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Capítulo 1 - Uma decepção não tão comum assim

Até onde você estaria disposto a ir para esquecer um grande amor? Muitos se jogariam nos braços da bebida, outros iriam em busca de novos romances. A segunda opção foi a escolhida por Hanna. E, enquanto embebedava um de seus melhores amigos, ela se perguntava se aquilo que estava fazendo era o certo. 

Talvez fosse melhor deixar as coisas rolarem naturalmente. Não. Não podia se dar ao luxo de esperar para que, o cara que ela estava afim, desse conta de seus sentimentos e finalmente começasse a olhar para ela com outros olhos. Ela já tinha seguido essa linha uma vez e acabou se dando mal. Ele a trocou por outra. 

Entretanto, não podia culpá-lo. Ele nem mesmo sabia de seus sentimentos, então como poderia aceitá-los? Mas também não se culpava. Ele também não era o tipo fácil de decifrar. Hanna balançou a cabeça com força. Não era hora de lembrar dele, de seu sorriso, do modo como agia com ela e de como… Ah!

Maldição!

Não, não, não! Ela já não sentia mais nada por ele. Já havia superado. Era por isso que estava naquela festa, não? Estava tentando revelar seus quase sentimentos pelo seu amigo de infância, antes que ele partisse para Flórida. Era. Somente por isso.

Respirando fundo, ela entregou para Brendo o terceiro copo de tequila daquele início de noite. Já com aspecto de um bêbado, o rapaz virou a bebida com uma rapidez impressionante em sua boca, enquanto resmungava que queria tomar um ar. Hanna se aproximou da janela que ficava atrás dela e encarou o céu.

Nuvens escuras bloqueavam os resquícios de luz que ainda insistiam em continuar na atmosfera. Era evidente que, a qualquer momento, no mínimo, uma garoa tocaria a terra e afugentaria os desavisados. Hanna sorriu com o pensamento. Amava a chuva na mesma intensidade que desgostava daquela situação.

Era algo sem limites.

Tomando coragem para olhar para Brendo, que ainda permanecia conversando com um de seus amigos e bebericando de uma bebida qualquer, Hanna teve que admitir. Brendo era muito belo. Seus cabelos negros e curtos eram encantadores; aquela típica regata masculina azul clara que ele vestia lhe caía muito bem e, para melhorar — ou não — a situação, ela combinava perfeitamente com a bermuda jeans preta que ele usava e com o tênis cinzento que calçava. Uma roupa que parecia tão casual para ele, quanto aquele suéter que Hanna vestia era para ela. Sabia muito bem disso 

Enquanto observava de longe Monet, uma figura imponente se aproximava cada vez mais dela. Sem que Hanna pudesse reagir, o homem negro, tatuado e de dread puxou ela pelo pescoço, forçando-a a perceber sua presença. Em um sobressalto, Hanna quase gritou ao ver o rapaz lhe segurando com tamanha firmeza. Mas, ao ver quem era, ela só pôde sorrir.

— Eros? O que você está fazendo aqui? — ela perguntou, intrigada com a aparição do seu amigo e ex-ficante. 

— Não é lógico? — Eros sorriu, fazendo Hanna revirar os olhos.

— Você não quis dizer óbvio? — indagou, com uma sobrancelha franzida. O rapaz apenas gargalhou.

— É por aí. — Eros balançou a cabeça e, soltando o pescoço de Hanna, se escorou na bancada que estava ao lado dela, cruzando os braços. — Aquela sua amiga gostosa me mandou lhe avisar que ela já foi embora e que está desejando boa sorte em sua "investida" — explicou, ressaltando a parte da investida.

— E você veio me dizer isso pessoalmente? — Hanna estava desconfiada. Era inegável isso em seus olhos castanhos. — Conta outra, Guerra.

— Eu tô dizendo a verdade, Fiore. — Eros sorriu, mas dessa vez era um sorriso mais triste. — Vou ficar uma semana fora, então queria aproveitar e me despedir também. 

— Sério isso, Eros? 

