— Hoje mesmo? – arregalei os olhos até ele sem acreditar no que ele dizia – eu não posso, senhor. Olha o modo como eu estou vestida.
— Então quer desistir do emprego? – o homem me olhou dos pés à cabeça, começou a suar e eu vi o desespero estampado no rosto rechonchudo dele – o patrão precisa de uma babá o mais rápido possível.
Patrão? Eu fiz uma careta. Eu trabalharia para um homem que eu nem conhecia. E se ele fosse um arrogante mesquinho como o meu padrasto, ou um velho abusador? Eu não sabia por que minha mente me levava para o lado mais obscuro das pessoas, mas eu já não conseguia confiar em ninguém.
— Eu não estou desistindo – soltei um longo e pesado suspiro, enquanto encarava os olhos aliviados do homem – estou apenas dizendo que eu não devo chegar em um estado tão reprovável no meu primeiro dia de trabalho.
— Isso não é importante – ele ignorou completamente o meu estado – o importante é saber se você consegue cuidar de um bebê recém-nascido.
Eu franzi a testa e o tempo que levei para responder a isso foi como uma eternidade. Não era nenhum problema, para mim, cuidar de uma criança recém-nascida, o que me incomodava realmente era não saber a verdadeira identidade do homem que me contratava.
— Eu consigo cuidar de um recém-nascido com toda a certeza – abri um amplo sorriso a ele, mas meu coração estava afundado no medo – mas eu posso saber o nome do seu patrão? Não gosto de trabalhar para pessoas anônimas.
— Não será anônimo, posso lhe garantir – ele retirou um pequeno lenço do paletó e enxugou o rosto, mas não respondeu a minha pergunta – posso levá-la agora mesmo para conhecê-lo. Só preciso realizar uma ligação.
Meu corpo estremeceu. Vi o homem gorducho virar as costas e voltar para dentro do prédio. Eu nem conhecia o meu novo patrão e já temia ele. Passei a mão sobre o meu rosto ainda molhado. Minhas roupas sujas e encharcadas ainda pesavam sobre o meu corpo e os meus joelhos ralados ardiam devido à água da chuva. Eu corria um sério risco de infeccioná-los, seria outro grande problema para mim, ficar doente no meu primeiro dia de trabalho.
Vi o homem voltar com um sorriso no rosto enquanto um vento gelado ia ao encontro do meu corpo, me fazendo estremecer. A chuva não dava uma trégua, as ruas estavam alagadas e eu não sabia se aquilo era um bom sinal.
— O meu nome é Alexandre, sou advogado do… – ele se calou quando percebeu estar ao ponto de revelar o nome do homem a qual eu iria trabalhar – o patrão pediu para que eu a levasse até a mansão dele.
Mansão? Minha boca estava entreaberta. Rosa tinha toda a razão quando presumiu que eu trabalharia para uma pessoa importante e muito rica.
— Sou a Kara Jimenez – estendi a mão pálida e enrugada até ele. Ele a apertou com entusiasmo – vamos logo conhecer o seu patrão.
O homem sorriu para mim. Alexandre parecia realmente entusiasmado com a minha presença. Entrei no carro luxuoso dele, sabendo que molharia todo o seu estofado.
— Não se preocupe com isso, Kara – ele me observava e percebeu certamente o quanto eu havia ficado constrangida – depois levo o veículo até à lava jato e resolvemos isso.
Alexandre era um advogado humilde e aparentemente de bom coração. Sorri para ele, embora sentisse minhas bochechas queimando de vergonha.
— Por que tanta pressa em contratar uma babá?
A minha indagação fez Alexandre mudar de cor. O homem estava pálido, como se sua vida dependesse daquela resposta.
— O patrão viaja muito a trabalho e a mãe da criança, infelizmente, não pode cuidar dela – eu o percebi engolindo a seco e deixando uma enorme incógnita na sua resposta. Alguma coisa não se encaixava – hoje mesmo ele precisa viajar e como mora sozinho, não tem com quem deixar a criança.
Eu observava o rosto dele, tentando ligar os pontos, mas nada parecia fazer sentido para mim.
