No dia seguinte, eu havia despertado cedo. Tinha dormido muito bem na última noite, mas a ansiedade que estava me consumindo se tornou maior assim que o sol deu as caras pelas persianas da minha janela.
Saio do anexo e me dirijo até a casa. Ainda é muito cedo para que a garotinha esteja acordada, o sr. Barichello na última noite havia me enviado todos os horários da sua filha.
Assim que entro na casa, a mansão está mergulhada em silêncio e eu me atrevo a bisbilhotar, procurando por porta-retratos de fotos de família. Procurando por ela. Pela mulher que o meu chefe estava aliviado que tenha morrido. Mas não existe nenhum resquício de sua existência ali.
—O que está fazendo?— a voz masculina e firme me fez dá um sobressalto, as mãos no coração.
Me viro, me afastando de uma mesinha no centro da sala e encaro os mais intensos pares de olhos negros em mim.
—Eu só estava tentando me familiarizar com a casa.— Falo rapidamente e minha voz sai mais alta do que eu gostaria.
Ele apenas me olha do modo mais apático possível. O seu clássico olhar para tudo ao seu redor.
—Emma ainda não acordou.— É tudo que ele diz e está prestes a ir embora, quando eu o chamo outra vez.
—Sr. Barichello?— minha voz sai um pouco embargada e ele apenas para de andar, mas não se vira. —Você não lembra de mim?
Naquele momento, ele se vira e me encara. Sua cabeça cai para o lado um pouco e me observa, como se fizesse força mental para recordar de três dias atrás.
—Nunca a vi em parte alguma.— Ele diz simplesmente.
Por alguma razão, isso me cobre de uma raiva que eu não consegui prever. Como poderia ser possível que aqueles breves minutos naquele carro estivessem correndo em minha mente desde o primeiro dia e ele simplesmente não recordava disso?
—Nem quando tentou pegar o mesmo táxi que eu?— digo, irritada.
Por um minuto, vi uma brecha de um pequeno sorriso em seu rosto e imaginei que talvez ele só estivesse zoando com a minha cara. Mas do pouco que conhecia daquele homem, a última coisa que ele seria, é divertido.
No entanto, seu olhar intenso recai sobre mim. Sinto como se minha alma estivesse descortinada e eu me tornasse vulnerável aquela situação, ao olhar do homem sombrio e misterioso. Do qual nem o seu primeiro nome, eu sabia.
Lentamente ele se aproxima de mim e o meu coração acelera em meu peito. Não sei porque me sinto tão nervosa, ansiosa. Mas meu olhar ainda segura o dele.
Quando já está bem próximo de mim, ele ergue lentamente as suas mãos enquanto olha em meus olhos.
—Você está atrasada para sua primeira tarefa.— Fala, a voz baixa e me indica o relógio em seu pulso. —Me pergunto se irá sobreviver até o fim do dia.
E antes que eu pudesse reagir, ele simplesmente vai embora. O sentimento de confusão e medo me consome o peito, porque eu também não tinha tanta certeza se iria sobreviver ali.
No entanto, respiro fundo e trato de subir as escadas, indo acordar a Emma.
***
Emma era o total oposto do que seu pai era.
Era extremamente comunicativa e doce. Havia me dado bem com ela desde o primeiro instante e agora estávamos nos esbaldando com um maravilhoso walffes que a cozinheira da casa havia preparado.
—Você tem uma mamãe, Ayla?— de repente ela me pergunta, enquanto estávamos sentadas na grama no jardim da casa.
—Tenho sim. Mas agora ela está longe de mim.— Respondo, receosa sobre onde aquele assunto levaria.
—Está longe igual a minha?— ela pergunta surpresa, os olhos enormes e verdes me encarando. —Meu pai falou que ela está tão longe que não poderia mais voltar.
Engulo em seco. Aquele assunto me partia o peito, porque não poderia imaginar uma menininha de 4 anos sem o cuidado e o amor incondicional materno.
