Capítulo 1
Eliza Campos
A luz suave da manhã me acordou, com um raio de sol que invadiu o quarto. Em vez de trazer paz, aquele dia parecia diferente, como se algo estivesse fora de lugar. Eu me virei na cama, sentindo uma pontada incomoda de ansiedade.
Lá fora, a cidade começava a se mexer sob um céu azul e limpo, mas dentro de mim, uma tempestade se formava. Ainda de pijama, fui para a cozinha, guiada pelo cheirinho bom do café que, estranhamente, não trazia o conforto de costume. Sentei à mesa com uma xícara fumegante e um livro da biblioteca. As palavras que normalmente me transportavam para outro mundo pareciam embaçadas, eu sentia que algo grande estava prestes a acontecer.
Estava tão imersa na leitura que só percebi o celular vibrando na mesa quando ele tocou. Era o Matheus.
— Oi, Lizz! — A voz dele parecia animada, como se tivesse acabado de fazer algo inesperado.
— Oi, Math! — Sorri, surpresa com a ligação. — Não é meio cedo pra você estar acordado?
Ele riu, mas o riso não soou leve como de costume.
— Pois é... acho que o sol resolveu me expulsar da cama hoje. — O silêncio que se seguiu foi desconfortável. Eu queria perguntar o que o incomodava, mas não tive coragem. — Sabe, acordei pensando... sobre aquele café na padoca. Quer dar uma passada lá hoje?
O convite me pegou de surpresa, mas eu adorava aqueles momentos com ele.
— Ah, com certeza! — respondi, tentando esconder a tensão que sentia. — Tô precisando mesmo sair um pouco.
Depois de desligar, fiquei sorrindo, refletindo sobre como a nossa amizade só ficou mais forte depois de tudo que passamos.
Enquanto me arrumava, me vi no espelho. Os meus cabelos ruivos caiam suavemente sobre os ombros, e meus olhos verdes brilhavam com uma mistura de ansiedade e empolgação. Pensei em Matheus e em como ele sempre acreditou em mim, mesmo quando eu duvidava de mim mesma.
Minha vida mudou completamente depois da fase difícil, mas, com Matheus ao meu lado, me sentia forte o suficiente para enfrentar qualquer coisa. Peguei minha bolsa e saí de casa. O sol brilhava forte, iluminando as ruas de São Paulo com uma luz dourada. Caminhei pelas ruas familiares, sentindo a brisa suave no rosto.
A padaria estava ali, na esquina. O cheiro de pão fresco e café me envolveu, mas algo chamou minha atenção: um homem de costas, usando um chapéu de feltro, observava a vitrine com uma intensidade que me deixou curiosa.
E lá estava Susana, uma amiga da escola, atrás do balcão. Seu sorriso radiante era tão acolhedor quanto os aromas deliciosos que enchiam o ar, e seus olhos castanhos brilhavam com alegria.
— Oi, Susana! — cumprimentei. — Tem alguma mesa livre?
— Lizz! — Ela abriu um sorriso radiante. — Claro, vou te arranjar uma mesa, vem comigo.
Ela me guiou até um canto aconchegante, e logo o garçom apareceu, simpático como sempre.
— Oi, bom dia! O que vai querer?
— Um café gelado, por favor. — Sorri de volta, me sentindo em casa.
Logo depois, ele voltou com meu pedido e colocou na mesa com um sorriso antes de se afastar. Tomei um gole do café gelado, apreciando seu sabor rico e amargo. A música ambiente preenchia o local com uma melodia suave, enquanto risos e conversas animadas criavam um cenário acolhedor.
Matheus chegou logo depois, os cabelos rosados brilhando sob a luz. Sua presença sempre carregava uma energia boa, como se ele fosse uma brisa leve em um dia quente.
— Demorei? — Ele perguntou, sem fôlego, mas com aquele sorriso fácil.
— Nem um pouco. — Ri. — Acabei de chegar também.
Ele pediu um café expresso e começamos uma conversa descontraída.
— Eliza, preciso te contar uma coisa... — Ele pegou minhas mãos, mas dessa vez o toque não trouxe conforto. — Uma amiga minha da Editora Monteiro disse que estão precisando de uma secretária. Eu pensei em você na hora.
Minha respiração travou. O nome daquela editora trouxe uma onda de memórias indesejadas. Minha mãe sempre me proibiu de sequer considerar trabalhar lá. Não sabia exatamente o motivo, mas algo obscuro a cercava, algo que minha mãe nunca explicou totalmente.
— Não acredito! — murmurei, dividida entre o sonho e o medo. — Sempre sonhei em trabalhar lá!
— Eu sei! — Ele riu, satisfeito. — Já até passei seu número pra ela. Ela vai te ligar amanhã pra combinar uma entrevista.
Fiquei emocionada com a chance. Trabalhar em uma editora era um sonho antigo, e agora parecia estar ao meu alcance. Matheus sempre soube como me ajudar, mas o que eu mais admirava era sua capacidade de me incentivar sem me empurrar. Ele sempre me deixava tomar minhas próprias decisões.
