A capela estava silenciosa, exceto pelo som suave da respiração de Valentina. Ela estava ajoelhada diante do altar, as mãos unidas em prece. Tentava acalmar o coração que ainda pulsava descompassado desde o encontro com Gabriel.
“Senhor, guia-me em Tuas verdades,” ela sussurrou, os olhos fechados com força. “Afasta de mim tudo o que não pertence ao Teu plano. Não permita que eu me perca.”
Mas, mesmo em oração, a lembrança dos olhos intensos de Gabriel surgia em sua mente. A maneira como ele a desafiara, como se enxergasse algo que nem ela mesma sabia existir, a deixava inquieta.
De repente, Irmã Amélia apareceu silenciosamente ao seu lado.
“Valentina,” a freira disse em tom sério, “você está bem?”Valentina abriu os olhos lentamente, respirando fundo.
“Sim, Irmã Amélia. Só… tentando encontrar paz.”A mais velha inclinou a cabeça, estudando-a por um momento.
“Você precisa ser forte. Homens como Gabriel não têm escrúpulos. Ele está aqui para destruir tudo o que amamos. Não permita que ele a confunda.”Valentina assentiu, mas não conseguiu responder. Parte de si concordava plenamente com a irmã, mas outra parte… outra parte sentia algo que não conseguia explicar.
Enquanto isso, Gabriel estava em seu escritório improvisado no hotel mais luxuoso da cidade. Um tablet estava sobre a mesa, exibindo fotos e documentos sobre o convento. Ele havia mandado sua equipe investigar a história do lugar, e os resultados começaram a chegar.
“Valentina Mendes,” ele murmurou, passando os dedos pelo nome que aparecia em um dos relatórios.
Ele descobriu que Valentina havia perdido os pais ainda criança e fora criada por uma tia devota, que a enviara ao convento aos 18 anos. No entanto, algo na trajetória dela chamou sua atenção: havia uma lacuna de dois anos antes de ela ser aceita como noviça. Dois anos sem registros claros.
“Interessante,” ele disse para si mesmo, os olhos brilhando com curiosidade.
Nesse momento, Felipe, seu assistente, entrou na sala com um sorriso malicioso.
“Parece que o senhor está particularmente interessado na noviça,” comentou, colocando mais documentos na mesa.Gabriel arqueou uma sobrancelha.
“Não é interesse. É estratégia. Ela parece ser importante para o convento, e entender o que a mantém aqui pode ser a chave para avançarmos.”Felipe riu.
“Estratégia, claro. E aquele olhar que você deu a ela hoje foi pura tática de negócios, certo?”Gabriel não respondeu imediatamente. Ele se recostou na cadeira, pensando na força nos olhos de Valentina e na vulnerabilidade escondida sob sua determinação.
“Ela é diferente,” admitiu, quase em um sussurro. “E talvez isso torne tudo mais… complicado.”
Felipe levantou as mãos em rendição.
“Complicado ou não, o senhor é conhecido por conseguir o que quer.”Na manhã seguinte, Valentina estava no jardim novamente, cuidando das plantas. O trabalho manual sempre fora seu refúgio, uma maneira de silenciar a mente.
“Essas flores parecem mais felizes quando você está por perto.”
Ela se sobressaltou ao ouvir a voz familiar e virou-se para encontrar Gabriel parado ali, encostado no portão do jardim. Ele estava vestido de maneira mais casual desta vez, mas o mesmo ar de confiança o acompanhava.
“O que você está fazendo aqui de novo?” ela perguntou, tentando manter a calma.
“Passei para admirar a paisagem,” respondeu ele com um sorriso travesso, os olhos pousando nela por tempo suficiente para deixá-la desconfortável.
“Você não deveria estar aqui,” ela repetiu, levantando-se.
“Você sempre repete isso, mas nunca diz o que realmente quer.”
Valentina estreitou os olhos, cruzando os braços.
“E o que você acha que eu quero?”Gabriel deu um passo à frente, diminuindo a distância entre eles.
“Acho que você quer proteger este lugar com toda a força que tem. Mas também acho que há algo em você… algo que está questionando tudo isso.”“Você não sabe nada sobre mim,” retrucou ela, embora sua voz tenha vacilado.
“Talvez,” ele respondeu, inclinando ligeiramente a cabeça, “mas vou descobrir.”
