Alexandre Xavier

— Juro que não entendo por que a sua mulher não gosta de mim. — Heitor caminhava de um lado para o outro no escritório, sua frustração evidente. Eu poderia listar as razões do desgosto da minha esposa em relação ao meu amigo, mas isso não importava agora.

— Anda, Heitor, por que não diz o que realmente quer? — falei em um tom brando, observando-o puxar a cadeira à minha frente.

— Problemas de novo? — Ele levantou uma sobrancelha, e eu assenti levemente. Não era nada que eu não pudesse contornar.

— Meio que sim, mas vamos lá, o que te trouxe aqui? — Perguntei, tentando mudar de assunto.

Heitor, impaciente como sempre, apenas moveu as sobrancelhas. — Ah, esqueci. Talvez não fosse tão importante. — Dei um meio sorriso para sua resposta. Apesar de parecer desleixado, ele não era.

— O que você estava fazendo? — Estendeu a mão em direção ao parecer médico que estava à minha frente.

— Tentando compreender a situação de um paciente. E você? — Ele observou o papel vagamente, antes de jogá-lo de volta na mesa.

— Muita palavra, pouco significado. Deseja que eu veja um horário com esse médico? — Assenti. Uma conversa com o especialista seria mais esclarecedora do que aquele relatório.

— Sim, não entendi muito também. — Heitor ainda olhava para o papel, e pude sentir a curiosidade emanando dele. Clara definitivamente não viria ao meu trabalho sem um bom motivo.

— Tem certeza de que está tudo bem? — Ele perguntou, seu olhar perscrutador me fazendo hesitar.

— Ela só quer mais atenção. Diz que eu vivo para o trabalho. — Confessei, vendo Heitor soltar um bufo de desdém.

— Hum, nada que uma bolsa dessas que diminuam alguns números da sua conta não resolva. — Ele insinuou, enquanto eu negava com a cabeça, de fato, sendo especialista em fracassos em relacionamentos, de algo, eu poderia ter certeza, jamais seguiria os seus conselhos sobre este assunto. 

— Não é isso. De fato, tenho deixado ela de lado, mas prometo que irei me atentar mais a ela. — Heitor revirou os olhos, cético.

— Como você quiser. — Concluiu sem esconder a insatisfação. 

Em um mês, percebi que precisava sair mais cedo do hospital, adiando algumas cirurgias e consultas não tão urgentes. Apesar de Heitor entender, sendo um amigo leal, eu sabia que meu casamento precisava ser salvo. Levei Clara para jantar fora várias vezes, cancelei reuniões e até uma viagem a Paraty, tudo em nome do amor. Queria que tudo parecesse perfeito: entregas de buquês de rosas durante seu expediente, pequenos gestos que me faziam lembrar os primeiros dias do nosso casamento, quando eu fazia questão de surpreendê-la com presentes e declarações.

Mas aquela noite foi diferente. — Amor, você pode ir para casa. Não vou conseguir sair cedo hoje, reunião até tarde. — A mensagem da minha esposa vibrou sobre a mesa de vidro, chamando minha atenção. Ao lê-la, percebi que já havia encerrado meu expediente mais uma vez e revisava a agenda com a minha secretária. Não respondi; decidi esperar por ela e, quem sabe, surpreendê-la no trabalho.

Sai do escritório cedo, como planejado, e dirigi até o local onde ela trabalhava. Ao parar o carro em frente ao escritório MC Advocacia, na escuridão da noite, vi seu carro saindo do estacionamento. Sorri fraco, levando a mão até a buzina, querendo surpreendê-la, mas Clara, apressada, não percebeu. Sem malícia, a segui, supondo que ela visitaria algum cliente especial.

Pela aparência duvidosa do lugar, minha curiosidade aumentou. Clara sempre foi refinada, vindo de uma família de alta classe e com uma educação impecável. Eu sempre me esforcei para estar à sua altura. Desci do carro e adentrei o ambiente, que confirmava minha primeira impressão: um local de péssima qualidade. A recepcionista, com maquiagem exagerada, sorriu ao me ver.

— Boa noite, senhor. Deseja um quarto? — Ela perguntou, enquanto eu olhava ao redor, à procura de Clara. Sentia-me perdido, e não vi nenhum sinal dela.

— Deseja esperar a sua companhia lá em cima? — A recepcionista já estava me estendendo uma chave, sem me pedir nenhum dado. Fitei o metal em sua mão, vendo agarrada, pendurada uma placa de madeira com o número trinta e cinco pintado em tinta preta.

