NAYOLE AKELLO Olhei pela janela e a chuva caía com força, batendo nas vidraças com um ritmo quase hipnótico. Levantei-me da cama, sentindo cada movimento como se um peso invisível estivesse grudado em meus ombros. Após um breve momento de hesitação, decidi que precisava de algo para me reanimar e fui em direção à cozinha.Duas semanas se passaram desde que cheguei aqui e a sensação de que o tempo deslizava entre meus dedos, como areia numa praia deserta, tornou-se insuportável. O verão se despediu, dando lugar ao outono, e eu me encontrava em uma batalha interna, lutando para entender o que estava acontecendo dentro de mim.Os passos silenciosos pelo corredor pareciam ecoar em um vazio que só crescia. Cada batida do meu coração ressoava, e eu mal podia concentrar-me na tarefa simples de encher uma garrafa de água. Enquanto esperava a torneira encher, percebi que minha mente divagava, viajando até ele. Sua presença, sombria e cheia de enigmas, havia se infiltrado nos meus pensamentos,
00 NAYOLE AKELLOFalta menos de uma hora para a minha entrevista de emprego, que na verdade é um teste para um comercial. Estou muito ansiosa e nervosa, muitas emoções para um dia só. Simba, meu noivo saiu muito cedo antes mesmo eu despertar. Olho para o relógio na paredes amarela a direita e quase infarto. — Ai! Droga. Vou me atrasar. – Praguejo em mil idiomas, que não sei falar enquanto pego minha bolsa e saio a correr do apartamento do de Simba. Se não fosse pela insistência dele, provavelmente não estaria nesta situação. Simba não gostou muito da ideia quando apresentei para ele e tenho quase a certeza de que fez de propósito. Mas fazer o que? É assim que homens apaixonado agem na tem muito o que falar. Já na portaria, cumprimento o senhor Romeu, ele sorri para mim e faço o mesmo. O carro de Emanuela, esta estacionando um pouco distande da portaria do prédio. Ela bosina fazendo correr ate ela, entro no corro e olhos para ela que esta com o rosto tranco e uma so
1 NAYOLE AKELLO Olho para a janela pensativa, não sei de que forma irei convencer Simba da ideia de aceitar gravar o comercial, isso seria muito bom para nós dois principalmente na questão financeira. Simba e eu somos de Namíbia, dois miúdos imaturos que queriam mudar de vida, foi isso que os pais deles disseram quando ele contou sobre a viagem. Embora dona Luciana e senhor João fossem uns bons pais para ele, nunca aceitaram a ideia do filho mudar de país ainda mais Europeu. Quando Simba e eu nos conhecemos éramos adolescentes ele estava nos seus dezassete anos e eu quinze. Fomos grandes amigos antes de tudo isso se transformar em um romance, estudavamos na mesma escola, ele é vem de uma boa família com uma condição financeira estável e eu bem... Eu era só uma rapariga que fazia de tudo para sobreviver. Hoje com vinte e quatro anos e vinte e seis nos tornamos noivos e realizamos o sonho de vir para cá. Os anos não tem sido fácil, ele trabalha em dois empregos para no
2 NAYOLE Não falei com Simba desde o ocorrido, estava completamente embriagada de medo e de tristeza, ele tentou falar comigo durante a noite, porém eu não deixei. Fiquei decepcionada e magoada, nunca pensei que ele fosse levantar sua mão para mim um dia. As lágrimas escorriam do meu rosto ao lembrar da cena. Eu sei que devia ter chegado cedo ontem, porém isso não justificava a agressão física. Estou consciente de que ele talvez não tenha feito por mal, entretanto não posso tolerar isso. No quarto de banho, olho a minha imagem, a marca do tapa ainda estava lá teria que fazer muito esforço para esconder isso. Suspirei fundo, só queria que isso tudo fosse um sonho, um sonho ruim que a qualquer momento poderia acordar. Sai do meus decênios com uma batida fraca na porta, e em seguida a voz de Simba chamando por mim.— Amor. Sou eu! Por favor vamos conversar. — Não respondi, nada, não queria vê-lo, estou com medo e não sei se ele vai voltar a ser agressivo comigo. — P