— Não acha que ele vai se incomodar com o modo como eu estou vestida? – Alexandre desviou o olhar até mim e pelo modo como me encarou eu percebi que eu realmente estava em um estado lastimoso.
— Ele entenderá as circunstâncias – ofereceu um sorriso forçado até mim – além disso, foi ele quem me autorizou a contratar a primeira candidata que aparecesse.
Cada vez mais a história parecia ficar sinistra. Como um pai contrataria qualquer pessoa para cuidar da sua filha recém-nascida sem nem ao menos conhecer os seus antecedentes criminais.
— E se essa pessoa fosse uma criminosa? – minha pergunta fez Alexandre sorri – e quando o seu patrão chegasse de viagem a filha dele estivesse morta? Você como advogado sabe que essa ideia é arriscada demais.
— Você não tem jeito para ser uma criminosa, Kara – ele sorriu – afinal, eu reconheceria um de longe.
— Reconheceria e o contrataria ainda assim?
— Eu mentiria ao patrão e diria que ninguém apareceu – foi sincero – mas por favor, jamais conte isso a ele.
Ele havia quebrado toda a tensão que havia sobre os meus ombros. Quando o carro entrou no condomínio e estacionou em frente a bela mansão, eu já não estava tão apreensiva como no começo. Desci do carro admirando cada pedacinho daquele paraíso. Indaguei como alguém conseguia viver em uma casa enorme como aquela, sozinho.
Alexandre me conduziu até a entrada principal. A casa estava silenciosa.
— Eu esqueci minha pasta no carro – ele disse e nessa hora meu coração disparou de ansiedade – vou buscá-lo e não demoro. O patrão já deve chagar para conhecê-la.
Fiquei paralisada com a boca aberta sem conseguir dizer nada. Olhei apreensiva para os lados, temendo que o homem misterioso aparecesse a qualquer momento sem que Alexandre estivesse ao meu lado. Caminhei lentamente até a sala, enquanto os meus olhos brilhavam com a beleza daquele lugar. Mal percebi que os meus tênis sujavam a casa, deixando um rastro de lama logo atrás de mim.
Ouvi um choro de criança e passos vindo em minha direção. Quando me virei para olhar, me deparei com o homem que jurei que nunca mais queria ver em toda a minha vida.
O olhar furioso dele causou um enorme arrepio em mim.
— O que você faz na minha casa? – Gustavo me reconheceu imediatamente e eu até abrir os meus lábios para respondê-lo, quando ele avançou na minha direção e agarrou o meu braço com força.
— Voltou aqui para se vingar de mim? – ele me apertava com força e eu não conseguia emitir nenhum som além do gemido de dor – diga logo garota, o que você está fazendo na minha casa?
Gustavo estava tão transtornado que acreditava que eu invadiria a sua casa, que eu nem fazia ideia de onde ficava, para me vingar dele? Que tipo de pessoa Gustava achava que eu era?
— Já que não quer me responder, vou arrastá-la para fora daqui – ele saiu me compelindo, quando nossos corpos foram acometidos pela chuva. Um filme passou pela minha cabeça naquela hora, mas eu não conseguia sequer me defender – vai embora imediatamente da minha casa.
Gustavo já estava pronto para me lançar no meio da rua, quando Alexandre veio correndo e interveio. O homem gorducho tinha dificuldades até mesmo para falar, mas conseguiu impedir Gustavo de cometer outra loucura.
— Não faça isso, senhor – Alexandre conseguiu fazê-lo parar e olhar para ele – essa moça é Kara Jimenez, a babá que o senhor contratou.
Aquilo não podia ser verdade. Gustavo me olhou sem acreditar e eu fique paralisada de horror em saber que Gustavo Henri seria o meu novo patrão.
