— Está certo. — Eu digo, simplesmente, para me livrar dela.
Tento me acalmar depois que ela sai. Permaneço no meu lugar por alguns minutos, olhando para o nada. Sinto uma tensão no ar, como se algo estivesse prestes a acontecer.
Escuto os movimentos de Zafir ao longe. Imediatamente, meus olhos o procuram. Sua expressão fria não revela nada diretamente, mas eu percebo o leve traço de irritação em seus gestos. Ele guarda as suas coisas na mala com uma força exagerada, como se estivesse descontando uma raiva silenciosa.
Respiro fundo e começo a colocar as minhas coisas na mochila, tentando imitar a sua compostura, mas sinto o meu coração acelerado. Quando termino, volto a olhar para ele. Zafir está sentado atrás da sua mesa, me observando em silêncio, os seus olhos escuros cravados em mim como se estivessem a desvendar todos os meus segredos.
—Sente-se aqui, senhorita Nurab —Ele aponta uma cadeira em frente à sua, uns dez passos distantes de sua mesa.
Eu obedeço. Com passos vacilantes me aproximo dele e me sento aonde ele indicou. Coloco minha mochila no chão e o encaro.
Ele me olha calado por um tempo. Então se levanta, meu coração já disparado, salta dentro do peito. Zafir se apoia na mesa. As pernas esticadas para frente, cruzadas. As mãos enfiadas no bolso.
—Muito bem. Você deve saber porque eu pedi para que ficasse.
—Sim, porque estou com dificuldade na matéria. — Eu me faço desentendida.
Ele me dá um sorriso frio.
—Sério isso? — Diz ele em tom frio e ameaçador. —Você vai se fazer de desentendida?
Eu respiro fundo e, em seguida, engulo secamente.
—Não foi minha intenção invadir sua privacidade.
—Bem melhor. —Ele diz com escárnio.
—Podemos apenas fingir que isso não aconteceu? —Suplico.
Ele estuda meu rosto.
—Quando começou a frequentar minhas aulas, eu tinha uma outra ideia de você. Me surpreendi com sua atitude. E então, tem gostado do que tem visto? Geralmente estou coberto, mas e quando ando nu pelo quarto? Isso te agrada?
Eu me levanto indignada.
—Está falando isso para me constranger, nunca te vi nu!
Ele estica os lábios em um sorriso frio. Eu estremeço.
Allah! Eu tinha acabado de confessar que eu o tenho observado continuamente.
Minha respiração fica agitada, irregular. Ele se aproxima de mim. Meu coração agitado parece um que vai sair voando da minha garganta. Ele para à minha frente, nossos corpos quase se tocam.
—Sente-se! —Ele diz entredentes.
Trêmula e ofegante, obedeço. Respiro fundo, tentando me acalmar.
—Olha, eu não sou desse tipo que está pensando. —Digo de cabeça baixa. Então a ergo. — Desculpe-me por ter invadido sua privacidade. Mas dá para esquecer isso, por favor? —As palavras saem fracas, suplicantes.
Seus olhos mudam e eu me encolho com a intensidade de seu olhar.
—Tudo bem. Não falamos mais no assunto. Mas uma coisa exijo. Que você guarde o que viu com você. Não quero minha vida exposta.
—Eu nunca falaria nada.
Sua mandíbula flexiona, mas ele não diz nada.
— Posso ir? —Eu suplico. —Acho que você perderia o emprego se te vissem com intimidade com uma aluna. —Eu de repente o acuso.
—Você está me ameaçando?
—Não, falo para o seu próprio bem.
—Para a sua informação, isso só aconteceria se eu estivesse dando aula para o ensino superior. Já neste curso, extracurricular, não tem nenhuma clausula que impõe isso.
Eu estremeço ao saber disso. Pego a minha mochila e me levanto.
—Bem, estou indo.
—Não, sem ainda me dizer por que, esse tempo todo estava me espionando?
Eu abro a boca e a fecho. O silêncio fica entre nós.
Se eu colocasse toda a culpa em Samantha, eu estaria mentindo. Eu o espionava porque ele me atraía como um poderoso imã.
—Eu...não sei. Curiosidade. — Eu continuo estudando-o. Ele está me observando, sua expressão desprovida de qualquer emoção.
Ele se aproxima mais, parece uma cobra que anda sinuosa e aí, quando você menos espera, dá o bote.
—Você nunca namorou? Nunca teve um homem de verdade?
Meu coração b**e em minha garganta quando me lembro do meu relacionamento inofensivo com Liam. Não cheguei a namorar, meus pais descobriram meus intentos antes e foram contra.
E quanto a um homem de verdade, Liam parecia um cachorro de madame, inofensivo comparado a Zafir, um lobo com dentes afiados e garras.
Engulo em seco.
—Eu...eu preciso ir, meus pais controlam meu horário. Você deve saber, pois conhece muito bem nossa cultura. Você também é libanês? Percebi pelo sotaque.
Ele dá um sorriso rápido.
—Sim, não poderia ser diferente. Gilbert é um bairro formado por imigrantes libaneses. Você não sabia disso?
Ah! Está explicado porque meu pai escolheu meu bairro para viver.
—Não, eu não sabia. Não reparei.
Surge em seu rosto um sorriso cheio de segundas intenções. Tento esconder o arrepio que percorre meu corpo.
—Não? Olhos tão observadores, não reparou nisso. Só reparou na vida de um homem solitário?
Eu recuo.
—Olha, preciso ir. Prometo que isso não irá acontecer novamente.
—E então? Tem gostado do que tem visto? —Ele diz num tom baixo, ameno.
Eu sinto meu rosto queimar.
—Por favor. Pare com isso! Eu errei. Prometo não fazer mais isso.
Ele avança, fazendo meu coração saltar no peito. Seus dedos passam pelos meus cabelos, sinto sua respiração quente soprando no meu rosto.
Com certeza ele quer me dar uma lição pelo meu comportamento. Afinal, seu coração já pertence a alguém. Ou ele me quer só para transar. Uma aventura.
—Você não respondeu minha pergunta.
—Olha, eu não tenho que responder nada.
—Muito bem. O que foi? Achou que não teríamos essa conversa? —Ele sorri friamente. —Sabe que eu fiquei impressionado com sua tática para me comover?
Eu o encaro estática, tentando entender suas palavras:
—Como? Eu? Te comover?
Ele fecha a cara.
—E não?
Só então entendi o que ele se referia.
—Você está achando que eu me esborrachei no chão de propósito?
—Sei que é grave na nossa cultura uma mulher ficar olhando um cara seminu. Cair para mostrar-se frágil. E falar nossa língua me lembrando que pertence ao nosso povo, foi magistral.
Eu o encaro furiosa.
—Olha, eu sei porque está agindo assim! Por que eu te vi num pior momento. Você sofre por alguém. O que foi? Ela magoou você?
Seu rosto se fecha em dor, seus olhos soltam faíscas e eu me arrependo por ter tocado no assunto. Meu coração se aperta. Uma dor diferente de tudo que eu já senti. Eu sabia que estava desenvolvendo sentimentos por Zafir, mas nunca, nem por um segundo, pensei que eles eram tão fortes. Eu não tinha percebido até esse momento.
Zafir se recompõe e se aproxima de mim com o olhar duro.
— Uau. Sua imaginação é impressionante. Está no curso certo. Será uma ótima escritora.
Eu respiro fundo.
—Olha, eu errei, não devia ter invadido sua privacidade. Esquece isso, por favor. —As palavras saem fracas, suplicantes.
Tento me afastar, mas ele me segura pelo braço e me puxa. Estremeço quando nossos corpos se chocam. Seu olhar desce para os meus lábios e depois procuram os meus olhos.
—E então, Jade. Coloca para fora aquilo que está em seu coração e tranca à sete chaves. Pensa que não reparei a forma que olha para mim quando eu não estou olhando? Sou um homem vivido.
— Você acha que estou babando por você?
—E não? —Ele diz com uma expressão irritantemente confiante.
—Não. Você não faz meu tipo. —Digo seca. —Preciso ir.
