Capítulo 4

Eu não sabia o que esperar da cerimônia. Sabia apenas que seria um marco na minha vida, e não um marco qualquer. Era o tipo de evento que mudaria tudo. Ou, pelo menos, era o que o Clã esperava. O casamento de Rafael e Selene não seria apenas uma celebração de união. Seria uma afirmação do poder, da hierarquia, da separação entre os que pertencem e os que estão destinados a viver à margem.

Minha mente estava um turbilhão de pensamentos enquanto eu me preparava, ou melhor, enquanto tentava me preparar para o que estava por vir. O vestido que me deram era simples, sem brilho, sem luxo. Nada mais do que um reflexo de minha posição dentro daquele mundo. Eu não era importante o suficiente para merecer algo especial.

Naquela manhã, antes de sair para me juntar ao Clã, o silêncio no meu interior foi quebrado de maneira inesperada. Freiren, minha loba, a presença que eu sempre mantive escondida, que raramente falava comigo, apareceu em minha mente com uma clareza que me assustou. Sua voz era suave, como uma brisa na noite fria, mas firme e cheia de uma determinação que eu não sabia que ela possuía.

— Isadora... — Sua voz, embora serena, carregava algo inusitado. Algo... urgente.

Eu congelei, meus dedos tocando o tecido do vestido. Freiren raramente se comunicava diretamente comigo. Na verdade, nossa conexão era mais silenciosa. Eu sentia sua presença dentro de mim, mas raramente ouvia palavras. Por isso, a súbita clareza em sua voz me fez parar.

— O que está acontecendo? — Perguntei mentalmente, a preocupação tomando conta de mim. Eu sabia que algo estava diferente. Eu sentia isso na maneira como a energia em meu corpo vibrava. Algo estava prestes a acontecer. Algo que não poderia ser evitado.

— Fuja. — A palavra ecoou em minha mente, simples, mas tão carregada de significado que me fez tremer. — Fuja enquanto há tempo, Isadora. Durante a cerimônia, quando todos estiverem distraídos, podemos escapar.

Eu fiquei em silêncio, a palavra fugir reverberando em meu cérebro. Fugir. Não era uma palavra que eu usava facilmente. Eu era um espectro entre os lobos, alguém sem uma identidade clara. Não pertencia a lugar algum. E, no entanto, essa sugestão de Freiren... parecia impossível, mas ao mesmo tempo, tentadora. Fugir de tudo. Fugir do Clã, de Rafael, de Selene. Fugir da dor. Fugir da realidade que me aprisionava.

— Mas... como? — Perguntei, ainda sem acreditar no que estava ouvindo. — Como podemos fugir? Onde iríamos?

Eu senti a presença de Freiren aumentar dentro de mim, uma sensação quente e reconfortante, como se ela estivesse me envolvendo com um abraço silencioso, mas poderoso.

— O Clã é uma prisão, Isadora. Sempre foi. — A voz dela parecia mais firme agora, como se suas palavras carregassem uma verdade universal, algo que ela tinha guardado dentro de si por tanto tempo. — A liberdade está além dos muros. A floresta, a noite... está esperando por nós.

Eu respirei fundo, absorvendo o peso das palavras de Freiren. Parte de mim desejava acreditar nela. Parte de mim queria estar livre. A dor do vínculo, a rejeição de Rafael, a humilhação de ser apenas uma sombra na vida dele... tudo isso me empurrava para esse desejo urgente de escapar, de encontrar um lugar onde eu pudesse ser mais do que apenas a companheira rejeitada de um Alfa.

Mas havia uma sombra de dúvida que se infiltrava em meu coração. A ideia de fugir, de romper com tudo o que eu conhecia, me deixava apreensiva. Eu não sabia o que me aguardava do lado de fora dos muros da mansão. Não sabia o que me aguardava na floresta ou na noite. E a pergunta que martelava em minha mente era: "E se nós falharmos?"

— E se nós falharmos? — Perguntei, a dúvida se infiltrando entre as palavras. — E se eu me perder ainda mais, sem um lugar para ir, sem saber para onde ir?

A voz de Freiren foi suave, mas cheia de confiança.

— A falha é permanecer onde você não pertence, Isadora. A falha é aceitar que alguém ou algo tenha o poder de decidir o seu destino. O Clã... Rafael... eles não podem nos prender. Não mais.

A certeza na voz de minha loba me fez engolir a ansiedade crescente dentro de mim. Eu nunca imaginei que Freiren, tão silenciosa e observadora, tivesse tal força em suas palavras. Mas, de alguma forma, tudo o que ela dizia parecia certo. Eu já não sabia o que mais me prendia ali. O que mais havia para perder?

Ficar no Clã significava uma vida de submissão, de dor, de uma existência sem identidade, onde eu jamais seria mais do que a sombra silenciosa ao lado de Rafael e Selene. A ideia de seguir em frente, de sair daquela prisão, mesmo que o futuro fosse incerto, parecia agora uma opção muito mais atraente do que continuar vivendo como uma espectadora da vida deles.

Eu não queria mais viver para eles. Eu finalmente disse isso em voz baixa, para mim mesma, mas com uma resolução crescente.

— Então, você deve ir. Agora. — Freiren respondeu, sua voz cheia de urgência, mas também de uma estranha tranquilidade. — Durante a cerimônia, enquanto eles estiverem distraídos com os votos, você terá uma chance. Não será fácil, mas você precisa tentar. O tempo é agora. Não há mais desculpas, Isadora. Nós dois sabemos que você não pertence àquela vida. Não mais.

Eu fechei os olhos, sentindo o peso de sua decisão pesando sobre mim. Eu não podia mais voltar atrás. Fugir. Era o único caminho que me restava. E a sensação de liberdade, embora assustadora, era mais atrativa do que qualquer coisa que o Clã pudesse me oferecer. Era uma chance de recomeçar, uma chance de ser algo mais, de ser alguém por mim mesma.

Olhei uma última vez para o espelho. O vestido simples, sem brilho, refletindo um rosto cansado, uma mulher que havia sido derrotada, mas que agora estava pronta para lutar pela sua liberdade. Meu reflexo mostrava alguém que nunca havia tido escolha, mas que agora tinha o poder de decidir seu próprio destino. A dor do vínculo, a humilhação e a rejeição de Rafael... tudo isso poderia ser deixado para trás. Eu não seria mais uma sombra. Eu não seria mais a companheira rejeitada.

O que quer que o futuro me reservasse, eu não sabia. Mas, naquele momento, estava clara para mim uma verdade: o vínculo, a dor, as correntes invisíveis que me prendiam àquele lugar, poderiam ser rompidas. Eu não era mais a mesma mulher. Eu não tinha mais medo de desafiar a ordem do Clã. Eu não tinha mais medo de fugir.

Com um suspiro profundo, me virei para a porta. A cerimônia estava prestes a começar. O peso da decisão que eu tomava era imenso, mas ao mesmo tempo, a leveza da liberdade parecia me envolver. E, com isso, minha fuga, minha jornada para a liberdade, também começava.

Eu sabia que o caminho não seria fácil. A floresta, o desconhecido, as incertezas... tudo isso me aguardava, mas havia uma coisa que eu sabia com certeza: eu estava prestes a deixar para trás a vida que me aprisionava. O grito silencioso da minha alma, que sempre buscou ser livre, agora tinha um caminho a seguir.

A porta se abriu, e eu dei o primeiro passo. O futuro ainda era uma grande incógnita, mas uma coisa estava clara para mim: finalmente, a liberdade não era mais um sonho distante. Ela estava ali, ao meu alcance. Eu iria lutar por ela, acontecesse o que acontecesse.

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