Kara Jimenez
Já havia se passado cinco minutos desde que o Gustavo entrou no carro e partiu, ainda assim eu continuava parada no mesmo lugar, olhando para o dinheiro que ele fez questão de jogar no meu rosto.
Eu abaixei com dificuldade para pegar o dinheiro que o vento quase levou embora. Depois da humilhação que ele me fez passar e das feridas nos meus dois joelhos, pagar um táxi era o mínimo que ele poderia fazer.
Me ergui e olhei para dentro do centro de treinamento. Os meus joelhos nem se comparavam ao meu coração estraçalhado. Gustavo não estava mais ali, me provando que ele não havia se importado com os ferimentos que causou em mim.
Um suspiro longo e profundo escapou dos meus pulmões quando me lembrei o quanto eu o admirava antes mesmo de o conhecer. Embora a sede do clube estivesse vazia, eu sabia que os imperadores fariam um jogo importante naquela noite, e eu queria estar ali para passar eles toda a minha energia positiva.
Acho que estou exagerando um pouco, na verdade, eu vim parar aqui por pura casualidade do destino. Sai de casa às escondidas após comer um pedaço de torta que eu sabia que não deveria comer, e para não ouvir os gritos da minha mãe me avisando que as coisas que o Sebastian comprava eu não devia tocar, eu saí antes que ela chegasse.
Peguei um ônibus até o centro da cidade e quando eu avistei o centro de treinamento, não conseguir evitar. Conhecer aquele time de futebol era o meu grande sonho. Eu passava noites imaginando o dia em que eu conheceria o Gustavo Henri e pediria a ele um autógrafo.
Mas as palavras despudoras dele foi como uma desilusão sobre a minha cabeça. A julgar pelas atitudes estupidas dele, era obvio eu havia me iludido demais com aquele rosto bonito.
Soltei um grunhido quando dei um passo à frente. Sentia tanta dor que não conseguia fazer nada além de chorar em silêncio. Se eu tivesse ficado em casa nada disso teria acontecido, eu só suportaria as delongas da minha mãe, defendendo o seu marido abusador. Por outro lado, se minha blusa não tivesse ficado presa no arame da cerca e eu não tivesse a puxado com força e perdido o equilíbrio, certamente não teria sido atropelada.
Olhei para minha blusa rasgada e percebi que eu só estava tentando arrumar uma desculpa para o meu fracasso. Peguei meu velho celular do bolso e chamei um motorista por aplicativo.
Embora eu não tivesse morrido, eu me sentia como se tivesse prestes a ser enterrada viva. Sai do carro quase não suportando a dor e a demora no atendimento só piorava ainda mais minha situação. Senti o tempo se arrastando como uma eternidade, até finalmente eu ser atendida.
Com os dois joelhos enfaixados e andando com bastante dificuldade, eu saí do hospital com a certeza que não queria voltar para casa naquele dia. Também pensei em uma pessoa de muito bom coração chamada Rosa. Ela era a vizinha que sempre me salvava quando eu estava em apuros, e eu tinha certeza de que ela não me negaria ajuda naquele momento tão difícil. Meia hora mais tarde ela já estava ali, dirigindo seu carro velho que caia aos pedaços. Tinha um semblante preocupado quando me avistou.
— Como isso foi acontecer, menina? – me ajudou a sentar no banco e eu só respondi quando ela também entrou no veículo.
— Eu fui atropelada – disse, com um nó se formando em minha garganta – por um jogador de futebol.
Rosa arregalou os olhos abismada com o que eu contava. Parecia absorver minhas palavras e sua preocupação se intensificou.
— Quando sua mãe souber disso – meu coração congelou com as palavras dela.
— Por favor, Rosa, deixe-me dormi na sua casa essa noite – juntei as duas mãos, implorando por mais um favor – eu comi uma torta vencida do Sebastian que estava na geladeira. Imagine a confusão que isso dará.
— Sua mãe continua proibindo você de comer as coisas que aquele homem compra? – perguntou com uma expressão de ódio no rosto – alguma coisa precisa ser feita contra isso, menina.
— E será feita, Rosa – disse e ainda que parecesse que eu estava animada, eu não tinha ideia do que fazer – mas antes eu preciso descansar. Você entende, não é?
— Como eu não entenderia? – disse Rosa – afinal, quem era o tal jogador de futebol que causou todo esse acidente?
A pergunta dela fez meu coração congelar. Me lembrei então do belo rosto do Gustavo cheio de ira, quando olhava para mim. Eu já não conseguia vê-lo como antes. Agora ele parecia ser um homem cruel, arrogante e mesquinho. Eu realmente esperava nunca mais encontrá-lo em minha vida.
