O som dos passos apressados ecoava pelos corredores da mansão, mas eu não me movi. Estava parada na janela de meu quarto, olhando para o luar, perdida em meus próprios pensamentos. Lá fora, a floresta parecia tranquila, mas dentro de mim tudo estava em ruínas. O vínculo, a dor, o sofrimento que me consumiam — parecia que a lua havia se afastado de mim, deixando-me à deriva em um mar de desesperança.
Eu sabia que algo estava por vir. Não sabia exatamente o quê, mas o clima dentro da mansão havia mudado. Havia uma tensão no ar, algo pesado, como se a própria terra estivesse se preparando para um grande acontecimento.
Então, ouvi os passos dele. Rafael. Como se o som de seus pés no piso de madeira soubesse exatamente quando ele me encontraria. Seu cheiro invadiu meus sentidos antes mesmo que ele chegasse à porta. Eu não me virei para olhá-lo, não queria enfrentar os olhos dele, aqueles olhos que, apesar de me rejeitarem, continuavam a me consumir com um poder que eu não conseguia ignorar.
A porta do meu quarto se abriu lentamente, e eu senti a presença dele atrás de mim. Rafael ficou ali, imóvel, observando-me em silêncio. Eu sabia que ele estava esperando por algo — por uma reação minha, talvez. Mas eu não tinha mais nada a dizer. Não havia palavras que pudessem aliviar a dor que ele me causava, não havia gestos que pudessem diminuir o vazio que ele deixava dentro de mim.
— Isadora. — A voz de Rafael era firme, mas havia algo nela que eu não conseguia identificar. Ele não estava zangado, mas também não parecia suave. Era uma voz de comando, uma voz que deixava claro que o que ele ia dizer não era uma questão de escolha.
Eu não olhei para ele, mas murmurei com a voz trêmula
— O que é, Alfa?
Ele deu um passo à frente, seus passos pesados, mas suaves, como se soubesse que sua presença estava marcando cada segundo do meu sofrimento. Ele se posicionou ao meu lado e olhou para fora, para a floresta que se estendia como um manto escuro sob a luz da lua.
— O Clã… — Ele pausou, como se estivesse ponderando suas palavras. Quando voltou a falar, havia uma gravidade em sua voz. — O Clã Lunar está se preparando para um evento importante. Eu… eu irei oficializar meu casamento com Selene.
Eu não o encarei. Sabia que essa notícia não era novidade. Era algo que todos no Clã já esperavam. A união deles era natural, inevitável. Todos sabiam que Rafael e Selene eram destinados um ao outro, que o vínculo deles era forte, como a própria lua. A dor que eu sentia não era surpresa, era apenas um lembrete constante de que eu não pertencia àquele mundo.
Mas então, ele continuou, e suas palavras me atingiram com a força de um soco.
— E você será obrigada a comparecer à cerimônia. — Sua voz soou autoritária, como se a ordem não fosse passível de questionamento. — Não há escolha, Isadora. O seu lugar está aqui, com o Clã. Como parte dele. Você tem um papel a desempenhar.
Eu me virei lentamente para encará-lo, meus olhos agora tão frios quanto o gelo que parecia tomar conta de meu coração. Minha garganta estava apertada, o nó da raiva e da dor me impedindo de falar. Mas, no fundo, eu sabia que não havia como fugir daquilo. Não havia como escapar dessa armadilha que ele havia me imposto. Ele não queria que eu fosse feliz. Não queria que eu tivesse um propósito, uma escolha. Eu não passava de uma sombra, uma obrigação a ser cumprida.
— Você não pode me forçar a isso — falei, minha voz tremendo de raiva e frustração. — Eu não sou parte desse casamento, Rafael. Não sou parte de vocês.
Ele me olhou por um momento, seus olhos escuros observando-me com uma intensidade que me fez sentir como se estivesse sendo despida de minha alma. A dor do vínculo começou a pulsar, ainda mais forte, como se ele estivesse me marcando mais uma vez, mais profundamente.
— Eu não estou pedindo sua permissão, Isadora — ele disse, sua voz tão grave quanto uma sentença de morte. — O que eu estou dizendo é que você é obrigada a estar lá. Não só por mim, mas por tudo o que o Clã representa. O seu lugar é ao nosso lado. Você não tem mais escolha.
Eu queria gritar, queria dizer-lhe tudo o que estava guardado dentro de mim, mas não consegui. As palavras simplesmente não saíam. Eu não podia falar o que queria, não podia expressar a dor, o ódio que crescia dentro de mim. Eu estava cega pela raiva e pela tristeza, mas sabia que não havia como sair daquilo. Eu tinha que estar ali, observando o casamento entre Rafael e Selene, o homem que eu amava se unindo à mulher que ele havia escolhido.
— Eu farei o que for necessário para o Clã, Alfa — minha voz saiu fria, sem emoção. Eu sabia que ele não queria que eu me rebelasse, mas também sabia que minha dor era invisível para ele. Nada mais importava.
