Capítulo 5

Os olhos dele estavam presos em mim, como se fosse capaz de queimar a minha alma só com o poder daquele olhar. De repente, o escritório se tornou mais abafado, enquanto uma luta interna se travava dentro de mim.

—Ela falou que sentia sua falta.— Volto a falar, um pouco mais calma. —Não acho que seja fácil pra ela, ter perdido a mãe e ver o próprio pai, tudo que sobrou pra ela, se afastando.

Aquele homem franze a testa, como se as palavras da minha boca fossem uma espécie de enigma mal compreendido.

—O que te faz acreditar que você sabe de algo da nossa vida?— ele pergunta rudemente. —Você é apenas alguém que trabalha para mim. E pelo o que posso notar, está desejando que isso mude.

Não deixo sua provocação me distrair. Me recuso que ele mude de assunto daquela forma, porque a curiosidade sobre tudo aquilo que aquele homem poderia esconder me consome a cada segundo.

—Sei o suficiente para saber que se sente aliviado pela morte da sua esposa.— Deixo as palavras saírem livremente, sem me importar com qualquer descrição.

Os olhos do Sr. Barichello de repente se iluminam e ele me encara intensamente, como se apenas naquele momento, ele recordasse do nosso encontro naquele carro e da afirmação terrível que ele deixou no ar.

—Senhorita Green, aprecio sua maneira de tentar controlar ou descobrir detalhes sobre a minha vida pessoal. Mas preciso me anteceder e dizer que você jamais saberá nada sobre mim. E se ainda quiser ter um emprego, eu sugiro que saia da minha empresa e leve a minha filha para segurança da minha casa. Agora.

Aquela foi a única vez que o vi se expressar tanto, o que acabou me deixando sem folego. A mudança em sua expressão, a face apática e os olhos em chamas... Quem é você? Eu me perguntava.

No entanto, eu sabia que havia ido longe demais e eu realmente ainda precisava de um emprego. Mas antes de começar a sair da sua sala, me virei para o olhar mais uma vez:

—Tudo que você me pediu foi para cuidar da sua filha e eu estou o fazendo. Você me disse que ela era preciosa demais para você, no entanto, a trata como se fosse algo comum. Suas palavras não convêm com suas atitudes.

E dizendo isso, saí daquele escritório e ao encontrar Emma do lado de fora, voltamos até a mansão.

Mais tarde naquele dia, ela teve aula de ballet. O cansaço daquele dia a venceu assim que voltou pra casa e jantou junto a mim. A coloquei em sua cama até que ela dormisse e quando finalmente conseguiu, decidi me retirar.

A lua estava alta e cheia enquanto eu me dirigia até o anexo ao lado da casa, mas notei a boneca Dorothea da Emma na varanda da casa e lembrei que se ela acordasse no meio da noite e não a sentisse com ela, despertaria.

Pego a boneca e decido levar de volta a garota. No entanto, assim que paro em frente ao seu quarto, eu acabo travando.

O seu pai estava ali. Pelo traje, havia acabado de chegar do trabalho, mas estava ali em seu quarto, próximo a sua cama e a observava dormir, velando o seu sono. Pude ver amor em suas íris, uma espécie de cuidado e proteção incondicionais. No entanto, eu também podia enxergar dor. Muita dor.

De repente, ele se vira para mim. E eu engulo em seco.

—Vim apenas trazer a boneca dela.— Eu me adianto em falar, esticando os braços.

Rapidamente entro no quarto e deposito o brinquedo ao lado da garota que dorme tranquilamente. Seus cabelos castanhos em cachinhos caem ao redor do seu rosto, a pele clara e os lábios fartos e bem desenhados.

—Ela é extremamente linda.— Eu digo baixinho, também a observando por alguns segundos.

Sr. Barichello não diz nada, apenas segue a encarando, como se fizesse isso todos os dias.

—Ela é igualzinha a mãe.— Ele diz de repente, quando já estava próximo a porta.

Paro de andar rapidamente quando escuto a melancolia em sua voz. Uma espécie de dor misturada com saudade, decepção, medo, raiva.

Foi naquele instante que a compreensão de tudo aquilo se encaixou em minha cabeça como um quebra-cabeça doloroso.