— Ele não é ninguém – as sensações ao falar dele eram desconfortavelmente avassaladoras – ele é um jogador qualquer, ninguém o conhece.
Rosa ficou confusa com a minha resposta. Me observou por alguns segundos e percebeu certamente o quanto eu não queria falar mais daquele assunto. Deu de ombros e voltou sua atenção a estrada.
Quinze minutos depois chegamos a sua casa. Observei a minha residência de longe, todas as luzes estavam apagadas. Olhei para a tela do meu celular, não havia nenhuma ligação da minha mãe. Eu sabia o que isso significava, eu estava encrencada.
Deixei um bilhete na cama da Rosa agradecendo o seu afeto comigo e sai antes do sol nascer completamente. Caminhei com dificuldade até o portão da minha casa. Eu tinha chaves extras e tentei fazer o menor barulho possível para não acordar ninguém.
Meus esforços foram em vão. Assim que entrei pela porta, aquela voz surgiu logo atrás de mim. Em meus olhos, uma breve pontada de horror se revelou.
— Com quem você passou a noite, vadia? – o meu coração quase parou com a voz de Sebastian
Eu me virei para olhá-lo, mal conseguia ver o seu rosto com a pouca luminosidade da casa, mas percebi que ele se aproximava, chegando bem perto de mim.
— O que eu faço da minha vida, não o interessa.
Eu o vi apertar os punhos e com a outra mão agarrar o meu rosto, segurando minhas bochechas com os dedos.
— Se você mora na minha casa, me interessa sim – me soltou com brutalidade e eu tive que me esforçar bastante para me manter de pé.
Eu gemi de dor. Ele observou meus joelhos enfaixados, quando a luz da sala foi acessa.
— O que está acontecendo aqui? – Minha mãe olhava para mim com horror.
— A vadia da sua filha dormiu fora de casa, Celeste – apontava o dedo no meu rosto – além e ter roubado a minha torta, ela acha que pode chegar na minha casa a hora que bem-quiser.
— Eu não roubei a sua torta – meus olhos lacrimejaram e eu levantei a voz para respondê-lo – e eu sou maior de idade, não me lembro ter que dar satisfação a você.
— Não trate o Sebastian dessa maneira, Kara – algo sinistro brilhou nos olhos da minha mãe. Era claro que ela defenderia o marido inescrupuloso – diga logo onde você passou a noite e o que aconteceu com os seus joelhos.
— Eu fui atropelada – mas não havia comoção nenhum no rosto dela ao ouvir minha confissão - eu estava no centro de treinamento dos imperadores quando tudo aconteceu.
Minha mãe não conseguiu ocultar o desgosto em seu rosto ao me ouvir confessar aquilo.
— Você deveria estar arrumando um emprego – o rosto do meu padrasto escureceu ao falar comigo – ao invés disso fica atrás de jogador de futebol. Nenhum deles vai querer alguém tão desprezível como você.
Ele não tinha o direito de ser tão insolente assim comigo. Tive vontade de pular no pescoço dele e esganá-lo. Contudo, foi a presença da minha irmã mais nova, que correu para me abraçar, que me impediu de cometer uma grande loucura.
— A senhora não vai dizer nada mãe? – mas ela virou as costas para mim deixando claro o lado que iria ficar – vai deixar esse verme ofender a sua filha?
— O Sebastian tem razão – ela deu de ombros e eu não deveria me magoar pela atitude da minha mãe, mas ela aumentou o buraco que havia em meu coração.
— Quer saber de uma coisa – ele sacudia o dedo na direção e eu percebi que ele planejava algo – isso acaba agora mesmo. Como você mesmo disse, já é de maior e certamente consegue se cuidar sozinha.
— O quê? – observei o Sebastian caminhando na minha direção e com um único gesto me agarrar pelo braço me arrastando para fora – o que você acha que está fazendo?
— Expulsando você da minha casa – eu apenas ouvir o ranger do portão, quando fui lançada com força contra o asfalto gelado.
Meus joelhos arderam com o impacto. Aquilo não podia estar acontecendo. Ergui o rosto lentamente, agora encharcado pelas lagrimas e olhei nos olhos da minha mãe. O que realmente estraçalhou o meu coração foi ver Olivia, minha irmã, chorando e chamando pelo meu nome.
Os olhos de Celeste eram frios e sem compaixão.