Ele fez uma pausa, como se estivesse estudando minha reação, antes de se virar para sair. Seus passos foram suaves, mas pesados ao mesmo tempo. Ele sabia que tinha me derrotado. Ele sabia que eu não tinha poder algum sobre minha vida, sobre minhas escolhas.
Antes de sair, ele parou à porta e disse:
— Não esqueça, Isadora. Você tem um lugar no nosso mundo. O que você é e o que você sente não muda a realidade. Esse casamento não é só meu, é de todos nós.
E com isso, ele saiu. A porta se fechou com um clique suave, mas o eco daquele som permaneceu em minha mente, como uma sentença.
Eu caí de joelhos no chão, a dor do vínculo agora se tornando insuportável. Eu podia ouvir os ecos da cerimônia, os risos, as promessas, os votos que nunca seriam meus. Eu estava ali, sozinha, e ninguém sequer olharia para mim. Meu coração, que ainda batia com esperanças tolas, agora estava reduzido a nada mais do que uma sombra, uma lembrança do que poderia ter sido.
Mas eu não podia me permitir sucumbir à dor. Não agora. Eu tinha que ir. Eu tinha que estar lá. Mesmo que fosse a última coisa que eu queria fazer. Porque, no fundo, sabia que o caminho que Rafael havia escolhido para mim seria o meu destino.
A noite passou lentamente. Eu fiquei ali, na escuridão do meu quarto, me preparando para o dia seguinte. O dia da cerimônia. O dia que selaria meu lugar no mundo de Rafael. E, com isso, minha condenação.
Eu não sabia o que esperar da cerimônia. Sabia apenas que seria um marco na minha vida, e não um marco qualquer. Era o tipo de evento que mudaria tudo. Ou, pelo menos, era o que o Clã esperava. O casamento de Rafael e Selene não seria apenas uma celebração de união. Seria uma afirmação do poder, da hierarquia, da separação entre os que pertencem e os que estão destinados a viver à margem.Minha mente estava um turbilhão de pensamentos enquanto eu me preparava, ou melhor, enquanto tentava me preparar para o que estava por vir. O vestido que me deram era simples, sem brilho, sem luxo. Nada mais do que um reflexo de minha posição dentro daquele mundo. Eu não era importante o suficiente para merecer algo especial.Naquela manhã, antes de sair para me juntar ao Clã, o silêncio no meu interior foi quebrado de maneira inesperada. Freiren, minha loba, a presença que eu sempre mantive escondida, que raramente falava comigo, apareceu em minha mente com uma clareza que me assustou. Sua voz era s
A cerimônia era tudo o que eu esperava e temia. A mansão do clã estava tomada por uma vibração frenética, lobos de todas as idades reunidos em celebração, aguardando o momento em que Rafael e Selene fariam seus votos sob a luz da lua. Eu os observei de longe, fingindo que estava ali apenas para cumprir o meu papel de empregada, mas o peso no meu peito era quase insuportável.Rafael estava deslumbrante em sua postura de líder, o Alfa que todos respeitavam. Ele falava com autoridade e charme, sorrindo para Selene como se ela fosse a única coisa que importava. Enquanto isso, eu era apenas uma sombra, um eco na periferia daquele mundo brilhante.Mas esta noite seria diferente.Essa noite eu seria finalmente livre.Freiren estava comigo, como sempre. Mas, ao contrário do habitual, sua presença não era silenciosa. Ela pulsava dentro de mim, ansiosa e determinada, como uma fera que esperou muito tempo para ser libertada. Suas palavras ecoavam em minha mente desde a manhã, me guiando, me prep
A floresta era um labirinto de sons e sombras, uma tapeçaria intricada tecida com o sussurro das folhas, o canto dos pássaros e o crepitar de galhos sob o vento. Mas, para Freiren, não era apenas um labirinto; era um lar. Cada galho quebrado sob suas patas, cada folha farfalhando ao toque do vento, cada aroma terroso que dançava no ar, tudo fazia parte de uma sinfonia complexa e harmoniosa que apenas ela entendia. Após anos aprisionada, escondida dentro de mim como uma chama adormecida, Freiren estava finalmente livre. A escuridão que a sufocava havia se dissipado, revelando uma força e uma determinação que eu mal podia imaginar.E ela corria. Corria com a força de mil tempestades, como se tentasse compensar todo o tempo perdido. Cada passo era uma declaração de independência, uma rejeição das correntes invisíveis que a prendiam. Todo o tempo em que passou aprisionada, observando o mundo através de uma janela embaçada, agora se transformava em pura energia, impulsionando-a para frente
