Nos afastamos e seguimos para o elevador. Minha mãe que nos esperava por ali limpou uma lágrima e meu padrasto logo estendeu um lenço para ela.
— Mamãe, não chore, ou eu irei borrar a maquiagem. — Pedi com a voz trêmula.
Ela me deu um abraço e meu padrasto me abraçou também. Esforcei-me para não chorar. Um casamento devia ser um processo feliz, mas eu estava tremendo por inteiro, assustada.
— Eu sinto que falhei em proteger você, minha filha. — Ela disse aos soluços, apertando os braços com força ao meu redor.
— Ninguém falhou em proteger ninguém. — Meu padrasto disse. — Estarei sempre aqui para proteger vocês duas, custe o que custar.
Sei que Irineo está dando o seu melhor e que apesar de não poder impedir que eu me case com alguém dentro da Máfia; ele está lutando bravamente naquilo que acredita. Por mais que eu tenha medo do meu noivo, eu também sei que meu padrasto não me abandonaria à má sorte. Deve haver um motivo para Duncan Delvecchio ter me escolhido como sua noiva e para que Irineo tenha permitido nosso casamento.
Sei que pode parecer maluquice da minha parte, mas eu confio muito em Irineo e em seu julgamento. Ele tem sido um verdadeiro pai para mim, me dando carinho e conselhos. Seu jeito doce e amável é que acende em mim a necessidade de ser uma boa filha para ele.
— Não se preocupem comigo, — minha voz soou trêmula pela emoção, mas eu a fiz sair bem firme, para que eles soubessem que eu ficaria bem. — Ainda vai levar um tempo para eu me casar, não vão se livrar tão fácil de mim. — Brinquei.
Minha mãe se afastou limpando as lágrimas e Irineo logo deu a ela seu lenço do paletó com o qual ela secou os olhos, se esforçando para não borrar a maquiagem.
— Vamos, Antonella, dê crédito para Vicenza, ela é esperta. — Tentou acalmar os ânimos.
— Claro, é um casamento, devemos comemorar. — Minha mãe disse devolvendo o lenço. — Os Delvecchios também são aliados adequados, não casaria minha filha com qualquer um.
— Eu não me casaria com qualquer um e acredito no julgamento de vocês. — Tentei os tranquilizar, embora naquele momento nem eu pudesse acreditar naquilo. — Se acreditam nisso, vou honrar com a minha parte.
Meu padrasto estava lidando com problemas maiores e eu sabia que o meu casamento era uma parte importante para nos garantir proteção. Eu podia encarar um casamento em troca de alguma segurança.
— Eu sei que você é uma boa menina, Vicenza. — Minha mãe me olhou com alguma admiração faiscando em seu olhar.
— Se serve de algum consolo, Duncan faz sucesso com as garotas da Sociedade, há muitas que esperam por uma proposta de casamento. — Meu padrasto tentou.
Eu dei um riso baixo e cobri levemente a boca com a mão, balançando a cabeça. Eu podia imaginar o porquê.
— Imagino que sim! Ele tem muito boa aparência.
Quando o elevador abriu, uma onda de sons distantes da festa invadiu o corredor. As risadas e conversas animadas dos convidados ecoavam suavemente, me dando uma sensação de que eu não poderia nunca escapar do que estava prestes a acontecer. Não que eu fosse dar de noiva fugitiva, não há escapatória, mas eu estava buscando acreditar que aquele não era o fim do mundo. Dos homens disponíveis na máfia, Duncan foi escolhido por meus pais por algum motivo. Eu precisava descobrir qual.
— Mesmo? — Meu padrasto encarou-me confuso, segurando a porta do elevador para nós duas.
— Eu concordo, vi algumas fotos e nos encontramos com ele pessoalmente há algumas semanas, mas… — Minha mãe passou e segurou o meu braço, tentando ficar mais animada. — Quero saber como você sabe disso, mocinha?
— Ah, eu o vi no seu casamento, mãe. — Não era de todo mentira, mas daí a dizer que ele tinha causado uma boa impressão em mim, já era outra história.
