O dia começou como a continuação de um sonho. Leonardo estava na cama, o peito arfando num ritmo concentrado. Breno mamou apenas uma vez e seguia o pai no sono restaurador. Jéssica cuidadosamente retirou a coberta e, pé por pé, caminhou até o banheiro para um banho quente e hidratante com o kit caro que ganhara de presente do marido.
Vestiu o uniforme que já estava passado e colocou o perfume favorito do marido. Com um toque de carinho todo especial, preparou o café da manhã de todos: a toalha de mesa rendada, a louça cara que herdara do avô, quitando o que ela mesma fizera para o momento. Não tinha motivos para não oferecer o melhor que possuía, pois estava recebendo tanto carinho ultimamente. Decidia se deveria acordar ou não o marido quando eles irromperam na cozinha. — Que mesa linda! Como você é caprichosa, meu amor. Um beijo selava a paixão mútua e cada vez maior que pairava sobre aquele lar. — Tudo para vocês. Bom dia, meu amor. Cadê o lindo da mamãe? Breno, de mãozinhas estendidas, se jogava querendo o próprio café da manhã. — Certo, garotão, entendi. Pode dar de mamar tranquila, amor. Eu termino tudo aqui. Leonardo passou de bêbado escandaloso para o mais prestativo dos maridos em poucos dias. Foi um momento lindo e marcante. Um assunto empolgado sobre a repercussão do feat. Jéssica falando sobre como o treinamento a ajudou a melhorar na carreira. Pareciam compartilhar os melhores sonhos dos seus corações.Ela nem precisou ir até a casa da sogra; Leonardo se encarregou disso, pois tinha assuntos urgentes para tratar com o advogado. Um detalhe muito pequeno que esqueceu de comentar com a esposa.
No trabalho, Jéssica chegou com um passo confiante e tomou seu posto com determinação. Janete observou a mudança na amiga nos últimos dias e tentava tirar alguma informação sobre o que estava acontecendo que a deixava tão plena. — Nossa, chegou cheirosa hoje. O que aconteceu que te deixou tão bem desse jeito? — Ué, tomei um banho de manhã, só isso. Revigora as energias e a gente fica mais animado. Nada demais. Ela tentava desconversar para não falar sobre sua vida pessoal. — Sei não, hein. Tem cara de um romance, um novo amor. Ela provocava para ver o que saía desse mundo de segredos que Jéssica parecia carregar. — Eu sou casada, esqueceu? É normal ter romance na minha vida. Deu de ombros e se voltou para o cliente com um sorridente: — Bom dia, vai querer CPF na nota? Luan observava a cena com um sorriso satisfeito. Jéssica tinha um jeito carinhoso e bem-humorado com os clientes. Sabia sair bem das fofocas e intrigas que aconteciam naquele lugar. Teve um desempenho tão satisfatório no treinamento, que não teve nenhuma dúvida na hora de tomar a decisão. — Bom dia, Jéssica. Tudo bem? Podemos conversar um minuto? Dessa vez, ela nem ficou apreensiva. Estava esperando por esse momento desde o final do treinamento. Sabia que estava dando o seu melhor ultimamente. Enquanto se encaminhavam para a sala dele, Janete se encarregou de iniciar sua especialidade: falar mal de Jéssica. Começou uma campanha de difamação maciça desde que ela começou a ir para a sala de Luan. — Viu, né? A escolhida já foi pra sala do babão. Comentou com uma outra colega num tom muito maldoso. — Eles perderam a vergonha mesmo. Fazendo essas coisas