Capítulo 2

A mansão estava silenciosa quando a noite finalmente caiu. As paredes, feitas de pedra fria, mantinham os ecos dos passos que, durante o dia, se haviam apressado pelas imponentes escadas e corredores. Agora, o único som era o vento que assobiava entre as frestas das janelas, como se a própria casa estivesse respirando. Eu estava sozinha em meu quarto.

O quarto. O único lugar no mundo onde eu realmente sentia que podia respirar. Mas, ao mesmo tempo, era o lugar que mais me lembrava de quem eu era — ou melhor, de quem eu não era.

A cama simples no chão, um colchão de palha velho que mal conseguia esconder as rachaduras do piso de madeira, era tudo o que eu tinha. Não havia luxo. Não havia conforto. Apenas a solidão e o vazio que eu carregava dentro de mim todos os dias.

Durante o dia, minha vida era uma rotina sem fim. Acordava antes do amanhecer para começar as tarefas na mansão. Limpava, cozinhava, fazia o que fosse necessário para manter as coisas em ordem, tudo sem ser notada. O trabalho era árduo, mas suportável. Ao menos, eu não tinha que pensar no que acontecia fora dos muros da mansão, nas coisas que eu não podia controlar.

Mas à noite, quando o silêncio tomava conta de tudo, o peso da verdade caía sobre mim com uma força esmagadora. Era no escuro que eu sentia, mais intensamente, o que eu tentava desesperadamente evitar durante o dia. A dor do vínculo. A dor de ser uma companheira rejeitada.

Fechei os olhos e, como sempre, ele veio a mim — Rafael. Eu sabia que ele estava com ela. Selene. A mulher que ele escolheu. A mulher com quem ele compartilhava a vida. Eu não podia escapar disso. Não podia fugir. Não havia como ignorar. O vínculo de companheiros, embora rejeitado por ele, ainda estava lá, intrínseco em meu ser. Cada vez que ele tocava Selene, cada vez que os corpos deles se uniam, eu sentia a dor. Uma dor tão profunda que parecia cortar meu peito, como se uma parte de mim estivesse sendo arrancada à força.

Era uma dor física, visceral, que me fazia contorcer no colchão de palha, meus dentes cerrados e as mãos apertando os lençóis. Eu não conseguia respirar direito. Era como se a essência do meu ser estivesse sendo consumida. Sentia o peso do desejo de ser amada, de ser vista, de ser aceita. Mas tudo o que eu tinha era essa dor — essa dor insuportável que me lembrava o quanto eu não importava.

O quarto estava quieto, mas em minha mente, os sons eram claros. Os gemidos abafados, os sussurros de Rafael e Selene, todos ressoavam dentro de mim, intensificando a agonia que já estava tão profundamente cravada em minha alma. Eu mordi o lábio até sentir o gosto do sangue, tentando silenciar o grito que ecoava em meu peito.

Era inútil. Eu não podia fugir de mim mesma, não podia fugir do que eu sentia.

A dor era pior do que qualquer ferida física. Era uma dor de perda, de abandono. Eu me perguntava como era possível amar alguém que sequer sabia da minha existência além do papel de empregada, alguém que já havia feito sua escolha, que estava comprometido com outra mulher. E eu? Eu estava presa em um vínculo que não desejava, uma verdade que me separava de qualquer esperança de felicidade. Como era possível, então, que eu sentisse isso tão intensamente?

Aquela noite foi especialmente cruel. Eu podia sentir cada movimento de Rafael como se fosse meu, cada suspiro de Selene como se fosse uma lâmina afiada cravada em minha carne. Eu me afastei do colchão de palha e me encolhi no canto escuro do quarto, abraçando os joelhos contra o peito, tentando me proteger da dor que consumia cada parte de mim.

Minhas mãos tremiam. Eu estava começando a perder o controle. Mas não podia fazer nada. Não havia nada que eu pudesse fazer. Nenhum remédio para essa dor. Nenhuma maneira de apagar a verdade que batia tão forte dentro de mim.

