Capítulo 1

Seis anos. Eu tinha passado seis anos comendo o pão que o diabo amassou, mas eu cheguei naquele momento: o dia de dar o primeiro passo em direção a minha vingança e recuperar minha filha.

Quando sai do hospital, recebendo um atestado de óbito e tendo visto o corpinho morto de uma criança que em nada se parecia comigo, tentei voltar para a casa dos meus pais. Mas não fui bem recebida. Não eu, a garota que tinha machado a reputação da família ao perder a virgindade antes do casamento com um homem qualquer, engravidar e decidir ter aquela criança mesmo que o pai tenha me abandonado no instante em que soube da gravidez.

– Mas... Você tem certeza de que é meu? – Lembro-me dele perguntar.

– Como pode perguntar isso? – Respondi, indignada. – Você sabe que foi o primeiro!

– Sei que fui o primeiro, mas não posso ter certeza de que fui o único.

Lembro-me de ter virado a mão na cara dele. E foi a última vez que o vi.

Então, quando tentei voltar para casa naquele dia, a única resposta que tive foi a rejeição. Minha família era de uma religião muito pautada em suas regras retrógradas, e eu era a ovelha desgarrada. Obviamente eles não me colocaram para a fora de casa, mas também na facilitarem a minha vida. Quando eu fiquei obcecada com a ideia de que minha filha não estava morta, mas sim tinha sido roubada, cheguei a apanhar da minha mãe, que dizia que eu tinha sido possuída pelos demônios ao me render aos pecados carnais e que deveria parar inventar besteira e aceitar o fato de que estava sendo punida por minha conduta.

Naquele momento eu soube, que se nem a minha própria família acreditava em mim, de nada adiantaria eu ir até a polícia, sem prova nenhuma, denunciar o que tinha me acontecido. Se eu quisesse minha filha de volta, eu não poderia usar de meios lícitos. Eu teria que fazer justiça com minhas próprias mãos.

Sai de casa assim que arrumei emprego em um bar e usava boa parte do meu salário para dividir um apartamento de dois cômodos com uma colega de trabalho. Comecei a estudar cada detalhe da vida dos Oeri. Obviamente eles tinham uma filha, recém-nascida, que era exibida em posts e mais posts no I*******m da mãe. Da falsa mãe.

Apesar de tudo o que eu estava passando, consegui estudar e passar na faculdade de engenharia civil, determinada a um dia conseguir ser contratada pelo Grupo Oeri. Me formei como a melhor da classe. Implementei meu currículo aprendendo línguas diferentes, fazendo cursos profissionalizantes e finalmente... Seis anos depois daquele fatídico dia na sala de parto, aqui estava eu, sentada em uma mesa, de frente para a recrutadora do Grupo Oeri, para uma entrevista de emprego, depois de ter passado pela fase em grupo do processo seletivo.

– Seu currículo é bem impressionante, senhorita Castilho – Joyce, a entrevistadora, levanta os olhos das folhas em sua mão para me observar por trás de seus óculos redondos. – Ao menos em relação as suas qualificações. Mas...

Experiência. Eu sabia. Eu não tinha nenhuma experiência além do meu estágio. Não quis perder tempo indo atrás de outros empregos antes. Quando mais tempo eu demoraria para chegar até aqui? Dez? Vinte anos? Se precisasse, eu esperaria a vida inteira, claro, mas eu precisava tentar o quanto antes.

– A vaga oferecida não é para iniciantes.

– Estagiei em uma grande empresa do ramo – tento me defender. – E aprendo rápido.

– E como você lidaria com os desafios de liderar uma equipe em um projeto de construção de grande escala? – Ela questiona, seus olhos penetrantes fixos em mim.

Eu respiro fundo, tentando encontrar as palavras certas para transmitir minha competência e habilidade. Mas quando começo a responder, as palavras parecem fugir de mim, e minha mente parece um labirinto de ideias desconexas.

– Senhorita Castilho, ficarei feliz em recebe-la para uma nova entrevista em alguns anos, quando tiver mais experiên...

– Joyce! – A porta se abre com violência, exibindo um homem muito, muito nervoso. – Camilla faltou novamente! Me diga... Como posso entrar em uma sala de reunião em uma hora sem a porra dos arquivos que ela não entregou...? – Ele passa a mão pelos cabelos castanhos volumosos ao mesmo tempo em que umedece os lábios com a língua.

– Vou cuidar disso agora mesmo, senhor Oeri.

– Senhor Oeri? – Deixo escapar, em um sussurro.

É claro que era ele. Eu já tinha o visto em fotos antes, muitas e muitas vezes, claro. Mas pessoalmente ele era ainda mais... atraente. Sua postura era imponente do alto dos seus quase 1,90 de altura, seus músculos se salientavam mesmo através de todas as camadas daquele terno de três peças, e seus olhos esverdeados eram tão penetrantes que pareciam me despir completamente. Por um momento tenho medo de que possa enxergar até mesmo através de minhas intenções.

– Gato pra um caralho! – Lembro–me de Julia, a amiga com quem eu ainda divido o apartamento, dizer pouco antes de eu sair de casa naquela manhã. – Cuidado pra não se render àquele par de olhos verdes e esquecer do que você está indo fazer naquele lugar.

Arrumar um emprego. Até mesmo para ela a desculpa é de que eu estava indo arrumar um emprego. Eu tinha parado de falar que minha filha foi roubada por uma família de multibilionários. Ninguém acreditaria mesmo.

– Não tem nem chance de eu achar alguém como ele minimamente atraente – digo.

Nesse momento, percebia que não era verdade. Eu sabia que Vitor Oeri tinha sido um dos solteiros mais disputados do país antes de acabar se casando com sua atual esposa. Olhando para ele agora, eu conseguia entender como poderia ser fácil cair em sua lábia.

– E quem é você? – Ele me pergunta.

– Ninguém! – Joyce diz. – Ela já estava indo embora... Nós te ligaremos, senhorita Castilho – mas eu não me movo. – E falando em ligar, vou ligar para Camilla agora e...

– Acha que já não fiz isso? – O tom de irritação na voz dele estava de volta. – Ela não me atende. Demita aquela incompetente. E me consiga uma nova secretária. AGORA!

– Posso fazer isso! – Pulo de pé, mal me dando conta do que estava fazendo. – Posso ser sua secretária.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo