O sol ainda não havia nascido e no horizonte uma pequena linha vermelha surgia tingindo de vida o céu negro. Porém ele estava, ali, parado encarando o futuro jantar. A flecha tremia diante dos olhos enquanto calculava a força do vento. Respirou fundo esperando o momento certo, ajustou o foco e sem perceber a haste escorregava dos dedos, fazendo o alvo cair. Rapidamente saiu da ravina sacando a faca de esfolamento, desejando terminar o serviço o quanto antes. Sentindo os passos descompassados e a beira do colapso continuou correndo para finalizar o pobre animal caído, abandonando os arbustos cobertos de neve onde se escondia.
- Uma morte limpa e um tiro perfeito. – Disse a si mesmo entre seus pensamentos conforme removia a haste do flanco do pequeno chacal. – Raydon iria se orgulhar!
Ele seria lindo um dia e um perigoso rival em qualquer outra noite, mas agora não passaria de um bom jantar e um futuro casaco. Pensou ele separando a carne da pelagem que futuramente lhe renderiam algumas moedas de ouro e juntando as outras peles, e se negociasse bastante, quem sabe conseguisse lucrar alguns "numbers" também, mas tudo dependeria se conseguiria voltar.
Eram cinco dias de caminha na melhor das hipóteses e nas piores morreria congelado em alguma tempestade de neve. Orion não tinha muitos recursos das vintes flechas só restavam sete, onde cinco já tinham sido usadas mais de uma vez. A neve também não ajudava e os últimos gravetos que recolhera na vinda agora serviam de alimento a fogueira.
Os dedos estavam gelados enquanto os olhos atentos buscavam animais atraídos pelas labaredas que dançavam ao vento. No lado esquerdo o arco descansava enquanto uma longa adaga se escondia em uma bainha as costas. Ele recordava do seu treinamento: Primeiro faça uma fogueira, segundo se estiver sozinho evite dormir na floresta e terceiro sempre esteja atento a tudo.
Os olhos do menino pesavam conforme as horas passavam, a única coisa que o mantinha acordado era a expectativa de saborear o pequeno animal. O sol surgia atrás das altas montanhas dando contraste no azul-negro com o intenso dourado e contrastava com as poucas nuvens cinza que o perseguiam. Ao menos era o que parecia ao vê-las todo amanhecer cada vez mais perto e dessa vez por pouco não estava sobre sua cabeça.
Orion ainda estava perdido entre um e outro devaneio lutando contra o sono que constantemente o assediava e ao menor ruído já estava de pé com a mão no arco, mirando em direção ao som. Ele não podia baixar a guarda prestando atenção nos menores ruidos ou ele seria mais uma vítima do acaso e do próprio descuido.
- Saia se não quiser morrer! – Orion deu o aviso impaciente e exausto demais para qualquer rodeio ou surpresa.
Não demorou muito para que uma sombra surgisse revelando cabelos dentro de um capuz, passos descompassados e as costas uma mochila quase vazia. Fazendo tanto barulho quanto uma criança na floresta densa, quebrando galhos enquanto andava, murmurando pra si e deixando rastros pra todos os lados. O indivíduo saiu em meio as árvores e mais próximo Orion pode ver além da silhueta. Era uma garota. Deduziu ele tropeçando os olhos na estranha que tingia a paisagem branca e verde com uma jaqueta azul, calças marrom e as botas negras.
- No sul as pessoas são mais hospitaleira. – Disse em tom brincalhão, com um leve sorriso nos lábios, e com o sotaque sulista dissonante na voz melodiosa.
- Infelizmente só os precavidos sobrevivem aqui. -- Devolveu ele impassível ainda a estudando.
Orion se mantinha atento não permitindo que as longas horas sem sono afetassem em nada. Seria mais um tiro em um animal muito maior. Reação e ação, nada mais e muito menos. Fora assim que fora criado e seria assim para sempre.
Ele ainda não entendia por que ela escondia o rosto se não conseguia ser discreta, mas a resposta se entregou rápido a sua pergunta. Ela se escondia do frio. Não dele.
- Teria um espaço nesse acampamento para mais um? - Ela parou hesitante apertando os punhos que pendiam ao lado do corpo, sentindo a tensão de ser o alvo por um instante e então tornou a andar como se nada estivesse acontecendo.
