Maria Vitória Bocci

Eu não fazia ideia do que fazer. Observava minha mãe, deslumbrante em um vestido branco de renda, com os cabelos soltos, enquanto ela me lançava um sorriso. Nossos olhares se cruzaram por alguns minutos, mas as palavras, ou qualquer possibilidade delas, morreram em minha boca.

Eu não conseguia identificar se era ciúmes ou um medo profundo do que estava acontecendo, mas ao perceber o homem atrás dela também me observando, um sentimento ainda mais intenso surgiu dentro de mim.

Ela não podia fazer isso, pensei, isolando qualquer som externo que não fosse a tempestade de pensamentos na minha mente. Como uma criança assustada, simplesmente fugi, seguindo em direção ao meu quarto, sem me importar com mais ninguém. O peso da confusão e da traição parecia me esmagar, e a única coisa que eu queria era escapar daquela realidade.

— Mavi, Mavi, espera! — A voz da minha mãe me alcançava, como se abafasse o som ao meu redor. Eu não a esperei. O peso dos meus sentimentos confusos era insuportável. — Vai embora! — Pedi, fechando a porta em sua cara aborrecida. 

— Mavi, filha, espera. — Segurei a maçaneta, enquanto ela tentava abrir, impedindo-a de entrar. A porta não trancava; a fechadura estava quebrada.

— Mavi. — Escutei-a me chamar, mas a ignorei, enfurecida. A notícia que me dera abria uma ferida interna, e eu me sentia traída como sua única filha, com a nossa cumplicidade sendo jogada ao vento. Ela tentava girar a maçaneta que eu forçava a segurar, e, em um desabafo de choro, não aguentei mais.

— Você não podia fazer isso, comigo. — Chorei entre palavras chateada, sentindo-me traída. 

— Eu sei, eu sei que devia ter te contado, mas achei que ia ser uma surpresa. É... é isso, eu queria fazer uma surpresa, filha. Você não está feliz? — Não, eu não estava nada! O som da festa junto ao da sua voz me irritava,  soltei a maçaneta, indo em direção à cama.

O choro descia sem parar. Eu quis pará-lo, afinal, eu sabia melhor que ninguém o quanto minha mãe desejava construir uma família, mas na minha cabeça, só faltava a figura paterna, um possível padrastro. A ideia me angustia ainda mais, e a confusão só aumentava.

Lá fora, na sala, e em mais parte da casa, a festa continuava, quando a minha mãe entrou no meu quarto. — Vai Marcelo, eu preciso ficar a sós com ela. — As suas palavras me fizeram erguer a cabeça, ver Marcelo de blusa branca, calça social marron, encarando-a como se eu fosse um perigo em ascenção doía-me mais. — Tem certeza? — A vi assenti. 

— Não precisa explicar. — Falei abaixando a cabeça, constantando verdade, o que estava feito, já estava afinal, o que mais eu poderia fazer, exceto, me conformar. — Vai Marcelo! — Num tom mais bravo, a senhora Laura Bocci falou. 

Apenas o vi dar passos em direção a saída, receoso, enquanto a minha mãe fechou a porta ignorando o seu olhar para ela, o que me fez sentir o incomodo de não haver mais um espaço em sua vida, isso já vinha acontecendo a dias, dias sem nos falar, sem ir ao shopping, sem um cineminha, os momentos mãe e filha, já não eram existentes. 

O que me incomodou, foi saber que eu permitir, a maior causadora deste afastamento foi eu.  — Bem, Mavi, como você sabe, eu estou grávida, isso não foi planejado, aconteceu...

Afirmei, sentada a cama. — Como foi comigo não é? — E sem pensar duas vezes, minha mãe afirmou de pé, vindo em minha direção. — Sim, foi, não posso negar, como também não nego que você foi a coisa mais importante que aconte...

— Custava se prevenir? Como acha que vai ser quando esse bebê nascer? — Fitei a sua barriga inexistente, trabalhada em musculos em formas de gominhos. — Ué, como vai ser, filha? Eu não estou sozinha, tem o Marcelo, ele é um bom companheiro, tenho você...

— Um bom companheiro? E se ele te abandonar como o meu pai fez? — Saltei da cama, quando a minha mãe, mal havia sentado, ver os seus olhos enormes azuis paralizados em mim, assustada fizeram-me pensar no peso da minha pergunta, que saiu como um mal agouro. — Desculpa eu...