— Mãe, eu não tenho para onde ir – eu mal vi o momento em que Sebastian saiu dali e só voltou com minhas roupas em um saco de lixo – por favor, mãe, não permita que ele faça isso.
Mas minhas súplicas foram em vão. Eu apenas vi minha mãe virar as costas para mim, agarrando na pequena mão de Olivia, antes do portão se fechar. Agora eu olhava para o portão bem fechado, sentindo-me completamente entorpecida.
Eu não vi o momento em que Rosa me alcançou em seus braços e me levou de volta para a sua casa. Ela tentava me consolar, enquanto eu me sentia perdida, sem saber o que fazer da minha vida.
No ritmo do jogo, corri na direção do gol, só eu e o goleiro, e chutei, vendo a bola passar distante. Ouvi a voz do preparador físico gritar de longe o meu nome. — Hoje você está muito distraído, Gustavo. Precisa se concentrar mais – Deu um leve tapa nas minhas costas e se afastou novamente. Estávamos apenas no aquecimento e todos já haviam percebido que algo estranho acontecia comigo. Os torcedores logo perceberiam também, quando eu, o artilheiro do time falhasse no jogo que valeria a nossa vaga para final. Eu tentava não pensar nisso, esvaziar a mente e me focar no real objetivo daquela noite, mas todas às vezes que eu buscava um caminho diferente, minha mente me levava de volta à cena em que minha mulher estava me traindo. — Droga! – esbravejei, quando senti a presença do Allan logo atrás de mim. — Está de mau-humor porque foi punido pelo atraso, ou por que errou aquele chute no gol? — Um pouco dos dois – menti, mas eu sabia que o Allan não acreditaria naquilo – o dia est
Kara Jimenez Meu olhar se arregalou quando eu li a notícia nas redes sociais. A mulher do Gustavo havia sofrido um grave acidente e estava em estado grave no hospital. Ele devia estar arrasado, eu pensei, e por uma breve fração de segundos eu sentir compaixão dele. Me levantei atordoada quando percebi meus sentimentos. Gustavo não merecia nem meus pensamentos, imagine então minhas considerações. — Espero que agora ele aprenda a ser mais prestativos com pessoas atropeladas – bravejei em voz alta, sem perceber que eu não estava sozinha na pequena sala. — Ora essa, menina, anda falando sozinha agora? – meu coração acelerou quando ouvi a voz da Rosa logo atrás de mim. Enquanto recuperava o ar, observei Rosa rir de mim. Nem parecia que fui expulsa de casa há uma hora e estava aqui, morando na casa dela sem saber o que fazer da minha vida. — Desculpa, Rosa – me aproximei dela e a abracei. Meu coração estava cheio de gratidão por aquela mulher se tão bondosa comigo – eu prometo q
— Hoje mesmo? – arregalei os olhos até ele sem acreditar no que ele dizia – eu não posso, senhor. Olha o modo como eu estou vestida. — Então quer desistir do emprego? – o homem me olhou dos pés à cabeça, começou a suar e eu vi o desespero estampado no rosto rechonchudo dele – o patrão precisa de uma babá o mais rápido possível. Patrão? Eu fiz uma careta. Eu trabalharia para um homem que eu nem conhecia. E se ele fosse um arrogante mesquinho como o meu padrasto, ou um velho abusador? Eu não sabia por que minha mente me levava para o lado mais obscuro das pessoas, mas eu já não conseguia confiar em ninguém. — Eu não estou desistindo – soltei um longo e pesado suspiro, enquanto encarava os olhos aliviados do homem – estou apenas dizendo que eu não devo chegar em um estado tão reprovável no meu primeiro dia de trabalho. — Isso não é importante – ele ignorou completamente o meu estado – o importante é saber se você consegue cuidar de um bebê recém-nascido. Eu franzi a testa e o t
Gustavo Henri Eu estava extremamente irritado e minha vontade era agarrar aquela garota e jogá-la para fora da minha casa. Parado ainda no meio da chuva, eu larguei o braço dela e a olhei com enorme reprovação. Percebi que ela estava assustada, embora dessa vez eu conseguisse ver os traços finos do seu rosto. A garota era bonita e a chuva que caia sobre ela a deixava ainda mais interessante. — Isso não pode ser verdade – comecei a andar para longe dela, quando subitamente olhei para trás para ver qual reação ela teria – eu não contrataria ninguém como ela. Havia indignação no rosto dela e percebi que a garota não havia gostado nada do que eu dissera. — O senhor mesmo pediu para que eu contratasse a primeira candidata que aparecesse – Alexandre sussurrou no meu ouvido, certamente para não a constranger – a Kara foi a única que apareceu para a entrevista. Eu achava aquilo consciência demais. Depois que ouvi as palavras de Alexandre, bufei e dei de ombros. Eu não podia levar a sér