Gustavo Henri Eu estava extremamente irritado e minha vontade era agarrar aquela garota e jogá-la para fora da minha casa. Parado ainda no meio da chuva, eu larguei o braço dela e a olhei com enorme reprovação. Percebi que ela estava assustada, embora dessa vez eu conseguisse ver os traços finos do seu rosto. A garota era bonita e a chuva que caia sobre ela a deixava ainda mais interessante. — Isso não pode ser verdade – comecei a andar para longe dela, quando subitamente olhei para trás para ver qual reação ela teria – eu não contrataria ninguém como ela. Havia indignação no rosto dela e percebi que a garota não havia gostado nada do que eu dissera. — O senhor mesmo pediu para que eu contratasse a primeira candidata que aparecesse – Alexandre sussurrou no meu ouvido, certamente para não a constranger – a Kara foi a única que apareceu para a entrevista. Eu achava aquilo consciência demais. Depois que ouvi as palavras de Alexandre, bufei e dei de ombros. Eu não podia levar a sér
Kara Jimenez Meu coração estava destruído, embora eu fingisse não sentir nada para não dar ao Gustavo o gosto de me ver sofrer, eu permaneci de cabeça erguida. O olhar dele era frio e indecifrável. Eram verdes escuros como jade rara. Os cabelos tão bem aparados, dourados como a luz do sol, agora molhados, deixava-o com um ar sedutor, o que era um perigo para mim. Nariz perfeito, a barba por fazer. O rosto esculpido por Deus. Meu corpo estremeceu e precisei desviar o olhar. Como um homem tão bonito como aquele podia ser tão arrogante? Senti ele se aproximando e eu precisei abaixar a cabeça. Eu sabia que o Gustavo não confiava em mim e só iria me contratar porque não tinha outra opção. Me lembrei da esposa dele, internada em um hospital em estado grave. Ainda assim não era compreensível todo aquele ódio no seu coração. — Eu vou contratá-la – ergui o rosto rapidamente olhando nos olhos dele. Eu sei que a expressão do meu rosto denunciou o quanto eu estava feliz com aquilo – mas devo
Gustavo Henri O choro de Jasmim rompeu todos os meus maus pensamentos. Eu corri até lá e levei um grande susto quando vi aquela mulher segurando a minha filha. Embora meu coração se enchesse de medo e desconfiança, o que realmente me chamou a atenção foi o modo como Kara estava vestida. Eu não deveria olhar para outra mulher com segundas intenções, enquanto Bruna estava em uma cama de hospital, lutando para sobreviver, mas o vestido que ela vestia, deu a Kara outra impressão. Ela realmente era muito bonita. Quando percebi meus pensamentos, dei um jeito de eliminá-los, quando me lembrei do que Bruna havia feito comigo. Sua traição certamente me faria olhar para todas as mulheres de maneira igual. Traidoras e dissimuladas. Eu tive vontade de arrancar minha filha dos braços dela, mas Jasmim parecia tão confortável e bem que acabei desistindo. Eu precisava confiar em Kara e realmente acreditar que ela não faria mal algum a minha família, e então seguimos até o escritório e ela, enfim,
Kara JimenezO choro de Jasmim só piorava ainda mais as coisas. Eu estava tão assustada com o que havia acabado de acontecer, que fiquei perdida dentro daquela mansão sem saber para que lugar ir. Eu precisava primeiro acalmar a menina, para que só depois eu conseguisse me acalmar.Voltei para o quarto no andar de baixo, onde eu havia visto Jasmim pela primeira vez. Deitei ela na cama e o choro se intensificou. Eu quase entrei em desespero.Troquei a fralda com as mãos tremulas, segurei a menina no colo e sai. Eu precisava descobrir onde era a cozinha daquela casa. Cinco minutos se passaram e eu quase perdi a paciência, quando ouvi vozes, o alívio me percorreu imediatamente. Quando entrei na cozinha me deparei com duas senhoras. Como eu não havia percebido a presença delas antes?Elas giraram os pescoços em sintonia e me olharam desconfiadas. Eu fiquei desconfortavelmente agitada sob o olhar julgador daquelas mulheres, mas eu não tinha muito tempo para me explicar.— Eu preciso de ajud