Eu mal conseguia segurar a empolgação, mas uma preocupação me rondava.
— Matheus... minha mãe sempre teve algum problema com essa editora. — A frase saiu hesitante, e vi um lampejo de tensão nos olhos dele.
Matheus franziu a testa por um momento, mas logo suavizou o olhar, como se já tivesse uma resposta pronta.
— Vai no seu tempo, Lizz. Resolva o que tiver que resolver, mas não deixe isso te parar. Vai lá e arrasa na entrevista primeiro.
Assenti, sentindo um pouco de nervosismo passando. Matheus era assim, sempre me dando espaço para respirar, mas sem deixar de me dar aquele empurrãozinho que eu precisava.
— Você tem razão. — sorri, apertando as mãos dele em agradecimento. — Primeiro, a entrevista. O resto, eu vejo depois.
— Exatamente. — Ele disse, me dando aquele sorriso confiante. — E eu tô aqui, viu? Sempre.
Continuamos a aproveitar o nosso café, curtindo o momento e compartilhando os nossos planos e sonhos. Sentia uma mistura de gratidão, alegria e determinação, sabendo que tinha encontrado alguém especial disposto a me apoiar em todas as adversidades.
Capítulo 02Eliza CamposEu estava prestes a sair da lanchonete quando percebi que algo estava errado. Matheus sempre me protegeu na escola, mas agora o silêncio e o olhar desviado me deixavam inquieta. Apertei meus dedos, um tic nervoso que eu costumava ter quando criança. Era como se estivesse voltando ao passado. Aquele passado em que eu o amava e ele me amava, mas a droga me levou para longe de tudo.— Você tá bem, Math? — perguntei, tentando entender o que estava passando pela cabeça dele.Ele desviou o olhar e cruzou os braços, os dedos apertados a ponto de deixar as veias salientes. O Matheus que eu conhecia, que eu amava, parecia distante.— Lizz... — ele murmurou. — Preciso te contar uma coisa, mas talvez não seja o momento certo.Tentei puxar assunto, mas ele se levantou, claramente desconfortável, fazendo a cadeira ranger. Pagou a conta e saiu sem olhar pra trás. Fiquei lá, confusa, tentando entender o que havia acontecido. O silêncio da lanchonete parecia gritar, e cada bar
Capítulo 03 Eliza CamposO despertador tocava sem parar, me tirando do sono. Resmunguei, me sentando na cama, ainda grogue. A discussão com a minha mãe martelava na cabeça, mas decidi deixar para lá por enquanto. Fui para a cozinha esquentar o café de ontem.O cheiro familiar do café me envolveu, e eu fechei os olhos por um instante. O apito do micro-ondas me puxou de volta à realidade. Peguei a xícara e me sentei à mesa, tomando goles do café morno. O silêncio do apartamento era uma paz temporária. Sabia que não ia durar muito.E não durou. O telefone tocou, me tirando dos meus pensamentos.— Alô? — atendi, tentando parecer calma.— Oi, Eliza! Aqui é a Carla, da Monteiro. Seu currículo chamou nossa atenção! Podemos marcar uma entrevista amanhã, às 10h?Meu coração disparou.— Sério? Sim, tô livre!— Ótimo! A gente quer conhecer suas experiências e como você pode se encaixar aqui. Ah, e traz seu portfólio, tá?— Pode deixar! Obrigada pela oportunidade!— De nada, Eliza. Estamos ansios
Capítulo 04Eliza CamposMeu coração batia acelerado, como se estivesse prestes a saltar do peito, e a inquietação me consumia, dificultando minha respiração.Tentei relaxar sob o chuveiro quente, mas a sensação de nervosismo persistia. O vapor envolvia meu corpo, criando um ambiente de calor e conforto, mas minha mente continuava agitada. Passei mais tempo debaixo do chuveiro do que o normal, como se pudesse lavar a ansiedade, mas ela não saía.Saí do banho e me enrolei na toalha, procurando algo no meu armário que me fizesse sentir confiante. Encontrei o vestido azul — meu favorito. Elegante e confortável, ele sempre me transmitiu segurança. Me arrumei com cuidado, tentando afastar os pensamentos perturbadores.Enquanto ajustava o cabelo no espelho, o celular tocou, interrompendo meus devaneios.— Oi, Matheus? — falei, enquanto calçava os sapatos, tentando soar mais animada do que realmente estava.— E aí, Lizz? Já tá pronta? Tô aqui fora te esperando. — A voz dele era tranquila, mas
