Kara Jimenez
Meu olhar se arregalou quando eu li a notícia nas redes sociais. A mulher do Gustavo havia sofrido um grave acidente e estava em estado grave no hospital. Ele devia estar arrasado, eu pensei, e por uma breve fração de segundos eu sentir compaixão dele. Me levantei atordoada quando percebi meus sentimentos. Gustavo não merecia nem meus pensamentos, imagine então minhas considerações. — Espero que agora ele aprenda a ser mais prestativos com pessoas atropeladas – bravejei em voz alta, sem perceber que eu não estava sozinha na pequena sala. — Ora essa, menina, anda falando sozinha agora? – meu coração acelerou quando ouvi a voz da Rosa logo atrás de mim. Enquanto recuperava o ar, observei Rosa rir de mim. Nem parecia que fui expulsa de casa há uma hora e estava aqui, morando na casa dela sem saber o que fazer da minha vida. — Desculpa, Rosa – me aproximei dela e a abracei. Meu coração estava cheio de gratidão por aquela mulher se tão bondosa comigo – eu prometo que vou arrumar um bom emprego e desocuparei a sua casa em breve. Ela fixou os olhos em mim e eu percebi que minhas palavras haviam decepcionado a Rosa. — Falando assim você me ofende, Kara – ela raramente me chamava pelo nome e isso só acontecia em ocasiões especiais – eu moro sozinha nessa casa há tantos anos, que tê-la comigo é mais um presente do que uma preocupação. Eu sorri com amargura e abaixei a cabeça ao perceber a tristeza no olhar dela. Rosa era viúva. Havia perdido o marido e os dois filhos em um acidente de carro. Desde aquele dia ela vivia sozinha, depositando o amor que ainda havia guardado no peito em qualquer pessoa que precisasse da sua nobre ajuda. Embora ela fosse a mulher mais generosa que eu conhecia, de modo algum me aproveitaria disso. Eu já tinha vinte e dois anos e estava na hora de viver a minha própria vida. — Eu jamais me esquecerei das coisas boas que tem feito por mim – segurei nos seus pequenos ombros e olhei para ela com afeto – mas eu não sou mais uma criança, preciso aprender a voar com minhas asas. — Eu não me conformo que a Celeste permitiu que o Sebastian fizesse aquilo com você – O rosto de Rosa se escureceu com a indignação – se ela soubesse a dor que é perder um filho, não iria virar as costas para você. Eu engoli o choro ao ouvi-la dizendo aquilo. — O que eu preciso agora é arrumar um bom emprego – Rosa sorriu de orelha a orelha e concordou imediatamente – o que você me sugere? Por onde eu devo começar? Como se acabasse de lembrar algo muito importante, Rosa arregalou os olhos para mim, abrindo a boca logo em seguida. Eu assenti, enquanto olhava para ela agitada, caminhando com suas pernas pequenas pela sala, para alcançar o celular. — Veja isso, Kara – levou o celular até o meu rosto e exibiu um leve sorriso repleto de animação. Eu precisei adaptar os meus olhos a tela do celular que tinha um brilho intenso. Era uma postagem de vaga de emprego, onde alguém procurava uma baba em tempo integral. Ofereciam casa, comida e um salário bom. Meus olhos brilharam. Rosa exibiu uma expressão solene em seu rosto e prosseguiu. — Você cuidou da sua irmã desde quando ela nasceu para que sua mãe pudesse trabalhar – eu olhei nos olhos dela percebendo que rosa sabia quase tudo sobre a minha vida – se eles procuram por alguém experiente, certamente essa vaga será sua. Todavia, eu senti medo. Era uma oferta encantadora, mas não havia nenhuma informação sobre quem estava contratando. — Bom, parece ser um emprego dos sonhos – voltei a olhar para o anúncio – mas a senhora não acha estranho eles não informar quem está contratando? E se for uma armadilha para me sequestrar e extrair os meus órgãos? O sorriso da Rosa preencheu o silêncio da casa. — Isso não vai acontecer, Kara – ela tentou me encorajar – algumas pessoas famosas ou importantes fazem esse tipo e anúncio sem querer revelar sua identidade. Contudo, as palavras de Rosa, fizeram o pânico, subitamente me invadir. Por outro lado, aquele não era o momento para sentir medo ou me desencorajar. Se eu quisesse ser alguém, eu tinha que me arriscar. — A meu ver, esse salário que eles oferecem