Capítulo 5

        Volto ao bar e fico perto o suficiente do Top Gun, para que ele entenda a mensagem.

            — Posso comprar uma bebida para você? — diz. De perto, ele está mais para o personagem de Anthony Edwards que para Tom Cruise, mas já não me importo com essas coisas. Sorrio de modo doce.

            — Adoro o Moscow Mule. — Não adoro não, mas a bebida com vodca, refrigerante de gengibre e limão custa pouco e é um jeito mais eficiente de se embebedar do que com as cervejas baratas, quando eu tinha que pagar pelas próprias bebidas.

            — Adoro seu jeito de dançar. — Top Gun diz.

            Bebo meu drink tudo de uma vez.

— Vamos.

            Ele me segue até a pista, onde se mostra um dançarino ainda pior do que eu. Balançava de um lado a outro. Mantinha os cotovelos flexionados, os dedos estalando. Às vezes, ele olhava para baixo e para trás, como um homem que tomava cuidado para não pisar em cocô de cachorro.

            Pelo menos, me deixei levar, estendendo os braços, balançando o quadril. Top Gun diminuiu o ritmo quando começou a tocar algo mais lento.

Fechei os olhos e tentei não pensar em Josh. Não sabia se ele gostava de dançar. Talvez ele nem gostasse de sair à noite. Ou beber. Droga, eu não sabia nada sobre ele.

            Eu não posso mais ficar aqui. O aperto da pista de dança está demais. As pessoas me sufocam. Passo por elas. Eu preciso de uma bebida. Encontro a bolsa presa no banco do bar onde a havia deixado. Procuro por dinheiro em meio à escova de dente, escova de cabelos, meus pertences e a troca de roupa íntima que eu trouxe para o caso de não voltar para o abrigo essa noite. Tenho certeza de que trouxe uns trocados, mas não consigo achar.

Até que um cara mais velho coloca um segundo Moscow Mule no balcão à minha frente. O gelo já derreteu. O líquido passou de dourado à canela. Bebo assim mesmo. A vodca chega ao fundo de minha garganta como um martelo. Engasgo.

            — Hey — Lauren aparece e dá tapas em minhas costas até eu parar de tossir. — Está bem?

            — Que horas são? — pergunto. Lauren olha no relógio da parede.

            — Exatamente 22h38.

            Eu estava dançando por menos de uma hora. Pareceu uma eternidade.

            — Quero voltar.

            — Por que não espera mais um pouco?

            — Não, minha cabeça está me matando.

            — Foi você quem disse que não deveríamos sair sozinhas.

            — Só se estiver bêbada, e não estou.

Na verdade, eu me sinto meio zonza, mas provavelmente porque meu coração partido está no fundo de meu estômago.

— Obrigada pela companhia, Lau. Foi muito importante para mim. Sinto muito por seu amigo não ter aparecido.

            — Não achei que ele fosse vir. Já achei outro cara. — Lauren olha para mim como se eu estivesse agindo de modo esquisito. Talvez eu esteja. — Tem certeza de que está bem?

            — Sim, obrigada. É uma boa amiga.

            — Oh, que meiga. — Lauren passa a mão no meu ombro. — Também amo você, amiga.

Não ama, não.

            A pista ainda está lotada de dançarinos e estudantes que se arrependerão de ter estado aqui quando o despertador tocar de manhã. E eu tenho aula no dia seguinte. Mas eu só queria ficar no meu quart, choramingando de pijama, abraçada a todos os gatos e cachorros que achar na rua, assistindo a novelas o dia todo.

            Abro a porta pesada de metal. O ar da noite é a sensação mais agradável que eu já senti. A cada passo, sinto os pulmões se abrirem. Minha cabeça roda com todo o ar fresco. Estendo os braços ao descer pela calçada vazia, aproveitando a noite, aproveitando a claridade que a lua traz.

            Lembro-me das garotas desaparecidas. Quem será a próxima? Alguma caloura bêbada? Marilyn Carter, que tinha vomitado no banheiro do bar? Alguém deveria levá-la para casa.

            Tropeço numa parte quebrada da calçada e quase caio. De repente, sinto-me muito zonza. Meu estômago embrulha. Talvez a vodca esteja fazendo efeito. Ou o refrigerante de gengibre, que devia estar sem gás. Isso não deixaria ninguém enjoado, mas eu estou enjoada. Apoio-me na parede e sinto um jato de líquido quente sair da boca. Cubro o rosto com as mãos. Tem algo errado. Tento me situar. Meus joelhos fraquejam. Recosto-me numa lata de lixo fedorenta. Tento ler a placa da rua, mas meus olhos bagunçam as palavras em manchas brancas no verde. O abrigo não deve estar longe. Afasto-me da lata de lixo. Tento focar na calçada à minha frente, mas cada passo é um esforço. Tenho que me recostar num carro antigo para recuperar o fôlego.

            — Você parece perdida. — Ouço uma voz dizer. Viro-me rapidamente. Tem uma van branca estacionada no meio fio. A porta lateral está aberta, e vejo um homem nas sombras. Eu o conheço. Já vi seu rosto antes, talvez várias vezes antes. Hoje? No centro da cidade? No campus? A informação está muito próxima, mas eu não consigo lembrar.

