Giulia Ricciardi
A festa finalmente tinha terminado. Eu subi as escadas até meu quarto, meus pés descalços mal fazendo barulho no piso de madeira. A longa noite e o peso da bebida me deixavam um pouco zonza, mas era mais do que isso. Algo mais queimava em mim, algo que eu não conseguia nomear, ou talvez não quisesse.
Fechei a porta atrás de mim e encarei meu reflexo no espelho. O vestido vermelho ainda estava impecável, apesar das horas de uso. Meu cabelo, antes tão perfeitamente arrumado, agora caía em cascatas desalinhadas pelos meus ombros. Suspirei. Fui até a penteadeira, pegando um algodão e o removedor de maquiagem.
Enquanto esfregava o rosto, tentando apagar os traços da noite, uma batida baixa na porta me interrompeu.
— Entre — eu disse, sem tirar os olhos do espelho, esperando ver Francesca ou talvez até minha mãe entrando para perguntar como estava a festa.
Mas não era nenhuma delas. Era ele.
Lorenzo fechou a porta atrás de si, silenciosamente, como sempre fazia. Ele estava ainda de terno, mas com o paletó jogado sobre um braço. Os dois primeiros botões da camisa continuavam abertos, revelando aquele pedaço da tatuagem em seu peito que parecia tão proibido quanto tudo que ele representava para mim.
— Está tudo bem? — ele perguntou, a voz grave quebrando o silêncio do quarto.
Dei um pequeno sorriso.
— Eu estou ótima, Lorenzo. Apenas cansada. — Virei-me para ele, encontrando aqueles olhos intensos que pareciam despir minha alma todas as vezes que se cruzavam com os meus.
Ele hesitou por um momento, mas deu um passo à frente. Não era comum ele entrar no meu quarto, muito menos a essa hora da noite.
— Você parecia... desconfortável na festa e bebeu mais do que de costume.
— Eu sei. Mas não é nada com o que você precise se preocupar.
Silêncio. Lorenzo continuava a me encarar, e aquele olhar dele parecia penetrar muito mais fundo do que eu queria admitir. Meu coração começou a bater mais rápido. Antes que eu pudesse pensar demais, deixei escapar:
— Lorenzo, você pode me ajudar com uma coisa?
Ele franziu o cenho, mas assentiu.
— Claro.
Me levantei da penteadeira e andei até ele, enquanto olhava fixamente em seus olhos. Virei-me de costas para ele, afastando os cabelos para o lado.
— O botão do meu vestido. No pescoço. Pode abrir para mim?
A hesitação dele foi quase palpável, mas então senti seus dedos roçarem levemente a minha pele. Ele abriu o botão com cuidado, como se estivesse tocando algo que poderia quebrar a qualquer momento.
— E o zíper, também — acrescentei, a voz saindo mais baixa do que eu pretendia.
Senti o calor de suas mãos enquanto ele descia o zíper devagar, expondo cada vez mais da minha pele. Quando o zíper chegou ao final, o vestido deslizou pelo meu corpo, e eu não o segurei, caindo no chão em um círculo de tecido vermelho aos meus pés.
Eu estava de costas para ele ainda, vestindo apenas uma calcinha preta de renda. Por um momento, ninguém se moveu, o ar entre nós carregado com uma tensão quase insuportável.
Virei-me de frente para ele, erguendo o olhar para encontrar o dele. Lorenzo não desviou os olhos, mas o que vi no rosto dele era algo que eu nunca tinha visto antes: desejo puro, cru e incontrolável.
Seus olhos percorreram meu corpo inteiro, demorando-se em cada curva, cada centímetro de pele exposta. Meu coração batia tão forte que eu podia ouvir. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele deu um passo à frente e me puxou para ele.
Sua boca encontrou a minha com uma intensidade que me fez perder o fôlego. Suas mãos seguraram minha cintura, os dedos pressionando minha pele com força, enquanto ele explorava cada pedaço de mim.
Minhas mãos subiram instintivamente, agarrando os cabelos dele, puxando-o para mais perto. Lorenzo desceu as mãos até meu quadril, segurando-o com força antes de deslizar mais para baixo, apertando minhas nádegas de uma maneira que fez meu corpo inteiro se acender.
O calor entre nós era quase insuportável, e eu sabia que estava prestes a cruzar uma linha da qual nunca mais poderia voltar.
E então acordei.
Maldição!
Sentei-me na cama, ofegante, meu corpo ainda queimando com as sensações do sonho. Olhei ao redor, reconhecendo meu quarto iluminado pela luz suave do sol da manhã. Passei as mãos pelo rosto, tentando me recompor.