—Algumas viagens que fazemos são mais longas que as outras.— Digo em seguida. —Algumas vezes encontramos o caminho de volta, e em outras, precisamos apenas aceitar nosso novo lugar. Mas a melhor parte de tudo isso... —sussurro e brinco com seu nariz, a fazendo sorrir. —É que mesmo longe, a gente nunca esquecerá de nenhuma parada dessa viagem.
Emma assente e volta a comer em seu silêncio, antes de mais perguntas voltarem a encher seu pequeno cérebro.
—Você sabe onde o meu pai trabalha?— ela pergunta e eu assinto. —Você pode me levar até lá? Eu sinto muita saudade dele.
Mordo o meu próprio lábio com força e me vejo incapaz de dizer não aquela garotinha. O fim daquele primeiro expediente estava prestes a terminar e imaginei que o sr. Barichello fosse gostar de poder almoçar com sua filha.
O motorista da casa nos deixou em frente a empresa trinta minutos depois e uma Emma muito saltitante saia do carro em direção a empresa. Aquela multinacional era maior do que eu tinha imaginado e eu precisei pedir informação sobre onde seria a sala do Sr. Barichello.
Subimos até o 14° andar, e por fim, bati a porta daquele escritório. A voz firme e um tanto tediosa expressou um —entra.— E o fizemos logo em seguida.
Assim que entramos naquele escritório e os olhos daquele homem pousaram em mim e em sua filha, ele se levantou rapidamente da sua cadeira, dando um passo para trás. Como se aquilo de repente o assustasse.
—O que pensa que está fazendo?— sua voz soa alta e eu percebo como seu rosto fica vermelho de repente. —Por que está aqui?
—A Emma queria almoçar com você.— Digo, ainda conseguindo sorrir.
A menina apenas encara o seu pai, ansiosa e parecia extremamente receosa.
—Eu estou trabalhando. E se você ainda quiser ter um trabalho, sugiro que vá logo embora daqui.— O seu tom é ríspido e um tanto cruel.
Emma apenas abaixa os olhos e vejo a tristeza cobrir o rosto da garotinha mais iluminada que já conheci. Aquilo encobre o meu peito com uma raiva que me faz querer explodir.
—Emma querida, você pode ir lá fora um pouquinho enquanto resolvo um assunto de trabalho com o seu pai? —sussurro pra ela, me abaixando. —A secretária dele ficará com você por uns instantes.
A menina sai um pouco mais cabisbaixa do que entrou, mas assim que aquelas portas se fecham, deixo todo o ódio me invadir.
—Qual seu maldito problema?— grito. —Sua filha te venera e só sente sua falta e você a trata assim? Que tipo de monstro você é?
No mesmo instante que aquelas palavras saem dos meus lábios, percebo que havia ido longe demais. Mas aquele homem... Por Deus, despertava o pior de mim.
—Você desconhece a magnitude do monstro que reside em mim. Portanto, não o provoque.— Ele fala estridentes enquanto dá as costas para mim.
Só que aquele aviso havia chegado tarde demais, porque eu iria até o fim.
—Me mostra o tipo de monstro que você é, e eu garanto que nada me assustará.
E naquele momento, aquele homem lança o olhar duro sobre mim e eu percebo então o arrependimento por ter me envolvido em tudo aquilo.
