Até onde você estaria disposto a ir para esquecer um grande amor? Muitos se jogariam nos braços da bebida, outros iriam em busca de novos romances. A segunda opção foi a escolhida por Hanna. E, enquanto embebedava um de seus melhores amigos, ela se perguntava se aquilo que estava fazendo era o certo.
Talvez fosse melhor deixar as coisas rolarem naturalmente. Não. Não podia se dar ao luxo de esperar para que, o cara que ela estava afim, desse conta de seus sentimentos e finalmente começasse a olhar para ela com outros olhos. Ela já tinha seguido essa linha uma vez e acabou se dando mal. Ele a trocou por outra.
Entretanto, não podia culpá-lo. Ele nem mesmo sabia de seus sentimentos, então como poderia aceitá-los? Mas também não se culpava. Ele também não era o tipo fácil de decifrar. Hanna balançou a cabeça com força. Não era hora de lembrar dele, de seu sorriso, do modo como agia com ela e de como… Ah!
Maldição!
Não, não, não! Ela já não sentia mais nada por ele. Já havia superado. Era por isso que estava naquela festa, não? Estava tentando revelar seus quase sentimentos pelo seu amigo de infância, antes que ele partisse para Flórida. Era. Somente por isso.
Respirando fundo, ela entregou para Brendo o terceiro copo de tequila daquele início de noite. Já com aspecto de um bêbado, o rapaz virou a bebida com uma rapidez impressionante em sua boca, enquanto resmungava que queria tomar um ar. Hanna se aproximou da janela que ficava atrás dela e encarou o céu.
Nuvens escuras bloqueavam os resquícios de luz que ainda insistiam em continuar na atmosfera. Era evidente que, a qualquer momento, no mínimo, uma garoa tocaria a terra e afugentaria os desavisados. Hanna sorriu com o pensamento. Amava a chuva na mesma intensidade que desgostava daquela situação.
Era algo sem limites.
Tomando coragem para olhar para Brendo, que ainda permanecia conversando com um de seus amigos e bebericando de uma bebida qualquer, Hanna teve que admitir. Brendo era muito belo. Seus cabelos negros e curtos eram encantadores; aquela típica regata masculina azul clara que ele vestia lhe caía muito bem e, para melhorar — ou não — a situação, ela combinava perfeitamente com a bermuda jeans preta que ele usava e com o tênis cinzento que calçava. Uma roupa que parecia tão casual para ele, quanto aquele suéter que Hanna vestia era para ela. Sabia muito bem disso
Enquanto observava de longe Monet, uma figura imponente se aproximava cada vez mais dela. Sem que Hanna pudesse reagir, o homem negro, tatuado e de dread puxou ela pelo pescoço, forçando-a a perceber sua presença. Em um sobressalto, Hanna quase gritou ao ver o rapaz lhe segurando com tamanha firmeza. Mas, ao ver quem era, ela só pôde sorrir.
— Eros? O que você está fazendo aqui? — ela perguntou, intrigada com a aparição do seu amigo e ex-ficante.
— Não é lógico? — Eros sorriu, fazendo Hanna revirar os olhos.
— Você não quis dizer óbvio? — indagou, com uma sobrancelha franzida. O rapaz apenas gargalhou.
— É por aí. — Eros balançou a cabeça e, soltando o pescoço de Hanna, se escorou na bancada que estava ao lado dela, cruzando os braços. — Aquela sua amiga gostosa me mandou lhe avisar que ela já foi embora e que está desejando boa sorte em sua "investida" — explicou, ressaltando a parte da investida.
— E você veio me dizer isso pessoalmente? — Hanna estava desconfiada. Era inegável isso em seus olhos castanhos. — Conta outra, Guerra.
— Eu tô dizendo a verdade, Fiore. — Eros sorriu, mas dessa vez era um sorriso mais triste. — Vou ficar uma semana fora, então queria aproveitar e me despedir também.
— Sério isso, Eros?
Hanna estava decepcionada. Ela tinha alguns planos que precisava inteiramente da ajuda do rapaz, mas se ele não estivesse ali, ela teria que adiar sua ideia mirabolante para mais tarde. Bem, não seria por muito tempo.