Kara Jimenez Meu coração estava destruído, embora eu fingisse não sentir nada para não dar ao Gustavo o gosto de me ver sofrer, eu permaneci de cabeça erguida. O olhar dele era frio e indecifrável. Eram verdes escuros como jade rara. Os cabelos tão bem aparados, dourados como a luz do sol, agora molhados, deixava-o com um ar sedutor, o que era um perigo para mim. Nariz perfeito, a barba por fazer. O rosto esculpido por Deus. Meu corpo estremeceu e precisei desviar o olhar. Como um homem tão bonito como aquele podia ser tão arrogante? Senti ele se aproximando e eu precisei abaixar a cabeça. Eu sabia que o Gustavo não confiava em mim e só iria me contratar porque não tinha outra opção. Me lembrei da esposa dele, internada em um hospital em estado grave. Ainda assim não era compreensível todo aquele ódio no seu coração. — Eu vou contratá-la – ergui o rosto rapidamente olhando nos olhos dele. Eu sei que a expressão do meu rosto denunciou o quanto eu estava feliz com aquilo – mas devo
Gustavo Henri O choro de Jasmim rompeu todos os meus maus pensamentos. Eu corri até lá e levei um grande susto quando vi aquela mulher segurando a minha filha. Embora meu coração se enchesse de medo e desconfiança, o que realmente me chamou a atenção foi o modo como Kara estava vestida. Eu não deveria olhar para outra mulher com segundas intenções, enquanto Bruna estava em uma cama de hospital, lutando para sobreviver, mas o vestido que ela vestia, deu a Kara outra impressão. Ela realmente era muito bonita. Quando percebi meus pensamentos, dei um jeito de eliminá-los, quando me lembrei do que Bruna havia feito comigo. Sua traição certamente me faria olhar para todas as mulheres de maneira igual. Traidoras e dissimuladas. Eu tive vontade de arrancar minha filha dos braços dela, mas Jasmim parecia tão confortável e bem que acabei desistindo. Eu precisava confiar em Kara e realmente acreditar que ela não faria mal algum a minha família, e então seguimos até o escritório e ela, enfim,
Kara JimenezO choro de Jasmim só piorava ainda mais as coisas. Eu estava tão assustada com o que havia acabado de acontecer, que fiquei perdida dentro daquela mansão sem saber para que lugar ir. Eu precisava primeiro acalmar a menina, para que só depois eu conseguisse me acalmar.Voltei para o quarto no andar de baixo, onde eu havia visto Jasmim pela primeira vez. Deitei ela na cama e o choro se intensificou. Eu quase entrei em desespero.Troquei a fralda com as mãos tremulas, segurei a menina no colo e sai. Eu precisava descobrir onde era a cozinha daquela casa. Cinco minutos se passaram e eu quase perdi a paciência, quando ouvi vozes, o alívio me percorreu imediatamente. Quando entrei na cozinha me deparei com duas senhoras. Como eu não havia percebido a presença delas antes?Elas giraram os pescoços em sintonia e me olharam desconfiadas. Eu fiquei desconfortavelmente agitada sob o olhar julgador daquelas mulheres, mas eu não tinha muito tempo para me explicar.— Eu preciso de ajud
Kara JimenezEu senti um arrepio percorrer todo o meu corpo, dos pés à cabeça, assim que sai da cozinha indo atrás da Cassandra. Eu ainda estava desesperada com choro de Jasmim e corri atrás da mulher para tentar resolver aquela situação.Antes que eu pudesse abrir minha boca para contestar, fui fuzilada com aquele olhar gélido.Cassandra me examinou profundamente, dos pés à cabeça. A profundidade do seu olhar me fez tremer pela segunda vez naquele dia.— Diga-me, desde quando você é amante do Gustavo?Senti meu rosto esquentar instantaneamente assim que ouvi as palavras daquela mulher. Eu sabia eu o meu rosto havia ficado vermelho quando a raiva atingiu o meu coração. Sob qual alegação, Cassandra afirmava aquilo com tanta certeza?— Do que está falando, senhora? – meus olhos estavam arregalados de pavor – como pode pensar que eu teria um caso com o senhor Gustavo se eu mal o conheço?Ela olhou no fundo dos meus olhos e gritou com os dentes apertados, enquanto o meu coração disparava,