Os olhos dele estavam presos em mim, como se fosse capaz de queimar a minha alma só com o poder daquele olhar. De repente, o escritório se tornou mais abafado, enquanto uma luta interna se travava dentro de mim.—Ela falou que sentia sua falta.— Volto a falar, um pouco mais calma. —Não acho que seja fácil pra ela, ter perdido a mãe e ver o próprio pai, tudo que sobrou pra ela, se afastando.Aquele homem franze a testa, como se as palavras da minha boca fossem uma espécie de enigma mal compreendido.—O que te faz acreditar que você sabe de algo da nossa vida?— ele pergunta rudemente. —Você é apenas alguém que trabalha para mim. E pelo o que posso notar, está desejando que isso mude.Não deixo sua provocação me distrair. Me recuso que ele mude de assunto daquela forma, porque a curiosidade sobre tudo aquilo que aquele homem poderia esconder me consome a cada segundo.—Sei o suficiente para saber que se sente aliviado pela morte da sua esposa.— Deixo as palavras saírem livremente, sem me
Aquela informação paira no ar e eu ainda estou desnorteada demais para conseguir formar qualquer pensamento completo. —Noiva?— é tudo que consigo falar e aquela mulher apenas levanta uma sobrancelha sugestivamente, como se estivesse travando uma batalha individual em sua própria cabeça. —Algum problema com isso?— ela pergunta, um tom de superioridade em sua voz. —Problema algum.— Me recupero rapidamente. —Só fiquei meio surpresa com o fato de existir um noivado só apenas alguns dias desde que ele enterrou a sua mulher. As palavras saíram da minha boca antes mesmo que eu pudesse controlar, esse era um dos defeitos da minha longa lista. E aquela vez, minha língua havia voltado a me colocar em apuros. Bianca apenas me entrega um sorriso cínico e sei que está prestes a me responder da maneira mais humilhante que uma loira de classe alta poderia. No entanto, um barulho de passos surge logo na sala ao lado. Pressentindo que o sr. Barichello estava se aproximando, ela rapidamente traz d
O ar naquela atmosfera pareceu denso demais, enquanto eu assistia a troca de olhares selvagens e ameaçadores entre Erlon e o meu chefe. —Quem você pensa quem é?— Erlon pergunta exasperado, e tenta se afastar da figura potente e alta em sua frente. Sr. Barichello apenas dá um passo em frente e só aquele simples ato parece ser ameaçador o suficiente. —Essa será a segunda e última vez que sugiro que deixe a moça em paz.— Ouço a voz do meu chefe soar baixa o suficiente, estridentes. —E eu vou perguntar pela segunda vez: quem diabos é você?— Erlon insiste, também se aproximando. Sinto meu coração acelerar rapidamente. Eu não fazia ideia sobre tudo que poderia acontecer naquela situação, mas eu tinha a absoluta certeza que eu não gostaria do que quer que fosse. Por isso, soube que precisava intervir. Mesmo que isso me forçasse a agir do modo mais estupido possível. —Erlon, tudo que a Diana te contou é verdade.— Eu falei rapidamente, entrando no meio dos dois. —E esse é ele. É o cara q
Passo através daquele homem rapidamente, ignorando totalmente sua presença e como meu coração acelera em meu peito. Paro em frente ao balcão onde consigo contatar o recepcionista daquele hotel. —Boa noite, como posso ajudar a senhorita?— um senhor de cabelos grisalhos e muito sorridente me pergunta. —Boa noite. O senhor poderia me informar algum número de táxi e onde posso pegá-lo por aqui?— minha voz está tão ofegante, que acredito ter assustado aquele senhor. Por isso, forço um sorriso logo em seguida. O recepcionista apenas dá uma pequena tossida fingida e em seguida olha para tela do computador e com um sorriso empático no rosto, me informa. —Eu sinto muito, minha querida. Mas nessa área do hotel, os únicos carros permitidos a fazer rota são os do próprio hotel. E receio que nesse momento, todos estejam ocupados. Solto uma respiração completamente cheia de exasperação. Eu realmente gostaria de saber em qual ponto da minha vida, toda a sorte resolveu simplesmente dissipar. —P