Valentina sentiu o coração disparar enquanto Gabriel se afastava, deixando-a com mais perguntas do que respostas. O que ele queria realmente com ela? E por que suas palavras pareciam tocar partes de sua alma que ela pensava estar enterradas?Enquanto ele atravessava os portões do convento, um sorriso enigmático brincava em seus lábios. Gabriel sabia que essa batalha estava apenas começando, e Sant’Elisa estava prestes a ser abalada de maneiras que ninguém poderia prever.
O sol de Sant’Elisa brilhava intensamente naquela manhã, iluminando a cidade pacata e suas ruas movimentadas. Gabriel caminhava pelo centro, de olho nos habitantes locais que passavam por ele com olhares curiosos. Era evidente que sua presença incomodava, mas ele estava acostumado com isso. No entanto, algo o incomodava mais: Valentina.Desde que lera o relatório sobre ela, Gabriel não conseguia parar de pensar nos dois anos misteriosos de sua vida. O que acontecera antes de ela decidir se refugiar no convento? Havia uma história ali, e ele estava determinado a descobrir.Ele parou na frente de uma padaria charmosa, onde o aroma de pão fresco e café o envolveu. Dentro, para sua surpresa, lá estava Valentina. Ela estava sentada perto da janela, com um livro nas mãos e uma xícara de chá à sua frente.Por um momento, Gabriel hesitou. Observou-a em silêncio, notando como a luz do sol iluminava seu rosto sereno. Ela parecia tão distante do mundo ao seu redor, como se estivesse protegida po
Valentina acordou antes do amanhecer, como sempre fazia, mas dessa vez o peso da culpa parecia maior. Sentia-se inquieta, como se estivesse carregando um segredo proibido. Toda vez que fechava os olhos, via o rosto de Gabriel, seus olhos intensos, e ouvia sua voz provocadora.Ela tentou afastar esses pensamentos com a oração, mas as palavras pareciam vazias, como se algo dentro dela estivesse mudando. Ao sair de sua cela para ajudar nas tarefas matinais, encontrou a Madre Superiora no corredor."Valentina, está tudo bem?" perguntou a madre, com um olhar preocupado."Sim, madre. Apenas cansada," respondeu ela, evitando o olhar da superiora.Mas a verdade era outra. Algo dentro dela estava diferente, e ela não sabia como lidar com isso.Enquanto isso, Gabriel estava no café do hotel, olhando pela janela enquanto segurava uma xícara de café. Ele não conseguia tirar Valentina da cabeça. Havia algo nela que o desarmava, uma força que ele não conseguia compreender.“Gabriel, você parece dis
A manhã no convento amanheceu mais silenciosa que o habitual, como se o vento soubesse que algo estava por vir. Valentina, ajoelhada na capela, mal podia concentrar-se em suas preces. Cada palavra das orações parecia pesar, carregada pela lembrança de Gabriel — seu sorriso confiante, o olhar que parecia enxergar além da superfície e a proximidade que fazia seu coração disparar de maneira assustadora.A tranquilidade foi quebrada pelo som suave dos passos da Madre Superiora entrando no recinto.— Valentina, preciso conversar com você — disse ela, com um tom de preocupação que fez o estômago da jovem noviça se apertar.Valentina levantou-se rapidamente, ajustando o véu.— Sim, Madre.As duas caminharam até o jardim do convento, onde a Madre Superiora parou ao lado de uma pequena fonte de pedra.— Você sabe quem é Gabriel Santos? — perguntou, seus olhos fixos nos de Valentina.Valentina hesitou. Mentir não era uma opção.— Ele veio até o convento há alguns dias. Tivemos... uma conversa b
O escritório de Gabriel estava mergulhado no caos. Papéis espalhados, arquivos abertos, e uma pilha de documentos antigos sobre a mesa. Ele segurava uma folha amarelada pelo tempo, os olhos brilhando com uma mistura de excitação e frustração.— Então é isso... — murmurou para si mesmo.O documento, encontrado nos arquivos históricos da cidade, mencionava uma cláusula que poderia preservar o convento como patrimônio religioso e cultural, protegendo-o de qualquer intervenção. Mas havia um porém: a cláusula só teria efeito com a assinatura da Madre Superiora, algo que Gabriel sabia ser quase impossível de conseguir.Ele tamborilou os dedos na mesa, pensativo. Havia uma possibilidade — Valentina. Desde o primeiro encontro, ela parecia ser a chave que poderia destrancar portas no convento, talvez até no coração da Madre Superiora. Mas usá-la para isso trazia complicações que ele não queria admitir.Gabriel recostou-se na cadeira, um sorriso aparecendo no canto dos lábios. Ele sabia como jo