—É por isso que você tem dificuldade em se relacionar com ela?— sussurro baixinho. —Porque ela lembra tudo que você perdeu?

No mesmo instante, ele vira o olhar minha direção. A expressão apática em seu rosto de volta ali.

—Porque ela me lembra tudo que eu nunca tive.— E dizendo isso, ele simplesmente vai embora, me deixando com mais uma centena de perguntas em minha cabeça.

Quem é você? O que a sua mulher fez que o deixou tão destroçado? É isso que me pergunto a noite inteira, sem conseguir dormir por nenhum segundo.

***

Na manhã seguinte em que me dirijo até a mansão, pude observar o carro do sr. Barichello ainda na garagem, o que significava que ele ainda não havia saído para trabalhar. Estranhamente aquilo me deixou nervosa, porque não tinha tanta certeza que iria conseguir olhar em seus olhos e não fazer mais uma centena de perguntas.

Assim que entro na casa, posso ouvir burburinhos na sala de jantar. A curiosidade me vence e eu caminho até lá. O sr. Barichello estava ali, tomando café com uma mesa repleta de coisas suficientes para comer em uma semana.

E para minha surpresa, Emma também estava ali.

— Ayla, vem!— ela grita assim que me vê, anunciando minha presença.

Olho o relógio me perguntando se havia realmente me atrasado tanto assim.

—Ela acordou mais cedo hoje.— Sr. Barichello sussurra, sem me olhar, com sua atenção ainda presa no jornal que ele trazia em mãos. —Decidi ficar com ela enquanto você não chegava.

Emma me olha em seguida, seus olhos estão mais um pouco iluminados que no dia anterior. E eu sorrio para ela, cumplice.

Me pergunto o que deve ter influenciado um pouco aquela decisão do sr. Barichello. Porque por mais que ele não estivesse olhando ou conversando com sua filha, aquela simples ação já significava muito.

—Senta aqui, Ayla.— Emma volta a chamar.

—Eu... eu não posso, eu...— me vejo gaguejando, porque não saberia lidar com aquela situação. —Vou ficar te esperando comer lá na sala ao lado e...

—Sente.— A voz firme e grossa do sr. Barichello enche aquele lugar de repente e eu percebo que não se trata de um pedido.

Não me atrevo a recusar diante de tudo aquilo que já havia feito e me sento ao lado de Emma. Por mais que ela apenas estivesse conversando comigo, eu podia perceber que só a presença do seu pai ali já era o suficiente para ela.

—Emma, precisamos cuidar pra ir à escola.— Digo, quinze minutos depois.

—Eu já estou pronta. Só irei pegar minha mochila.— Ela fala rapidamente e antes que eu conteste algo, ela sai correndo.

—Ela é muito independente, não é?— comento sorrindo.

O seu pai apenas levanta uma sobrancelha, o único sinal real que ele realmente está me ouvindo.

Me sinto inquieta com o silencio que ficou ali de repente, até que a campainha toca e segundos depois uma mulher alta e de pernas longas e finas aparece naquela sala de jantar.

Seus cabelos longos e loiros faz um contraste com sua aparência de modelo de Victoria´s Secret.

—Querido?— ela chama assim que vê o sr. Barichello.

No mesmo momento ela dirige o olhar até a mim, a sobrancelha arqueada, como se eu fosse algum tipo de animal exótico fora do seu habitat. Talvez eu realmente fosse.

—Já estou indo, Bianca.— Sr. Barichello diz de repente e se levanta, saindo daquele espaço.

Estou me levantando, prestes a ir em direção a Emma quando aquela mulher me chama.

—Quem é você?— sua voz aparece acusativa quando me observa de cima abaixo, estando a muitos centímetros abaixo dela.

—Olá, eu sou a Ayla. Sou a nova babá da Emma.— digo sorrindo, mas ela não corresponde.

—E por que estava sentada a mesa?— sua pergunta inconivente me faz lembrar o tipo de pessoa que ela é.

—Perdão, mas e você? Quem é?— pergunto, um tanto rude.

Ela apenas voltar a me olhar e jogando o longo cabelo loiro para o lado e sorrindo diz:

—Sou Bianca. Noiva do sr. Barichello e sua futura patroa.

Mas o quê...

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