— Sim, sim. — Ele sorriu, e ajeitou seu colete de couro no corpo. Apesar do frio que fazia, ele vestia apenas uma calça preta colada, uma regata branca e o seu habitual colete marrom escuro. — Eu tenho alguns negócios a tratar.
— Eu entendo — ela sussurrou, pensando em como todo mundo estava indo embora sem ela. Esse pensamento deixava-a desnorteada. — Obrigada por me avisar.
— Não precisa agradecer, Fiore. — Ele voltou a sorrir, curvando o corpo em direção a garota e depositando um beijo em sua testa. — Venha me visitar quando eu voltar.
— Pode deixar — ela confirmou, fazendo-o assentir com a cabeça.
— Bem, agora eu tenho que ir — anunciou, se afastando do balcão. — Boa sorte com sua empreitada, madame. — Hanna riu, assentindo em seguida. Dando um tchau com uma das mãos, Eros sumiu em meio a multidão de adolescentes e jovens que compunham a maioria das pessoas presentes ali.
Balançando a cabeça, Hanna voltou sua atenção para onde seu alvo estava. Nesse momento, ela pode ver Brendo saindo de perto de seus outros convidados e dirigindo-se para a piscina. Essa era a chance perfeita. Podia forçá-lo a uma falsa confissão e conseguir a tão esperada aceitação no amor que buscava.
Talvez, finalmente, pudesse esquecer aquele impertinente.
Depois de esperar cinco minutos após a saída do jovem Monet, suspirando profundamente, Fiore caminhou com dificuldade até a piscina. Seu suéter grosso, marrom escuro, e sua calça de algodão cinza, não combinavam nada com a ocasião. Eram duas peças que ela usava para ficar em casa, mas tinha achado interessante a ideia de inovar um pouco e ir com elas na festa de seu amigo. Uma ideia que várias beldades da faculdade onde estudava não gostaram.
Dane-se!
De toda e qualquer forma, ela não se importava com opiniões de gente como elas.
Parando um pouco antes de chegar na piscina, ela vislumbrou os cabelos negros de Brendo voando com o vento vindo da colina que ficava não muito longe de sua casa. Ela respirou fundo, sentiu o cheiro da maresia adentrar forçadamente suas narinas. Suas mãos tremiam, ela só não sabia se era de frio ou de receio, talvez fossem os dois, afinal, Marjorie era uma cidade fria e, uma parte dela, dizia para que parasse com aquela ideia tola. No entanto, inevitavelmente, não respeitaria tal presságio.
Hanna era teimosa demais para voltar atrás com seus planos.
Dando mais alguns passos em direção ao seu alvo, ela conseguiu ter uma visão melhor do rapaz e, consequentemente, percebeu que ele não estava sozinho. Havia alguém com ele.
Os cabelos castanhos cor-de-mel de Sarah se mantinham firmes em um coque perfeito. Seus olhos verdes permaneciam presos no rapaz que estava à sua frente e que ela beijava ferozmente. Sim, ela estava nos braços de Brendo, aos beijos com ele.
Só podia ser brincadeira.
Inevitavelmente, ao ver aquela cena, Hanna ficou boquiaberta. Todo seu plano tinha ido por água abaixo e, para piorar, ele tinha praticamente lhe traído, mesmo que fossem somente amigos, lá no fundo, ela esperava que ele sentisse algo além. Essa esperança, por mais pequena que fosse, lhe alimentava e fazia ela se esquecer daquele certo alguém. Só que, ao ver aqueles dois se devorando vivos, ela percebeu que novamente havia sido trolada. Que havia sido trocada mais uma vez.
Inaceitável.
Com passos apertados, um olhar raivoso e dentes cerrados, Hanna se aproximou do mais novo casal. Com um raspar exagerado de garganta, ela interrompeu os dois pombinhos e, assim que eles pararam de se pegar, a olharam incrédulos. De forma inconsciente, Hanna cruzou os braços, franziu as sobrancelhas, e os olhou como se fossem lixos. Aquele olhar de menosprezo fez uma carranca brotar no rosto de Brendo e de sua companheira.