Capítulo 05Pedro MonteiroO despertador tocou, me acordando de um sono leve. A luz da manhã já entrava pela janela. Espreguicei-me com cuidado, tentando não acordar Heloísa. A briga de ontem ainda estava na minha cabeça – mais uma discussão que não resolveu nada e só nos deixou cansados.Fui ao banheiro e me olhei no espelho. A cara de cansado refletia o que eu estava sentindo. Passei a mão no rosto, como se pudesse apagar o cansaço. Atrás de mim, Heloísa dormia tranquila, nem ligando para a noite passada.Peguei um terno preto no guarda-roupa e me vesti rápido. O trabalho na Editora Monteiro não dava folga. Na cozinha, fiz um café forte, mas o gosto amargo não ajudou a aliviar a tensão.No estacionamento, entrei no carro. O barulho do motor ligado me deu uma sensação de controle, por pequena que fosse. O trânsito estava bom, e quando estacionei na editora, vi algumas pessoas esperando na entrada – provavelmente candidatos para as entrevistas do dia. Carla, minha assistente, me cumpr
Capítulo 06Eliza CamposMeu coração disparou enquanto acompanhava Carla até a recepção. O olhar intenso de Pedro me deixava nervosa, como se ele pudesse ver tudo sobre mim, e eu estava até agora sem entender o motivo dele me olhar daquela maneira. Cada passo parecia pesado, e eu estava prestes a desabar.— Eliza, bem-vinda à equipe! Aqui estão seus horários. Você começa amanhã e vai cuidar da agenda do Sr. Monteiro. Sua sala é aquela ali, perto da do Pedro — disse Carla.Ela parecia tão confiante, enquanto eu me sentia meio perdida, quase frágil, como se pudesse desabar a qualquer momento. Pensei em contar pra Carla sobre meu passado, mas a lembrança do Jonas me fez travar. Me recordei de quando ele me dava sorrisos falsos e da dor que ele me causou quando terminamos.— Nossa, o trabalho tá uma loucura aqui! Muitos autores nacionais estão chegando, e tá sendo bem legal, sabe? — comentou ela, toda animada.— É, imagino. Deve ser um desafio — respondi.— É, mas é maneiro! Você vai ver.
Capítulo 07Eliza CamposTinha que contar tudo a Matheus sobre Jonas. Um aperto no peito me sufocava. Cada palavra era um nó na garganta. Era um peso enorme, uma verdade que carregava há tempos. Precisava dividir.— Matheus, sabe... encontrei o Jonas hoje. — A voz saiu quase como um sussurro, e eu me senti um pouco tonta. — Foi rápido, mas... me pegou de surpresa. Não tava esperando. — Meu coração disparou e temi que ele percebesse o tremor na minha voz.Ele me encarava com aquele olhar compreensivo, uma ruguinha de preocupação surgindo em sua testa. Aquilo me deixava ainda mais nervosa.— Sério? O que aconteceu? Ele aprontou alguma coisa?— Não, estávamos na mesma entrevista, e ele foi contratado também. Mas foi o suficiente pra me dar um susto. Fiquei com medo de recair.Ele se aproximou e recuei, sentindo um friozinho na barriga. Ele hesitou por um instante, como se estivesse escolhendo as palavras certas.— Sobre... o que rolou ontem... — ele começou, mas eu o interrompi, desviando
Capítulo 08Eliza CamposSaí da minha sala com aquele friozinho no estômago; a reunião estava prestes a começar. No fim do corredor, avistei a Carla. Segurei o papel com firmeza e respirei fundo, tentando reunir coragem para falar com ela.— Carla! — chamei, acenando. — Preparei algo especial para a reunião. Quer dar uma olhada?Seus olhos brilham como se estivessem dizendo: "Conta tudo!", me encararam.— Deixa eu ver! — respondeu, toda animada.Carla pegou o papel e, enquanto olhava, seu rosto se iluminou com um sorriso enorme.— Uau, Lizz! Isso ficou incrível! Você arrasou!— Sério? — perguntei, um pouco insegura. — Tava com medo de ter exagerado...Ela me olhou nos olhos, como se conseguisse ler minha mente.— Olha, a gente ainda tá se conhecendo, mas posso dizer: você mandou muito bem! Eu adoraria ter uma apresentação assim.Senti um calorzinho no peito. Era bom saber que alguém que eu mal conhecia já estava do meu lado.— Obrigada! — respondi, me sentindo um pouco mais confiante.
Capítulo 09 Eliza CamposEu estava nervosa, esperando pela Carla. A reunião seria no último andar do prédio, e meu coração estava a mil. A situação era complicada, especialmente com a presença de Jonas, Cassandra e Heloísa — que, para minha surpresa, era noiva do Pedro.Respirei fundo várias vezes até que Carla apareceu no final do corredor. Quando ela chegou, senti um alívio misturado com nervosismo. Uma lágrima quase escapou, mas me esforcei para que ela não percebesse.— E aí, pronta? — perguntou Carla, sorrindo.— Vamos nessa — respondi, tentando esconder o tremor na voz. Minha respiração acelerada já entregava a tensão.Caminhamos até a sala de reuniões. O ar-condicionado aliviava o calor e a pressão no meu peito. Ao entrar, percebi que quase todos já estavam lá. Jonas e Cassandra estavam num canto, sussurrando, o que me deixou com um nó no estômago. Heloísa estava ao lado de Pedro, me observando com um olhar critico. O clima estava pesado, cheio de expectativas, e a pressão aume