O dia começou agitado no convento de Sant’Elisa. As freiras andavam de um lado para o outro, preparando-se para receber um grupo de visitantes locais interessados na história do lugar. Valentina, que ainda se adaptava à rotina como noviça, estava no jardim, podando rosas com cuidado. Ela respirava fundo, tentando acalmar a mente que, inexplicavelmente, insistia em revisitar o encontro do dia anterior.
Mas antes que pudesse se concentrar em seus pensamentos, ouviu passos rápidos ecoando pelo pátio. Quando se virou, viu Gabriel atravessando os portões do convento com a mesma determinação que carregava no olhar.
Ele parecia um homem em missão, vestindo um terno impecável que contrastava com a simplicidade daquele lugar sagrado. Seu olhar varreu o jardim até pousar nela. Um sorriso leve — talvez até desafiador — surgiu em seus lábios.
“Valentina, não é?” ele perguntou, como se fossem velhos conhecidos.
“Senhor… Gabriel, não deveria estar aqui. Este é um lugar restrito.” Valentina ergueu o queixo, tentando soar firme, mas sua voz traiu uma leve hesitação.
“Eu preciso falar com a Madre Superiora. Hoje. Agora,” ele disse, aproximando-se. “E parece que você é a única que pode me levar até ela.”
Valentina deu um passo para trás, tentando manter distância. “A Madre Superiora está ocupada. E você não pode simplesmente invadir o convento assim.”
Gabriel cruzou os braços, um gesto que exalava confiança. “Invasão é uma palavra forte. Digamos que sou um homem determinado. E você parece ser a única pessoa sensata aqui para entender isso.”
Valentina apertou os lábios, claramente irritada. “Determinação não justifica desrespeito. Este lugar merece mais consideração do que isso.”
Ele inclinou a cabeça, estudando-a com interesse. “Você fala como alguém que acredita profundamente no que está defendendo. Gosto disso.”
Ela sentiu o sangue subir ao rosto. “Não é questão de gostar ou não. É minha obrigação.”
Gabriel deu um passo à frente, diminuindo ainda mais a distância entre eles. Valentina podia sentir o cheiro amadeirado de seu perfume, algo que a incomodava mais do que gostaria de admitir.
“E qual é exatamente a sua obrigação. Valentina? Obedecer cegamente ou questionar o que realmente acredita?”
Ela piscou, surpresa com a pergunta. “Minha fé não é cega. É uma escolha.”
“Escolha? Hm,” ele murmurou, pensativo, com um sorriso de canto. “Interessante. Então, escolha me ajudar. Me leve até a Madre Superiora. Garanto que minha conversa será rápida.”
Valentina hesitou. Ele tinha uma maneira de desarmar suas respostas com facilidade, e isso a deixava desconfortável.
“Você não entende, senhor Gabriel. Este convento não é apenas um prédio. É um lar, um refúgio para muitas pessoas. Seu plano de demoli-lo…”
“Valentina,” ele a interrompeu, sua voz mais baixa, quase gentil, “não sou o vilão que você está imaginando. Só quero uma chance de explicar minha proposta.”
Antes que ela pudesse responder, a voz firme de Irmã Amélia ecoou pelo pátio.
“Senhor Gabriel! Eu já disse ontem que você não é bem-vindo aqui sem um agendamento.”
Gabriel virou-se, mantendo a compostura. “Irmã Amélia, bom vê-la novamente. Espero que esteja tendo um dia abençoado. Agora, por favor, seja razoável. Não vim aqui para causar problemas, apenas para conversar.”
“Conversas podem ser marcadas. Agora, se não se retirar imediatamente, serei obrigada a chamar as autoridades.”
Valentina observava a troca tensa, mas algo em Gabriel a intrigava. Ele não parecia intimidado, nem mal-intencionado, apesar da maneira invasiva de agir.
Gabriel suspirou, levantando as mãos em um gesto de rendição. “Certo, certo. Vou embora… por enquanto.” Ele então se virou para Valentina, seus olhos prendendo os dela por um momento longo demais. “Mas vou voltar. Você sabe que vou.”
Sem esperar resposta, ele se retirou, deixando um rastro de perfume e perguntas não ditas.
Mais tarde, no silêncio da capela. Valentina sentou-se em um dos bancos, encarando o altar. As velas tremeluziam, lançando sombras nas paredes.
“Por que ele me deixa tão inquieta, Senhor?” sussurrou, fechando os olhos.
