Desastre

Foram duas horas de sono talvez três calculava ele que com mais uma estaria novo em folha. O Orion olhou para baixo observando a garota brincando com alguns galhos. Ele resgatou o arco e a aljava a cabeceira de seu saco de dormir e mais acima o par de adagas. Antes de dormir mais um pouco faria uma ronda mantendo o velho hábito, enquanto repassava uma lista como um mantra contra sua má sorte. 

"Um nunca durma no solo, dois monte armadilhas e terceiro sempre tenha uma isca ou um bom alarme."

Não demorou muito pra que avistasse duas sombras sobre a neve caminhando sem deixar rastro e sem dificuldade alguma. Aquela era a marca registrada dos mercenários de Falcon. Criaturas sanguinárias, animalescas e cruéis.

"Se encontrar um deles fuja, não se esconda. Nunca pela neve ela não é um empecilho para eles que são ótimos rastreadores. Deixe tudo pra trás, nada é mais importante que sua vida."

Orion estava a favor do vento e tão alto que poderiam passar batido, mas havia alguém pra trás. A moça se escondia em uma moita e não seria possível alerta-la sem ser descoberto então ficou quieto observando tudo. O primeiro erro dela foi se afastar tanto do acampamento, o segundo não olhar para onde estava correndo, e o terceiro a creditar que a sorte seria sua aliada quando na maioria das vezes seria sua maior inimiga. 

Ele a fitava assombrando percebendo agora o que ela realmente escondia. Não era apenas o seu rosto, mas algo maior e peculiar, uma coisa que ele almejava tanto mais que sempre escorria entre seus dedos. Uma coisa que faria do seu pequeno sonho uma realidade vivida e inegavelmente real. Era uma parte dela que ele desejava tanto que fosse dele. Magia.

A descoberta não foi suficiente para afastar as perguntas que ainda pairavam sobre sua mente o interrogando a cada instante. O instigado a descobrir mais sobre ela. Mantendo os olhos sonolentos sobre a garota e não mais nos oponentes. E novamente uma questão surgia entre seus pensamentos, uma após outra criando muitas dúvidas. 

"Será que era isso, só isso? Ou ela esconde mais alguma coisa em baixo daquele sorriso frágil?"

Orion observou-a engatinhando até que se levantou sem ar ou vigor algum e passou a andar por pura força de vontade. O caçador a acompanhava de galho em ganho em movidos tão sutis que nem ele ouvia seus passos. A respiração muda mal fazia seu peito subir enquanto a garota parecia lutar por cada sopro de vida. 

Ela já estava próximo e para sua sorte se aproximava da fogueira e pro seu azar cometeria seu maior erro. Percebendo apenas o ruído distinto antes do mundo mudar de lugar.

Verke não estava longe enquanto a garota se debatia. Para ajudar Surg também dava as caras com a arma grudada as mãos e o pelo em um tom estranho de azul chamava atenção. 

-- Eu vou deformar sua cara também. Seu monstro! -- Ameaçou Verke com o rosto corrido, parte do cranio a mostra e um olho aquoso em um verde translucido.

-- Venha que terei mais ácido pra você! - Blefava ela sem um pingo de magia e ainda deslocada com a rápida troca de posição. 

-- E o que fará comigo? -- A voz grossa ecoava nos passo que não tinham pressa alguma esbanjando uma estranha sutileza feroz e ousada. -- Cair na própria armadilha é um coisa que nem um idiota faria.

Orion poderia ficar seguro enquanto assistia tudo de camarote, mas era a injustiça das circunstancias que o instigava a tomar parte da luta. O caçador buscou uma flecha na aljava quase vazia. A seta resvalou em um galho que o vento brincava o fazendo errar por pouco passando por cima da cabeça de Verke. O garoto desceu alguns metros e na nova linha de tiro considerava o vento quase ausente. 

-- Se correr agora terei mais prazer ao destroçar seu corpo! -- Rugiu Surg o procurando entra as arvores.

-- Eu sei que está ai em cima. -- Apontou Verke sentindo o próprio cheiro de carne recém queimada.

O segundo tiro seria perfeito assim esperava. A flecha atingiria o alvo prévia ele antecipando  o resultado, porém por puro reflexo Verke virou o corpo caindo no chão desequilibrado, mas expondo o único olho bom a haste que roçava seu crânio. 

-- Você matou meu RASTREADOR! -- Esbravejou Surg perdendo o controle ao ver o aliado cair. -- O próximo será você!