— Qual é o problema da vez, Hanna? — Brendo perguntou, exaltado. Pelo tom de sua voz, ela era capaz de ver o quão embriagado ele estava.
Perfeito.
— É recalque, querido — Sarah sussurrou, alto o suficiente para que Hanna ouvisse. Irritada, a garota respirou fundo.
Ela iria matar aquela atrevida.
— Se é, ou não, isso não é problema seu, Leclerc — retrucou, rápido o suficiente para evitar que Brendo pudesse dizer algo.
— Grossa como sempre, né, Fiore? — a garota caçoou, fazendo ênfase no sobrenome de Hanna.
— Meu assunto não é com você, funcionária — rebateu, voltando sua atenção completamente para Brendo. Sarah apenas engoliu em seco. Hanna tinha certeza que ela estava abalada.
— Hanna, por que está agindo assim? — Brendo perguntou, censurando aquela atitude com seus olhos castanhos claros.
Fiore apenas deu de ombros.
— Assim como?
— Infantil — retrucou. — Você não cresce, não?
— Claro que não, querido. — Sarah sorriu, passando seus braços em volta do pescoço de Monet e lançando um olhar provocativo em direção a Hanna. — Essa daí nunca vai crescer.
— Por que você não me erra, Leclerc? — retrucou, enfurecendo-se. Batendo o pé com força, ela descruzou os braços e apoiou as mãos em sua cintura. — Quer saber? Vocês dois se merecem! Dois manipuladores de araque!
— Olha quem fala! — Sarah replicou, olhando maliciosamente para ela. — Não foi você que embebedou o Brendo só para ficar com ele?
— É. Fui eu, sim, mas e daí? — Hanna disse, indiferente à provocação da garota. — Não é você que está com ele agora? Ou é uma versão bem mixuruca de mim mesma? Se sim, tenho que reclamar com a fábrica, pois o trabalho dela está deixando a desejar! — alfinetou, arrancando um grunhido alto da outra garota.
— Ora sua…!
— O que foi? Vai me bater? Se sim, cai para cima, amorzinho.
— Calma vocês duas! — Brendo interveio, parecendo espantado pela agressividade de sua amiga. Mesmo bêbado, ele parecia estar ciente da situação. — Hanna, peço que dê licença da minha festa — ele disse, fazendo ênfase na parte que deixava claro que quem que mandava na situação era ele.
Incrédula com o pedido, Hanna olhou estupefata para o casal. Sarah ria baixinho, comemorando sua vitória, já o rapaz parecia orgulhoso de sua decisão.
Será que continuaria assim quando voltasse ao normal?
Não importava a resposta. Hanna não ficaria e nem voltaria a falar com ele para responder essa pergunta.
— Se é isso que você quer, Brendo, eu vou indo — disse, com desgosto estampado em cada palavra. Hanna se virou para ir, mas, após pensar novamente, voltou sua atenção outra vez para o casal. — Antes de partir, deixe-me dar o devido até logo para vocês.
— Para nós? Mas só o Brendo que irá…
Sarah foi interrompida assim que Hanna se aproximou dela e, sem nenhuma delicadeza, empurrou os dois para dentro da piscina. Assim que eles caíram na água, gritaram um socorro, atraindo a atenção de todos os outros convidados para si.
Enquanto algumas pessoas ajudavam Brendo e Sarah a saírem da piscina, Hanna deixou a casa de seu ex-amigo gargalhando. Em seu interior ressoava um misto de alegria por ter se vingado, alívio por não ter continuado com aquele plano louco e tristeza por ter sido trocada mais uma vez. Era sempre tão difícil ser praticamente trocada? Para Hanna era muito. Nunca conseguia superar, principalmente quando essa pessoa seguia a vida dela normalmente e não ligava para seus sentimentos.
Isso era tão frustrante.
A casa de Brendo não ficava tão longe de onde ela morava, por isso Hanna optou por ir a pé. Mesmo que ainda assim fosse uma boa caminhada, era melhor do que permitir que mais alguém visse o que ela pretendia fazer.
