Parte 2...
Tenho muitas recordações de minha vida ao lado deles e quase todas são perfeitas. Anos maravilhosos que eu não esqueço. E gostaria de poder repetir, mas sei que isso não é mais possível.
— Você tem que pensar bem sobre tudo o que diz respeito a esse testamento - Otávio me aconselhou — Não vai ter volta depois que for tudo assinado.
— É verdade - Sandro puxou o ar e limpou a garganta — E sendo bem claro, ninguém pode saber que já falamos com você sobre isso ou poderemos perder nosso registro na ordem e talvez, até mesmo responder um processo sério e acabar pegando um tempo em cana.
— Realmente, Matteo. Nós te chamamos aqui porque somos seus amigos e sabemos que você tem um grande interesse pela herança.
— Eu sei disso e agradeço muito aos dois.
Eu na verdade não tenho necessidade de dinheiro. Eu já sou rico, muito rico mesmo. Claro que gostaria de aumentar esse montante, porém meu interesse maior é na propriedade. O que vivi ali me marcou demais e sempre tive planos para o lugar, não posso perder agora por um capricho.
— E não se preocupem - ergui a mão — Eu jamais iria contar a alguém o que vocês me revelaram.
Sandro fez um gesto afirmativo com a cabeça. Os dois trabalham juntos no escritório de advocacia que cuida dos interesses de minha família há muitos anos. Foi assim que nos conhecemos e ficamos amigos.
Todas as vezes que meu avô precisava de algo ele ia até o escritório e me levava junto. Comecei a conversar com os dois certa vez. Eles ainda eram estagiários do escritório e logo nos demos bem. Depois disso começamos a nos reunir com outros colegas para saídas e até hoje somos bons amigos.
O que pra mim é muito bom, porque também contratei os dois para cuidar de algumas coisas relacionadas às minhas empresas e eles são ótimos no que fazem.
— E se você por acaso desistir, seu irmão vai receber tudo... Inclusive as propriedades atreladas ao pedido de seu avô - Otávio balançou a cabeça.
— Ele já tem a parte dele, não tem sentido isso de eu ter que ser o único a fazer o que meu avô manda - abri os braços me sentindo perdido — Isso é ridículo.
— Mas você sabe que isso é porque o seu irmão já fez uma parte do que Pietro exige - Sandro fez uma careta.
— Isso é só uma armação dele - elevei a voz e algumas pessoas por perto me olharam — É só mais uma coisa que ele faz para... Vocês sabem bem o que - falei baixo.
Eu sei e acho que muitas outras pessoas sabem também. Lucas é meu irmão mais velho. Quando tudo aconteceu, nós fomos morar com nossos avós. Pietro e Felicia.
Não sei o motivo real, mas nunca houve uma aproximação mais fraternal entre nós dois. Eu nunca senti que meu irmão me amasse de verdade e acho que nunca consegui mostrar isso a ele também. Talvez pelo fato de nós termos sofrido com a separação de nossos pais e ficarmos meio que de lado enquanto tudo acontecia.
Crescemos unidos, mas não como dois irmãos deveriam ser mesmo. Era mais porque a gente morava junto, tinha o mesmo nome e o mesmo sangue. Mas não sei se posso dizer que houve amor entre nós. Acho que foi apenas costume.
— Sim, nós sabemos - Otávio fez uma cara crítica e ergueu a sobrancelha — Mas será que Pietro sabia? E se ele sabia, porque será que exigiu que você também seguisse seu desejo? Já pensou que ele só queria que você tomasse uma atitude mais adulta?
Eu ri de modo irônico e balancei a cabeça. Isso é tão patético. Eu sou adulto. Tenho trinta e cinco anos e em pouco tempo farei trinta e seis. Já cuido de mim há bastante tempo e já fiz minha vida com muito trabalho. Se eu não fosse adulto, não poderia ter tanto sucesso como tenho.
Meu avô, Pietro Ferro era um italiano teimoso e que preza muito os valores de antes. Talvez até demais. Era casado com minha avó Felicia, uma linda senhora de cabelos brancos e grandes olhos azuis.
Minha infância só não foi ruim e mais problemática por causa deles. Os dois tinham um coração enorme, mas cada um ao seu jeito.
Minha avó Felicia era um doce de pessoa e sempre conseguia ser positiva em várias situações da vida, mesmo nas mais difíceis e dolorosas. Ela sempre procurava um modo de mudar o pensamento e achar algo que fosse bom. Eu até a chamava de “minha Polyana”.
Eu li um livro na escola que se chamava Polyana e contava a história de uma garota que fazia o jogo do contente, onde ela buscava colocar o lado bom de tudo e de todos, acima de todas as coisas ruins da vida. E foi por causa desse livro que eu comecei a chamar minha avó dessa forma. E ela gostava.