Ele gargalha, parecendo o gênio do mal, e eu fico espantada, olhando para ele, sentindo-me totalmente vulnerável. De repente, ele me puxa para os seus braços. Estremeço com o calor dele e sou privada de oxigênio. Olho assustada em os seus olhos, com cada centímetro de mim queimando de calor. Ele sorri diabolicamente antes de sua boca cobrir a minha.Estremeço ao sentir a umidade morna e deliciosa de a boca dele. O gosto dele é de menta.Allah! Eu nunca tinha sido beijada assim antes. Sinto-me devorada por os lábios dele, enquanto a sua língua invade a minha boca. Sinto os braços dele me puxando para mais perto, cada vez mais. Um choque de prazer atravessa o meu corpo quando percebo o estremecimento dele.Não sei quanto tempo passou com os seus lábios movendo-se nos meus, sugando. Quando ele me puxa ainda mais, sinto o cume duro em as suas calças pressionando contra a minha barriga. Isso causa um efeito devastador em mim e me assusta.Ofegante, fujo de os seus lábios e espalmo minhas m
— Pai eu estou dizendo a verdade!—Verdade? Da mesma forma que você falou a verdade quando se encontrava escondido com Liam?Eu me aproximo dele.—Pai, olha. Sei que errei por ter escondido Liam do senhor, mas eu já disse um milhão de vezes, eu nem o beijei. Só estávamos nos conhecendo. —Baixo a cabeça com o rosto mergulhado em lágrimas. —Mas agora, acredite em mim…Ah, eu posso provar! O senhor pode falar com meu professor.Foi pior, meu pai se enfurece. —Ah, é com ele que está saindo? Um mundano! Juntos, combinaram de mentir para mim?—Pai, ele descende de libaneses. Ele não mentiria para o senhor. —Digo, sem alternativa.Os ombros de meu pai caem em alívio. Allah! Meu pai não pode saber que ele é nosso vizinho.—Libanês?—Sim. O senhor pode ir na escola conversar com ele se quiser. Ele pode explicar o porquê cheguei tarde.Meu pai olha para a minha mãe e depois me encara.—Tudo bem, eu ligarei na escola para saber se diz a verdade.—Está certo, vou subir. —Digo, carregada de trist
Às sete horas, começo a me preparar para o jantar. Visto a primeira coisa que encontro. Um vestido azul-marinho, uma sandália preta. Sinto uma certa intranquilidade. Ando pelo quarto; não consigo ficar parada. Ainda sinto a sensação dos beijos de Zafir e os braços dele no meu corpo. A imagem dele transtornado também não me sai da cabeça. Eu me sinto culpada. Só não o suficiente, por isso, no escuro, vou até a janela novamente.Afasto só a fresta da minha cortina e olho para a sua casa.Cortinas!? Ele puxou as cortinas?Coloquei a mão na boca abafando um riso nervoso. Com um suspiro me afasto. Não sei o que pensar.Allah! Quão injusto é o nosso destino. Quando eu sinto algo realmente por alguém, ele está fora do meu alcance. Eu nem me preocupo mais com Samantha. Zafir não está pronto para amar, se ligar a alguém. Quando ele me beijou, foi por desejo animal, arrogância, dominância, não sei.Allah! Esperei tanto por alguém como ele, mas há esse oceano entre nós. Uma vozinha interior me
No dia seguinte, sem curso, passei o meu tempo tentando ser produtiva. Era uma forma de me distrair e não pensar tanto em Zafir. Ajudei na cozinha, na arrumação da casa, e estudei um pouco.No começo da tarde fiquei na biblioteca. Tirei para tocar piano. A música sempre acalmava meus nervos. Toquei três canções. Amira, Mabruk e Khalia.Agora, fim de tarde, sem nada pra fazer, estou na varanda. Yasmin está mais à frente, brincando com sua casa de bonecas. Mas não presto atenção nela, meus olhos estão vidrados, sem nada ver, pois uma dor de cabeça chata martela as minhas têmporas e minha mente está invadida por imagens de Zafir. Fico revivendo tudo. Como um disco quebrado.Ele era bem enervante.Arrogante!Convencido!Por que eu penso tanto nele?Levanto-me da cadeira e entro para dentro.~ * ~ * ~ * ~ZafirDepois de dar uma corrida no quarteirão, chego em casa às cinco horas da tarde. Abro a porta e entro no hall espaçoso e sigo até a sala silenciosa. Subo as escadas e entro no meu qu