no meio do expediente, para todos verem. — Estão falando do quê? Um dos empacotadores se juntou ao grupo maledicente. — A escolhida da semana já foi pra sala do babão. Ele nem tá fazendo questão de disfarçar mais, fica o dia inteiro encarando ela. Janete continuava com uma expressão estranha de contentamento. — Ela deveria se dar ao respeito. Uma mulher casada, com tanto converseiro com o patrão. Um absurdo. A outra operadora falou num tom envergonhado. — Acha que ela se importa com isso? Mulheres assim querem mais é o... você sabe. Não ligam pra mais nada. — Você é tão amiga dela, Janete. Por que não pergunta o que ela tanto tem feito na sala do chefe? O operador de caixa perguntou. — Eu já fiz isso. Ela nunca conta. Se faz de santa para não contar que está de caso com ele. Janete criou essa história que se espalhou como pólvora dentro do supermercado. Todos olhavam com desconfiança para Jéssica, que não entendia a mudança de comportamento de algumas colegas. Enquanto isso, na sala de Luan, o assunto era sobre a carreira dela. Luan tinha junto de si o gerente regional e a chefe do RH para dar a notícia. — Bom, Jéssica, você já conhece o Marcos, nosso diretor regional, e a Sarah, do RH. Estamos aqui para falar sobre o seu desempenho no curso. Marcos, quer falar? Luan permitiu que o chefe fizesse as honras da casa. — Jéssica, estamos observando seu desempenho aqui desde que começou. Notamos seu bom relacionamento com os outros colegas e não teve nenhum outro funcionário com sua pontuação no curso. Por isso, optamos por oferecer a você a vaga de supervisora de caixa, que está em aberto há algum tempo. Você gostaria de assumir? Jéssica sorriu largamente, com um gesto comedido. Era a sua vida melhorando de um jeito que ela nem sabia como agradecer. Com postura confiante e olhar vitorioso, agradeceu: — Muito obrigada pela confiança no meu trabalho. Me sinto muito feliz com essa proposta e aceito, sim. — Você será a mais jovem supervisora de caixa que já tivemos. Parabéns. Você inicia agora mesmo. Luan, explique tudo pra ela.Mais que depressa, Luan se disponibilizou para ajudar. Desceram para o showroom, reuniram a equipe e o gerente regional deu a notícia:
— Pessoal, chamei vocês aqui rapidinho, apenas para dar a feliz notícia de que a Jéssica vai assumir o cargo de fiscal de caixa. Aqui na nossa empresa, gostamos de dar oportunidades a todos que se empenham, e a Jéssica demonstrou estar disposta a aprender e trabalhar com perseverança. Boquiaberta, Janete mal conseguiu se recuperar do choque para ser a primeira a cumprimentar Jéssica animadamente. — Parabéns, amiga. Não vá ficar metida agora, hein. O comentário ácido fez com que todos dessem risadinhas irônicas da situação. Assim que o bando se dissipou e Jéssica se concentrou nas novas tarefas com Luan, Janete continuou a campanha difamatória contra a amiga. — Pelo jeito, dar para o chefe funciona mesmo. Ganhou até promoção. Ria de escárnio disfarçadamente.Querida leitora, espero que esteja se divertindo. Não se esqueça de adicionar o livro na sua biblioteca para ser notificada assim que entrarem os novos capítulos. De onde você lendo? Deixe nos comentários para eu te conhecer melhor. Siga o perfil de autora pra saber de todos os livros que eu escrever. Beijos.