Naquele momento, enquanto andava pelas ruas silenciosas de Marjorie, imaginou que o anfitrião da festa estivesse se pegando com a m*****a da Sarah ou com qualquer outra atirada como ela. Com esse pensamento, ela voltou a grunhir, sem saber o que fazer. Talvez devesse ir para o próximo nome da lista? Não era uma má ideia, considerando que ainda restavam nomes sem a marcação “não deu certo”.
Pensando que essa ideia fosse ultrapassada, Hanna voltou a bater o pé. Não podia gastar seu tempo com caras que provavelmente dariam mais dor de cabeça a ela do que soluções. Ela já não sabia se queria escolher alguém que pudesse lhe livrar dos pensamentos maçantes sobre aquele cara.
Sempre era sobre ele. O cara errado.
Passando as mãos em seus cabelos, Hanna deixou um pequeno grito exasperado escapar de sua garganta. Não tinha ninguém na rua, por isso nem notaram seu showzinho.
Fiore estava se sentindo desolada. Não conseguia pensar direito. Talvez fosse, para uns, loucura o que ela estivesse fazendo, mas que mal tinha em gritar? Nenhum. Ela gritava o tempo todo e nunca se importava sobre o que diziam a respeito disso. Simplesmente deixava que suas frustrações escapassem pela sua garganta, e isso a fazia sentir um pouco melhor. Bem, apesar disso, essa não era sua principal maneira de se livrar da decepção. Havia outra um tanto quanto curiosa.
Esfregando suas mãos, ela voltou sua atenção para o céu. Ele estava escuro e algumas gotas minúsculas caiam lentamente das nuvens. Inspirando fundo, tentou andar o mais rápido possível para evitar aquele mal iminente, porém, antes de terminar de dobrar a esquina, a chuva caiu sobre seu corpo aquecido pela corrida. Praguejando em silêncio seu azar, olhou ao redor, procurando um lugar para se abrigar. Se continuasse assim, logo, logo, seu suéter estaria tão encharcado que não conseguiria se mover nem mais um passo sequer.
Praguejando novamente sua falta de sorte, tentou se abrigar na fachada de uma lanchonete um pouco mais a frente de onde estava. Para seu azar, essa estava fechada e sua fachada não era grande o suficiente para lhe proteger por completo.
Batendo o pé incansavelmente para esvair sua raiva, passou uma de suas mãos sobre seus cabelos curtos na altura dos ombros. Lá se fora sua chapinha de hoje cedo e o dinheiro que havia dado para o cabeleireiro. Maldição! Ela sabia que não era uma boa ideia gastar seu dinheiro suado com algo tão simples, mas havia sido ingênua. Simplesmente seguiu o conselho de sua amiga maluca e acabou se ferrando no final.
Típico.
Respirando fundo para acalmar seu coração, fechou seus olhos e aguardou a chuva passar. A sensação das gotículas caindo sobre a pele do seu rosto era algo que lhe causava arrepios. Ela estava fria. O vento gélido trazia a maresia do mar até suas narinas. Não gostava. Seus cabelos curtos e castanhos grudavam em sua boca e em algumas partes de seu rosto, fazendo cócegas nas espinhas presentes naquela região. Sentia vontade de coçá-las. Soltando outro mini grito, Hanna bateu o pé com mais força e esbravejou alto.
Estava muito frustrada, tanto que, por um segundo, imaginou algo bloqueando a chuva e impedindo que aquela frieza alcançasse sua pele. Bem, infelizmente ou não, isso não era apenas sua imaginação.
Assim que se deu conta disso, imediatamente pode sentir uma presença se pondo ao seu lado para também se proteger dos pingos de chuva. Abrindo seus olhos, encarou a pessoa que estava lhe abrigando. Para seu descontentamento, o ruivo a qual mais tinha um relacionamento conturbado, lhe fitava com uma cara de divertimento.
Noah Bellini, seu tão aclamado rival e — não tão — inimigo assim.