Hanna estava decepcionada. Ela tinha alguns planos que precisava inteiramente da ajuda do rapaz, mas se ele não estivesse ali, ela teria que adiar sua ideia mirabolante para mais tarde. Bem, não seria por muito tempo.

— Sim, sim. — Ele sorriu, e ajeitou seu colete de couro no corpo. Apesar do frio que fazia, ele vestia apenas uma calça preta colada, uma regata branca e o seu habitual colete marrom escuro. — Eu tenho alguns negócios a tratar.

— Eu entendo — ela sussurrou, pensando em como todo mundo estava indo embora sem ela. Esse pensamento deixava-a desnorteada. — Obrigada por me avisar.

— Não precisa agradecer, Fiore. — Ele voltou a sorrir, curvando o corpo em direção a garota e depositando um beijo em sua testa. — Venha me visitar quando eu voltar.

— Pode deixar — ela confirmou, fazendo-o assentir com a cabeça. 

— Bem, agora eu tenho que ir — anunciou, se afastando do balcão. — Boa sorte com sua empreitada, madame. — Hanna riu, assentindo em seguida. Dando um tchau com uma das mãos, Eros sumiu em meio a multidão de adolescentes e jovens que compunham a maioria das pessoas presentes ali.

Balançando a cabeça, Hanna voltou sua atenção para onde seu alvo estava. Nesse momento, ela pode ver Brendo saindo de perto de seus outros convidados e dirigindo-se para a piscina. Essa era a chance perfeita. Podia forçá-lo a uma falsa confissão e conseguir a tão esperada aceitação no amor que buscava. 

Talvez, finalmente, pudesse esquecer aquele impertinente.

Depois de esperar cinco minutos após a saída do jovem Monet, suspirando profundamente, Fiore caminhou com dificuldade até a piscina. Seu suéter grosso, marrom escuro, e sua calça de algodão cinza, não combinavam nada com a ocasião. Eram duas peças que ela usava para ficar em casa, mas tinha achado interessante a ideia de inovar um pouco e ir com elas na festa de seu amigo. Uma ideia que várias beldades da faculdade onde estudava não gostaram.

Dane-se!

De toda e qualquer forma, ela não se importava com opiniões de gente como elas. 

Parando um pouco antes de chegar na piscina, ela vislumbrou os cabelos negros de Brendo voando com o vento vindo da colina que ficava não muito longe de sua casa. Ela respirou fundo, sentiu o cheiro da maresia adentrar forçadamente suas narinas. Suas mãos tremiam, ela só não sabia se era de frio ou de receio, talvez fossem os dois, afinal, Marjorie era uma cidade fria e, uma parte dela, dizia para que parasse com aquela ideia tola. No entanto, inevitavelmente, não respeitaria tal presságio.

Hanna era teimosa demais para voltar atrás com seus planos.

 Dando mais alguns passos em direção ao seu alvo, ela conseguiu ter uma visão melhor do rapaz e, consequentemente, percebeu que ele não estava sozinho. Havia alguém com ele.

Os cabelos castanhos cor-de-mel de Sarah se mantinham firmes em um coque perfeito. Seus olhos verdes permaneciam presos no rapaz que estava à sua frente e que ela beijava ferozmente. Sim, ela estava nos braços de Brendo, aos beijos com ele.

Só podia ser brincadeira.

Inevitavelmente, ao ver aquela cena, Hanna ficou boquiaberta. Todo seu plano tinha ido por água abaixo e, para piorar, ele tinha praticamente lhe traído, mesmo que fossem somente amigos, lá no fundo, ela esperava que ele sentisse algo além. Essa esperança, por mais pequena que fosse, lhe alimentava e fazia ela se esquecer daquele certo alguém. Só que, ao ver aqueles dois se devorando vivos, ela percebeu que novamente havia sido trolada. Que havia sido trocada mais uma vez.

Inaceitável. 

Com passos apertados, um olhar raivoso e dentes cerrados, Hanna se aproximou do mais novo casal. Com um raspar exagerado de garganta, ela interrompeu os dois pombinhos e, assim que eles pararam de se pegar, a olharam incrédulos. De forma inconsciente, Hanna cruzou os braços, franziu as sobrancelhas, e os olhou como se fossem lixos. Aquele olhar de menosprezo fez uma carranca brotar no rosto de Brendo e de sua companheira.