— Ouviu isso, Irineo? — Minha mãe virou-se para o marido sorridente. — Ela o viu em nosso casamento.
Irineo franziu as sobrancelhas e esquadrinhou o meu rosto desconfiado. Eu tinha certeza que o incidente com Duncan não havia passado despercebido para ele durante a festa, nada escapa esse homem, mas eu tinha meus truques.
Dei um sorriso.
— Bem, eu ainda era muito nova para dançar com ele, na época! — Brinquei me divertindo.
— Ainda é muito nova para muitas coisas, comporte-se! — Enciumado como um verdadeiro pai, ele ralhou.
Caminhamos em direção à sala de reuniões onde o contrato seria assinado, cada passo ressoando no chão de mármore polido.
— A festa já começou? — Minha mãe olhou para o final do corredor, onde ficava o salão, não iríamos para lá ainda, só depois de assinar o contrato.
— Sabe como minha família é, minhas irmãs estão ansiosas por esse contrato. — Irineo disse e colocou a mão nas minhas costas. — Sinto muito que esse peso recaia sobre você, Vicenza.
— Irineo… — Virei-me para ele e segurei suas mãos. — Você me salvou e também salvou a minha mãe, é o mínimo que posso fazer para retribuir.
Eu não estava mentindo. Endureceria, aguentaria qualquer coisa! Eu prometi a mim mesma que o faria.
Continuamos a andar e eu sentia a ansiedade aumentar, meu coração batendo mais rápido e meus dedos trêmulos agarrando a saia do vestido. As vozes alegres e a música festiva tornavam-se um pano de fundo distante enquanto nos aproximávamos da porta fechada. Cada passo parecia mais pesado, cada respiro mais difícil. Meu corpo inteiro estava tenso, uma mistura de medo e antecipação apertando meu peito.
Paramos diante da porta de madeira maciça e puxadores dourados. A porta se abriu e, pelas frestas, eu já espiava o interior com curiosidade crescente, vislumbrando apenas silhuetas indistintas. Eu via somente partes, os dedos longos, os papéis do contrato… era como um sonho, um dejavú.
A porta se abriu completamente e o ambiente se revelou um espaço escurecido com uma mesa grande e imponente no centro, com cadeiras de madeira e estofados brancos. O recinto estava cercado pelos guarda-costas sérios e advogados de semblantes graves. Uma mulher de postura rígida também estava presente, ao lado de Duncan, cuja figura se destacava.
O nó na minha garganta apertou e eu estava respirando tão nervosa que o meu peito subia e descia. Duncan Delvecchio estava sentado à mesa, fazendo meu coração acelerar como se eu estivesse dentro de um carrinho na curva mais perigosa da montanha russa. Suas mãos habilidosas estavam repletas de anéis, aquele dourado com o brasão de sua família no dedo indicador era o mais chamativo e capturava o meu olhar.
Ele dobrava as folhas do contrato transformando-as em sapos de origami, que saltavam com um leve toque do seu indicador. Alguns já estavam espalhados pelo chão. Aqueles papéis, tão cruciais a ponto de me tirarem o fôlego, eram tratados como meros brinquedos em suas mãos.
A fascinação pela sua personalidade intrigante me prendia completamente. Duncan Delvecchio tinha um magnetismo instigante, uma personalidade inconstante que agitava completamente o meu coração.
Como um homem dez anos mais velho do que eu pode mexer tanto comigo dessa forma?