Sabe quando sua família odeia uma certa pessoa e você se vê obrigado a ir junto com a manada? Bem, era isso que deveria ter acontecido com Hanna.Seus pais, os Fiore, eram donos de uma padaria que vinha sendo passada de geração em geração. Tudo começou com sua bisavó descendente de franceses casando-se com um descendente de italianos. O sonho dela era construir a maior padaria de toda Marjorie — uma pequena cidade no litoral sul do Brasil. Tudo estava indo bem, seu sonho estava prestes a se concretizar, entretanto ela apareceu, Myra Bellini, uma mulher imponente vinda da Itália. Ela era uma jovem de cabelos ruivos e olhos claros — cá entre nós, ela não se parecia nada com uma italiana —, elegante, batalhadora e com um sonho igual ao da bisavó de Hanna. Ela também queria construir a maior padaria de toda Marjorie e se tornar a maior padeira de sua época.Claro que duas pessoas com sonhos iguais e com alguns aspectos diferentes, não podiam se dar muito bem. Por isso, e outros motivos,
Os fracos raios de luz adentravam lentamente pela janela do quarto de Hanna. A pintura lilás das paredes pareciam mais claras quando expostas à luz do sol, deixando o ambiente aconchegante e calmo — o completo oposto da garota que ali dormia. Naquele dia, Fiore acordou não muito disposta com o toque frenético de seu despertador que ficava ao lado de sua cama. Como sempre, apesar do sol da manhã, fazia um frio de congelar as pontas dos dedos.Ela se espreguiçou lentamente e sorriu ao sentir o cheiro de pães fresquinhos vindo do andar de baixo. Em um salto, saiu da cama e correu para o banheiro do outro lado do corredor. Naquele pequeno toalete, ela efetuou todas suas higienes necessárias e tomou um bom banho. Infelizmente, ou não, sua aula começava cedo. Hanna cursava literatura e gastronomia na faculdade de Marjorie — a tão aclamada Lokelani. Amava cozinhar variados tipos de iguarias, inclusive aquelas à venda na padaria de sua mãe. Em seus tempos vagos, dedicava sua atenção à leitur
Lokelani do Sul era o nome da faculdade em que Hanna estudava. Ela levava esse nome por causa de sua fundadora, Lokekani Roux. Era ela uma mulher de garra que havia trazido o ensino superior para a pequena cidade de Marjorie a alguns anos atrás. Não havia muito registros sobre ela, entretanto o pouco que existia era estudado na faculdade. Em Lokekani, não havia uma enorme quantidade de cursos, estudavam somente os mais básicos. Mas, por isso, a qualidade do ensino era alta. Ninguém podia reclamar se caso fosse aceito — tinha que passar por uma prova para testar seus conhecimentos para se mostrar digno de estudar lá. Quem se formava tinham um ótimo apoio e recomendações que garantiram uma menor dificuldade ao conquistar um emprego ao entrar no mercado de trabalho. Recomendações eram o que regia e motivava os jovens a estudar em uma faculdade em sua própria cidade. E também era um dos motivos que trazia vários estudantes de cidades vizinhas para morar em Marjorie.