Do outro lado da cidade, Hugo estava em reunião com o detetive. O homem barrigudo iniciou o assunto sem muito tato. O tempo de carreira o ensinara algumas coisas sobre como proceder em situações desse tipo, principalmente quando as notícias eram tão graves.— Olha, menino, infelizmente, as notícias não são nada boas. Sua esposa está sendo infiel há bastante tempo, pelo que pude apurar. — Disse, direto e certeiro. Hugo não tinha tempo a perder, especialmente porque estava bastante desconfiado do comportamento de Clara ultimamente. Ela estava prestes a aprontar algo grande.— O quê?! Como essa m*****a teve coragem?! — Hugo desferiu um murro forte na mesa e lançou um olhar furioso para o pequeno homem à sua frente. Em choque com as fotos nas mãos, viu seu mundo desmoronar. Deu tudo o que tinha para fazer de Clara a estrela que ela queria ser, e veja só onde ela estava agora: traindo, enganando e mentindo para o homem que a ajudou durante todo esse tempo.— Sinto muito, rapaz. — O homem se
Depois que o homem saiu, Jéssica teve forças apenas para trancar o portão e voltou a chorar copiosamente. O que faria? Como sobreviveria sozinha sem Leonardo? Tudo o que sabia da vida, aprendeu com ele. E essa história de que ele fugiu com outra? Será verdade? Como nunca desconfiou de nada? Que tipo de mulher ela era, que não percebera nada? O que seria de Breno sem o pai? Eles eram tão apegados... Ligou para o telefone dele várias vezes. A cada tentativa, a mensagem dizia que o número não existia. Pensou em ligar para a sogra, mas sabia que ela não a ajudaria. Não tinha o contato de mais ninguém da banda. Estava largada à própria sorte. Toda essa confusão de informações, cobranças e medos crescia em sua mente, inundando seu coração de uma tristeza sem tamanho. Como ele teve coragem de abandoná-la? Por causa dele, ela havia desistido dos estudos! Por causa dele, foi expulsa de casa! Por causa dele, se entregou e foi mãe aos dezessete anos! Como ele pôde
Janete, sentindo-se no poder, tomou a decisão que estava em seu coração desde que assistiu à live de Hugo: tomaria tudo o que era de Jéssica, inclusive a admiração de Luan. Afinal, Jéssica nunca teve nada demais. Fez questão de mostrar o vídeo para todos no trabalho e inventar todas as histórias possíveis sobre o assunto. Aproveitava-se de sua proximidade com todos e mentia, certa de que ninguém ousaria questioná-la. Conseguir a vaga de Jéssica foi pouco; ela queria vê-la na sarjeta, como coisa repulsiva que ela era. Metida a melhor que todos, sempre de bom humor, sempre gentil. Jéssica sentiu a última facada, a apunhalada final no coração. Faltou-lhe o ar, e ela ficou paralisada por um minuto. Essa mulher se dizia sua amiga, a mais fiel. Garantiu que guardaria todos os segredos dela e a protegeria caso algo ruim acontecesse. E veja em que situação se encontrava agora. Sentiu a dor atravessar seu corpo de uma vez, mas não conseguia gritar, nem chorar. Era como se tivesse sido consu
Hugo chegou em casa furioso. Não conseguia se conformar por ter sido tão ingênuo! Aquela vadia o enganou por tantos anos, fazendo-se de boazinha para conquistar sua confiança. — M*****a! — Atirou um vaso na parede. Arrependeu-se logo em seguida, pois não queria assustar as crianças. Respirou aliviado ao perceber que elas não estavam chegando. Esquecera-se de que pedira à filha da vizinha para brincar com elas enquanto resolvia algo com Clara. Sua live foi um fracasso. Não conseguiu a exposição que desejava e fez papel de idiota. Depois que a raiva passou, restou-lhe a humilhação, a vergonha. Não sabia como enfrentaria os conhecidos no dia seguinte. Não fazia ideia de como sustentaria os filhos, já que seu trabalho era exclusivamente cuidar da carreira da esposa. Mais que um coração partido, ele tinha um buraco total na existência. Clara era todo o seu mundo. A dona do negócio onde ele trabalhava, a mãe de seus filhos, sua esposa. Sem ela, o que restava? Nada! Ele se sentia vazio e i