3Atenção Atenção:capítulo contém informação sobre agressão física. O vapor ainda saía debaixo da porta do quarto de banho, criando uma névoa que parecia carregar o peso das nossas discussões passadas. Eu me aproximei, a mão trêmula estendida em direção à maçaneta. Havia uma hesitação em meus movimentos, um medo que me fazia questionar se eu realmente tinha o direito de exigir mais, de querer mais.- Simba. - comecei, minha voz vacilante, mas mais firme a cada palavra. - nós precisamos conversar.Ele emergiu, envolto em uma toalha, com gotículas de água ainda percorrendo seu torso definido. Seu olhar era de confusão, mas logo se transformou em irritação quando percebeu o tom da minha voz.- O que agora? - ele perguntou, a impaciência evidente em cada sílaba. Eu engoli em seco, sentindo o clima ficar pesada. - Não podemos continuar assim. Eu me sinto sufocada, controlada. Eu preciso de espaço, de liberdade. Preciso respirar sem sentir que estou te desapontando- Simba riu, um som que
4 NAYOLLE AKELLO O cheiro de pão fresco era convidativo, mas eu não sentia vontade nenhuma de comer. A mesa estava posta com um café fumegante, pães quentinhos e frutas coloridas, mas tudo aquilo parecia uma cena pintada, um cenário de filme que eu não fazia parte. Manuela, com sua energia contagiante e jeito protetor, tentou mais uma vez me convencer a comer.— Ei! — chamou ela, com um olhar determinado, como se eu pudesse ouvir suas palavras. — Você precisa comer, aquele trapo de homem não merece seu sofrimento, amiga.Apenas balancei a cabeça, reprimi a sensação de que a resposta não era uma resistência, mas sim a conclusão da minha alma, silenciada por muito tempo. O peso do meu passado ainda pairava sobre mim, feito uma nuvem escura pronta para despencar.Manuela continuava ali, alinhando os pratos na mesa, seus movimentos eram rápidos e decididos, como se estivesse em um combate contra a minha dor. O jeito que ela ajeitava os talheres, com pequenas batidinhas nas bordas, pareci
5Nayole AKELLO Três dias que se sucederam aoacontecimento do meu rompimento com Simba, os dias têm sido bons para mim, Manuela tem feito de tudo para me ajudar a não entrar numa depressão social. Agora cá estou em frente a uma enorme casa que fica no meio do nada para um entrevista. É isso minha vida é uma maravilha. Quando soube dessa entrevista no jornal lia não perdi tempo e liguei rapidamente para eles. Sabia que um dia o hábito de ler jornais iria me ser útil. Quem não ficou muito feliz com isso foi Manu, pois seu medo era de que encontrasse Simba no caminho e me fizesse algum, entretanto não podia viver a minha vida toda com medo dele. Algum dia teria que sair de casa. Enquanto eu aguardava que os grandes portões se abrissem e eu entrasse naquela casa imponente, não pude deixar de sentir um misto de ansiedade e curiosidade e uma grande sensação tomou conta de mim, é como se já estivesse aqui antes. O lugar, cercado por árvores altas que sussurravam com o vento, tinha um ar
NAYOLLE AKELLO Estou com as malas abertas, em meio a roupas dobradas e objetos pessoais, lutando contra a sensação de que estou indo embora de algo que nunca realmente deixei. Manuela está atrás de mim, os olhos arregalados como os de um gatinho prestes a perder seu tutor. Sua preocupação é palpável, mas não vou deixar que a dúvida dela atrapalhe meu novo começo.— Você tem certeza disso? Olhe, acho que deveria pensar bem sobre esse emprego- Evidenciou seu ponto de vista, a voz trêmula com uma mistura de felicidade e apreensão.—Eu tenho, Manu. Além disso, vai ser bom finalmente colocar em prática tudo o que aprendi na escola. -- respondo, enquanto coloco um vestido azul na mala, seu tom vibrante contrastando com o marasmo da nossa sala.—Eu sei, mas…— Ela hesita, levando a mão ao quadril, uma expressão de desconfiança se formando em seu rosto. —Acho que é muito estranho, sabe? O lugar é afastado da cidade e eu nunca conheci ninguém que vive lá.—Pois é, mas você não pode achar que,