JadeEscovo os dentes com força desnecessária. Observando-me no espelho, aliso a camisa branca e a calça preta. Examino o meu cabelo. Resolvo deixá-los soltos. Olho a minha camisa com raiva. Ela me deixa gorda.De tão nervosa, estou tremendo.Vamos lá Jade. Por que tudo isso? Por que esse nervosismo todo?Respiro fundo.— Eu deveria me trocar. — Eu digo para o meu reflexo, quando me viro e olho como a camisa está larga. Vou até o armário e pego uma mais justa.Quarenta minutos depois estou já na sala de aula. Vestindo uma camisa preta para agradá-lo e ao mesmo tempo forçando a não ceder o meu desejo absurdo de ir embora. Tomo uma respiração profunda quando vejo Samantha. Ela não está com uma cara boa. Mas quando me vê sorri.—Aconteceu alguma coisa? —Pergunto curiosa.—Não. Está tudo ótimo.Pouco tempo depois, a sala zumbia com a conversa. Eu mantive os meus olhos longe da porta, olhando o vazio. Quando todos pararam de falar, eu engulo em seco. Ergo os meus olhos e dou com os negros
Zafir se aproxima muito rápido e me cerca pela cintura. Abri minha boca surpresa. Ele parece estar esperando alguma reação minha, mas eu estou tão fascinada que tudo o que consigo é ficar olhando para ele. Ele se inclina para a frente e eu estremeço. A expressão dele me diz que sou uma batalha ganha.—Não podemos. —Enfim, consigo dizer, mas minha voz sai tão fraca.Ele sorri. Passa longos segundos olhando para a minha boca com um fascínio explícito antes de voltar a olhar nos meus olhos.—Claro que podemos. — A voz dele é pouco mais que um sussurro, mas vibra pela minha pele, penetra nos meus ossos.Allah, sim, sim... penso observando esses lábios tão gostosos. Como se ele pudesse ler meus pensamentos, ele sorri sem tirar seus olhos dos meus lábios.Então, sua boca cobre a minha com um gemido, num beijo quent
Na idade dela, eu acompanhava meus pais com prazer. Papai sempre me comprava algo que eu gostava, e depois íamos a uma lanchonete. — O almoço está pronto — ela avisa. — Obrigada. Já vou descer. — Você não vai com a gente? — Não. — Viu meu vestido novo? Levanto-me da cama. — Vi. Ficou lindo em você. — Por que não quer ir conosco? Sorrio para ela. — Nem sempre o que é bom para nós é bom para outra pessoa. Na sua idade, eu gostava, mas agora cresci. — Se eu crescer e ficar como você, não quero — ela responde com a sinceridade de uma criança. Rindo, pergunto: — O que tem de errado comigo? — Você está sempre fechada no quarto com essa cara. Caímos na gargalhada. Ela faz uma expressão séria, olhar vidrado num canto, imitando-me. Rimos juntas. — Vamos descer, ô “encrenca”. Descemos as escadas. Yasmin está certa. Ser criança é bem menos complicado. O almoço transcorre em um silêncio característico. Cada um preso em seus próprios pensamentos. Mas algo está errado. Papai não e
Zafir? Engulo em seco.Com o coração acelerado, abro a porta até onde a corrente de segurança permite. Ele ainda usa as mesmas roupas da escola: calça preta, camiseta preta e botas de cano curto.— Zafir? Aconteceu alguma coisa?— Preciso falar com você.Não consigo evitar uma risada nervosa, pois a frase combina com ele.— Meus pais não estão em casa, e eles não permitiriam sua entrada.— Quer fazer o favor de abrir essa porta direito? — Ele diz, impaciente.Fecho a porta, retiro a corrente de segurança e a abro por completo. Agora estamos frente a frente.— Bem melhor. Eu não vou entrar. Podemos nos sentar aqui e ter essa conversa. — Ele aponta o banco em frente ao jardim, ao lado da porta.