Quarta-feira, 03 de outubro de 2018.
7h45 – Universidade de Baltimore
Baltimore – EUA.
“Foi horrível acordar hoje de manhã.
Não que os cobertores pesassem muito,
mas era como se eu estivesse enterrada.”
Diário de Olga.
Na manhã seguinte, sinto-me exausta. Estou sem energia e prestes a cair no choro a qualquer momento. Meus olhos estão vermelhos e inchados.
Minha pele parece estranha no meu corpo. Quase como se estivesse apertada demais e precisasse ser arrancada. Durante anos eu me concentrei em matar aula, e hoje eu lutei para conseguir vir, mesmo com esse estado de espírito. O que há de errado comigo?
Domingo, 14 de março de 2018.4h11 – Gilmor Homes, Sandtown Baltimore, EUA.Eu podia ouvir o barulho da chuva fraca do lado de fora. Ela batia contra a janela de um jeito melancólico. Olhei a hora no celular ao lado da cama e vi que passava das quatro da manhã, mas alguma coisa me mantinha acordada. A sensação de saudade de algo que nunca chegou a ser meu. Não sabia o que era, mas aquilo me perturbava havia semanas, como se me preparasse para alguma coisa que estava por vir. A antecipação de um vazio futuro.Espreguicei na cama, me esticando o máximo que consegui. Olhando para o vidro sem cortina, a sombra das gotas de chuva que desciam pela janela era hipnotizante. Eu seria capaz de passar horas encarando aquilo sem me cansar. Olhei novamente para o celular. Quatro e meia. Sentei na cama, colocando os p&e
2 anos atrás:Sábado, 28 de novembro de 2016.14h21 – Sandtown-WinchesterBaltimore, EUA.Não tem nada melhor do que a sensação de flutuar. Ou de o calor de uma mão no meu rosto, alisando meu cabelo. Se pelo menos a vida pudesse ser assim para sempre... Eu poderia viver para sempre aqui, no porão da casa da tia do Jeremy. Só paredes. Nenhuma janela. O lado de fora fica só lá fora. E aqui dentro: Jeremy: o garoto tímido que se esconde do mundo. Thomas: um cara cheio de tatuagens que assusta os normais e atrai os livres. E eu: a poeta na minha mente quando estou chapada. Vim para essa casa por segurança. Mas é só por uma semana. Eles vieram porque o s
Sábado, 28 de novembro de 2016.14h23 – Calhoun St - SandtownBaltimore, EUA.— Eu usava flores no cabelo — digo. Minha voz soa bizarra e distante. E falo de novo só para ouvir a estranheza. — Muitas. — Adoro quando ela faz isso — Thomas diz para Jeremy. Nós três relaxamos na cama grande do porão. Thomas, Jeremy e eu nos tocamos. Só nos tocamos quando estamos chapados ou bêbados ou as duas coisas. Thomas e Jeremy são melhores amigos desde a infância. E podemos fazer isso porque não conta nessas situações. Nada importa quando você se sente sem peso.Thomy passa a mão no meu cabelo de novo. O toque delicado me faz fechar os olhos e querer dormir para sempre. Um verdadeiro êxtase.
Quarta-feira, 12 de setembro de 2018. Quando volto para o abrigo, Lauren - uma garota da minha idade que ainda está no ensino médio e mora conosco - está se arrumando para sair, o que presumo ser algum encontro pago, que ela faz toda noite. Vou para meu quarto e tento estudar, mas com meus pensamentos inquietos sobre um certo garoto, ligo a pequena tv e procuro um filme.— Amy! Estou indo para uma festa — Lauren anuncia, parada na porta do quarto. — Queria muito que você fosse. Juro que não vamos passar a noite lá dessa vez. Vamos ficar só um pouquinho. Se você não for, vou ficar chateada! — Lauren insiste e eu dou risada. Ela continua falando enquanto arruma os cabelos e muda de roupa pelo menos três vezes antes de se decidir por um vestidinho verde que deixa pouquíssimo espaço para a imaginação. A cor forte ca
Mais tarde, decido pesquisar sobre garotas desaparecidas. Vou até à biblioteca pública do outro lado da cidade para poder usar a internet e ver os jornais de dias anteriores.Diante de mim, está uma pilha de impressões de artigos em jornais sobre meninas desaparecidas no estado de Maryland nos últimos doze meses.Dois meses atrás, The Daily Record havia divulgado uma matéria de capa a respeito de uma garota que havia desaparecido do campus da faculdade. A fotografia estava escura demais para que as pessoas tivessem uma ideia de como ela era, mas a descrição dizia que era morena e bonita.The Baltimore Sun: outra garota desaparecida, vista pela última vez em um cinema. Descrita como atlética e atraente. A matéria seguinte era do Baltimore Times: Uma garota desaparecida vista pela última vez perto da propriedade de Highland. Alta, c
Volto ao bar e fico perto o suficiente do Top Gun, para que ele entenda a mensagem. — Posso comprar uma bebida para você? — diz. De perto, ele está mais para o personagem de Anthony Edwards que para Tom Cruise, mas já não me importo com essas coisas. Sorrio de modo doce. — Adoro o Moscow Mule. — Não adoro não, mas a bebida com vodca, refrigerante de gengibre e limão custa pouco e é um jeito mais eficiente de se embebedar do que com as cervejas baratas, quando eu tinha que pagar pelas próprias bebidas. — Adoro seu jeito de dançar. — Top Gun diz. Bebo meu drink tu
Sim. Foi tudo o que ele disse, mas foi o suficiente para me fazer sorrir. Pelo menos eu ainda poderei vê-lo hoje, mesmo que ele esteja estranho. Chego à cafeteria antes dele. Eu estava prestes a mandar outra mensagem para confirmar, quando o vejo chegar. Não consigo evitar o sorriso. — Josh! — Amélia! — diz, imitando meu tom animado antes de sentar na cadeira à minha frente. — Você está muito animada — observa ele. — É a pesquisa — debocho e reviro os olhos, fazendo-o sorrir. Josh parece estar com um humor muito melhor do que antes. Ele queria comer alguma coisa, foi at&eac
Quarta-feira, 19 de setembro de 2018. 15h09 – Universidade de Baltimore, Baltimore – EUA.Os esquilos do campus são muito domésticos; chegam a ser abusados. Não importa o que você esteja comendo, eles sobem em você e tentam tirar a comida da sua mão. Nas quartas e sextas-feiras, eu tenho vinte e cinco minutos entre Literatura e Escrita de Ficção, e, nos últimos dias, eu vinha matando o tempo sentada aqui, na grama, à sombra, aos fundos do prédio da aula de Inglês.Não há com quem se preocupar. Ninguém além dos esquilos. Confiro as mensagens de texto, ainda que o celular não tenha vibrado. Eu não conversei com Josh desde segunda feira e ele não fez nenhum esforço para falar comigo.Eu o sinto em pé ao meu lado quando vejo que o esquilo leva um