seja breve. Não vejo a hora de chegar em casa para cheirar o meu brotinho.” “Vamos, então.” Eles pediram uma bebida. Depois disso, Vicente muito inquieto começou a relatar os boatos que vinha ouvindo na cidade. “Meu amigo, quero falar com você sobre uma história que escutei de uma pessoa aqui na cidade.” “Do que se trata?” “Dizem que a sua esposa fugiu com outro homem na véspera do seu casa
“Raul, por favor, já falei que Otávio é meu amigo. Imagina a vergonha que vai ficar para a minha família.” “Vergonha?! Agora imagina eu e a minha família quando a cidade toda souber o que aconteceu, onde ficará a minha honra?” Nessa ocasião, Felícia já não sustentava mais o choro. “Eu não te toquei, posso anular o nosso casamento. Você segue a sua vida, assim como planejou. Agora, faça as suas malas, te espero lá na sala.” “Eu não vou, não posso voltar.” “Infelizmente acabou, Felícia!” Felícia desmoronou, pensando na vergonha que ela e a sua família iriam se submeter. As pessoas iriam julgá-la por estar desonrada e seu pai não iria aceitá-la de volta. “Otávio nunca me tocou, ele é meu amigo. Eu ainda sou pura!” Evidentemente, aquela afirmação o impactou de forma abrupta e inesperada. Ele mirou a mulher, atordoado com a declaração. “Você não está mentindo para mim, não é mesmo?” “Não, não estou mentindo. Eu ainda sou pura.” “Escuta aqui, Felícia, vou acreditar no que está diz
“Como está a minha filha? Ela está bem?” “Está sim. Vim falar sobre ela. Não sei se o senhor está ciente sobre o boato que me deixou muito enfurecido envolvendo a minha esposa.” “Mas que boato?” “Andam dizendo por aí que Felícia fugiu com outro homem na véspera do nosso casamento e eu quero que o senhor me esclareça essa história, pois estou preocupado com a minha reputação.” O Sr. Molina ficou atordoado com a descoberta do genro, ele respondeu com um nó na garganta: “Meu genro, isso é apenas boato. Realmente, Felícia não queria casar com você e resolveu se esconder na casa de uma amiga, foi só isso que aconteceu.” “Mas não foi dessa forma que o boato se espalhou, fazendeiro. Dizem que o filho do padeiro a pegou aqui e levou para casa dele. Ela fugiu com ele, é essa a história que eu soube em Santa Rita.” “São só fofocas de gente maldosa, filho. Eu te entreguei a minha filha por ela ser uma moça decente, ela jamais teria um caso com um filho de padeiro.” “Sr. Mo
Felícia, ao ver o marido naquelas condições, o levou para o banheiro e o ajudou a tomar um banho, repreendendo-o com um sermão: “Nunca mais faça isso, não vou aturar esse comportamento. Você é um homem casado e tem que se comportar de acordo. As pessoas vão falar e vão comentar. Isso é feio!” Ele retrucou, ressentido e com a voz embargada pelo efeito do álcool: “Feio foi o que você fez... nosso casamento já está na lama. A sua família e a minha são uma vergonha.” “Raul, se você quer vingança, você não terá. Não vou tolerar humilhações, da próxima vez juro que te deixo e vou embora. Não quero continuar com você agindo dessa forma.” “Você não está presa a mim, mulher! Quando desejar, pode partir.” Felícia o deixou e deitou na cama, emburrada e tristonha. Raul terminou seu banho e também caiu na cama. No outro dia, ele não lembrava de nada. Acordou com uma tremenda ressaca e com raiva de si mesmo por ter sido tão depravado. Felícia seguia o seu dia na rotina de sempre, a