O seu instinto dizia a tire, mas a humanidade nele argumentava o contrário. O garoto precisava dormir isso era incontestável e a adiante havia uma chance de ter mais um companheiro ou ser a próxima vítima. Tudo que os separava era uma fogueira e alguns poucos passos. Ele ainda não havia decidido enquanto a flecha vibrava entre os dedos. O seu instinto dizia que ela escondia muito mais que o rosto por trás do capuz e aos seus olhos era apenas uma moça inofensiva. E no limiar da mente uma frase ecoava a desacreditando e o pondo novamente em alerta.
"As aparências enganam."
- Depende. Pra onde você vai? – Orion não podia se deixar enganar, mesmo sendo uma garota. Já que não disperdiçaria uma flecha sem um bom motivo. – Não vá pra esse lado! – Disse baixando o arco sabendo o que aconteceria.
A moça sorriu diante do aviso e no próximo passo todo ar superior se esvaiu quando ficou de cabeça pra baixo. A mochila escorreu por seus braços ativando uma segunda armadinha no mesmo instante que a supresa preenchia o rosto exposto.
- Você bem que poderia ter me avisado. – Lamentou ela enquanto se debatia, mas na melhor das hipóteses teria uma queda de um metro e meio ou um pescoço quebrado. Mas o anseio por liberdade gritava mais alto a deixando mais inquieta.
- Eu lhe avisei. – Informou com um quase sorriso se divertindo com a menina de cabeça pra baixo. Mas em seu rosto os lábios não estavam curvados, os olhos inexpressivos e o cenho estava sem traços. Deixando o rosto inerte a qualquer expressão.
A moça parecia indefesa e inocente demais para estar tão ao norte e era isso que o preocupava, mas ignorando seus instintos permitiu se pôr em dúvida observando os fatos. Ele estava sozinho e o sono aos poucos cobrava seu preço. Orion sabia que por pouco não errou o tronco estreito do chacal, porém ainda se alegrava com o abate sabendo que a sorte não tinha nada haver com aquilo, mas sim as muitas horas de treino.
- Quem é você e para onde vai? - Questionou enquanto sumia atrás de uma arvore. Ainda em dúvida e isso o consumia, a indecisão gerando outras perguntas enquanto muitas hipóteses surgiam diante de uma única escolha. E mesmo querendo fazer algo não desejava ser precipitado então mais uma vez se encontrava inerte decidindo o que faria.
- Pra onde você foi? Vai me deixe aqui? Por favor! - Implorou ela enquanto o procurava.
Ele poderia ser sacana e simplesmente deixa-la cair a debilitando-a assim não poderia rouba-lo enquanto outro pensamento rondava suas ideias. Orion a desceu com cuidado lembrando que tudo que precisava era de mais um estorvo em sua viagem.
- Você não respondeu as minhas perguntas. - Disse ele enquanto oferecia uma coxa do animal e seu cantil. Não deixando que suas suspeitas o impedissem de ter alguma gentileza.
- Estou vindo de Sendinor visitar um parente pras bandas de Freend-Zone... - Informou ela após mastigar um grande naco de carne. - Para Iviston.
A pele bronzeada dizia que não estava mentindo e as bochechas rosadas informavam que não estava acostumada ao frio constante.
- O que é isso? - Questionou ela sentindo os lábios rachados arderem com o liquido amargo.
Orion já tinha perdido as contas se aquele era o terceiro ou quinto dia que estava sem sono, então rapidamente escalou o pinheiro sabendo que cedo ou tarde teria que dormir e não haveria oportunidade melhor que aquela.
- Framboia, ajuda a ficar acordado. - Explicou ele deitando em seu verdadeiro acampamento.
A moça fitou a arvore se perguntando como? Para logo então se questionar aonde? O procurando entre os galhos.
- O que vai fazer ai encima? - Ela parecia um cachorro perdido na densa floresta, seria covardia deixa-la sem instrução alguma. Considerou ele.