Foi só um sonho. Só um maldito sonho erótic0.
Mas meu coração ainda estava acelerado, e o calor em meu corpo ainda era real. Lorenzo... ele estava me destruindo de uma maneira que ele nunca saberia.
Deitei-me de novo, encarando o teto. Como eu ia encará-lo agora?
Levantei-me da cama ainda com o sonho fervendo em minha mente. A imagem de Lorenzo, seus olhos queimando de desejo enquanto suas mãos percorriam meu corpo, era como uma tatuagem gravada na minha pele. Suspirei pesadamente e fui direto para o banheiro.
De frente para o espelho, encarei meu reflexo. Minhas bochechas ainda estavam ruborizadas, meu coração batendo mais rápido do que deveria. Liguei o chuveiro, ajustando a água para a temperatura mais fria possível. Precisava esfriar a cabeça.
Deixei a água gelada cair sobre meu corpo, fechando os olhos. Mas isso não ajudou. Cada gota que escorria pela minha pele parecia despertar ainda mais as sensações que o sonho tinha deixado. Ainda podia sentir os dedos dele no meu quadril, o peso do olhar dele queimando cada parte de mim.
— Droga, Lorenzo... — murmurei para mim mesma, esfregando o rosto como se pudesse apagar as lembranças.
Depois de longos minutos no banho, finalmente senti minha respiração voltar ao normal. Enrolei-me em uma toalha, tentando não deixar minha mente vagar de novo. Escolhi uma roupa confortável: uma calça jeans clara, uma camiseta branca e um suéter cinza leve. Deixei o cabelo solto, ainda úmido, e saí do quarto.
No andar de baixo, a família já estava reunida à mesa de café da manhã. Minha mãe, como sempre, ocupava-se em servir a todos, enquanto papai lia o jornal com atenção. Marco e Francesca conversavam animadamente sobre algo que parecia ser o evento da noite anterior.
— Bom dia, dorminhoca — disse Francesca, lançando-me um sorriso.
— Bom dia — respondi, sentando-me à mesa e pegando uma xícara de café.
Eles continuaram conversando, mas eu mal prestei atenção. Minhas mãos seguravam a xícara com força enquanto minha mente era invadida por flashes do sonho e pelas palavras do meu pai na noite passada. Casamento arranjado, alianças... Eu sabia que isso fazia parte do mundo dele, do nosso mundo. Mas a ideia de ser uma peça em um jogo de poder me sufocava.
— Giulia, preciso falar com você. — A voz de papai cortou meus pensamentos.
Levantei os olhos para ele. Domenico Ricciardi não era um homem que aceitava ser ignorado.
— Quero que você conheça alguém — ele disse, direto ao ponto.
— Conheça quem? — perguntei, embora já soubesse a resposta.
— O filho de um dos nossos aliados. Ele tem uma posição respeitável, é um homem digno e...
— Não, obrigada — interrompi, voltando a olhar para o café.
Ele fechou o jornal e me encarou.
— Não é uma escolha, Giulia. Ele virá amanhã para conhecê-la.
Respirei fundo, tentando manter a calma.
— Não vou conhecê-lo — retruquei, olhando diretamente nos olhos dele.
— Giulia! Escute seu pai, ele só quer o seu bem — minha mãe me repreendeu e eu respirei fundo, para não respondê-la.
— Você vai conhecer ele sim, Giulia. É hora de começar a pensar no futuro, e um casamento...
— Um casamento que eu não quero — cortei, minha voz saindo mais alta do que eu pretendia.
Antes que ele pudesse responder, levantei-me da mesa.
— Estou de saída, tenham um bom dia!
Peguei uma maçã na mesa e saí sem olhar para trás. Ouvi minha mãe dizer algo baixo, mas não consegui captar. Meu peito estava apertado, e eu precisava de ar.
Caminhei rapidamente até a garagem, destranquei meu carro e entrei. Liguei o motor e saí pelo longo caminho que levava ao portão principal. Quando finalmente estava na estrada, permiti que algumas lágrimas escapassem.
Eu amava minha família. Amava meu pai, minha mãe, meus irmãos. Mas, às vezes, queria não fazer parte daquele mundo, daquela prisão dourada onde cada decisão minha parecia pertencer a outra pessoa.
Dirigi em silêncio pelas ruas de Milão, deixando os pensamentos se dissiparem conforme as paisagens familiares passavam pela janela. Meu destino era o mesmo de todas as segundas: o curso de pintura.
