No ritmo do jogo, corri na direção do gol, só eu e o goleiro, e chutei, vendo a bola passar distante. Ouvi a voz do preparador físico gritar de longe o meu nome.
— Hoje você está muito distraído, Gustavo. Precisa se concentrar mais – Deu um leve tapa nas minhas costas e se afastou novamente. Estávamos apenas no aquecimento e todos já haviam percebido que algo estranho acontecia comigo. Os torcedores logo perceberiam também, quando eu, o artilheiro do time falhasse no jogo que valeria a nossa vaga para final. Eu tentava não pensar nisso, esvaziar a mente e me focar no real objetivo daquela noite, mas todas às vezes que eu buscava um caminho diferente, minha mente me levava de volta à cena em que minha mulher estava me traindo. — Droga! – esbravejei, quando senti a presença do Allan logo atrás de mim. — Está de mau-humor porque foi punido pelo atraso, ou por que errou aquele chute no gol? — Um pouco dos dois – menti, mas eu sabia que o Allan não acreditaria naquilo – o dia está bem ruim hoje. — O que aconteceu? – ele jogou a toalha ensopada de suor em cima de mim e eu pensei se deveria contar toda a verdade a ele – eu sei que não está distraído só por isso. Suspirei quando Allan lançou o olhar até mim, ficando ainda mais intrigado. Se eu contasse tudo a ele naquele momento, perderia o foco completamente, meu peito se encheria de angústia e raiva e perderíamos o jogo. A última coisa que eu queria agora era prejudicar o time devido aos meus problemas pessoais. — Quando o jogo acabar e vencermos, eu contarei tudo a você – forcei um sorriso, jogando a toalha de volta – agora eu só quero a nossa classificação para final. Allan não disse nada, apenas concordou em silêncio com a minha decisão. Ao chegar no campo observei aquela torcida lotando o estádio. O canto deles me fez esquecer o resto e jogar futebol, que era o que eu, mas amava na vida. No apito final eu caí de joelhos no gramado e chorei. Senti as mãos dos meus companheiros me agarrando. Todos estavam felizes, nós vencemos o jogo. Alguma coisa de boa tinha que acontecer naquele dia, e a vitória foi como um alívio ao meu coração. Pela primeira vez naquele dia eu me senti feliz. Cantávamos no vestiário e imaginávamos a gente na final. Definitivamente aquele era um momento importante na minha carreira como jogador. — E como está a pequena Jasmim? – a pergunta do Allan me fez voltar a realidade. Ele certamente percebeu quando o sorriso desapareceu dos meus lábios. Minha garganta deu um nó e tudo o que eu sentir foi um imenso ódio invadir o meu coração. — Aconteceu algo com a Jasmim? – Allan segurou no meu ombro, quando me viu abaixar a cabeça. — A Jasmim está ótima – levantei a cabeça para me certificar que ninguém escutaria a nossa conversa, quando voltei a olhar nos olhos da Allan e confessei – eu voltei em casa essa manhã para pegar as minhas chuteiras da sorte, quando me deparei com a Bruna me traindo com o Donovan. Allan estava atordoado. — Filho da mãe – ele sussurrou – diga-me que você arrebentou a cara dele? — Eu poderia ter matado ele – eu percebi como ele tinha ficado espantado com a minha última palavra – tive que sair de casa às pressas para não cometer uma loucura. Acabei até atropelando uma garota no meio do caminho. Quando a imagem do belo rosto da garota invadiu minhas lembranças, a culpa me consumiu. — Não me diga que a matou? – ele perguntou, embora parecesse obvio que nada grave havia acontecido. — Se eu tivesse matado alguém hoje, eu estaria preso – Allan soltou um longo suspiro – mas a garota está bem, arranhou apenas os joelhos. Eu desejei que ela estivesse realmente bem e que não me processasse por não ter lhe prestado socorro. — O que vai fazer agora? – meu rosto se contorceu ao ouvir essa pergunta. — Vou pedir o divórcio – abaixei a cabeça novamente e fechei os olhos – eu não posso ficar ao lado de uma traidora. Eu mal havia fechado os meus lábios e levantado a cabeça, observei o vice-presidente do clube se aproximar de mim. O rosto gorducho dele parecia preocupado. Ele suava sem parar e parecia cansado, como se carregasse um enorme peso sobre as costas. — Precisamos conversar, Gustavo – como se as coisas já não estivessem ruins o suficiente, ele parecia trazer péssimas notícias para mim. Enquanto o acompanhava para fora do