A outra seta fez a foice atingir o chão atravessando a mão do canino.

-- Obrigado. Por essa gentileza te matarei sem piedade.  -- Agradeceu Surg pondo a mostra a palma que rapidamente se curava enquanto seus olhos se tornavam de um amarelado luminoso e ao ombro uma runa brilhava em um rubro opaco.

Orion não perdeu tempo puxando a única flecha negra da aljava. Respirou fundo, piscou uma última vez e deixou que a haste fizesse seu percurso certeiro. A seta atingiria o peito se o monstro não a segura-se antes de alcaça-lo. 

-- Isso não funciona comigo. -- Informava quebrando a haste como um graveto. Foi quando parte do seu corpo começou a congelar como se nitrogênio líquido escorrese por suas veias e outra flecha perfurava o tronco de Surg.

Havia algo de errado, a runa brilhava cada vez mais intensa na estatua de gelo que aos poucos começava a trincar. Não demorou muito pra que o gelo rui-se revelando um quadrupede peludo quase do tamanho de um cavalo. Os olhos tinham um brilho intenso amarelado, a pelagem totalmente negra e um conjunto de dentes brancos bem afiados.

Foi com mais surpresa que Orion fitava o grande animal escalar a arvore diminuindo a distância a cada salto. O caçador mirou na cabeça, mas a grande ferra abocanhou a flecha a fazendo em pedaços e dos lábios um tom avermelhado sujava os dentes a mostra. O garoto mudou de arvore buscando impulso para subir mais de pressa. Quando o monstro saltou o seguindo ele lançou a última flecha que a criatura desviou com um giro em pleno ar enquanto a adaga do garoto deslisava na pelagem negra abrindo uma ferida no flanco.

As chances estavam contra ele e não demoraria muito para Surg o alcançar naquele ritmo. Sem flechas soltou o arco subindo mais um pouco sem impedimento algum. O garoto esperou que isso fosse o suficiente e começou a golpear os galhos da copa da arvore com a adaga e um plano arriscado em mente, mas era melhor que encarar os muitos dentes logo abaixo.

O vento surrava o rosto enquanto usava seu único truque para molhar os galhos e indo pra ponta sacou outra adaga esperando o adversário. A criatura o fitou quase racional, como se compreende-se seu plano, e para instiga-la passou a lâmina no ante braço fazendo o sangue escorrer. O animal subiu cravando as garras nos ramos que rangiam. Orion torcia para que o galho cedesse e a queda desse o golpe final, mas a sorte escolhia um rumo diferente a história permitindo que o monstro investisse primeiro. Ambos caíram. O quadrupede abria caminho quebrando os galhos e Orion seguia logo atrás tentando se agarrar desesperadamente ao tronco usando as lâminas. 

Surg se recuperou primeiro grunhindo enquanto se afastava. No peito duas costelas a mostra e o pelo manchando de um vermelho viscoso. Orion por outro lado segurava a arma sabendo que sua vida dependeria da lâmina. O rosto ardia todo aranhado, os braços doíam e a perna estava no mínimo deslocada.

Não demorou pra que o animal investisse novamente deixando um rastro de sangue na neve alva. O caçador rolou para o lado enquanto os dentes roçavam a nuca e sem olhar golpeava o monstro que insistia em morder sua cabeça. A adaga se cravou no peito rasgando até a garganta no percurso até o maxilar, agitado,  mais mesmo assim Surg proseguia desejando levo-lo junto. Aos poucos o brilho dos olhos da criatura morriam dando lugar ao vazio e o queixo fechava sem pressa alguma no ombro do garoto. Orion encarava a morte enquanto a mandíbula da criatura rumava a sua jugular exposta então botou mais força enfiando a adaga mais fundo, até que o cabo se perde-se dentro do monstro. Mais uma vez ambos caíram,  Surg estava morto e Orion exausto tirava seu pescoço da queixada do animal. Deixando a pele exposta com marcas de dentes onde pequenas gotas se formavam percorrendo ao solo em um rastro curvo e rubro. 

Orion esperava descobrir o que vinha após a escuridão enquanto o céu rapidamente perdia as cores, ele podia sentir mais uma vez a morte tentando o abraçar e em seus olhos o brilho ansioso para recebe-lo. Mas rapidamente foi trazido de volta com ar faltando aos pulmões que sofriam almejando por uma única respiração.  

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