Mas, mesmo em sua prece, o rosto de Gabriel surgiu em sua mente. E em algum lugar da cidade, Gabriel estava sentado em um bar, lembrando-se dos olhos determinados de Valentina. Ele nunca havia encontrado alguém como ela antes.
Naquela noite, enquanto a cidade dormia, ambos estavam imersos em pensamentos um sobre o outro. Valentina se perguntava como afastar aquele homem de sua mente. Gabriel planejava como se aproximar dela novamente.E assim, o primeiro fio da teia que os conectava começou a se formar. Sant’Elisa não estava pronta para o que estava por vir — e talvez eles também não.
A capela estava silenciosa, exceto pelo som suave da respiração de Valentina. Ela estava ajoelhada diante do altar, as mãos unidas em prece. Tentava acalmar o coração que ainda pulsava descompassado desde o encontro com Gabriel.“Senhor, guia-me em Tuas verdades,” ela sussurrou, os olhos fechados com força. “Afasta de mim tudo o que não pertence ao Teu plano. Não permita que eu me perca.”Mas, mesmo em oração, a lembrança dos olhos intensos de Gabriel surgia em sua mente. A maneira como ele a desafiara, como se enxergasse algo que nem ela mesma sabia existir, a deixava inquieta.De repente, Irmã Amélia apareceu silenciosamente ao seu lado.“Valentina,” a freira disse em tom sério, “você está bem?”Valentina abriu os olhos lentamente, respirando fundo.“Sim, Irmã Amélia. Só… tentando encontrar paz.”A mais velha inclinou a cabeça, estudando-a por um momento.“Você precisa ser forte. Homens como Gabriel não têm escrúpulos. Ele está aqui para destruir tudo o que amamos. Não permita que e
O sol de Sant’Elisa brilhava intensamente naquela manhã, iluminando a cidade pacata e suas ruas movimentadas. Gabriel caminhava pelo centro, de olho nos habitantes locais que passavam por ele com olhares curiosos. Era evidente que sua presença incomodava, mas ele estava acostumado com isso. No entanto, algo o incomodava mais: Valentina.Desde que lera o relatório sobre ela, Gabriel não conseguia parar de pensar nos dois anos misteriosos de sua vida. O que acontecera antes de ela decidir se refugiar no convento? Havia uma história ali, e ele estava determinado a descobrir.Ele parou na frente de uma padaria charmosa, onde o aroma de pão fresco e café o envolveu. Dentro, para sua surpresa, lá estava Valentina. Ela estava sentada perto da janela, com um livro nas mãos e uma xícara de chá à sua frente.Por um momento, Gabriel hesitou. Observou-a em silêncio, notando como a luz do sol iluminava seu rosto sereno. Ela parecia tão distante do mundo ao seu redor, como se estivesse protegida po
Valentina acordou antes do amanhecer, como sempre fazia, mas dessa vez o peso da culpa parecia maior. Sentia-se inquieta, como se estivesse carregando um segredo proibido. Toda vez que fechava os olhos, via o rosto de Gabriel, seus olhos intensos, e ouvia sua voz provocadora.Ela tentou afastar esses pensamentos com a oração, mas as palavras pareciam vazias, como se algo dentro dela estivesse mudando. Ao sair de sua cela para ajudar nas tarefas matinais, encontrou a Madre Superiora no corredor."Valentina, está tudo bem?" perguntou a madre, com um olhar preocupado."Sim, madre. Apenas cansada," respondeu ela, evitando o olhar da superiora.Mas a verdade era outra. Algo dentro dela estava diferente, e ela não sabia como lidar com isso.Enquanto isso, Gabriel estava no café do hotel, olhando pela janela enquanto segurava uma xícara de café. Ele não conseguia tirar Valentina da cabeça. Havia algo nela que o desarmava, uma força que ele não conseguia compreender.“Gabriel, você parece dis
A manhã no convento amanheceu mais silenciosa que o habitual, como se o vento soubesse que algo estava por vir. Valentina, ajoelhada na capela, mal podia concentrar-se em suas preces. Cada palavra das orações parecia pesar, carregada pela lembrança de Gabriel — seu sorriso confiante, o olhar que parecia enxergar além da superfície e a proximidade que fazia seu coração disparar de maneira assustadora.A tranquilidade foi quebrada pelo som suave dos passos da Madre Superiora entrando no recinto.— Valentina, preciso conversar com você — disse ela, com um tom de preocupação que fez o estômago da jovem noviça se apertar.Valentina levantou-se rapidamente, ajustando o véu.— Sim, Madre.As duas caminharam até o jardim do convento, onde a Madre Superiora parou ao lado de uma pequena fonte de pedra.— Você sabe quem é Gabriel Santos? — perguntou, seus olhos fixos nos de Valentina.Valentina hesitou. Mentir não era uma opção.— Ele veio até o convento há alguns dias. Tivemos... uma conversa b