vestiário, indaguei a mim mesmo o que de mais errado eu teria feito naquele dia. Será que a garota havia me denunciado? Eu sei que o meu rosto ficou pálido quando o vice-presidente olhou para mim, eu podia sentir o sangue parar de correr pelas minhas veias. — Eu não tenho boas notícias – ele soltou um longo suspiro e abaixou o olhar. Certamente pensava na melhor maneira de me contar o que acontecia – houve um acidente com a Bruna. Foi como se o mundo parasse de girar. Eu prendi a respiração enquanto a minha mente criava centenas de possibilidades. — Ela vinha em direção ao centro de treinamento quando o carro dela capotou – eu ouvia atentamente o que ele dizia e nada mais, além disso, apenas esperando a bomba explodir – ela foi levada para o hospital em estado grave. Lamento não ter informado antes. No primeiro momento eu fiquei sem reação, como se os meus pés estivessem grudados no chão. No segundo seguinte eu apenas virei as costas e corri para longe dali. Eu só conseguia pensar em Jasmim e orar para que ela não estivesse dentro daquele carro. Senti uma mão me agarrar e me colocar no veículo. Eu e o Allan ainda vestíamos o uniforme do time quando chegamos ao hospital. A notícia impactou Cassandra Sanches, a minha sogra, como um raio caindo do céu. Toda coragem que eu havia reunido momentos atrás, havia desaparecido completamente quando eu olhei nos olhos chorosos dela. — Faça qualquer coisa para salvar a vida da minha adorável filha, Gustavo – ela me agarrou em prantos e eu já não sabia mais como reagir. Eu tentei consolá-la, esperando impacientemente o retorno do médico para nos informar sobre o estado de saúde da Bruna. Embora Bruna não merecesse minha compaixão, eu jamais desejaria a sua morte. O corpo de Cassandra tremeu quando ela viu o médico se aproximar. — Como está a minha filha, doutor? – desequilibrada emocionalmente para conseguir pensar direito, eu tomei a frente da situação. — Eu sou o Gustavo Henri, marido da Bruna Sanchez – estendi a mão e recebi um aperto caloroso. O médico parecia feliz em me ver. — Parabéns pela classificação – ele abriu um sorriso e eu não soube se ficava agradecido ou constrangido pelo momento em que ele me parabenizava – minha filha é torcedora dos imperadores. Está muito feliz com o resultado. Eu ofereci a ele um sorriso forçado, enquanto Cassandra chorava ainda mais. — Diga-me doutor, como a Bruna está? – ele limpou a garganta e o seu semblante mudou drasticamente. Eu não gostei do que vi nos olhos dele. — As notícias não são boas – a expressão no rosto de Cassandra escureceu – a Bruna sofreu traumatismo craniano e está em coma. O seu estado é gravíssimo. A atmosfera no hospital ficou tensa e eu me afundei em um silêncio mortal. Como era possível tantos desastres acontecerem no mesmo dia? Eu desabei no banco que havia logo atrás de mim. Mas nenhuma lagrima escorreu do meu rosto. Se posso confessar algo, seria que meu coração estava vazio por dentro. Eu nem ao menos conseguia sentir pena da minha mulher. Pensava na minha pequena filha, que agora não tinha a mãe para cuidar dela. Quando me lembrei de Jasmim, meu coração se apertou instantaneamente. Levantei-me alterado, olhando nos olhos de Cassandra e indaguei o obvio. — Onde está a Jasmim? – segurei nos dois braços dela, imaginando que minha filha estivesse no mesmo carro que Bruna sofreu o acidente. — Ela está na minha casa. Bruna a deixou antes de ir atrás de você – Cassandra limpava as lagrimas apenas deixando um enorme borrão de maquiagem em seu rosto – mas não poderei ficar com ela por muito tempo. Eu já não tenho mais jeito com crianças. Eu lancei um olhar gélido até Cassandra. Era claro que ela não poderia cuidar da própria neta e nem eu mesmo iria querer tal coisa. Talvez não fosse o momento de pensar em quem cuidaria de Jasmim, quando me lembrei que dali a dois dias eu viajaria com o meu time para outro importante jogo. Eu não podia deixar Jasmim sozinha. Minha mãe estava ocupada cuidando da saúde da minha irmã, que passava por um severo tratamento de câncer. Eu não tinha parentes por perto, ninguém de confiança que eu pudesse entregar a vida da minha filha. — Contrate uma babá para cuidar de Jasmim até que a Bruna se recupere – a própria Cassandra sugeriu. Por minha vez, eu fixei Cassandra com um olhar severo – Sinto muito, Gustavo, mas eu não posso ajudá-lo. A ideia de Cassandra ia contra tudo o que Bruna havia planejado. Ela não queria uma estranha cuidando da nossa filha, quando ela podia estar em casa cumprindo o seu papel de mãe. Mas eu não tive outra alternativa. Quando retornei para casa naquela noite, contatei o meu advogado e pedi para que ele contratasse uma babá em menos de vinte e quatro horas , sem revelar que seria eu o patrão. Com a minha identidade preservada, me restava apenas esperar, enquanto as notícias sobre o grave acidente de Bruna se espalhavam como pólvora por todos os meios de comunicação.Kara Jimenez Meu olhar se arregalou quando eu li a notícia nas redes sociais. A mulher do Gustavo havia sofrido um grave acidente e estava em estado grave no hospital. Ele devia estar arrasado, eu pensei, e por uma breve fração de segundos eu sentir compaixão dele. Me levantei atordoada quando percebi meus sentimentos. Gustavo não merecia nem meus pensamentos, imagine então minhas considerações. — Espero que agora ele aprenda a ser mais prestativos com pessoas atropeladas – bravejei em voz alta, sem perceber que eu não estava sozinha na pequena sala. — Ora essa, menina, anda falando sozinha agora? – meu coração acelerou quando ouvi a voz da Rosa logo atrás de mim. Enquanto recuperava o ar, observei Rosa rir de mim. Nem parecia que fui expulsa de casa há uma hora e estava aqui, morando na casa dela sem saber o que fazer da minha vida. — Desculpa, Rosa – me aproximei dela e a abracei. Meu coração estava cheio de gratidão por aquela mulher se tão bondosa comigo – eu prometo q
— Hoje mesmo? – arregalei os olhos até ele sem acreditar no que ele dizia – eu não posso, senhor. Olha o modo como eu estou vestida. — Então quer desistir do emprego? – o homem me olhou dos pés à cabeça, começou a suar e eu vi o desespero estampado no rosto rechonchudo dele – o patrão precisa de uma babá o mais rápido possível. Patrão? Eu fiz uma careta. Eu trabalharia para um homem que eu nem conhecia. E se ele fosse um arrogante mesquinho como o meu padrasto, ou um velho abusador? Eu não sabia por que minha mente me levava para o lado mais obscuro das pessoas, mas eu já não conseguia confiar em ninguém. — Eu não estou desistindo – soltei um longo e pesado suspiro, enquanto encarava os olhos aliviados do homem – estou apenas dizendo que eu não devo chegar em um estado tão reprovável no meu primeiro dia de trabalho. — Isso não é importante – ele ignorou completamente o meu estado – o importante é saber se você consegue cuidar de um bebê recém-nascido. Eu franzi a testa e o t
Gustavo Henri Eu estava extremamente irritado e minha vontade era agarrar aquela garota e jogá-la para fora da minha casa. Parado ainda no meio da chuva, eu larguei o braço dela e a olhei com enorme reprovação. Percebi que ela estava assustada, embora dessa vez eu conseguisse ver os traços finos do seu rosto. A garota era bonita e a chuva que caia sobre ela a deixava ainda mais interessante. — Isso não pode ser verdade – comecei a andar para longe dela, quando subitamente olhei para trás para ver qual reação ela teria – eu não contrataria ninguém como ela. Havia indignação no rosto dela e percebi que a garota não havia gostado nada do que eu dissera. — O senhor mesmo pediu para que eu contratasse a primeira candidata que aparecesse – Alexandre sussurrou no meu ouvido, certamente para não a constranger – a Kara foi a única que apareceu para a entrevista. Eu achava aquilo consciência demais. Depois que ouvi as palavras de Alexandre, bufei e dei de ombros. Eu não podia levar a sér
Kara Jimenez Meu coração estava destruído, embora eu fingisse não sentir nada para não dar ao Gustavo o gosto de me ver sofrer, eu permaneci de cabeça erguida. O olhar dele era frio e indecifrável. Eram verdes escuros como jade rara. Os cabelos tão bem aparados, dourados como a luz do sol, agora molhados, deixava-o com um ar sedutor, o que era um perigo para mim. Nariz perfeito, a barba por fazer. O rosto esculpido por Deus. Meu corpo estremeceu e precisei desviar o olhar. Como um homem tão bonito como aquele podia ser tão arrogante? Senti ele se aproximando e eu precisei abaixar a cabeça. Eu sabia que o Gustavo não confiava em mim e só iria me contratar porque não tinha outra opção. Me lembrei da esposa dele, internada em um hospital em estado grave. Ainda assim não era compreensível todo aquele ódio no seu coração. — Eu vou contratá-la – ergui o rosto rapidamente olhando nos olhos dele. Eu sei que a expressão do meu rosto denunciou o quanto eu estava feliz com aquilo – mas devo