— Há algum lugar para reuniões aqui? — Perguntei, tentando manter a compostura. A resposta foi uma risada zombeteira.

— Reunião? — Ela disse, divertindo-se claramente com a ideia, assenti, ignorando a sua falta de decência, ou educação. — Há muitas reuniões aqui, senhor! — Disse, levando a língua ao canto da boca, franzi o cenho, observando além, pensei em esperar que saísse por fim, mas altos gemidos começaram com gritos vindo do alto. 

Algo praticamente incapaz de reproduzir, aquele lugar não era decente para mim, tampouco para Clara, a minha esposa. Virei-me novamente em direção ao balcão, até notar que placas se somavam ao lugar onde a jovem coloca a trinta e cinco, pendurada em ganchos, faltando somente a placa dezenove entre elas. 

— Vai esperar? — Me perguntou sorrindo, a mulher de batom vermelho, suspirei fundo e apontei para o alto. Aquilo não a incomodava? — Ah, não se preocupe, aqui é um lugar onde as pessoas liberam o máximo do prazer, senhor. — Para mim, passava longe disto. 

Peguei a m*****a chave, mas a intenção era outra, fosse quem pudesse ser, eu tiraria a minha esposa deste lugar. Subi a escada apressado, revoltado com o ambiente, desrespeitoso, as minhas pernas falharam ao ouvir uma voz familiar. — Uhuhhh que gostoso! — Um gemido sôfrego, não poderia ser, engoli em seco, eu me senti freneticamente louco.

Ao ponto que ignorei até a minha suposta numeração. — Senhor, é para o outro lado! — A jovem gritou de baixo, quando corri ao lado oposto, reconhecendo gritos, gemidos e uivados. — Cachorra, rebola no pau, cadela! Isso vai... — Uma voz masculina surgiu, eu parei diante do quarto de onde vinha a baixaria. 

— Assim, tá bom! — Como uma gata manhosa, a mulher gemeu, meus batimentos se perdiam, chutei a porta de vez, era Clara, não poderia ser. Chutei a porta mais vezes, que fracamente desmontava-se em tiras de madeira fina. A imagem que vi à primeira vista era a minha mulher de quatro numa cama, um homem robusto, de cabelo preso ao topo da cabeça, montado atrás dela. 

Meu sangue fervendo, eu não podia acreditar em meus olhos. Vendo Clara, tentando sair, enquanto ele a segurava pelos cabelos escovados soltos, ela buscou se cobrir. — Clara? — A chamei quase sem voz, a raiva me entorpecia.

— Xande? — A minha esposa sentava-se à cama, enquanto o homem corria em direção a uma janela, nu. Eu paralisei diante da cama redonda, o cheiro de sexo sujo terrivelmente por todos os cantos. — Senhor, o que...

— Saia! — Clara berrou, nua, enrolada a lençóis brancos sobre a cama, meus olhos ardiam. — Pode me explicar isso? — Pedi, mas não havia o que explicar, já estava explicado. Clara saiu da cama, vindo em minha direção. — Posso, posso, meu amor, por favor, acredita em mim, ele não é nada...

— O quê? — O desconhecido gritou, pude perceber que, apesar de gordo, é jovem. 

— Cala boca, Silas! — A minha infiel esposa gritou. — Como nada? Estamos juntos há três meses, Clara! — A dor se tornava maior. Olhei para a mulher ajoelhada no chão à minha frente, eu senti nojo dela, apesar de chorar, essa também era a minha vontade. 

—  Xande! — Tentou me tocar, quando recuei impedindo-a. — Xande, eu… eu...— Aquilo era sujo demais para mim, mesmo tendo saído da pobreza, evitando qualquer ação que me levaria a tragédia, girei nos calcanhares saindo em seguida, ignorando a recepcionista de pé próximo à porta quebrada com lascas de madeiras em todos os lugares. — Xande! Xande. 

Ignorei os gritos e a mulher que tentara me alcançar e chamar, cheguei ao carro atordoado, perdido, Clara era o que eu chamava definitivamente de casa. As lágrimas desceram de uma maneira infidada, a traição mais que doí, queima, ferre, rasga, soquei o volante, repetidas vezes, e ao vê-la tentando se vestir vindo em direção ao meu carro, liguei o motor e partir. 

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