Capítulo 005— Há algum problema com o contrato, senhor Delvecchio? — Meu padrasto perguntou entrando na sala.Duncan ergueu a postura, mas não se levantou, apoiando o queixo na mão com o cotovelo por cima da mesa, com a outra mão, deu um peteleco no sapo de papel, fazendo-o parar diante dos meus sapatos. Seus cabelos escuros caiam adoravelmente em seu rosto pálido, seu maxilar estava relaxado, diferente da primeira vez que nos vimos e achei a curva de descontentamento em seus lábios ainda mais adorável. Eu certamente não devia pensar assim, mas Duncan Delvecchio era mesmo um dos solteiros mais bonitos da alta sociedade. Era inegável.— Este contrato não me satisfaz. — Revelou com a voz calma, ainda mansa. O timbre grosso e rouco fez meu corpo se arrepiar. Fazia tempo desde a última vez que ouvi sua voz e ela continuava hipnotizante.Meu padrasto suspirou cansado, com ambas as mãos na cintura por cima do paletó:— E como podemos agradá-lo então?— Fiz algumas alterações. — Duncan fez u
Os guardas de Duncan tinham levantado suas armas para mim. Por mais que o som das armas municiando me fizessem tremer as pernas, eu me mantive em pé, encarando meu futuro noivo com fogo no olhar.— Não a machuque! — Irineo interveio.Duncan ergueu a mão, olhando para os homens atrás de mim e pedindo calma de maneira descontraída:— O que estão fazendo? — Reclamou. Os homens recuaram. — Saíam da sala, quero resolver logo o contrato com minha noiva e vocês estão nos atrapalhando. — Ele disse, expulsando seus guardas-costas e virando-se para mim. Fiquei chocada com suas palavras e percebi que ele realmente considerava um casamento entre nós. — O que você quer, pequena? Estou ouvindo.Senti o tom de escárnio e desafio em sua voz. Mas se ele achava que eu me dobraria tão facilmente, estava enganado. Não demonstrei medo para ele na primeira vez que o vi e certamente eu não o faria agora. Os guardas deixaram a sala e ficamos apenas nós, os advogados e os seguranças do meu padrasto.— Não lev
A decoração da festa tinha sido exatamente como imaginei, mas agora que eu olhava para ela, via que talvez eu tivesse sido muito ingênua na escolha de alguns elementos. As cores que escolhi eram para representar uma pintura renascentista com ares de vernaglia; aquela nostalgia da primavera.Rosas exuberantes em tom rosa claro eram expostas puras em vasos longos dourados. Os pratos tinham bordas douradas e rosas delicadas pintadas à mão por uma artista talentosa. Os lustres eram pendurados, com cristais que expunham feixes de luzes brilhantes e reluziam as lâmpadas amareladas. O salão fora coberto por um tapete cinza claro, os sofás, de couro branco, adornados com almofadas douradas e rosas. Nas mesas, em estilo provençal, haviam arranjos arrojados.A única coisa destoando naquela decoração toda era um adorno de pomba que deveria representar fidelidade, harmonia e união entre os noivos e que agora eu suspirava resignada só de olhar para ele. Como haveria paz entre eu e Duncan?! Como eu
Duncan tirou seu paletó o jogou sobre meus ombros. Dei um salto e olhei para o lado. Sentir o calor dele sobre o meu, foi como receber um abraço. O perfume intenso estava impregnado em sua roupa, me envolvendo. Meus olhos capturaram o coldre que ele usava, que lembrava um suspensório e segurava as duas armas nas costas.Engoli em seco encarando as pistolas cromadas de um metal levemente dourado, indicando que eram personalizadas. Quando ele transita para a leveza dessa forma, quase me esqueço de que Duncan é um homem perigoso.— O que está fazendo? — Questionei.— Está frio.— Eu posso pegar uma estola com uma das responsáveis pela festa, não precisa se preocupar. — Tirei o paletó e devolvi para ele.Fiquei segurando a peça no ar, mas Duncan não se mexeu. A única coisa que ele fez foi tirar o cigarro dos lábios e soltar a fumaça pela boca. O breve silêncio entre nós foi preenchido pelo som da música no salão, uma balada lenta.Duncan cortou o momento com um “tsc”.— Você quer me mostra