As lágrimas desciam, eu me senti confusa. — ...simplesmente não dá para receber este tipo de noticia e te dar parabéns. — Confessei, lhe vendo parada sentada em minha cama. Por isso, voltei ao meu assento, novamente, sentando-me a seu lado. — Está com ciumes ou com medo? — Dei de ombros para pergunta, lhe vendo me olhar, a sua mão tocou a minha. 

— Esta tudo bem, nada vai mudar entre nós, você continua a minha filha, lembra? — Entrelaçou a sua mãe a minha, e encarou-me nos olhos. — Esse bebê e o Marcelo não vão interferi em nada entre nós, sempre fomos...

Retirei a minha mão da sua, friamente, sentia-me confusa. — Já interferiu, mãe, mal convivemos juntas e o Marcelo...— A olhei a meu lado, lhe vendo parar de dizer. — O que tem o Marcelo? — Sendo inevitável os olhos descer para a barriga, para aquele ser não visto ainda, eu deveria dizer, mais não disse, após evitar a verdade que já não havia duvidas, e uma conversa em que pussemos panos quentes sobre o assunto da gravidez, saimos do quarto.

A festa continuava, a ideia de me tornar irmã mais velha, não era boa como parecia para mim, mas nada poderia mudar isso, os dias foram passando, os olhares de Marcelo continuaram, as roçadas até próximo a pia, no corredor, entre encontros na casa, ja que ele mudou-se para a nossa casa de vez. 

Era manhã de domingo, quando saia do meu quarto para ir encontrar com a minha Isis, a minha amiga tentava a tudo custo me tirar de casa, pois, meio mês das férias haviam passado, e ninguém, justamente ninguém me via, sai do meu quarto, trajando uma saída de praia branca de renda, o biquini em tom cobre que esta em alta. — Tá bom, já tô descendo.

Avisei ao telefone, enquanto fechei a porta, segurando a bolsa, até sentir o corpo do homem ao meu, o contato do seu peito as minhas costas, denunciando que estava quente, havia acabado de levantar, afastei o aparelho em seguida, recebendo um beijo cálido em meu pescoço, pude sentir a ereção em minha nadega naquele instante. — Gostosa! — O sussuro veio baixo a minha pele. 

Dei-lhe um cotovelada que não vi onde pegou. — Nojento! — Rosnei, lhe vendo assustado. — Mavi! — A voz que veio foi da minha mãe em seguida, abrindo a porta do seu quarto, Marcelo me olhava, e em seguida olhou na mesma direção que eu. 

Vê-la completamente nua na porta, me fez engoli em seco. — O que esta acontecendo? — Minha mãe perguntou, nua, cabelos soltos, seus músculos definidos brilhavam sob a luz suave. — Nada amor, a sua filha está falando...

— Mentira mãe, o Marcelo, ele tem me tocado, tem... — As palavras ruminavam a sair, em meio a raiva, e a risada que ele deu tão cinica. — roçado em mim, vive me olhando, eu venho tentando te falar isso. — Ela parecia surpresa. 

— Não, Mavi. O Marcelo...— Os seus olhos foram de mim para ele, que negou com a cabeça. — Mavi que loucura é essa? — Indagou o infeliz, eu mantive a expressão séria. — Mavi, filha. — Pude perceber que ela não reagiu bem ao que eu disse, pela forma que levou a mão a porta, ele estando mais próximo a segurou. — Esta vendo o que você fez? — Ele esbravejou irado!

Minha mãe passou mal, a praia foi cancelada, havendo uma queda na pressão, averiguei, indicando repouso, Marcelo queria leva-la ao hospital, o clima entre nós tornou-se mais tenso, anoitecia quando minha mãe me chamou para conversar. 

— Mavi, filha...— As suas palavras tornaram-se receosas, quando sentei-me a cama. — Oi mãe, estou aqui, como você está? — Arrastei-me pela cama, a me aproximar de seu rosto. — Porque inventou isto? Sei que está com ciumes, mas dizer que o Marcelo está te assediando é demais, Maria Vitória. — Eu jamais esperei isso dela. 

— Quê? — Estremeci em temor. 

— É isso Maria Vitória, não vê que estou recomeçando, você sabe que eu sempre sonhei com tudo isso, uma família, um marido, um casamento? — Prendi o lábio inferior ao ouvir. — E isso inclui um assediador dentro de casa?

— Não invente mentiras, Maria Vitória Bocci. — Para mim era o fim, iniciamos uma discurssão, e por mais que eu quisesse que ela enxergasse a verdade, parecia impossível. — É melhor você ver um lugar para você, estou grávida do Marcelo, irei me casar com ele...

— Mãe! — Gritei exasperada ao ouvir. 

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