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Sábado à noite

Molly

Eu consegui sobreviver ao primeiro mês de aula, e não poderia estar mais orgulhosa de mim. Tudo bem que quase não possuía tempo para nada, nem mesmo conseguia ligar para minha família, mas estava adorando tudo.

Quando o último fim de semana do mês finalmente chegou, eu sabia que desejava aproveitar ao máximo, por isso fiz todos os trabalhos extras durante a sexta à noite e deixei meu sábado livre, para que eu pudesse fazer o que quisesse. E foi assim que consegui ficar o dia quase todo deitada no sofá, colocando minhas séries em dia, comendo besteira e conversando com Ashley por chamada de vídeo.

— Como assim você não saiu ainda, Molly? Parece até que eu não te ensinei a aproveitar a vida direito! — brigou comigo, me fazendo dar uma risada.

— Ash, não tem graça sair sem você comigo. É sério.

— Ué, mas você já está morando aí tem quatro meses, tenho certeza que já fez amizade com várias pessoas! — começou a falar, se movendo pelo seu quarto tão rapidamente, que me deixou tonta. — Sem contar que tem a garota com quem você divide o apartamento. Tenho certeza que se você a chamar para sair, talvez ela deixe de ser tão ranzinza com você.

Tapei a saída de som do telefone e segui de volta para meu quarto. Isla não estava em casa, mas não queria correr o risco de ela chegar bem no instante em que minha amiga estava falando mal dela.

— Você acha que eu já não tentei, Ash? A garota simplesmente não vai com a minha cara, e eu não sei o porquê — falei, por fim, me jogando na cama. — Eu já tentei fazer aquela torta de chocolate maravilhosa que você me ensinou, me ofereci para ajudá-la com um trabalho gigantesco que ela tinha de fazer, mas ela simplesmente me olha com desprezo e solta uma resposta sarcástica. Eu não sei mais o que fazer, Ashley, de verdade.

Realmente não estava mais conseguindo lidar com aquilo. Isla ficava cada vez mais agressiva comigo, no que dizia respeito a como falava comigo ou me olhava, e eu não estava mais conseguindo suportar. Por acaso eu havia feito algo de tão terrível para que ela me tratasse daquela maneira? Não fazia a mínima ideia.

O que estava me ajudando com aquela situação era que minha irmã mais nova, Haley, e meus pais me ligavam quase todos os dias, e Ashley, sempre que podia, mesmo que trocássemos mensagens o tempo todo. Se não fosse por eles, estaria me sentindo mais sozinha ainda.

— É complicado mesmo, amiga. Espero que consiga resolver isso ou, sei lá, vê com o seu pai se consegue outro apartamento para você.

— Ashley, eu não pretendo pedir aos meus pais que continuem pagando as coisas para mim. Já disse que estou tentando encontrar um trabalho — repeti pela milésima vez, a observando revirar os olhos castanhos do outro lado da tela.

Ashley, assim como minha irmã, não achava que eu deveria me preocupar em procurar um emprego se meus pais tinham condições para me manter ali. O que elas não conseguiam entender era que eu não me sentia muito confortável com aquilo e achava que nada seria mais justo que dar uma folga para eles das minhas contas, depois de vinte e dois anos.

O único problema era conseguir encontrar tempo durante a semana e algum lugar que tivesse uma vaga disponível.

Dando de ombros e jogando suas tranças, muito parecidas com as minhas, para trás, Ashley voltou a falar:

— Tudo bem, eu já entendi o recado. Agora me diz: já conheceu algum dançarino legal aí, que tenha te interessado? Ou pelo menos algum ou alguma que você possa me apresentar?

— Estava demorando tanto para você perguntar isso, que eu já estava até achando que você tinha mudado. — Ri, balançando a cabeça e escutando minha amiga rir junto. — Conheci vários colegas de turma e talvez eu realmente possa te apresentar, já que nenhum me interessou.

— Às vezes você me decepciona, Molly Parker. — Ashley balançou a cabeça, com falso desapontamento, me fazendo rir mais ainda. — Estou com saudades, amiga.

— Eu também, Ash. Tenta aparecer por aqui, poxa! Tenho certeza que você consegue uma folga da faculdade para vir me visitar, ainda mais sendo a melhor de todos, não é? — Sorri da maneira mais adorável que consegui.

— Eu vou tentar, amiga, prometo. Agora eu preciso ir, falo com você mais tarde, ok?

— Ok, Ash. Tchau! — Mandei um beijo pouco antes de ela desligar a ligação e segui de volta para a sala.