nem se compara ao que eles realmente irão te pagar – Rosa deu um passo à frente e pegou o celular das minhas mãos e continuou – agora se apresse, vista sua melhor roupa e vá até o endereço informado para fazer a entrevista. — Tão rápido assim? – enquanto eu era empurrada por Rosa até o quarto, ela seguia falando. — Eu te darei o dinheiro da passagem e algo para que você se alimente no caminho – me segurou pelos ombros e me obrigou a olhar para ela – embora eu não queria que você saia daqui, eu entendo que você precisa sair. Faço isso com o coração em pedaços. Meus olhos se encheram de lagrimas. Quando finalmente me vi sozinha no quanto, percebi que eu não tinha nenhuma roupa apresentável para vestir. Avistei a calça velha que vestia no dia do acidente, ela era a melhor que eu tinha. O suor começou a escorrer pela minha testa, quando me vi no espelho. Que chance eu tinha de conseguir aquele emprego, vestindo esses trapos velhos? — Eles procuram uma baba, não uma modelo de capa de revista – eu disse a mim mesma, enquanto me afastava do espelho – esse emprego será meu. Sai do quarto de cabeça erguida e nem mesmo o olhar subjugador de Rosa me desanimou. Mas eu não podia me dar ao luxo de mostrar nenhum sinal de fraqueza, embora soubesse que eu estava horrível vestida daquele jeito. Eu suspirei quando sai da casa da Rosa, cheia de expectativas e me deparei com um céu carregado de nuvens negras. Era só o que faltava um temporal àquela hora. Corri até o ponto de ônibus, e fiquei ali por mais de uma hora. Quando eu desci do ônibus, o céu desabou. Os pingos grossos da chuva logo ensoparam a minha roupa. Por mais que eu caminhasse apressada, ainda com dores intensas para procurar um abrigo, meus esforços eram em vão. — Agora mesmo que perco esse emprego – bufei baixinho, quando olhei para os meus documentos completamente molhados. Já não havia mais vestígios de que aquele papel molhado foi um currículo algum dia. Olhei para mim completamente desgrenhada e com a roupa respingada de lama e quis desistir. O melhor que eu podia fazer pela minha dignidade era voltar para casa e esquecer aquele emprego. Se é que eu ainda tinha dignidade. Mas eu estava disposta a me tornar a garota que não desistia nunca. Não havia nada para perder e eu precisava arriscar conquistar aquele emprego. Retirei meu velho celular do fundo da bolsa, orando constantemente para que ele não estivesse molhado. Suspirei de alívio quando vi sua tela acender. Procurei a postagem que Rosa havia me enviado e percebi que eu estava apenas alguns metros do meu destino. Embora eu tivesse um sorriso determinado no meu rosto, minhas mãos tremiam, de medo, de frio. Eu já não sabia mais. Voltei a encarar a chuva que caia constante. O meu destino estava do outro lado da pista. Eu só precisava caminhar mais alguns metros e alcançá-lo. Quando finalmente parei debaixo do prédio, meus pulmões imploráveis por mais um pouco de ar. Até eu recuperar o folego, quase dez minutos havia se passado. Notei que o lugar estava vazio, o que pareceu bastante estanho. E se realmente fossem sequestradores que só queriam extrair os meus órgãos, ou pior me levar para um país distante e me obrigar a me prostituir? Meu coração congelou, na mesma medida meus calcanhares giraram para fugi imediatamente dali. Escutei passos vindo na minha direção e um homem gorducho falava ao telefone. — Não apareceu ninguém para a vaga de emprego, senhor – ele dizia, caminhando de um lado ao outro na recepção do prédio – devo esperar mais algum tempo? Talvez fosse um sinal divino de que eu deveria insistir mais um pouco e ficar ali. Aquele homem não parecia ser um traficante de pessoas, pelo contrário, seu semblante parecia apavorado com a possibilidade de não encontrar uma candidata. Esperei que ele terminasse a ligação e enchi os meus pulmões de coragem, antes de erguer o meu braço e chamá-lo, atraindo sua atenção. — Me desculpe senhor – eu percebi que os olhos dele brilharam quando me viu – eu sei que não estou apresentável e que já é tarde, mas o temporal me alcançou e molhou o meu currículo… — Você veio para a vaga de emprego? – ele me interrompeu com ansiedade. — Sim, senhor – encolhi o corpo e abaixei o olhar apenas esperando a resposta negativa. — Você está contratada – levantei os olhos assustados até o homem. Ele só podia estar louco – e começa a trabalhar hoje mesmo.