Gustavo Henri O choro de Jasmim rompeu todos os meus maus pensamentos. Eu corri até lá e levei um grande susto quando vi aquela mulher segurando a minha filha. Embora meu coração se enchesse de medo e desconfiança, o que realmente me chamou a atenção foi o modo como Kara estava vestida. Eu não deveria olhar para outra mulher com segundas intenções, enquanto Bruna estava em uma cama de hospital, lutando para sobreviver, mas o vestido que ela vestia, deu a Kara outra impressão. Ela realmente era muito bonita. Quando percebi meus pensamentos, dei um jeito de eliminá-los, quando me lembrei do que Bruna havia feito comigo. Sua traição certamente me faria olhar para todas as mulheres de maneira igual. Traidoras e dissimuladas. Eu tive vontade de arrancar minha filha dos braços dela, mas Jasmim parecia tão confortável e bem que acabei desistindo. Eu precisava confiar em Kara e realmente acreditar que ela não faria mal algum a minha família, e então seguimos até o escritório e ela, enfim,
Kara JimenezO choro de Jasmim só piorava ainda mais as coisas. Eu estava tão assustada com o que havia acabado de acontecer, que fiquei perdida dentro daquela mansão sem saber para que lugar ir. Eu precisava primeiro acalmar a menina, para que só depois eu conseguisse me acalmar.Voltei para o quarto no andar de baixo, onde eu havia visto Jasmim pela primeira vez. Deitei ela na cama e o choro se intensificou. Eu quase entrei em desespero.Troquei a fralda com as mãos tremulas, segurei a menina no colo e sai. Eu precisava descobrir onde era a cozinha daquela casa. Cinco minutos se passaram e eu quase perdi a paciência, quando ouvi vozes, o alívio me percorreu imediatamente. Quando entrei na cozinha me deparei com duas senhoras. Como eu não havia percebido a presença delas antes?Elas giraram os pescoços em sintonia e me olharam desconfiadas. Eu fiquei desconfortavelmente agitada sob o olhar julgador daquelas mulheres, mas eu não tinha muito tempo para me explicar.— Eu preciso de ajud
Kara JimenezEu senti um arrepio percorrer todo o meu corpo, dos pés à cabeça, assim que sai da cozinha indo atrás da Cassandra. Eu ainda estava desesperada com choro de Jasmim e corri atrás da mulher para tentar resolver aquela situação.Antes que eu pudesse abrir minha boca para contestar, fui fuzilada com aquele olhar gélido.Cassandra me examinou profundamente, dos pés à cabeça. A profundidade do seu olhar me fez tremer pela segunda vez naquele dia.— Diga-me, desde quando você é amante do Gustavo?Senti meu rosto esquentar instantaneamente assim que ouvi as palavras daquela mulher. Eu sabia eu o meu rosto havia ficado vermelho quando a raiva atingiu o meu coração. Sob qual alegação, Cassandra afirmava aquilo com tanta certeza?— Do que está falando, senhora? – meus olhos estavam arregalados de pavor – como pode pensar que eu teria um caso com o senhor Gustavo se eu mal o conheço?Ela olhou no fundo dos meus olhos e gritou com os dentes apertados, enquanto o meu coração disparava,
Eu fiquei apavorada!Minha respiração ficou pressa em meus pulmões, assim que Antônia comunicou que o expediente dela havia terminado. Marta já havia ido embora e pelo que parecia eu ficaria sozinha naquela mansão a noite inteira.— Tem certeza de que não pode ficar, Antônia? – Eu coloquei às duas mãos juntas em frente ao corpo e implorei – só essa noite.— Eu sinto muito, Kara – eu sei que ela sentiu pena de mim, era possível ver isso na expressão do seu rosto – não está no nosso contrato permanecer na mansão depois do expediente.Segundos se passaram, enquanto eu olhava para o teto da casa com o olhar perdido, imaginando os inúmeros riscos que eu corria em pernoitar sozinha, com jasmim, naquela casa. Por fim, Antônia disse, com a intenção de me acalmar.— Não precisa sentir medo, Kara – ela tinha um sorriso no rosto e eu me sentir uma insensata medrosa – você está em um dos condomínios mais seguros da cidade. Nada acontecerá com você.— Eu nunca estive em um lugar tão grande como es