Kara JimenezEu senti um arrepio percorrer todo o meu corpo, dos pés à cabeça, assim que sai da cozinha indo atrás da Cassandra. Eu ainda estava desesperada com choro de Jasmim e corri atrás da mulher para tentar resolver aquela situação.Antes que eu pudesse abrir minha boca para contestar, fui fuzilada com aquele olhar gélido.Cassandra me examinou profundamente, dos pés à cabeça. A profundidade do seu olhar me fez tremer pela segunda vez naquele dia.— Diga-me, desde quando você é amante do Gustavo?Senti meu rosto esquentar instantaneamente assim que ouvi as palavras daquela mulher. Eu sabia eu o meu rosto havia ficado vermelho quando a raiva atingiu o meu coração. Sob qual alegação, Cassandra afirmava aquilo com tanta certeza?— Do que está falando, senhora? – meus olhos estavam arregalados de pavor – como pode pensar que eu teria um caso com o senhor Gustavo se eu mal o conheço?Ela olhou no fundo dos meus olhos e gritou com os dentes apertados, enquanto o meu coração disparava,
Eu fiquei apavorada!Minha respiração ficou pressa em meus pulmões, assim que Antônia comunicou que o expediente dela havia terminado. Marta já havia ido embora e pelo que parecia eu ficaria sozinha naquela mansão a noite inteira.— Tem certeza de que não pode ficar, Antônia? – Eu coloquei às duas mãos juntas em frente ao corpo e implorei – só essa noite.— Eu sinto muito, Kara – eu sei que ela sentiu pena de mim, era possível ver isso na expressão do seu rosto – não está no nosso contrato permanecer na mansão depois do expediente.Segundos se passaram, enquanto eu olhava para o teto da casa com o olhar perdido, imaginando os inúmeros riscos que eu corria em pernoitar sozinha, com jasmim, naquela casa. Por fim, Antônia disse, com a intenção de me acalmar.— Não precisa sentir medo, Kara – ela tinha um sorriso no rosto e eu me sentir uma insensata medrosa – você está em um dos condomínios mais seguros da cidade. Nada acontecerá com você.— Eu nunca estive em um lugar tão grande como es
Rosa dormiu na sala aquela noite. Se recusou prontamente a ir para o quarto de hóspedes por pensa que não tinha direito nem ao menos de estar ali. Eu tentei explicar a ela que o Gustavo não voltaria pelos próximos três dias, devido à final do campeonato. Nem mesmo assim ela conseguiu se acalmar.Deixei-a deitada no sofá da casa e fui para o quarto ficar com Jasmim. Preparei algumas mamadeiras, porque sabia que ela acordaria de madrugada para se alimentar e enquanto ela dormia, eu apenas a admirei em silêncio.Logo peguei no sono e confesso que perdi as contas de quantas vezes tive que levantar-me para alimentá-la. Rosa por vezes batia na porta do quarto para saber se eu precisava de ajuda. Eu negava, embora com bastante sono pedia para que ela fosse descansar.Aquela foi a noite mais longa de toda a minha vida. Despertei assustada com os gritos que vinham da sala. Olhei para Jasmim, que dormia tranquilamente e corri para entender o que estava acontecendo.Me deparei com a Marta segura
Gustavo HenriPerdemos o campeonato. Estavam todos cansados e frustrados no vestiário.Eu estava obviamente aborrecido, como jogador principal desse time deveria ter dado o meu melhor. A responsabilidade daquela derrota corria pelas minhas veias. Lembrei-me dos acontecimentos anteriores da minha vida. Certamente isso estava bloqueando minha mente. Eu sentia que nada seria como antes.Aquela seria a noite mais longa para os imperadores. Ganhar o título era importante para nossa confiança, agora teríamos apenas que lidar com a derrota e seguir.Mas, eu não tinha para onde seguir. Era como se o estado clínico de Bruna me prendesse ao passado e enquanto eu não conseguisse me divorciar dela, não conseguiria ir adiante.Quando chegamos ao hotel, eu liguei para Alexandre. Era estranho perceber que o mais próximo da família que eu tinha, era meu advogado. Eu esperava ouvir boas notícias, já tinha problemas demais, para que aquela garota que cuidava da minha filha, me arrumasse mais confusões.