Já o meu avô era um homem mais sério, mais rígido, mas ainda assim, com um coração grande também. Ele só não sabia bem como demonstrar isso e muitas vezes tentava mostrar com presentes, com viagens ou coisas que ele achasse importante para nosso desenvolvimento.
Eu amava os dois e ainda hoje sinto falta deles. Muito mais até do que sinto de minha própria mãe e de meu pai.
Meu avô foi contra minha mãe se mudar para a Inglaterra após quinze dias de férias, onde ela conheceu meu pai e caiu de amor por ele.
Minha avó tentou ajudar para que os dois não brigassem, mas não conseguiu evitar que houvesse uma quebra de confiança entre eles. Meu avô não aceitava que a filha se mudasse para outro país e menos ainda que se casasse com um total estranho.
Parte 3...Porém minha mãe não estava ouvindo a voz da razão e as brigas foram muitas, o que causou muita tristeza em minha avó. E isso piorou no dia em que minha mãe fugiu de casa para se encontrar com meu pai. Maxwell Smith Ferro.Meu pai era um homem que vivia de acordo como lhe desse vontade. Mudava de humor praticamente o dia todo e isso depois de um tempo começou a trazer problemas para o casamento deles.Lucas é mais velho do que eu cinco anos e isso talvez tenha marcado mais a vida dele do que a minha. Eu ainda cheguei a presenciar algumas brigas entre eles e até flagrei minha mãe chorando no quarto, mas ela dizia que não era nada demais. E eu aceitava porque era muito novo para entender.Quando eu estava com cinco anos e Lucas com dez, meus pais se separaram. Um dia meu pai estava em casa e no outro tinha saído para não voltar.Eu só fui entender certas coisas que aconteceram com eles, muito tempo depois, já adolescente. Mas isso já não me importava mais.Depois de uma semana
Parte 4...Comecei a comer, pensando nas palavras deles. Eu não tenho um problema, só acho que casamento é uma bobagem, uma instituição falida. Na verdade não passa de um acordo que deve ser muito bem feito para não ter nenhuma surpresa desagradável depois.— Seu irmão já está casado, Matteo.— Eu sei disso, Otávio, mas ele só se casou para esconder duas coisas - ergui os dedos — Que ele é gay e que a filha que a esposa falsa dele está esperando, na verdade é do amante dele - eu disse entre os lábios apertados.— Nossa, isso seria um escândalo gigante - Sandro balançou a cabeça — Será mesmo que o Pietro não sabia disso ou fazia de conta que não sabia?— Eu realmente nunca cheguei a falar com ele sobre isso, é muito pessoal e se o Lucas nunca quis se abrir com ele sobre seu modo de vida, não seria eu quem iria fazer isso.Lucas nunca se abriu comigo sobre ser gay. Eu descobri. Mas isso nunca fez diferença para mim, ele é meu irmão e vai continuar sendo, independente do modo de vida que
Parte 5...— Eu sei bem disso, Sandro, mas pra mim estava tudo bem, até que esse bendito testamento apareceu.— Pietro deixou claro que o testamento só seria aberto depois de um mês de sua morte. O escritório tinha que cumprir seu desejo - Otávio balançou a cabeça.— Eu sei disso - cocei a testa — Só não pensei que teria que passar por essa cláusula ridícula.— Vai ter que mudar algumas coisas, querendo ou não. A outra alternativa é abrir mão da propriedade para Lucas.Eu esqueci por um instante e soltei um palavrão. Vi as caras das pessoas por perto.— Matteo, assim fica difícil te ajudar, homem - Sandro abriu as mãos — Segura a língua e o gênio forte.— Pra você é fácil falar - fiz uma careta.— Não é fácil, sei disso, mas não dê mais motivos para que as pessoas falem sobre você.— E o que falam de mim?— Que você é mimado, egocêntrico, mulherengo, cínico... E outras coisinhas mais que prefiro não comentar.Eu fechei a cara e apertei as mãos. As pessoas falam sem saber a verdade. Ne
Parte 1...Eu não queria ter que ficar lendo um monte de papel e e-mail agora, minha cabeça ainda está cheia do que os dois me falaram sobre a abertura do testamento. Eu tenho que fazer algo, mas o que?Passei pela recepção que nem prestei atenção se havia alguém esperando para falar comigo, como muitas vezes acontece. E nem estou com vontade de conversar com ninguém agora. Preciso colocar meu cérebro para pensar.Entrei no escritório tão rápido que nem prestei atenção se a songa monga da minha secretária estava em sua mesa. Até minha respiração está acelerada depois de sair do restaurante. Acho que talvez eu tenha passado por algum sinal vermelho pelo caminho até aqui, o que talvez em breve me faça receber uma multa.Me joguei na cadeira e virei para a grande parede de vidro que me permite ter uma vista muito bonita da cidade lá embaixo. Aqui não é tão alto quanto minha cobertura, mas ainda assim é bonito. Eu gosto de ficar olhando o movimento lá embaixo, os carros passando, as pesso
