Alguns dias depoisDaniela olhou-se no espelho que ficava na parede do quarto. Via-se com nitidez, mas era como se não estivesse ali. O reflexo que o vidro lhe devolveu era de outra pessoa, uma estranha. Sua expressão naquele momento era impassível, calma, serena, de uma normalidade assustadora. Só a palidez e as olheiras fundas traíam as noites de insônia, as horas atormentadas na escuridão da noite, olhando para o nada, deitada na cama fria na qual passara a dormir sozinha. Ainda estava tomando medicamentos para dormir, mas em menor dose e já conseguia se alimentar. As coisas pareciam normais; todos na casa tentavam se comportar de maneira normal, mas nada mais era normal, principalmente ela.Uma rotina básica foi retomada, mas desde o dia em que tudo aconteceu, cada minuto vivido estava sendo angustiante. O mundo ao redor ficou cinza, nada tinha graça, só um detalhe lhe trazia esperança: o filho que crescia no seu ventre. Era por ele que ela se esforçava para melhorar, comer, andar,
Quatro anos depoisEra domingo. Daniela estava chegando em casa depois de ter passado a manhã com o filho na praia. Enzo estava com quase três anos e cada dia se parecia mais com o pai. Tinha cabelos negros brilhantes e olhos escuros e profundos.Ela havia fugido para o Brasil logo após a morte de Antonino e desde então não quis mais saber da Itália. Sim, havia fugido de Franco, porque não confiava nele, tinha medo dele.Jogou o chapéu e a sacola sobre o sofá e gritou:— Carmem, estou sentindo cheiro de comida gostosa.Daniela comprou uma casa à beira-mar e convidou Carmem para morar com ela depois que Carlos e Angélica se casaram.Abriu mão da herança de Antonino deixando tudo para Enzo quando completasse a maioridade. Usou a herança da avó e abriu uma Drogaria e Loja de Cosméticos na Avenida Paralela, uma das mais movimentadas da capital baiana.Mas não foi fácil chegar até ali e recuperar o equilíbrio emocional e psicológico. Teve que lutar muito, se esforçar além dos seus limites p
PARTE 2SalvadorNaquela noite, diante da janela do quarto olhando para fora, para o nada, Daniela repensava sua vida enquanto o colar de diamantes e a passagem para o Quênia jaziam sobre sua cama como um fantasma que voltou para assombrá-la. Sabia que aquilo não poderia ser coisa de Antonino; ele estava morto. Naquele momento, Daniela foi transportada no tempo; seus pensamentos retrocederam para quatro anos antes.No instante em que o médico disse que Antonino havia morrido de uma parada respiratória como consequência do atropelamento na faixa de pedestres, ela começou a sentir as dores do parto e naquele dia Enzo nasceu. Que coisa estranha! O garoto nasceu no mesmo dia em que o pai dele morreu. No dia do sepultamento, um dia após o nascimento de Enzo, ainda incomodada pelos pontos, Daniela saiu escondida do hospital com o filho recém-nascido nos braços, ligou para Alex e com a ajuda dele conseguiu chegar a tempo no cemitério. Deixou o bebê no carro com o amigo e caminhou pelo piso
Rio de JaneiroAntonino Goldacci serviu-se de uma bebida no quarto de hotel, sentou na beirada da cama e aguardou. Não demorou muito e a mulher loura entrou e tirou o sobretudo exibindo a roupa que usava por baixo; estava vestida de enfermeira: usava uma touca branca na cabeça, um minúsculo vestido branco e um par de sapatos de saltos finos da mesma cor.Ela aproximou-se dele, ajoelhou e desceu o zíper da sua calça. Em seguida segurou seu pênis e o enfiou na boca quente e úmida, antes de começar a chupá-lo vorazmente.Ele segurou na sua cabeça com bastante força, fechou os olhos e aproveitou aquele momento. O prazer que ela lhe proporcionava era intenso, mas ele decidiu que queria mais, então a levantou, virou e a jogou na cama. Ela caiu de quatro, mostrando que não estava usando nada por baixo do vestido minúsculo. Ele colocou o preservativo e entrou nela. A mulher se remexia cada vez mais rápido, fazendo bem o seu papel. Depois de um tempo entrando e saindo dela, sentiu que o êxtas
