Capitulo 03

Sammy

Era terça feira e eu estava acabada. Noite passada foi um verdadeiro porre e eu queria esquecer tudo sobre ela. Ouvir minha mãe dizer aquelas coisas e saber que ela realmente achava aquilo era horrível. Meu pai havia saído cedo pro trabalho na clínica veterinária e eu estava tentada a não ir pra escola. Não queria deixar Sean sozinho em casa com ela.

Tomei banho e desci pra tomar o café da manhã. Mamãe estava com a mão no queixo olhando pra janela enquanto mexia seu café com a colher. Ela me viu e sorriu.

— Bom dia, querida.

Não respondi ela e me sentei.

— Por que não está vestida? — perguntou olhando para meu pijama azul claro.

— Não vou hoje e vê se para de falar comigo. — falei rude sem olhar pra ela.

— Sei que está brava com o que aconteceu ontem, mas tente entender...

— Mãe, por favor, estou tentando não pecar ao mandar você calar a boca de uma forma que vai te fazer desejar que eu tivesse morrido.

Minha mãe me olhou chocada.

— Sammy, por Deus...

— Cala a boca! — gritei com ela e me senti mal na hora. — Como você pode ser assim? Benjamin e Sean são preciosos, sensíveis, são meus irmãos. Seus filhos. Como pode odiar eles? Você é tão fanática, vai tanto na igreja. Advinha mãe? Deus não quer que você viva na igreja, não quer fanatismo. Ele quer amor, quer olhar pra terra e ver seus filhos amando. Ele quer ter orgulho de nós. Quer que seguimos seus mandamentos, não por obrigação. Mas por amor. É tudo o que ele quer.

“Benjamin e Sean foram feitos por Deus. No amor e na sabedoria dele. Você colocou defeitos nos seus filhos e disse que eles eram sua cruz pesada.  A punição de Deus para o seu pecado. Grande pecado, né mãe? Fazer amor com seu próprio marido. Que baita absurdo!”

Mamãe estava com a cabeça abaixada sem falar nada. Ela não via seu erro, não via que era errado ser do jeito que era. Pensar daquele modo. Eu odiava isso. Minha cabeça estava começando a rodar e eu me levantei rápido demais. Cambaleei pra trás e vi tudo girar. De repente eu estava no chão e minha mãe gritando por mim desesperada.

* * *   * * *

Abri meus olhos devagar ao ouvir sussurros e um cheiro estranho e metálico. Meus olhos estavam desfocados e pisquei tentando me concentrar. Olhei em volta e vi que estava em um quarto de hospital. Olhei para mim e percebi que estava usando uma camisola branca com bolinhas pretas. Meu pai entrou com minha mãe no quarto e a médica veio logo atrás. Carina era minha médica desde que nasci e ela era um amor de pessoa. Me conhecia muito bem. Ela sorriu pra mim e acenou com a cabeça.

— Que bom que acordou.

Meu pai parou ao meu lado e me beijou na testa.

— Fiquei tão preocupado, querida.

— Não precisa. — Carina disse. — Ela não tem nada sério. Quer dizer, é sério, mas não é uma doença.

Franzi a testa pra ela e lambi os lábios secos. Minha cabeça ainda estava rodando um pouco e sentia uma vontade fraca de vomitar. Engoli em seco e esperei ela falar algo.

— Carina, fale logo o que ela tem. — minha mãe pediu ao lado do meu pai.

Carina tocou meu pé coberto pelo lançou e sorriu gentil. Ela estava tentando me passar força e eu estava mesmo confusa.

— Sammy está grávida.

Suas palavras me fizeram fechar os olhos com força. Eu já estava desconfiada. Minha menstruação estava atrasada, eu andava enjoada, com dores abdominais, estava mais emotiva do que o normal e meus seios estavam inchados. Eu só não queria fazer o exame para saber se estava certa, estava com medo.

Papai pegou minha mão e apertou. Abri os olhos e olhei para minha mãe que encarava Carina sem nenhuma emoção. Eu não iria perguntar porquê, nem como e nem diria “que droga”. Era um bebê, meu bebê e de Marcus. Me lembrei de seu rosto lindo e a imagem me fez suspirar. Respirei fundo quando minha mãe soltou uma risada baixa.

— Eu não gosto de brincadeiras, Carina. Então, por favor, diga o que ela tem. É alguma bactéria? Eu li que...

— Sra. Preston. — Carina falou calmamente. — Não é brincadeira. Sammy está grávida.

Minha mãe me olhou com os olhos arregalados e negou com a cabeça.

— Não. — disse firme. — Minha filha não peca. Ela não faria isso. É um pecado carnal...

— Lauren... — papai começou, mas ela o interrompeu.

— Minha filha foi criada segundo as leis de Deus todo poderoso. Ela não tem namorado, ela não é uma vadia, ela não peca. Sammy não está grávida! Ela é virgem. Esse é o exame de outra pessoa...