            Dou um passo para trás e ele caminha em minha direção. Ando até me encostar na lixeira novamente.

— Você não bebeu tudo? — diz ele. — Porque já era para você estar desacordada.

— Top Gun? — solto. — Por favor... não.

            Sinto o perigo na minha frente, o que me faz ficar em alerta. Espero o cara chegar mais perto, e percebo que ele não está armado. Então chuto bem no meio de suas pernas, pegando-o desprevenido. Olho para a lata de lixo e tiro dali uma garrafa de vidro e a quebro na cabeça dele. E depois corro. Corro sem parar.

Sábado, 16 de julho de 2018.

16h37 – The Crown - Remington

Baltimore, EUA.

Os nervos vibram no meu estômago, e respiro fundo várias vezes. Não importa quantas vezes eu inspire, ainda tenho dificuldade para encher os pulmões de ar. Por favor, Deus, por favor, faça com que aquele babaca tenha ido embora. E, por favor, por favor, faça com que o Thomas concorde com o meu plano maluco quando eu aparecer com a Olga.

Pensei em contar antes para ele sobre o meu plano, mas no fim, eu sabia que ele não ia concordar em levar minha amiga junto. Ele a culpa pelos problemas da minha vida, mas eu conheço o Thomy. Quando eu aparecer com ela, implorando para ir embora, ele não vai me deixar na mão. Ele vai levar nós duas.

O bar The Crown está vazio, mas daqui uma ou duas horas vai estar cheio. Mesmo à luz do dia, o lugar é escuro como uma masmorra. Usando os jeans e a camisa de flanela de sempre, James está sentado no bar e inclinado sobre um notebook. Pelo canto do olho, ele me vê.

— Soube que sua amiga está com Jk.

— É — respondo.

Ele dá um gole na sua cerveja.

— Sinto muito, garota.

— Como ela está? — Minha boca está seca, e preciso de toda a força que tenho para agir como se a resposta dele não me importasse.

— Quer saber mesmo?

Não. Não quero.

— Preciso encontrá-la.

Ele fecha o notebook.

— Volta para o lugar de onde você veio garota. Qualquer lugar é melhor que aqui.

Segunda-feira, 17 de setembro de 2018.

10h15 – Universidade de Baltimore,

Baltimore – EUA.

            As primeiras três aulas passaram rápido, o que foi um alívio, já que eu não fiz amizades nessa turma e Josh não faz essa aula comigo. Eu estava ansiosa para ir comer alguma coisa e conversar com ele. Estar com ele me faz esquecer os problemas.

Quero esquecer o que pesquisei esse final de semana. E o que aconteceu ontem à noite. Porque, se eu contar que estava bêbada, serei a culpada. Um cara me atacou no meio da noite, e eu estava sozinha e bêbada. Ah, sem falar na roupa que eu estava vestindo. Então, qual o sentido de falar sobre isso, se vão me culpar no final?

            Sou a primeira a sair da sala. Chego no refeitório e não o vejo. Depois de ficar na fila sozinha e pegar meu lanche, relutantemente me viro para procurar uma mesa. Mesmo sabendo que Josh não está aqui, olho ao redor procurando por ele. Fico desapontada quando não o encontro.

            Eu sei que ele está comendo sozinho na biblioteca, em sua pequena caverna de livros. Pensar nele lá em cima sozinho, só me faz querer sair da mesa para encontrá-lo. Mas eu não vou. Eu queria conversar sobre a pesquisa que precisamos fazer em dupla, mas marcamos para amanhã, então vou ficar na minha. Eu não tenho certeza se ele quer me ver, para ser honesta. Talvez ele tenha escolhido sentar-se lá para poder ficar sozinho e eu só estarei invadindo seu espaço. Eu não quero me empurrar para a vida dele.

            O resto do dia passa sem qualquer sinal de Josh. Por que estou me preocupando? Ele claramente não se importa comigo e muito menos quer ser meu amigo.

***

Quando acordo na manhã seguinte, sinto como se não tivesse dormido. A única motivação que tive para levantar da cama foi o fato de que eu veria Josh na primeira aula e lembrei que marcamos de nos encontrar depois, para estudarmos juntos.

            Quando chego na sala e sento ao lado de Josh, ele mal diz uma palavra para mim. Ele apenas murmura um "oi" antes de voltar para o livro que está lendo. Quando faço perguntas, ele simplesmente balança a cabeça com sim ou não, e ocasionalmente resmunga uma resposta.

            No final da aula, sinto-me extremamente desanimada por não termos tido mais interação. E ele está fora da porta antes que eu possa perceber e muito menos confirmar nosso encontro mais tarde. No almoço, mais uma vez, sento sozinha.

Mais tarde, eu precisava ter certeza de que ainda iríamos nos encontrar, então tiro meu celular do bolso e escrevo uma mensagem para ele.

“Oi Josh, só queria saber se ainda vamos nos encontrar depois da aula?”

            Não tão pacientemente, olho para o meu telefone esperando que ele responda. No entanto, quando o almoço termina, não recebo nenhuma resposta. Só na metade da última aula que sinto meu celular vibrar no bolso. Josh finalmente respondeu.

“Sim”

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