A lua estava alta no céu, sua luz prateada banhando a floresta com um brilho etéreo. A escuridão ao meu redor parecia infinita, como se a noite nunca fosse chegar ao fim. Meu corpo, em forma lupina, se movia rápido, quase sem pensar. As folhas secas estalavam sob minhas patas, e o vento gelado cortava meu pelo negro como a noite. Há dias eu não descansava, mas sabia que não poderia parar. Não até encontrar as respostas que buscava. Não enquanto aquele fardo, aquela questão, ainda pairasse sobre mim como uma tempestade iminente.“Encontre sua Luna ou escolha uma loba do clã.”As palavras do conselho ecoavam em minha mente, sem cessar. A pressão que sentia aumentava a cada dia. Meus próprios guerreiros, aqueles que sempre me seguiram sem questionar, agora me olhavam com uma preocupação disfarçada, sussurrando entre si. Ser um Alfa sem uma Luna era um tabu para muitos. Não porque eu não fosse forte o suficiente ou incapaz de liderar. Não era isso. Mas matilha acreditava que a verdadeir
A chuva caía em torrentes, uma cortina incessante que envolvia a floresta. O som do impacto das gotas sobre as folhas e o solo parecia um tambor que batia furiosamente, refletindo o tumulto interno que tomava conta de mim. Cada gota era uma lembrança constante da nossa vulnerabilidade, um lembrete implacável de que estávamos sendo caçadas. O chão se transformava rapidamente em um emaranhado escorregadio de lama e folhas mortas. A cada passo, sentia a terra ceder sob minhas patas, dificultando ainda mais nossa fuga. Estávamos nos afundando no terreno traiçoeiro, mas não havia escolha. A perseguição estava mais próxima do que nunca, e a única chance de sobrevivermos era se conseguíssemos despistar os Rogue's que nos seguiam implacavelmente.A exaustão pesava sobre mim como uma mortalha. Cada músculo doía, cada respiração era um esforço. As batalhas recentes haviam nos cobrado um preço alto, deixando-nos à beira do colapso. Mas eu sabia que não podia ceder. Não podia permitir que o cansa
As paredes frias, úmidas, exalavam o cheiro de mofo e ferrugem. A cela em que me colocaram era pequena, com grades grossas e uma única lamparina fraca iluminando o corredor de pedra. Meu corpo ainda tremia, não apenas pelo frio, mas também pela exaustão. A dor nos músculos parecia ser constante, como um lembrete do ataque dos Rogue ‘s e da minha fuga desesperada.Eles haviam me jogado ali sem qualquer explicação, suas expressões severas deixando claro que eu não era bem-vinda naquele território. Freiren ainda estava silenciosa, provavelmente pela ação do sedativo que me separava dela. Era como se um pedaço de mim tivesse sido arrancado, deixando-me vazia e indefesa.Pouco tempo depois, passos ecoaram no corredor. Levantei a cabeça lentamente, meus olhos encontrando os de um homem alto e robusto. Seu cheiro carregava a força característica de um lobo Beta. Ele trazia um prato de comida simples e algo dobrado embaixo do braço. Enquanto seus homens traziam o que parecia ser um balde de á
O cheiro de pedra úmida e metal enferrujado invadiu minhas narinas enquanto eu descia as escadas estreitas e irregulares que levavam às masmorras. Cada degrau rangia sob o peso das minhas botas, um som monótono que ecoava no corredor silencioso. A umidade impregnava o ar, colando-se à minha pele como um véu invisível. O frio era cortante, penetrando nas camadas de tecido e atingindo meus ossos. Cada respiração era uma névoa branca que se dissipava rapidamente na escuridão. Ao meu lado, Damon Cross, meu Beta, mantinha-se um passo atrás, sua presença constante e confiável como uma sombra leal. Seus sentidos aguçados varriam as paredes de pedra, atento a qualquer sinal de perigo nas sombras frias que nos cercavam. — O que temos aqui, Damon? — perguntei, sem desviar os olhos do caminho à frente. Minha voz, embora baixa, carregava o peso da autoridade, um reflexo dos anos que passei liderando nosso clã. Ele cruzou os braços enquanto caminhava, sua expressão tão controlada quanto sua pos
O silêncio nas masmorras era quase absoluto, quebrado apenas pelo som das gotas de água que pingavam incessantemente das paredes úmidas. O ambiente fétido e gelado era um reflexo da condição de minha alma naquele momento. Sentada no canto escuro da cela, meus braços estavam abraçados aos joelhos, tentando desesperadamente encontrar uma maneira de acalmar minha respiração acelerada. A presença de Caelum, ainda fresca em minha mente, fazia meu coração bater mais rápido do que eu gostaria de admitir. Não era apenas o medo do desconhecido, mas algo mais profundo, algo que me conectava a ele de uma maneira que eu não podia compreender.Freiren estava em silêncio, e isso me deixou ainda mais inquieta. Ela sempre fora minha âncora, minha força em momentos de desespero. Desde que fugimos do clã Lunar, a loba nunca me abandonou. Ela esteve comigo nas batalhas, nas noites de medo e solidão, sempre me guiando e me protegendo. Mas agora, naquele momento de extrema necessidade, ela não estava comi