- Dormir. Mantenha o fogo aceso e não se afaste muito. Traga alguns galhos pra secar na fogueira e não deixe que o fogo apague. - Orientou deitando a cabeça, em um travesseiro improvisado com peles, e antes que o sono o tomasse por completo percebeu que ela não havia dito seu nome. O que no momento pouco importava se comparado com todo o cansaço que percorria seu corpo. A maior necessidade agora era dormir e não saber o nome de seu novo alarme.
- Ta... bem - Respondeu ela um tanto confusa mordendo lentamente os lábios conforme digeria toda a informação recebida.
Orion a fitou mais uma vez antes de fechar os olhos por completo e a última coisa que viu foram os cabelos castanhos contornando o rosto e os olhos caramelados que fitavam o nada despreocupados.
Faziam apenas duas semanas que estava viajando e foi só quando deu de cara com a neve que sentiu falta de casa, do clima quente onde o frio era uma brisa calorosa e a bafada, da cama aconchegante e da comida de suas empregadas. Endy ainda se perguntava por que viera sozinha? Quando sua mãe insistiu pra que ao menos um serviçal a escolta-se. Um que certamente saberia o caminho e seria responsável o suficiente pra não usar o mapa pra iniciar uma fogueira. Talvez uma vez na vida ela quisesse desfrutar de sua independência e da liberdade dos olhos super protetores da mãe. Mas agora sentia o amargo arrependimento por não ter lhe dado ouvidos e sofria por não saber se virar por sua conta. Desorientada em uma montanha sem recurso algum se não algumas blusas e uns pedaços de carne seca.Aquele era o segundo dia que estava perdida e por sorte encontrará uma trilha ate o topo da montanha. Só havia um problema não havia nada, apenas árvores e algumas
Foram duas horas de sono talvez três calculava ele que com mais uma estaria novo em folha. O Orion olhou para baixo observando a garota brincando com alguns galhos. Ele resgatou o arco e a aljava a cabeceira de seu saco de dormir e mais acima o par de adagas. Antes de dormir mais um pouco faria uma ronda mantendo o velho hábito, enquanto repassava uma lista como um mantra contra sua má sorte."Um nunca durma no solo, dois monte armadilhas e terceiro sempre tenha uma isca ou um bom alarme."Não demorou muito pra que avistasse duas sombras sobre a neve caminhando sem deixar rastro e sem dificuldade alguma. Aquela era a marca registrada dos mercenários de Falcon. Criaturas sanguinárias, animalescas e cruéis."Se encontrar um deles fuja, não se esconda. Nunca pela neve ela não é um empecilho para eles que são ótimos rastreadores. Deixe tudo pra trás, nada é mais importante que sua vida."Orion estava a fav
Assim que abriu os olhos a cabeça doía, com o sangue fluindo para o único lugar possível, e por um momento parecia que seus tímpanos iriam explodir ouvindo o coração descompassado, tentando bombear o líquido ferroso por todo o corpo.A visão estava turva com o sangue latejando a cabeça e por pouco tudo não ficava escuro e sem foco. Endy não sabia quanto tempo estava, ali, de cabeça pra baixo pendurada por uma única perna na armadilha, que ativava por puro azar e seu próprio desprezo.Não demorou mais que alguns segundos pra recordar o que estava acontecendo, ela não precisou de muito apenas vislumbrar uma árvore desgalhada e dois vultos caídos na neve, como se recebessem um forte abraço dos pequenos flocos e sem forças pra lutar permaneciam estáticos esperando que algo acontecesse por si só.Endrelina reunia cada grama de magia restante para produzir pequenas chamas, mas tudo que conseguia eram inconstantes f
Quando acordou tudo doía e vagarosamente abandonava o embaçado para ganhar cor e alguma profundidade. O céu era de uma vastidão profunda perdida em um manto negro que engolia tudo, as estrelas e até mesmo as nuvens tempestuosas carregadas de neve. O vento gelado açoitava seus braços desprotegidos e por isso acordará em plena madrugada. Se não fosse por isso dormiria mais quem sabe muito além do amanhecer. Afinal ele precisava dormir.-- Que bom que acordou! - Disse ela com o rosto tingido pela luz vermelha - amarelado.Assim que a fitou perguntas rapidamente surgiam em sua mente e conforme acordava eram respondidas com uma sessão de flashs. Ela era uma estranha que conhecerá a pouco na estrada. Ela era a isca que não sabia o caminho para onde ia e mesmo assim salvará sua vida. Ele não admitiria tal fracasso e a levaria a seu destino mesmo que isso custasse a sua vida e a deixaria segura na porta de casa e iria embora. Por que senti