— Isso não é justo! Eu e clichê não combinamos — Hanna gritou, a todo pulmões. Bryath, que a acompanhava naquela tarde de sol forte, apenas revirou os olhos e cruzou as pernas.— Por que diz isso, quase xará? — ela perguntou, fingindo interesse. Como a garota precisava conversar com alguém, fingiu que não havia percebido isso. Era boa quando se travava de fingir de sonsa, apesar de não gostar.— Tentei criar uma cena de clichê entre eu e um rapaz que conheci, mas acabei de cara com o chão — disse, fungando e secando seu choro falso com uma de suas mãos.— Mas também, né? Quem tenta criar uma cena clichê? — ela indagou, rindo da cara de Hanna. Isso não era o eu que precisava, dona Ana.— Escritores de romance? Ou de novela, filme e seriado? — perguntou, com sarcasmo. — Eles não fazem isso na vida real, querida. — Ela sorriu, levantando-se de sua cadeira. A passos lentos caminhou até o balcão.Já era sexta-feira e as inv
A primeira coisa que Hanna sentiu ao pôr os pés na calçada fria da rua fora o ricochetear do vento gélido atingindo seu rosto. Os, ainda fortes, raios de sol da tarde provocavam ardência em seus olhos, deixando-a desnorteada por alguns segundos. Seus cabelos curtos grudaram em sua boca, sua saia rodada verde abóbora dificultava a locomoção de suas pernas e a blusa roxa soltinha que vestia parecia querer sair toda vez que o vento — um pervertido, inclusive — adentrava suas vestes com agressividade.Aquela situação a irritava, tanto que ela bateu o pé com força e apertou seus punhos, sem saber lidar com suas emoções. Ela sabia que precisava de calma naquele momento, mas não a tinha, por mais que quisesse.Enquanto andava apressadamente pelas ruas quase desertas de Marjorie e tentava, em vão, encontrar seu irmão no meio das pessoas que ali estavam, Hanna sentia alguns olhares caindo sobre si. Eram, em sua maioria, de adolescentes, jovens e de algumas mulheres adultas. Elas a olhavam com
Se pudesse, Hanna com certeza teria ficado em casa naquela manhã.As luzes do ambiente ofuscavam sua visão. Suor escorria por sua testa à medida que suas pernas doíam de tanto ficar em pé. Hanna respirou fundo desejando um pouco de água para matar sua sede. O tempo abafado daquela manhã de sábado denunciava que não demoraria muito para chover. Era só uma questão de tempo para novamente se ver encharcada pelas gotas d'água que sempre desciam do céu velozmente. Nada diferente do habitual em sua querida cidade natal.Apesar do tempo tão incômodo, seu humor era agradável. Por esse único motivo — ou nem tanto assim —, vestia um vestido de alcinha florido e rodado, seu cabelo estava em uma pequena trança lateral bem arrumados e ela calçava uma sandália rasteira rosa bebê. Tudo muito bem trabalhado para ficar o mais próximo possível da perfeição. Não que ela gostasse disso, mas Mia havia feito questão de que seu look estivesse maravilhoso para não passar vergonha durante sua ida ao único sho
— Eu já disse não! — Eros praticamente berrou, já aparentando estar impaciente com a insistência de Hanna. A garota resmungou, se erguendo do sofá vermelho em formato de "L" que ficava na sala de estar do apartamento do moreno, para se aproximar ainda mais dele. — Por que não? É algo fácil, rápido e que não vai te custar muito! — Hanna protestou, batendo o pé com força no chão. Mia, que estava sentada em uma poltrona do outro lado da sala, gargalhou baixo.— Você não sabe o que é não, Fiore? — replicou, incrédulo com a atitude contínua dela.— Ela nunca se cansa, gato — Mia disse, antes mesmo que Hanna pudesse abrir a boca para falar algo. Contrariada, a jovem assentiu.Ela era e não podia negar isso.— Eu sou sim e não tô nem aí — disse, se aproximando de Eros ainda mais. — E, além do mais, o que eu estou te pedindo é algo tão simples que não posso me conformar com seu não!— Hanna — a chamou, respirando fundo. — Vamos recapitu
— Não acredito que foi por isso que me chamaram aqui! — Hanna resmungou, lançando um olhar mortal na direção de Alba. A garota somente deu de ombros e sorriu minimamente.— É algo importante, Hanna! — alegou, apontando para Dominic que se olhava em um grande espelho do outro lado da sala onde os três se encontravam. — Você quer acabar com a infância daquelas crianças lá fora? Quer? — acusou, gesticulando com as mãos.Hanna somente revirou os olhos. Não era tão gritante assim.— Você está exagerando.— Estou? Olha para aquilo, Hanna! — exaltou, apontando para Dominic novamente. — Que criança não ficaria traumatizada ao ver isso?Relutante, Hanna foi obrigada a assentir.Seu pai estava, no mínimo, esquisito.Dominic vestia uma fantasia da pequena sereia. A peruca ruiva que usava estava posta desajeitadamente em sua cabeça e não condizia com a barba, não tão rala, que ele possuía. Para piorar a situação, a calda da sereia parecia mais um par de músculos esquisitos, nada delicada, em seu