O escritório de Gabriel estava mergulhado no caos. Papéis espalhados, arquivos abertos, e uma pilha de documentos antigos sobre a mesa. Ele segurava uma folha amarelada pelo tempo, os olhos brilhando com uma mistura de excitação e frustração.— Então é isso... — murmurou para si mesmo.O documento, encontrado nos arquivos históricos da cidade, mencionava uma cláusula que poderia preservar o convento como patrimônio religioso e cultural, protegendo-o de qualquer intervenção. Mas havia um porém: a cláusula só teria efeito com a assinatura da Madre Superiora, algo que Gabriel sabia ser quase impossível de conseguir.Ele tamborilou os dedos na mesa, pensativo. Havia uma possibilidade — Valentina. Desde o primeiro encontro, ela parecia ser a chave que poderia destrancar portas no convento, talvez até no coração da Madre Superiora. Mas usá-la para isso trazia complicações que ele não queria admitir.Gabriel recostou-se na cadeira, um sorriso aparecendo no canto dos lábios. Ele sabia como jo
O dia estava nublado, como se o céu refletisse a tempestade que se formava dentro de Valentina. Desde que Gabriel lhe entregara aquele documento, ela se sentia dividida. Ele era carismático, mas também perigosamente persuasivo. Sua mente sabia que deveria manter distância, mas seu coração — ou talvez algo mais profundo — insistia em desafiá-la.Valentina caminhava pelo jardim, perdida em seus pensamentos, quando ouviu uma voz familiar.— Pensativa de novo? — Gabriel estava encostado em uma árvore, observando-a com aquele sorriso que parecia tanto um convite quanto uma armadilha.Ela parou, surpresa, mas logo recuperou a compostura. — O que está fazendo aqui, Gabriel? Este é um lugar privado.Ele deu de ombros, caminhando em sua direção. — Não sabia que jardins eram restritos. Só vim dar uma volta.— Você nunca "só vem dar uma volta". Sempre tem um motivo — respondeu ela, cruzando os braços.Ele parou a poucos passos dela, as mãos nos bolsos, mas os olhos fixos nos dela. — Talvez o
A manhã era fresca, mas Valentina sentia o peso do dia antes mesmo de ele começar. O documento que Gabriel lhe entregara estava escondido no fundo de sua gaveta, mas ocupava espaço demais em seus pensamentos. Cada vez que tentava rezar, o rosto dele surgia em sua mente, junto com a pergunta que não conseguia evitar: "Por que ele mexe tanto comigo?"Enquanto realizava suas tarefas, os olhares das outras irmãs eram difíceis de ignorar. Cochichos seguiam cada passo seu, e Valentina sabia que algo havia mudado. Até mesmo Irmã Amélia, que sempre fora sua confidente, parecia inquieta.— Valentina, precisamos conversar — disse a Madre Superiora mais tarde, com um tom severo que não permitia recusas.Valentina assentiu e seguiu a líder até o escritório. Lá dentro, o ar era ainda mais pesado.— O que está acontecendo? — perguntou Valentina, mesmo sabendo que não gostava da resposta que estava por vir.A Madre Superiora pousou uma carta sobre a mesa, sem perder tempo. — Existem rumores, minha
A noite estava fria, e Gabriel, sentado em um bar discreto na periferia da cidade, girava o copo de uísque nas mãos, perdido em pensamentos. O lugar era pequeno e vazio, exceto por ele e outro homem sentado à sua frente. Este era Raul, um amigo de longa data, alguém que conhecia o Gabriel antes de todo o poder e ambição. — Nunca imaginei que te veria assim, Gabriel — disse Raul, recostando-se na cadeira e cruzando os braços. — O que está acontecendo com você?Gabriel riu, mas era um som vazio. — Talvez eu esteja perdendo o controle.— Não, isso não é do seu feitio. Você sempre tem controle de tudo, até do que sente.Gabriel inclinou-se para frente, o rosto tenso. — É aí que está o problema, Raul. Não tenho mais controle.Raul arqueou uma sobrancelha, intrigado. — Isso tem a ver com o convento? Ou... com alguém de lá?O silêncio de Gabriel foi resposta suficiente. Raul riu, balançando a cabeça. — Então é isso. Você, Gabriel de Morais, está mexido por uma mulher.— Não é só isso. —