Fechei os olhos e coloquei minha mão trêmula na barriga ainda lisa. Acariciei sob a camisola do hospital e sorri um pouco. Estou grávida.

— Não foi um erro, mãe. — eu disse e abri os olhos para encará-la. — Eu... fiz amor com um cara.

Minha mãe colocou a mão na boca e vi lágrimas rolarem por seu rosto. Meu pai segurou minha mão mais firme me ajudando a continuar e eu agradeci por ele estar comigo. Eu não disse nada à ele, mas não era preciso. Ele sabia que eu e Marcus tínhamos algo.

— Não. — ela disse como um lamento e ficou de costas pra mim.

Apesar das nossas diferenças enormes, ela era minha mãe e eu a amava. Não queria que ela me desse as costas nesse momento. Mas eu não esperava muito dela. Afinal, ela virou as costas para Benjamin e Sean sem nem pestanejar. Ela ficou em silêncio por um tempo e depois se virou para nós.

— Como faz para abortar? — perguntou pra Carina.

Arregalei os olhos e senti as lágrimas surgirem. Meu peito doeu com suas palavras e eu sabia que ela realmenre queria aquilo. Soltei a mão do meu pai e abracei minha barriga em uma tentativa de proteger esse vida que crescia dia após dia dentro de mim. Neguei com a cabeça veementemente.

— Não!

Carina estava com os olhos levemente arregalados e meu pai olhava sem palavras para minha mãe. Ela se mantinha firme olhando para a médica.

— Sra. Preston, sei que é um momento difícil para a senhora que é tão... orgulhosa da criação extremamente severa que deu à seus filhos. — Carina estava falando de forma dura com ela. — Sei também que é extremamente fanática por Deus. Para a senhora um filho fora do casamento é algo ruim. Mas sua filha precisa do seu amor e não do seu julgamento errôneo...

— Como faz para abortar? — ela voltou a perguntar.

— Não faz. — papai respondeu. — Não vou permitir isso.

— Cláudio, por favor, fique fora disso.

— Não. Passei anos da minha vida abaixando a cabeça pra você, Lauren.  Deixei levarem meu filho para um hospício por sua causa. Diminuiu Sean na minha frente e eu permiti. Esse foi meu pecado. Não vai fazer isso com Sammy.

— Mãe...

— Calada! — ela gritou pra mim e eu me encolhi. Ela nunca gritou comigo daquele jeito, nunca me olhou daquele modo. Com nojo e decepção. — O que foi que você fez, Aubrey? Como conseguiu? Você envergonhou à Deus. Nos envergonhou. Você não vai ter o fruto desse pecado, Aubrey. Eu não quero!

— Foda-se o que você quer, mãe! — gritei pra ela que se calou. — É o meu bebê. É o meu corpo. Eu tomo minhas decisões.

— Tem dezessete anos. É uma criança!

— Mas Cláudio também responde por ela. — Carina disse. — E ele não vai permitir.

Minha mãe se virou pra ela e a olhou com nojo.

— Conspiradora de pecado.

— Porquê não quero ver uma menina boa como Sammy ter sua vida arruinada pela mãe ignorante? — Carina estava alterada. — Sou com prazer. Essa cidade é uma fraude. O amor que vocês, senhoras respeitadas de cidade pequena, dizem ter por Deus é falso. É fanatismo. Deus não quer isso. Ele não apoia o assassinato de um bebê.

— Você não tem o direito de se envolver na minha família.

— Família que você destruiu! — eu disse. — Mandou Ben para um hospício, nos chama de pecado e agora quer matar meu bebê? Quem você pensa que é? Ele é meu e eu vou tê-lo.

— Querida, por favor, não faça isso. Não vê que destruiu sua vida, sua alma...

— Chega! — meu pai a pegou pelo braço e a arrastou para fora do quarto.

Carina veio para o meu lado e me abraçou. Chorei em seu ombro até cansar e não sobrar mais nada. Como ela podia dizer aquelas coisas sobre um bebê inocente? Eu nunca entenderia o modo distorcido dela de enchergar Deus e seus ensinamentos. Ele era amor e vida, bondade pura. Eu sentia uma dor profunda no peito, a dor da rejeição e a da raiva. Eu estava puta com ela por ser maluca, por sugerir tirar o meu bebê.

— Ela é um monstro. — sussurrei entre soluços.

— Não pense nisso, Sammy. Tudo o que tem que pensar agora é no seu filho. — Carina disse amavele repousou sua mão sob minha barriga. — Esse garotinho ou garotinha vai precisar muito de você.

— Eu sei. Mas ela é minha mãe. E dói...

Carina me embalou em seus braços como minha mãe deveria ter feito e beijou meus cabelos enquanto eu chorava.

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