Hugo se culpava por tudo: a negligência com os filhos, a dor que eles passaram, a medo que deveriam sentir, o sumiço da mãe, sem nenhum tipo de despedida ou explicação. Todas essas emoções tomavam conta de seu peito. Uma pontada aguda o atravessou. Que tipo de homem não consegue proteger os filhos? Não sabe cuidar da família? Não percebe o que acontece dentro de sua própria casa? Andava pelo quarto observando os filhos dormindo, com os bracinhos perfurados pelas agulhas da bolsa com vitaminas. Mais do que remorso, o que mais o feria era o sentimento de parecer um ser desnecessário. Não servia para nada nesta vida miserável. Um homem que não protege a família é um inútil. Afundado nesse momento de autocomiseração, ouviu de longe a recepcionista falando algo sobre o cartão não ter sido aprovado e devolvendo o plástico para ele. Ele lhe deu outro, e outro, mas sempre voltava com a mesma expressão. — Desculpe, senhor, todos os cartões foram recusados. Sem o pagamento, não poderemos ate
Um novo dia trouxe um ânimo levemente melhorado para Jéssica. A tela do celular brilhou, informando que havia saldo na conta. Luan apressou o pagamento da rescisão e ainda exigiu que fosse paga uma indenização pelo que Janete fizera na frente de todos.Isso ajudava a manter as coisas, pelo menos, até o fim deste mês. Encontrar um novo emprego seria muito difícil. Ela pensava no que poderia encontrar nas pessoas quando saísse pela porta da frente. Não tinha nenhuma confiança em si mesma nesse momento.Era desafiador olhar para o futuro com positividade diante de tanta tristeza que a rodeava. Criava coragem para sair e enviar currículos quando alguém bateu na porta. Receosa sobre que tipo de visita receberia naquele momento, abriu devagar.— Mãe? Por um momento, teve a ilusão de que a mãe soubera da situação e viera até ali para ampará-la, prestar apoio e lhe acolher neste momento de dor tão grande.— Que bela palhaçada você arrumou, hein? Júlia entrou sem esperar convite. Queria ver co
Hugo pediu a ajuda do detetive para descobrir tudo sobre a mulher que encontrou na casa no dia da live. Seu semblante o impactou; parecia tão devastada quanto ele com o que aconteceu. Foi muito injusto com a moça e queria consertar isso. Ricardo tinha toda a razão. O linchamento virtual que Clara promoveu contra ele acabou com qualquer possibilidade de se reerguer em Pedra Branca. Nenhum contato sério quis fazer qualquer tipo de acordo com ele; as pessoas o olhavam como se fosse algum criminoso. Estava circulando entre os moradores do condomínio um abaixo-assinado para que fosse expulso. Recebeu apoio do pior tipo de gente que existe: abusadores de mulheres que achavam que ele era parte desse grupo asqueroso. Ia embora de Pedra Branca, recomeçar com os filhos em outro lugar, mas, antes, precisava se acertar com a pessoa que prejudicou, mesmo que sem querer. — Me deixa conversar com você um minuto. — Falou rápido, para que a moça não tivesse tempo de afastá-lo assim que o reconhecess
As crianças se entrosaram rapidamente. Em poucos minutos, já estavam brincando animadamente pela sala quase vazia. Maria tentava ajudar a preparar as coisas para a refeição. Queria garantir que Caio tivesse o que comer.Ela se sentiu um pouco sobrecarregada quando conheceu Breno, achando que precisaria cuidar dele também. No entanto, Jéssica, com toda a docilidade do mundo, lhe disse para se divertir, pois ela e seu pai cuidariam das crianças.A menina levou um choque. Ninguém nunca lhe pediu para brincar antes, e muito menos de forma tão carinhosa. "Além de linda, essa moça é muito boa", pensou, e obedeceu, pegando um carrinho para si.— Que bom que você trouxe as crianças para o Breno brincar. Olha como ele ficou feliz. Tivemos um momento muito difícil no parquinho hoje — disse Jéssica, sorrindo ao observar a cena.— Eles se deram bem de cara. Veja como brincam em harmonia — respondeu Hugo, enquanto preparava os sanduíches com um largo sorriso. Por alguns instantes, tudo parecia mais