A brisa outonal batia fresca em meu rosto, queimando levemente minhas bochechas. Em frente ao Collegio Palazzo Splendore, as folhas das árvores estavam em tons vibrantes de laranja, vermelho e amarelo. Avistei Ottavia de longe, seus cabelos ruivos da cor do cobre sempre chamavam a atenção, mesmo em dias nublados. Ela levantou do banco ao me ver e veio rápido em meu encontro, segurando o celular enquanto puxava os fones de ouvido, a mochila Fendi balançando de um lado para o outro.— Vicenza! — Ela me abraçou e um sorriso espalhou no meu rosto. — Que saudades!— Também senti sua falta. — Respondi apertando os braços ao redor da minha amiga.De repente ela começou a farejar meus cabelos e roupas.— Uau, que cheirinho bom, é o novo perfume da coleção que a empresa do seu pai lançou? Aquele com cheirinho de pêssego?— Sim, é ele.— Ai! Eu estou louca para comprar. Assisti a propaganda com o Mattia! Ele é tão lindo! Você chegou a conhecê-lo? Foi por isso que você sumiu nas férias? Não me di
Alguns dias depois…O ambiente da biblioteca era tão ensurdecedoramente silencioso que meus fones de ouvido tocavam uma playlist das minhas bandas favoritas de K-pop. Estiquei os braços em um espreguiçamento discreto e verifiquei o relógio do tablet, controlando meu tempo com precisão.Após alguns dias de retomada à minha rotina habitual, consegui, de certa forma, empurrar os problemas com Duncan para o fundo da mente — embora a pulseira no meu pulso me lembrasse dele quase o tempo todo. O calendário avançava inexoravelmente e, a cada dia, eu me percebia menos como solteira e me enchia de uma ansiedade crescente.Aproveitava o horário vago para pesquisar arte abstrata para as aulas particulares com minha tutora de arte no famoso ateliê da cidade. A tarefa era apresentar um tema de trabalho e aprimorar minha estética, mas encontrar informações relevantes estava se provando uma dificuldade.Ainda com os fones nos ouvidos, levantei-me da mesa e fui até a estante de arte, navegando pelos c
O aroma dentro do carro era opressor, dominado pelo perfume de Duncan. Uma mistura de notas amadeiradas e cítricas que, embora sofisticadas, se tornavam esmagadoras em um espaço tão confinado. O cheiro se infiltrava em meus sentidos, tornando impossível ignorar sua presença ao meu lado.Minhas mãos apertavam forte a mochila, quando tive finalmente coragem de cortar o silêncio incômodo entre nós:— Onde você está me levando? Meus pais sabem que veio aqui? Aliás, o que você está fazendo desse lado da cidade uma hora dessa? Não devia estar em seu cassino cuidando dos negócios, uhm?Duncan não tirou os olhos da estrada, mas pude ver o sorriso de canto em seu rosto. — Seus pais sabem onde você está, — respondeu com a voz controlada, mas com um tom de impaciência nítido em seu timbre rouco. — Quanto ao meu cassino, ele pode esperar. Agora, fique quieta e coloque o cinto de segurança.— Ele pode esperar? Não pareceu que podia quando me deixou plantada esperando você voltar. — Alfinetei.— Ts
Capítulo 012Duncan estava esperando em pé encostado na parede e mexendo no celular, ele tinha optado por uma roupa mais casual, porém igualmente elegante. Notei que ele vestia-se sempre de preto. Ele me encarou devagar, seu olhar passeando pelas minhas roupas, avaliando minha escolha com uma aprovação silenciosa.— Está perfeita, — por um momento, pude ver uma suavidade em seus olhos que raramente aparecia.— Não vai me dizer onde vamos? — Questionei me aproximando dele.— Estragaria a surpresa, pequena.— Então é uma surpresa? — Queria arrancar alguma informação sobre o local onde ele me levaria, mas Duncan ficou misterioso o tempo todo.— E eu? — Ele mudou de assunto erguendo os braços. — Estou aprovado?— Hmmm, está faltando algo. — Provoquei com um tom de piada. Olhei ao redor e meus olhos viram uma arara com cachecóis, eu fui até lá e peguei um vermelho escuro para ele, me aproximei. — Não sei onde vamos, mas está esfriando, vista esse também.Ele se inclinou para frente, esper