— Hoje mesmo? – arregalei os olhos até ele sem acreditar no que ele dizia – eu não posso, senhor. Olha o modo como eu estou vestida. — Então quer desistir do emprego? – o homem me olhou dos pés à cabeça, começou a suar e eu vi o desespero estampado no rosto rechonchudo dele – o patrão precisa de uma babá o mais rápido possível. Patrão? Eu fiz uma careta. Eu trabalharia para um homem que eu nem conhecia. E se ele fosse um arrogante mesquinho como o meu padrasto, ou um velho abusador? Eu não sabia por que minha mente me levava para o lado mais obscuro das pessoas, mas eu já não conseguia confiar em ninguém. — Eu não estou desistindo – soltei um longo e pesado suspiro, enquanto encarava os olhos aliviados do homem – estou apenas dizendo que eu não devo chegar em um estado tão reprovável no meu primeiro dia de trabalho. — Isso não é importante – ele ignorou completamente o meu estado – o importante é saber se você consegue cuidar de um bebê recém-nascido. Eu franzi a testa e o t
Gustavo Henri Eu estava extremamente irritado e minha vontade era agarrar aquela garota e jogá-la para fora da minha casa. Parado ainda no meio da chuva, eu larguei o braço dela e a olhei com enorme reprovação. Percebi que ela estava assustada, embora dessa vez eu conseguisse ver os traços finos do seu rosto. A garota era bonita e a chuva que caia sobre ela a deixava ainda mais interessante. — Isso não pode ser verdade – comecei a andar para longe dela, quando subitamente olhei para trás para ver qual reação ela teria – eu não contrataria ninguém como ela. Havia indignação no rosto dela e percebi que a garota não havia gostado nada do que eu dissera. — O senhor mesmo pediu para que eu contratasse a primeira candidata que aparecesse – Alexandre sussurrou no meu ouvido, certamente para não a constranger – a Kara foi a única que apareceu para a entrevista. Eu achava aquilo consciência demais. Depois que ouvi as palavras de Alexandre, bufei e dei de ombros. Eu não podia levar a sér
Kara Jimenez Meu coração estava destruído, embora eu fingisse não sentir nada para não dar ao Gustavo o gosto de me ver sofrer, eu permaneci de cabeça erguida. O olhar dele era frio e indecifrável. Eram verdes escuros como jade rara. Os cabelos tão bem aparados, dourados como a luz do sol, agora molhados, deixava-o com um ar sedutor, o que era um perigo para mim. Nariz perfeito, a barba por fazer. O rosto esculpido por Deus. Meu corpo estremeceu e precisei desviar o olhar. Como um homem tão bonito como aquele podia ser tão arrogante? Senti ele se aproximando e eu precisei abaixar a cabeça. Eu sabia que o Gustavo não confiava em mim e só iria me contratar porque não tinha outra opção. Me lembrei da esposa dele, internada em um hospital em estado grave. Ainda assim não era compreensível todo aquele ódio no seu coração. — Eu vou contratá-la – ergui o rosto rapidamente olhando nos olhos dele. Eu sei que a expressão do meu rosto denunciou o quanto eu estava feliz com aquilo – mas devo
Gustavo Henri O choro de Jasmim rompeu todos os meus maus pensamentos. Eu corri até lá e levei um grande susto quando vi aquela mulher segurando a minha filha. Embora meu coração se enchesse de medo e desconfiança, o que realmente me chamou a atenção foi o modo como Kara estava vestida. Eu não deveria olhar para outra mulher com segundas intenções, enquanto Bruna estava em uma cama de hospital, lutando para sobreviver, mas o vestido que ela vestia, deu a Kara outra impressão. Ela realmente era muito bonita. Quando percebi meus pensamentos, dei um jeito de eliminá-los, quando me lembrei do que Bruna havia feito comigo. Sua traição certamente me faria olhar para todas as mulheres de maneira igual. Traidoras e dissimuladas. Eu tive vontade de arrancar minha filha dos braços dela, mas Jasmim parecia tão confortável e bem que acabei desistindo. Eu precisava confiar em Kara e realmente acreditar que ela não faria mal algum a minha família, e então seguimos até o escritório e ela, enfim,