O mês passou voando e a vida de Daniela parecia que tinha voltado ao normal. Acordava cedo, levava Enzo para a escola e ia trabalhar na Drogaria. Estava animada aquele dia e resolveu fazer uma visita inesperada. Parou na frente da academia onde Rafael trabalhava e entrou. Falou com a recepcionista e subiu um lance de escadas. A academia estava lotada, as salas ocupadas. Daniela parou na frente de uma sala envidraçada e ficou assistindo a uma aula de zumba cuja música ritmada ecoava pelo ambiente num ritmo gostoso e frenético. Lembrou-se do passado, quando fazia aulas de dança antes de a sua vida virar um caos com a doença da mãe.Subia mais um lance de escadas quando encontrou Rafael conversando com uma mulata que usava uma legging e um top curto, exibindo um corpo escultural maravilhoso. Ele a viu, se despediu da moça e veio cumprimentá-la.— Dani? Que surpresa! Beijaram-se.— Quem era a moça? — Daniela perguntou, curiosa.— Priscila, uma aluna da academia. Por quê? Está com ciúme
A música ao vivo era MPB. O som de voz e violão se espalhava pelo ambiente sensibilizando até os ouvidos mais insensíveis. Daniela e Valentina sentadas no bar numa orla bem movimentada, balançavam o corpo para cá e para lá enquanto bebiam cerveja.— Está vendo aquele cara gostoso ali de camisa amarela olhando para cá? Vou transar com ele ainda hoje — Valentina falou mordendo o lábio inferior.— Você é louca!Daniela não se surpreendia com as loucuras de Valentina; com ela cada minuto valia por um dia inteiro de emoção.— Tina, sair com você é uma verdadeira aventura. Não consigo esquecer daquela vez quando pegamos escondido a moto de Klaus Stein, depois a deixamos estacionada bem longe de nós enquanto tomávamos sorvete e ela foi roubada.— Nem me lembre disso. Foi a primeira vez que senti que a minha avó queria me dar uma surra. Daniela respirou profundamente lembrando de quando chegou na Itália sem conhecer nada, totalmente perdida, e foi acolhida pela avó de Valentina.— Dona Marin
Giorgio parou o carro ao longo do meio-fio e Antonino desceu na frente da escola, caminhando a passos largos. Se identificou na portaria e seguiu por um enorme pátio coberto. Na recepção, a moça loura, magra e baixinha o olhou de cima a baixo e deu um enorme sorriso antes de conduzi-lo até a sala da diretora.A sala estava vazia e ele sentou numa cadeira próxima à uma grande mesa. Ficou observando as imagens educativas na parede e as fotos dos grandes educadores que revolucionaram o ensino.De repente a porta foi aberta e uma mulher de meia-idade, sorridente, se aproximou. Antonino levantou e segurou a mão que ela lhe estendia.— Bom dia, sou Cristina, diretora da escola.— Toni Vannicola. — Quando não queria ser identificado, Antonino sempre usava o sobrenome da sua mãe.— Em que posso ajudá-lo, senhor?— Eu e minha esposa acabamos de nos mudar e estamos visitando algumas escolas para o nosso filho de quatro anos. — Sente-se, por favor. Tenho certeza de que depois que o senhor conh
Daniela chegou às seis da manhã na clínica, empurrando a cadeira de rodas de Rafael e se dirigiu para o salão da fisioterapia. O local estava cheio, ela posicionou a cadeira de rodas próxima a um banco e se sentou. Observando as expressões faciais de Rafael entendeu que ele estava sentindo dor.— Rafa, você tomou os medicamentos hoje?— Tomei, por quê?— Está sentindo dores?—Não, estou me sentindo eufórico, louco para correr na avenida — respondeu acidamente.Daniela fingiu não entender o ataque e prosseguiu:— Quer alguma coisa?— Quero que me deixe em paz! Está se comportando como se fosse a minha mãe.— Será que dá pra parar de me agredir e conversar como uma pessoa normal?Rafael deu uma gargalhada alta e disse com fúria:— Já deixei de ser normal há muito tempo. Agora eu sou essa aberração.— Não fale assim, Rafa. Isso não é verdade.— Então, você está comigo pelos meus movimentos graciosos, não é? Que piada! E fique sabendo de uma coisa: não preciso de você como babá.— Rafa,