Parte 2...Ainda bem que não, porque eu até gosto de trabalhar aqui e o salário é muito bom, me ajuda bastante. Eu não sou uma pessoa que gasta demais ou que sai por aí desperdiçando dinheiro e até porque, eu nunca tive esse costume, não aprendi nem mesmo a ter dinheiro e dá um trabalho enorme para ganhar, juntar e usar direito. Pra gastar é um piscar de olhos, mas eu acho que até faço milagres com o que tenho.É melhor que eu vá logo comprar esse capuccino para ele. Uma vez eu caí na bobagem de comprar na cantina aqui da empresa e o homem reclamou três dias seguidos. Quando ele me pediu de novo, eu fui logo na cafeteria na rua de trás e comprei lá o café. Ele gostou e pensa que a cantina melhorou o capuccino. Nunca disse a verdade a ele. Pelo menos não reclama mais comigo sobre isso. Eu não posso ser responsável pelo trabalho dos outros, apenas do que eu faço.Peguei o cartão na gaveta. Esse cartão tem uma senha só para mim. Ele me deu esse cartão quando comecei a trabalhar no lugar
Parte 3...— Ok - ele pegou o café e provou um pouco — Dessa vez está mais encorpado. Prefiro assim. Parece que a cantina melhorou muito.Eu tive vontade de rir. Ele nem imagina que compro na cafeteria aqui perto. Pelo menos acertei em algo.— Precisa de alguma coisa agora?— Não - abanou a mão — Pode sair.Educado como sempre. Pelo menos posso voltar para minha mesa e me distrair com meu trabalho.— Espere!Merda! Pensei que iria conseguir me livrar por um tempinho. Parei e me virei devagar.— Quero que você cancele meus compromissos para amanhã de manhã.— Todos eles?Ele me olha fazendo uma cara impaciente.— Eu disse que cancele meus compromissos - levantou — Se eu não especifiquei, então são todos. Você tem problema de entendimento?— Não, senhor - apertei a unha na palma da mão.— Então faça o que eu disse e pronto, não fique me questionando - pegou o celular — Pode ir agora.Fiz um gesto com a cabeça e saí, fechando a porta devagar. Agora posso respirar melhor. Meu Deus, tem di
Parte 1...— Mas você acha que isso vai adiantar?Eu ando pela sala, pensando no que Sandro veio me falar. Seria ótimo porque me daria mais um pouco de tempo.— Eu posso tentar - ele abriu os braços — Que outra alternativa você tem?— Até agora? - fiz uma cara irônica — Nenhuma, é claro. Ainda não tive tempo de pensar em algo que se encaixe.— Eu dei uma olhada na agenda do Tim e ele tem uma viagem para fazer, então talvez eu consiga falar com ele para adiar a leitura do testamento. — E quanto tempo eu ganho com isso?— No mínimo quatro dias além do que já tem.Eu puxo o ar, coço o queixo. Não é lá grande coisa, mas pelo são uns dias a mais. O problema é que eu não tenho a menor ideia do que fazer.Sandro explicou como ele poderia convencer Tim a adiar a leitura dos documentos e se ele falasse com Lucas seria até melhor porque iria parecer que realmente não tinha nada demais nessa leitura. Lucas não sabia do conteúdo do testamento e na certa esperava apenas o básico.Até me sinto um
Parte 2...Ana...Nossa, fiquei até feliz em poder sair mais cedo, parece que ele estava adivinhando que eu precisava disso. Foi bom o Sandro ter falado com ele, não sei o que, mas me ajudou.Pegar o ônibus sempre é chato quando estou com dor na perna porque o degrau é alto e tenho que forçar a perna para alcançar, mas o remédio está ajudando agora porque dói menos do que pela manhã.Como sempre, o ônibus está cheio, mas não me demoro em pé. Logo um casal desce e eu fui pegar o lugar para me sentar antes que outra pessoa fosse mais rápida. Daqui até o hospital leva pouco mais de meia hora. Se o trânsito estiver mais limpo, um pouco menos.Terei tempo para ficar com Acácia hoje e isso pra mim é muito bom. Espero que ela hoje esteja em um bom dia porque poderemos intragir melhor.Alguns dias ela está longe ou então muito cansada e isso prejudica nossos momentos porque ela fica mais fora do ar do que na realidade. É uma pena.Eu sinto falta de nossas conversas, mas não dá para forçar, a