Pintar era meu refúgio. No ateliê, ninguém era a filha do mafioso Domenico Ricciardi. Ninguém me olhava como uma peça valiosa em um tabuleiro de alianças. Eu era apenas Giulia, uma mulher com uma tela em branco e uma alma carregada de emoções.
Estacionei o carro em frente ao prédio e respirei fundo antes de sair. Precisava me recompor, pelo menos por algumas horas. Ao entrar no ateliê, o cheiro de tinta e terebintina me acolheu como um velho amigo. Sorri pela primeira vez naquela manhã.
Pintar não resolveria meus problemas. Não me livraria da pressão do meu pai ou do peso do meu amor impossível por Lorenzo. Mas, por enquanto, seria o suficiente.
Lorenzo SalvatoreCheguei ao portão da casa da minha mãe e já sentia a diferença no ar. Não era apenas pelo bairro simples onde ela morava, longe das mansões e do luxo da família Ricciardi. Era o cheiro de café fresco, o som de risadas ao longe, a ausência do peso que carregava nos ombros todos os dias.Estacionei meu carro ao lado da calçada, um sedã preto discreto. Desci, observando a fachada modesta da casa. A pintura branca estava um pouco desgastada, mas minha mãe insistia que não queria reformas. "Está boa do jeito que está, Lorenzo. Use seu dinheiro para a educação da sua irmã, não com isso."Abri a porta da frente, e o aroma de café invadiu minhas narinas imediatamente.— Lorenzo! — Minha mãe virou-se da pia com um sorriso caloroso no rosto. Seus cabelos grisalhos estavam presos em um coque frouxo, e ela usava o avental que eu mesmo tinha comprado para ela anos atrás.Antes que eu pudesse responder, senti um par de braços se jogar contra mim. Minha irmã, Anna, me abraçou com f
Giulia RicciardiA luz dourada do fim da tarde atravessava as janelas do meu quarto, iluminando o cavalete à minha frente. Minha tela quase terminada retratava um campo florido que eu havia visto em um verão distante, quando ainda era criança. Pintar era o meu refúgio, um dos poucos momentos em que eu sentia que podia ser eu mesma, sem as amarras da vida que meu sobrenome impunha.Enquanto passava o pincel pelos últimos detalhes de uma flor, ouvi a porta do quarto se abrir. Francesca entrou sem bater, como sempre fazia, segurando uma maçã meio comida. Seus longos cabelos estavam presos em um rabo de cavalo despretensioso, e seus olhos brilhavam com uma curiosidade irritante.— Giulia, você vai mesmo fazer essa cara de quem comeu e não gostou para o rapaz de amanhã? — ela perguntou, encostando-se na porta.Revirei os olhos, ainda focada no quadro.— Não estou com paciência para isso agora, Francesca.Ela se aproximou, sentando-se na beira da cama, e me olhou com aquele ar travesso que
Giulia RicciardiO som de batidas suaves na porta me tirou do sono. Com esforço, abri os olhos, vendo a luz da manhã já entrando pelas cortinas entreabertas.— Senhorita Giulia — chamou a voz de Sílvia, uma das empregadas da casa. — Seu pai pediu para avisar que a senhorita deve descer em dez minutos para o café da manhã.Suspirei profundamente, sentindo o peso da obrigação logo ao acordar.— Obrigada, Sílvia. Já estou descendo — respondi, minha voz ainda rouca de sono.Levantei-me, sentindo a preguiça do corpo após a noite anterior. Fui direto para o banheiro, onde tomei um banho rápido e frio para despertar de vez. Enquanto a água escorria pelo meu corpo, meus pensamentos vagavam para o que me esperava no dia. A aula do curso de moda começaria hoje, e eu estava animada. Era uma pequena fuga para um mundo só meu, ainda que temporária.Depois do banho, escolhi uma roupa prática: uma calça jeans justa, uma regata branca e uma jaqueta jeans que completava o visual. Coloquei alguns acess
Lorenzo SalvatoreUma semana depois...A sala de reuniões da mansão Ricciardi estava silenciosa, exceto pelo som das vozes firmes de meus homens enquanto discutimos os detalhes finais da segurança para a viagem. Uma grande movimentação como essa exigia planejamento impecável, e eu não tolerava falhas. A fazenda da família Ricciardi, localizada em uma região isolada do interior, era grandiosa e cheia de história, mas também um alvo perfeito para qualquer um que quisesse causar problemas.Minha responsabilidade era garantir que nada acontecesse.— Quero que as escoltas sejam divididas em dois grupos — expliquei, apontando para o mapa sobre a mesa. — Um à frente do comboio, monitorando qualquer movimento suspeito na estrada, e outro na retaguarda, para evitar surpresas.Os homens assentiram, absorvendo cada instrução. Domenico estava sentado à cabeceira da mesa, silencioso, mas com o olhar atento. Eu sabia que ele confiava plenamente em mim, mas ainda assim, era impossível ignorar a pres
Giulia Ricciardi Era impossível conter minha animação enquanto colocava as últimas peças na mala. Um casamento na fazenda da família significava uma pausa na rotina opressiva da casa em Milão. Alice, minha prima, sempre foi como uma irmã mais velha para mim, e agora que ela iria se casar, eu estava emocionada em fazer parte desse momento tão especial. Os vestidos das madrinhas estavam impecáveis. Meu tio, Antônio, havia contratado um estilista renomado para cuidar de tudo, e o resultado era deslumbrante. Os vestidos verde musgo, que combinavam perfeitamente com o cenário da fazenda, tinham cortes elegantes e delicados, destacando a beleza de cada uma de nós. Só de imaginar a cerimônia, cercada pela natureza, com Alice radiante em seu vestido de noiva, meu coração se enchia de felicidade. Depois de arrumar minha mala com roupas para os quatro dias, itens de higiene, sapatos e, claro, o vestido de madrinha, fui tomar um banho rápido. A água quente ajudou a relaxar meus músculos, mas
Lorenzo Salvatore Assim que desci do quarto onde havia deixado minhas coisas, fui direto procurar Luis e Alice. Eles estavam no grande salão principal, cercados por familiares e amigos, todos oferecendo parabéns e felicitações pelo casamento. Esperei um momento apropriado antes de me aproximar. — Lorenzo! — Luis me avistou primeiro, abrindo um sorriso largo enquanto se aproximava para me cumprimentar. — Que bom que veio, irmão. — Obrigado pelo convite, Luis. — Apertei sua mão firmemente antes de dar um leve abraço. — Alice, meus parabéns. Você está radiante. — Obrigada, Lorenzo. — Alice respondeu com um sorriso tímido, segurando a mão de Luis. — E obrigado por estar aqui. Luis me olhou com curiosidade, inclinando levemente a cabeça. — E sua mãe e sua irmã? Por que não as trouxe? — A Anna foi para um acampamento com a escola — expliquei, lembrando do entusiasmo dela ao falar sobre a viagem. — E minha mãe está cheia de encomendas de costura. Ela disse que mandará presentes depois
Giulia RicciardiAcordei com o som das risadas e vozes animadas de Francesca e Liz. Ainda meio grogue, demorei alguns segundos para me situar. O quarto estava iluminado pela luz da manhã que atravessava as cortinas, e as duas já estavam de pé, aparentemente discutindo o que vestir para o evento de hoje.— Finalmente! Achei que você não ia levantar nunca. — Francesca provocou, olhando para mim pelo espelho enquanto arrumava os cabelos.Liz virou-se com um sorriso caloroso.— Bom dia, dorminhoca!— Bom dia, meninas. — Respondi, esfregando os olhos. — Parece que vocês já estão animadas para o dia.— Claro que estamos! — Liz respondeu, rindo. — Hoje é o grande dia das mulheres.Lembrei-me do que Alice tinha nos contado na noite anterior: um amigo secreto “adulto”, algo ousado e divertido que ela havia organizado para nós. A ideia era que cada uma levasse um presente que pudesse ser usado por qualquer uma das participantes, sem saber para quem o presente seria. Confesso que a ideia me deix
Lorenzo SalvatoreA sala de jogos estava cheia de fumaça, risadas e o som inconfundível de copos sendo colocados na mesa com força. Era um ambiente tipicamente masculino, recheado de camaradagem e rivalidade saudável. Eu estava ali, com o controle na mão, focado na partida de videogame. A tela brilhava com intensidade enquanto Marco e eu esmagávamos Luis e Giovanni em uma partida intensa de futebol virtual.— Anda, Luis! Vai deixar o moleque passar por você assim? — gritou Stefan, rindo, enquanto tomava um gole de sua bebida e assistia ao massacre que acontecia na tela.— Ele tem sorte! Só isso! — Luis respondeu, a voz embargada pela frustração.— Sorte? É habilidade, meu caro. Aprende com os melhores — provoquei, lançando um olhar de canto para ele, enquanto Marco ria alto ao meu lado.Luis tentou recuperar o controle da situação, mas Marco marcou mais um gol, arrancando um coro de zoações dos outros homens na sala. Era um espaço de relaxamento raro, onde, apesar das tensões que todo