— Qual é o problema da vez, Hanna? — Brendo perguntou, exaltado. Pelo tom de sua voz, ela era capaz de ver o quão embriagado ele estava.

Perfeito.

— É recalque, querido — Sarah sussurrou, alto o suficiente para que Hanna ouvisse. Irritada, a garota respirou fundo.

Ela iria matar aquela atrevida.

— Se é, ou não, isso não é problema seu, Leclerc — retrucou, rápido o suficiente para evitar que Brendo pudesse dizer algo.

— Grossa como sempre, né, Fiore? — a garota caçoou, fazendo ênfase no sobrenome de Hanna. 

— Meu assunto não é com você, funcionária — rebateu, voltando sua atenção completamente para Brendo. Sarah apenas engoliu em seco. Hanna tinha certeza que ela estava abalada.

— Hanna, por que está agindo assim? — Brendo perguntou, censurando aquela atitude com seus olhos castanhos claros.

Fiore apenas deu de ombros.

— Assim como?

— Infantil — retrucou. — Você não cresce, não?

— Claro que não, querido. — Sarah sorriu, passando seus braços em volta do pescoço de Monet e lançando um olhar provocativo em direção a Hanna. — Essa daí nunca vai crescer.

— Por que você não me erra, Leclerc? — retrucou, enfurecendo-se. Batendo o pé com força, ela descruzou os braços e apoiou as mãos em sua cintura. — Quer saber? Vocês dois se merecem! Dois manipuladores de araque! 

— Olha quem fala! — Sarah replicou, olhando maliciosamente para ela. — Não foi você que embebedou o Brendo só para ficar com ele?

— É. Fui eu, sim, mas e daí? — Hanna disse, indiferente à provocação da garota. — Não é você que está com ele agora? Ou é uma versão bem mixuruca de mim mesma? Se sim, tenho que reclamar com a fábrica, pois o trabalho dela está deixando a desejar! — alfinetou, arrancando um grunhido alto da outra garota. 

— Ora sua…! 

— O que foi? Vai me bater? Se sim, cai para cima, amorzinho.

— Calma vocês duas! — Brendo interveio, parecendo espantado pela agressividade de sua amiga. Mesmo bêbado, ele parecia estar ciente da situação. — Hanna, peço que dê licença da minha festa — ele disse, fazendo ênfase na parte que deixava claro que quem que mandava na situação era ele.

Incrédula com o pedido, Hanna olhou estupefata para o casal. Sarah ria baixinho, comemorando sua vitória, já o rapaz parecia orgulhoso de sua decisão.

Será que continuaria assim quando voltasse ao normal? 

Não importava a resposta. Hanna não ficaria e nem voltaria a falar com ele para responder essa pergunta. 

— Se é isso que você quer, Brendo, eu vou indo — disse, com desgosto estampado em cada palavra. Hanna se virou para ir, mas, após pensar novamente, voltou sua atenção outra vez para o casal. — Antes de partir, deixe-me dar o devido até logo para vocês.

— Para nós? Mas só o Brendo que irá… 

Sarah foi interrompida assim que Hanna se aproximou dela e, sem nenhuma delicadeza, empurrou os dois para dentro da piscina. Assim que eles caíram na água, gritaram um socorro, atraindo a atenção de todos os outros convidados para si.

Enquanto algumas pessoas ajudavam Brendo e Sarah a saírem da piscina, Hanna deixou a casa de seu ex-amigo gargalhando. Em seu interior ressoava um misto de alegria por ter se vingado, alívio por não ter continuado com aquele plano louco e tristeza por ter sido trocada mais uma vez. Era sempre tão difícil ser praticamente trocada? Para Hanna era muito. Nunca conseguia superar, principalmente quando essa pessoa seguia a vida dela normalmente e não ligava para seus sentimentos.

Isso era tão frustrante.