-- Qual o seu nome? -- Assim que os olhos foram ofuscados uma pergunta já escorria aos lábios. O cansaço já não exista mais e pela segunda vez naquele dia ela sentia como se fosse ela mesma não uma outra pessoa tímida e quieta.-- Orion. -- O garoto trazia uma lebre em baixo do braço que se debatia dentro da gaiola improvisada. O animal era lindo de um amarelo queimado adornado com um fucinho negro e os olhos inteligentes buscavam uma fuga prevendo seu próprio fim.-- O meu é Endrelina mais pode me chamar de Endy. -- Ela não esperava que ele perguntasse de qualquer maneira queria quebrar o silêncio e fazer todas as perguntas que não conseguiu fazer no outro dia. Os olhos dela escorriam por ele sentindo a ausência de algo e ainda acordando do sonho do qual não se lembrava de nada, tornou a perguntar recordando do que faltava. -- O que fez com a tala?Ela gastou tempo e esforço fazendo o curativo. Ele teria que ter um bom motivo
Só quando a última gota de sangue escorreu que removeu as entranhas do animal, rasgando o peito enquanto tudo despencava pra fora e então as jogou o mais longe do acampamento, servindo de iscas para suas armadilhas. Ele fez pequenos furos na carne, colocou no espeto e antes de por sobre as brasas salgou o animal e despejou um líquido aquoso e opaco finalizando o tempero. Com o dejejum assando ele teria tempo para os negócios, não poupando nem um instante para que lucro algum fosse perdido.Não demorou muito pra encontrar Surg no fundo da vala. Tendo seu único interesse no pelame negro que poderia valer alguma fortuna devido a qualidade e o tamanho da peça. Já Verke não valeria nem uns poucos trocadas com o couro aspero e corroído por ácido em todas as partes.-- Por que está fazendo isso? -- Era nítido a curiosidade embebida em um tom de nojo na voz de Endrelina e nos olhos uma expressão de espanto com puro desgosto.
Ela não entendia como não conseguia acompanhá-lo, ele estava ferido e carregando mais peso e mesmo assim sempre ficava muitos passos á atrás. Nem parecia que o garoto era humano, mas um monstro vestido em pele de homem e isso explicaria tudo, como sobreviveu aquela altura, até por que escondia sua aptidão á magia. Naquele intervalo de tempo algo fazia sentido, Orion era um elfo não importava que o último deles estivesse morto a quase meio milênio. Fitando as costas do garoto toda a teoria fazia sentido, inclusive por que escalava tão bem e por que conhecia tantas ervas, nada tinha haver com preparo ou a busca incessante por conhecimento era apenas as características elficas embutidas nele.Ela respirou fundo sabendo que toda aquela linha de pensamento fritaria seu cérebro em algum momento e com o ar gélido percorrendo o corpo Endrelina só podia almejar por um breve descanso, que não viria ao menos naquele dia. A energia se esgotava rápido de seus músculos
O "Óleo verá" tinha acabado, ainda faltavam dois dias de caminhada, a água abençoada estava na metade e pra ajudar já começará a sentir as dores na perna.- É hora de descansar. - Anunciou ele jogando a mochila a esmo no chão enquanto o corpo despencava em outro canto.- Mais esse ainda é o segundo dia! - Retrucou ela com mais energia do que deveria. Talvez tivesse bebido franboia demias, o que explicava por que ela não parava quieta e o tremor na sobrancelha esquerda da garota, o que a fazia parecer uma inquisidora louca e raivosa.Ele ainda não sabia o que o surpreendia mais, se era por ela estar errada ou por ter alguma disposição pra falar depois de andar tantas horas sem descanso.- O que você comeu ontem? - Perguntou impassível formulando um argumento, não erguendo os olhos do acampamento que levantava. Ele não podia perder tempo, quanto mais enrolasse menos poderia descansar e