Cinco

Tessa Clark

Eu devia estar parecendo uma louca correndo pelas ruas, as buzinas fazendo uma festa.

Eu só espero que eles não me atropelem, eu posso parecer louca, mas tenho amor à minha vida.

Os óculos de grau já devem ter caído umas 20 vezes. 

Mas era necessário, meu pai se encontrava na lanchonete que eu acabei de para em frente. 

Aproveitei o horário de almoço para ir falar com ele, e só precisaria retornar à escola nas últimas duas aulas da tarde.

Respiro fundo e entro procurando ele, o vejo sentado em uma mesa no canto, lendo um jornal.

Caminho até ele meio hesitante. 

Parecia vários anos mais velho, que da última vez. 

— Oi pai.— falo assim que chegou à mesa. Ele tira os olhos do jornal e me olha com seus óculos. — Como vai? 

— Theresa, sente-se — fala, e eu sinto falta de outras palavras de carinho. 

— Aconteceu alguma coisa? — pergunto me sentando à sua frente. Ele coloca o jornal de lado.

— Eu caí em um golpe.— ele fala como se fosse a coisa mais simples do mundo. 

— Como? — acho que estou escutando um zunido nos meus ouvidos. 

— Você escutou o que eu falei.— ele fala frio.— Agora preciso de 1 milhão de reais para não perdermos nossas terras. 

Meu. Deus.

Estou em completo choque.

— Como... Como isso aconteceu? — Pergunto receosa, meu pai era viciado em jogos. 

— Eu apostei, e perdi.— ele fala, mas nem um sentimento de culpa ou arrependimento. 

— Aquilo era tudo que tínhamos! — me exalto, mas repito fundo e tento me acalmar. — Como pode fazer isso? Eu não tenho dinheiro, não posso ajudar nessa sua irresponsabilidade. 

Pela primeira vez nesse momento vejo seu olhar ficar preocupado. 

— Como não? Eu sou seu pai! 

— Mas ultimamente não tem agido como um! — falo magoada. 

— Então você vai deixar perder as terras da sua mãe? — ele sempre faz esse jogo, utilizando o nome da minha mãe, e sempre me quebra. — Você foi a ingrata que me deixou e veio para cá, com seus sonhos fajutos. 

— Não fale assim, eu não queria ficar lá, meus sonhos eram esses – eu falo magoada — Eu só pedi que o senhor respeitasse minhas decisões.  

— Para ver você se tornar uma fracassada? — ele não pede a oportunidade.

Sempre que nós falávamos era assim, briga atrás de briga. 

Meu pai não era assim, ele era um pai maravilhoso, mas desde que resolvi seguir caminhos diferentes do que ele planejou ele ficou assim. Como se em uma fachada tivesse me criado para uma coisa e eu me rebelei. 

Suspiro pela milésima vez.

— Não tenho dinheiro.— falo cansada de discutir. — Com quem fez essa aposta? Onde foi isso?

— Lá no interior mesmo, o problema não está no cara que fez a aposta — ele fala.

  

Pode piorar? Sim, pode.

— Há quanto tempo isso?

— Cinco meses.....

— E só me fala agora? — pergunto indignada.

— É porque eu estava tentando resolver só, e não sabia que no segundo seguinte que o cara ganhou a aposta ele vendeu as terras para uma grande empresa. — ele fala, e eu quase infarto.

— Não vamos ter como recuperar isso! — eu falo exaltada novamente — Como você um contador tão inteligente faz uma merda dessas? 

— Então você pode ver com o dono que comprou, para ver se nós dá um prazo para recuperar? — ele fala sorrindo e ignorando minha última pergunta. — Ele é bonito e.. ...

— Está sugerindo que eu me venda? — arqueio uma sobrancelha. 

— Entenda como quiser, aqui o endereço.— me passa um papel. Em seguida se levanta e sai. 

Nem um tchau. 

— Senhora? — levanto o olhar para a garçonete.— A conta. 

— Conta? Mas eu não......— me calo quando vejo o chá preferido do meu pai lá.— Já passo lá no caixa. 

Sorri me agradecendo e sai. 

É sério, realmente houve um tempo em que ele não era assim. 

Olho para o endereço no papel e respiro fundo, pensando no melhor a fazer. 

Fico alguns minutos sentada na lanchonete pensando. 

Meu telefone toca.

— Alô? — falo assim até atendo, sem nem olhar quem é. 

— Estou até agora esperando a bonita. — Bella fala do outro lado da linha. 

— Me desculpe Bella, eu estou indo.

Ela fica em silêncio por segundos. 

— Aconteceu alguma coisa? — ela pergunta, com certeza notou minha voz.

— Em casa te conto, tchau — e desligo.

Me forço a levantar e ir embora, antes passei no caixa e pago o pedido do meu pai. 

Resolvo pegar um táxi que é mais rápido, e o caminho todo vou pensando nisso. . 

Minha mãe era dona de uma boa parte de terra em uma cidade no interior. Terras essas que deveriam ser minhas, mas meu pai que cuidava de tudo.

Isso foi a única coisa que ela deixou. 

Chego no meu prédio e subo as escadas com as forças que Deus me concedeu. 

Meu apartamento ficava no 3° andar, era o último do prédio, não era uma estrutura grande, mas era bem dividido e tinha vários outros apartamentos, era um bairro tranquilo também. 

Minha casa, era dividida a sala da cozinha por um balcão, tinha dois quartos e um banheiro e tinha varanda, então estava ótimo, e o preço era bastante bom, tudo ali eu dividia com Bella. 

— Oi — Bella fala assim que me vê. — Você está com uma cara péssima. 

Jogo minha bolsa no sofá pequeno e vou sentar ao lado dela no maior. 

Me jogo no sofá e suspiro.

— Você nem sabe o que aconteceu — falo e conto a ela tudo. 

— Eu vou matar aquele velho! — ela fala. 

— Bella.....

— Sério, como ele tem coragem? — ela fala puta da vida se levantando — Não aparece durante um bom tempo, e quando vem é com essa.

— Nem um oi,— minha voz sai com um tom magoado. — Acredita? Às vezes parece que só sou filha dele quando faço o que ele quer.

Ela me encara com pena.

— Já sabe o que vai fazer? — pergunta sentando novamente ao meu lado e eu balanço a cabeça negando. — Estou aqui para qualquer coisa, você sabe né? E se quiser dá uma surra nele eu conheço uma pessoas.

Só ela mesmo para me fazer rir.

— Agora fiquei preocupada. —  ela ri também.

— Não fique triste, ele não merece e conte comigo para tudo.

— Obrigada. Você é a melhor pessoa.— falo e só agora reparo no cheiro que está no apartamento.— Cadê meu almoço? 

— Ah!! — ela grita e corre para a cozinha — Venha, só estava esperando você. 

— Espero que sua comida me faça pensar em uma solução. 

— Com certeza! Minha comida é mágica. 

Eu não tinha dúvida disso. 

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