O dia estava nublado, como se o céu refletisse a tempestade que se formava dentro de Valentina. Desde que Gabriel lhe entregara aquele documento, ela se sentia dividida. Ele era carismático, mas também perigosamente persuasivo. Sua mente sabia que deveria manter distância, mas seu coração — ou talvez algo mais profundo — insistia em desafiá-la.Valentina caminhava pelo jardim, perdida em seus pensamentos, quando ouviu uma voz familiar.— Pensativa de novo? — Gabriel estava encostado em uma árvore, observando-a com aquele sorriso que parecia tanto um convite quanto uma armadilha.Ela parou, surpresa, mas logo recuperou a compostura. — O que está fazendo aqui, Gabriel? Este é um lugar privado.Ele deu de ombros, caminhando em sua direção. — Não sabia que jardins eram restritos. Só vim dar uma volta.— Você nunca "só vem dar uma volta". Sempre tem um motivo — respondeu ela, cruzando os braços.Ele parou a poucos passos dela, as mãos nos bolsos, mas os olhos fixos nos dela. — Talvez o
A manhã era fresca, mas Valentina sentia o peso do dia antes mesmo de ele começar. O documento que Gabriel lhe entregara estava escondido no fundo de sua gaveta, mas ocupava espaço demais em seus pensamentos. Cada vez que tentava rezar, o rosto dele surgia em sua mente, junto com a pergunta que não conseguia evitar: "Por que ele mexe tanto comigo?"Enquanto realizava suas tarefas, os olhares das outras irmãs eram difíceis de ignorar. Cochichos seguiam cada passo seu, e Valentina sabia que algo havia mudado. Até mesmo Irmã Amélia, que sempre fora sua confidente, parecia inquieta.— Valentina, precisamos conversar — disse a Madre Superiora mais tarde, com um tom severo que não permitia recusas.Valentina assentiu e seguiu a líder até o escritório. Lá dentro, o ar era ainda mais pesado.— O que está acontecendo? — perguntou Valentina, mesmo sabendo que não gostava da resposta que estava por vir.A Madre Superiora pousou uma carta sobre a mesa, sem perder tempo. — Existem rumores, minha
A noite estava fria, e Gabriel, sentado em um bar discreto na periferia da cidade, girava o copo de uísque nas mãos, perdido em pensamentos. O lugar era pequeno e vazio, exceto por ele e outro homem sentado à sua frente. Este era Raul, um amigo de longa data, alguém que conhecia o Gabriel antes de todo o poder e ambição. — Nunca imaginei que te veria assim, Gabriel — disse Raul, recostando-se na cadeira e cruzando os braços. — O que está acontecendo com você?Gabriel riu, mas era um som vazio. — Talvez eu esteja perdendo o controle.— Não, isso não é do seu feitio. Você sempre tem controle de tudo, até do que sente.Gabriel inclinou-se para frente, o rosto tenso. — É aí que está o problema, Raul. Não tenho mais controle.Raul arqueou uma sobrancelha, intrigado. — Isso tem a ver com o convento? Ou... com alguém de lá?O silêncio de Gabriel foi resposta suficiente. Raul riu, balançando a cabeça. — Então é isso. Você, Gabriel de Morais, está mexido por uma mulher.— Não é só isso. —
A praça principal da cidade estava cheia de vida naquela tarde ensolarada. Barracas de comida, música ao vivo e um aroma doce de algodão-doce preenchiam o ar. O evento anual de arrecadação de fundos do convento sempre atraía uma multidão, e Valentina estava ocupada ajudando na organização, tentando manter sua mente ocupada.Ela sabia que Gabriel estaria lá. Ele sempre estava onde não deveria, especialmente quando se tratava dela. Desde o último confronto, Valentina lutava para controlar o turbilhão de emoções que ele despertava. Culpa, raiva, atração — tudo se misturava de uma forma que a deixava confusa e vulnerável.Enquanto ajustava os arranjos de flores em uma das mesas, sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Não precisava olhar para saber que ele estava lá. A presença de Gabriel era como um calor sufocante que a envolvia, e quando ela finalmente ergueu os olhos, lá estava ele, de terno casual, parado a poucos metros, observando-a com aquele sorriso desafiado