E encontrei Isla sentada no sofá, parecendo estar muito longe dali. Eu a deixei quieta, fui até a cozinha, bebi um pouco de água e em seguida rumei ao banheiro para tomar um banho. Mesmo estranhando o fato de ela não me dar nenhuma alfinetada ou me chamar de América — clara referência a Meninas Malvadas, que eu notei ser um de seus filmes favoritos —, eu não disse nada.

Após terminar o banho e de me vestir, resolvi assistir mais um filme e voltei para a sala, encontrando Isla na mesma posição de quase vinte minutos antes, para minha surpresa. A garota estava pálida, os olhos levemente arregalados. Parecia estar em estado de choque, o que me deixou preocupada.

Tentando não a assustar, me sentei ao seu lado, colocando uma das minhas mãos em seu braço, e perguntei:

— Isla, está tudo bem?

A garota pareceu acordar do estado de transe em que se encontrava e me encarou, furiosa, praticamente arrancando minha mão fora de seu braço, gritando:

— Tira a mão de mim!

— Deus, garota, eu estou só tentando te ajudar! —  Eu me levantei, assustada com o olhar que ela me lançava. — Qual o seu problema?

— Meu único problema é você! Desde que você resolveu morar aqui, tudo está dando errado, droga! — gritou novamente, com a voz raivosa.

Meu coração foi à boca, observando aquela garota me atacar, e eu não consegui dizer nada. Ela andava de um lado ao outro da sala, parecendo totalmente transtornada.

— Isla...

— Por que já que o seu papaizinho te banca aqui, você não pediu a ele que pagasse a droga de um apartamento que seria só seu? Por que tinha que se enfiar aqui comigo, hein? —  Ela me interrompeu, apertando os olhos na minha direção. — Aliás, para que você veio para Londres? Não notou que aqui não é o seu lugar, nem que ninguém te quer por aqui, América?

Senti meus olhos arderem com lágrimas que resolveram vir à tona e vi Isla sorrir acidamente ao notar isso. Ela me mandou um beijo e seguiu em direção ao seu quarto, batendo a porta logo em seguida.

Segurando o choro o máximo que pude, fui até meu quarto, peguei minha bolsa, que não havia sido desfeita, coloquei uma sombrinha dentro— já que apesar de ainda estar fazendo um pouco de calor, o outono dava as caras durante a noite, e as chuvas também — e amarrei na cintura uma jaqueta de couro, da melhor maneira que minhas mãos trêmulas deixaram. Terminando de calçar um tênis, logo saí correndo do apartamento.

Assim que deixei o prédio, corri para a estação de metrô, sem saber exatamente para onde queria ir. Enquanto observava as paredes cinzentas passarem como um raio pelo subsolo da cidade e derrubava algumas lágrimas magoadas, as afirmações de Isla se repetia em minha mente.

A música que tocava em meus fones de ouvido também não ajudava em nada em meu estado de ânimo, e eu me peguei questionando se o que Isla dissera era verdade. Não que eu quisesse ir embora, eu estava amando cada segundo ali e estava feliz por viver meu sonho, mas não nego que me sentia muito sozinha.

Sim, era incrível estar estudando na faculdade dos meus sonhos, no curso dos meus sonhos, mas era estranho não ter ninguém com quem falar durante os intervalos ou quando chegava em casa, não encontrar com alguém que ficasse animado comigo sobre minhas aulas e novas conquistas.

Era barra estar longe da minha família, que me amava e me dava todo o seu apoio incondicional, e de meus amigos, que conseguiam me transformar em uma pessoa mais divertida e que não me deixavam desanimar de nada.

Suspirando longamente, limpei as lágrimas que encharcavam minhas bochechas, resolvendo não me deixar abater por aquilo. Quis fazer algo para me distrair um pouco. O problema é que meu celular resolveu descarregar, bem quando estava escolhendo uma música mais animada.

— Droga — reclamei, retirando os fones de ouvido e guardando tudo dentro da bolsa. — E agora, o que eu vou fazer...? — sussurrei, olhando para todos os lados.

Notei que estávamos parando na estação de Waterloo e resolvi descer, dando de cara com vários músicos espalhados pela estação e cantando músicas animadas. Assim que saí da estação, dei de cara com a London Eye e notei que não a conhecia ainda.

Aliás, eu não conhecia nada da cidade ainda. Então pensei que, talvez, aquela fosse a melhor hora para conhecer aquele lugar maravilhoso e finalmente poder apreciar a vista incrível da qual já ouvira tantas vezes.

Afinal, o que eu tinha a perder?

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