Eu respirei fundo, tentando controlar os pensamentos, tentando, ao menos, recuperar um pouco de sanidade. Mas isso era mais fácil de dizer do que fazer. A dor não desapareceria, não importava o quanto eu tentasse. Era algo que estava em minha essência, que havia se cravado tão profundamente em mim quanto o próprio sangue. E o mais cruel de tudo era saber que, mesmo que eu quisesse fugir, não havia para onde ir.

Minhas lágrimas escorriam silenciosas pela minha face enquanto eu ficava ali, imóvel, aguardando o fim daquela tormenta interna. Sabia que a dor só diminuiria quando o vínculo de Rafael e Selene chegasse ao fim. Mas isso nunca aconteceria. Eu sabia disso. Eles estavam juntos. E eu… eu estava apenas aqui, tentando sobreviver à dor que não podia ser apagada.

Era uma noite como qualquer outra. O vento continuava a assobiar pelas frestas das janelas, e a mansão permanecia silenciosa. Mas, no silêncio do meu quarto, algo dentro de mim se partia, quebrando a cada suspiro, a cada batida de meu coração, a cada lembrança do vínculo que me condenava.

Eu olhei para o teto, o olhar perdido nas sombras. Talvez, em algum lugar, lá fora, sob a mesma lua que iluminava os corpos de Rafael e Selene, eu pudesse encontrar a força para mudar meu destino. Mas até lá, eu teria que viver com a dor. Com a dor e o vazio. Até que a lua me chamasse.

O som do vento não cessava, mas, de alguma forma, ele se tornava menos presente à medida que a noite avançava. No fundo do meu ser, uma sensação de frieza, mais intensa que o vento cortante que passava pelas frestas da janela, parecia me envolver. Era uma solidão que parecia congelar o ar ao meu redor. Eu não era só uma espectadora da dor; eu era a própria dor.

Mas, apesar da dor que me consumia, havia algo dentro de mim que se recusava a ceder. Algo que ainda se negava a ser completamente engolido pela escuridão. O vínculo me esmagava, e eu sabia que o tempo me empurrava para um caminho sem volta, mas a pequena chama de resistência dentro de mim nunca desapareceu completamente.

A noite seguinte não seria diferente. Eu sabia disso. Cada noite era uma repetição da anterior, mas, talvez, alguma parte de mim ainda esperava algo. Não sabia o que, mas esperava. Talvez, em algum momento, eu pudesse encontrar um alívio para essa dor, ou talvez fosse o simples desejo de não ser invisível para o mundo. Um desejo de ser alguém que tivesse um papel mais do que o de uma sombra silenciosa nas paredes de uma mansão solitária.

Mas naquele momento, à medida que as horas passavam, eu sentia que nada poderia mudar. Eu estava presa em um ciclo de sofrimento que se repetia a cada respiração, a cada batida do meu coração, cada vez que o vínculo me lembrava de sua presença indesejada.

O que eu sentia por Rafael era inegável, mas também era irrelevante. Ele não sabia, ou talvez não se importasse. Eu era invisível para ele, uma presença distante que ele ignorava em favor da mulher que ele escolheu. E enquanto eu me afundava cada vez mais na dor de ser ignorada, uma pergunta me atormentava.

“Como alguém poderia suportar tanto?”

Mas a resposta, eu sabia, estava longe de ser simples. Não era sobre suportar. Não era sobre esperar um fim. Era sobre aprender a viver com a dor, como uma sombra que nunca desaparece, que apenas se estende, silenciosa, nos cantos mais sombrios da alma.

Naquela noite, enquanto os ventos cortavam a escuridão lá fora, eu simplesmente fiquei. Eu fiquei e esperei, mais uma vez, que algo mudasse. Ou que, pelo menos, o grito silencioso dentro de mim fosse ouvido. Mesmo que fosse apenas pela lua.

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