Kara JimenezO choro de Jasmim só piorava ainda mais as coisas. Eu estava tão assustada com o que havia acabado de acontecer, que fiquei perdida dentro daquela mansão sem saber para que lugar ir. Eu precisava primeiro acalmar a menina, para que só depois eu conseguisse me acalmar.Voltei para o quarto no andar de baixo, onde eu havia visto Jasmim pela primeira vez. Deitei ela na cama e o choro se intensificou. Eu quase entrei em desespero.Troquei a fralda com as mãos tremulas, segurei a menina no colo e sai. Eu precisava descobrir onde era a cozinha daquela casa. Cinco minutos se passaram e eu quase perdi a paciência, quando ouvi vozes, o alívio me percorreu imediatamente. Quando entrei na cozinha me deparei com duas senhoras. Como eu não havia percebido a presença delas antes?Elas giraram os pescoços em sintonia e me olharam desconfiadas. Eu fiquei desconfortavelmente agitada sob o olhar julgador daquelas mulheres, mas eu não tinha muito tempo para me explicar.— Eu preciso de ajud
Kara JimenezEu senti um arrepio percorrer todo o meu corpo, dos pés à cabeça, assim que sai da cozinha indo atrás da Cassandra. Eu ainda estava desesperada com choro de Jasmim e corri atrás da mulher para tentar resolver aquela situação.Antes que eu pudesse abrir minha boca para contestar, fui fuzilada com aquele olhar gélido.Cassandra me examinou profundamente, dos pés à cabeça. A profundidade do seu olhar me fez tremer pela segunda vez naquele dia.— Diga-me, desde quando você é amante do Gustavo?Senti meu rosto esquentar instantaneamente assim que ouvi as palavras daquela mulher. Eu sabia eu o meu rosto havia ficado vermelho quando a raiva atingiu o meu coração. Sob qual alegação, Cassandra afirmava aquilo com tanta certeza?— Do que está falando, senhora? – meus olhos estavam arregalados de pavor – como pode pensar que eu teria um caso com o senhor Gustavo se eu mal o conheço?Ela olhou no fundo dos meus olhos e gritou com os dentes apertados, enquanto o meu coração disparava,
Eu fiquei apavorada!Minha respiração ficou pressa em meus pulmões, assim que Antônia comunicou que o expediente dela havia terminado. Marta já havia ido embora e pelo que parecia eu ficaria sozinha naquela mansão a noite inteira.— Tem certeza de que não pode ficar, Antônia? – Eu coloquei às duas mãos juntas em frente ao corpo e implorei – só essa noite.— Eu sinto muito, Kara – eu sei que ela sentiu pena de mim, era possível ver isso na expressão do seu rosto – não está no nosso contrato permanecer na mansão depois do expediente.Segundos se passaram, enquanto eu olhava para o teto da casa com o olhar perdido, imaginando os inúmeros riscos que eu corria em pernoitar sozinha, com jasmim, naquela casa. Por fim, Antônia disse, com a intenção de me acalmar.— Não precisa sentir medo, Kara – ela tinha um sorriso no rosto e eu me sentir uma insensata medrosa – você está em um dos condomínios mais seguros da cidade. Nada acontecerá com você.— Eu nunca estive em um lugar tão grande como es
Rosa dormiu na sala aquela noite. Se recusou prontamente a ir para o quarto de hóspedes por pensa que não tinha direito nem ao menos de estar ali. Eu tentei explicar a ela que o Gustavo não voltaria pelos próximos três dias, devido à final do campeonato. Nem mesmo assim ela conseguiu se acalmar.Deixei-a deitada no sofá da casa e fui para o quarto ficar com Jasmim. Preparei algumas mamadeiras, porque sabia que ela acordaria de madrugada para se alimentar e enquanto ela dormia, eu apenas a admirei em silêncio.Logo peguei no sono e confesso que perdi as contas de quantas vezes tive que levantar-me para alimentá-la. Rosa por vezes batia na porta do quarto para saber se eu precisava de ajuda. Eu negava, embora com bastante sono pedia para que ela fosse descansar.Aquela foi a noite mais longa de toda a minha vida. Despertei assustada com os gritos que vinham da sala. Olhei para Jasmim, que dormia tranquilamente e corri para entender o que estava acontecendo.Me deparei com a Marta segura