Quando acordei naquela manhã de domingo, eu realmente senti que havia descansado. Foi a primeira noite desde o dia em que toda minha vida mudou, que minha mente pareceu finalmente relaxar.Poderia culpar o álcool, mas a verdade é que no final da noite não existia mais nenhuma gota de álcool em minhas veias. Só as novas lembranças e perguntas que havia acabado de criar.O sol já estava pintando forte no alto, quando decidi sair do meu anexo.—Ayla, você está aqui?— a voz de Emma alcançou meus ouvidos logo que coloco os pés pra fora.Sorri quando encontrei a garota vestida completamente de rosa, os cabelos partidos ao meio e a sua inseparável boneca ao lado.—Pra onde você vai tão linda assim?— perguntei ao me aproximar.—Vou sair com o papai.— Ela disse empolgada e no mesmo momento, aquela noticia me empolgou do mesmo jeito. —Achei que você não fosse ficar comigo hoje.—Ah, não. Eu só passei a noite aqui, já estava saindo.— Expliquei.A garota baixou os olhos no mesmo instante, parecia
Não me intimidei nem por um segundo com a figura loira e arrogante em minha frente, pelo contrário, eu soube exatamente o que deveria fazer. Eu já havia percebido Bianca o suficiente na última vez, eu era ótima em observar pessoas. Ela claramente se prestava a um papel de querida e boa moça na frente do Juan, tudo pra ganhar admiração e respeito. Mas a verdade era que ela não passava de uma cobra, à espreita pra atacar. —Estou fazendo a mesma coisa que você, Bianca.— Respondo. —Estou em um aniversário. Vejo quando sua mandíbula fica rígida e ela parece se morder de raiva com a audácia em minhas palavras. —Mas você não deveria estar aqui fora. Deveria estar com a Emma.— Ela insiste, claramente incomodada pela minha presença junto ao seu adorável noivo. —Ah, a Emma está bem, não se preocupe.— Eu digo, sorrindo. Aquilo pareceu acender ainda mais a raiva presente dentro dela. Juan ao seu lado apenas fumava, como se tivesse alheio aquele cenário todo. Me perguntei o que Bianca poderia
Os olhos de Juan permanecem em Ax, dessa vez imparcial. Espero que ele fale qualquer coisa, que pergunte porque eu trabalharia com Ax, uma vez que ele não irá me demitir. Mas ele não faz isso. Seus olhos apenas procuram Emma e buscam sua mão, apenas desejando ir embora daquele local. Bom, eu também desejava aquilo profundamente. E como se minha prece fosse atendida: —Você vem?— ele resmunga de repente, mas sem olhar pra mim. Ele não precisa se esforçar mais que isso pra me ver saindo em disparada atrás dele. —Juan, eu...— eu começo a falar, a voz trêmula, mas sou interrompida. —Aqui não.— Ele me corta friamente assim que chegamos ao seu carro e ele dá partida em alta velocidade. Eu engulo em seco, sabendo que aquele momento era um daqueles em que eu arruinaria tudo se eu só falasse descontroladamente. No meu lado, Emma parece muito mais tranquila sentada em sua cadeirinha, mesmo que silenciosa. Mas também respeito esse seu espaço. Assim que o carro para em frente a mansão, Juan
Aquele dia completamente intenso já estava chegando ao fim, e em breve, eu iniciaria mais uma outra semana de trabalho. A ideia de um final de semana relaxante e sem estresse já havia caído por terra há um bom tempo. É por isso que assim que o sol começa a desaparecer no céu pintado de rosa e laranja, eu apenas decido que iria continuar no meu anexo, juntando as tantas peças de um quebra-cabeça sem fim que minha vida se tornou desde o dia em que apareci por ali. No entanto, as novidades daquele dia, todavia não havia terminado. —Encontrei você aqui!— a voz masculina me parou antes mesmo que eu pudesse atravessar o jardim. —Ax, o que você está fazendo aqui?— pergunto confusa e olhando para todos os lados. —Eu só precisava ver você. Saber se tudo ficou bem.— Ele sorriu, enquanto enfiava as mãos no bolso da calça. —Ah, ficou tudo bem, sim. Obrigada.— Eu respondo de modo direto, porque por alguma razão, eu me sentia um pouco invadida pela sua presença ali. —Que bom, Ayla. Eu realmen