A casa de Brendo não ficava tão longe de onde ela morava, por isso Hanna optou por ir a pé. Mesmo que ainda assim fosse uma boa caminhada, era melhor do que permitir que mais alguém visse o que ela pretendia fazer.

Naquele momento, enquanto andava pelas ruas silenciosas de Marjorie, imaginou que o anfitrião da festa estivesse se pegando com a m*****a da Sarah ou com qualquer outra atirada como ela. Com esse pensamento, ela voltou a grunhir, sem saber o que fazer. Talvez devesse ir para o próximo nome da lista? Não era uma má ideia, considerando que ainda restavam nomes sem a marcação “não deu certo”.

Pensando que essa ideia fosse ultrapassada, Hanna voltou a bater o pé. Não podia gastar seu tempo com caras que provavelmente dariam mais dor de cabeça a ela do que soluções. Ela já não sabia se queria escolher alguém que pudesse lhe livrar dos pensamentos maçantes sobre aquele cara. 

Sempre era sobre ele. O cara errado.

Passando as mãos em seus cabelos, Hanna deixou um pequeno grito exasperado escapar de sua garganta. Não tinha ninguém na rua, por isso nem notaram seu showzinho.

Fiore estava se sentindo desolada. Não conseguia pensar direito. Talvez fosse, para uns, loucura o que ela estivesse fazendo, mas que mal tinha em gritar? Nenhum. Ela gritava o tempo todo e nunca se importava sobre o que diziam a respeito disso. Simplesmente deixava que suas frustrações escapassem pela sua garganta, e isso a fazia sentir um pouco melhor. Bem, apesar disso, essa não era sua principal maneira de se livrar da decepção. Havia outra um tanto quanto curiosa.

Esfregando suas mãos, ela voltou sua atenção para o céu. Ele estava escuro e algumas gotas minúsculas caiam lentamente das nuvens. Inspirando fundo, tentou andar o mais rápido possível para evitar aquele mal iminente, porém, antes de terminar de dobrar a esquina, a chuva caiu sobre seu corpo aquecido pela corrida. Praguejando em silêncio seu azar, olhou ao redor, procurando um lugar para se abrigar. Se continuasse assim, logo, logo, seu suéter estaria tão encharcado que não conseguiria se mover nem mais um passo sequer.

  Praguejando novamente sua falta de sorte, tentou se abrigar na fachada de uma lanchonete um pouco mais a frente de onde estava. Para seu azar, essa estava fechada e sua fachada não era grande o suficiente para lhe proteger por completo.

Batendo o pé incansavelmente para esvair sua raiva, passou uma de suas mãos sobre seus cabelos curtos na altura dos ombros. Lá se fora sua chapinha de hoje cedo e o dinheiro que havia dado para o cabeleireiro. Maldição! Ela sabia que não era uma boa ideia gastar seu dinheiro suado com algo tão simples, mas havia sido ingênua. Simplesmente seguiu o conselho de sua amiga maluca e acabou se ferrando no final.

Típico.

Respirando fundo para acalmar seu coração, fechou seus olhos e aguardou a chuva passar. A sensação das gotículas caindo sobre a pele do seu rosto era algo que lhe causava arrepios. Ela estava fria. O vento gélido trazia a maresia do mar até suas narinas. Não gostava. Seus cabelos curtos e castanhos grudavam em sua boca e em algumas partes de seu rosto, fazendo cócegas nas espinhas presentes naquela região. Sentia vontade de coçá-las. Soltando outro mini grito, Hanna bateu o pé com mais força e esbravejou alto.

Estava muito frustrada, tanto que, por um segundo, imaginou algo bloqueando a chuva e impedindo que aquela frieza alcançasse sua pele. Bem, infelizmente ou não, isso não era apenas sua imaginação.

Assim que se deu conta disso, imediatamente pode sentir uma presença se pondo ao seu lado para também se proteger dos pingos de chuva. Abrindo seus olhos, encarou a pessoa que estava lhe abrigando. Para seu descontentamento, o ruivo a qual mais tinha um relacionamento conturbado, lhe fitava com uma cara de divertimento.

Noah Bellini, seu tão aclamado rival e — não tão — inimigo assim.

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