INFÂNCIA PERDIDA
No interior de Minas Gerais, na zona rural, bem distante da cidade, morava uma família muito simples e humilde. Seu Joaquim e dona França lutavam com bravura na lavoura para criar seus doze filhos.
Apesar de ser um bom homem, seu Joaquim era muito severo com seus filhos. Eram três mulheres, Lourença, Conceição e Efigênia, a caçula, e nove homens. Assim como dona França, seu Joaquim sonhava em ver as três filhas casadas. Ele não aceitava que elas namorassem ninguém, não deixava elas saírem pra nenhum lugar, deixando-as presas. Loura, sua filha do meio, não aceitava a ideia do pai tratá-las como animais presos na gaiola e sempre apelava para sua mãe. Que sempre dizia. — Eu não posso fazer nada, Loura.— Olha mãe, eu estou gostando de uma pessoa. Vou sair com ele hoje, custe o que custar.— Mas você conhece seu pai, minha filha. Se ele te pegar, vai te machucar muito. Mas loura sempre teve um temperamento difícil.— Me ajuda mãe, por favor.—Tudo bem. Não concordo com que o Joaquim faz com vocês, afinal os filhos não foram feitos para gente, foram feitos para o mundo mesmo. Te ajudando ou não, você vai encontrar com esse rapaz de qualquer jeito. Então eu prefiro te ajudar a deixar você fazer besteira. Vai se arrumar e sai escondida. Vou colocar uns travesseiros aqui na sua cama para ele não perceber. Não chega tarde, porque se seu pai descobre que dou cobertura pra você encontrar esse homem, ele nos mata. Você sabe muito bem que seu pai não gosta desse povo.— Tudo bem, mãe.Respondeu ela, finalizando a conversa.Assim acontecia todas as vezes. Dona França a ajudava a fugir para que ela fosse encontrar com o seu grande amor. Mas o que ela não sabia é que esse amor a traria muitos sofrimentos e decepções.— Loura, vem cá – disse dona França. – Eu sempre te ajudei a fugir para encontrar com esse rapaz e você nunca me falou dele. Agora eu quero saber quem é ele e de onde ele é.— Mãe, depois eu te conto.— Ou você me conta agora ou não conta mais comigo para te ajudar.— Tudo bem, eu conto. Ele é filho do senhor José Augusto e dona Maria.— Meu Deus! O filho do seu Augusto fazendeiro?— Isso, mãe.— Meu Deus, minha filha. Cai fora desse homem, ele tem fama de que não presta. Ele já abusou de várias mocinhas inocentes daqui das redondezas. Se seu pai o descobre, ele te mata. Ele jamais vai permitir esse namoro. Esse homem não ama ninguém, é um egoísta que só pensa em nele mesmo.—
trabalhador e sempre fez o que pôde pra não deixar faltar o pão na mesa.— Perdoa-me. Não quis ofende a senhora. Eu sonho em casar, mas com um homem que eu ame.— Só que a vida não é um conto de fadas, Loura. Nunca é do jeito que a gente quer.— Pra mim vai do meu jeito e pronto. Querendo o papai ou não.— Pois então não conte mais comigo para te ajudar.Minha mãe retrucou de imediato e continuou:— Eu não gosto desse homem e sei que ele vai destruir sua vida. Não vou fazer parte disso.— Mesmo que a senhora não queira me ajudar eu vou vê-lo assim mesmo. Ninguém vai me afastar dele só por causa de algumas fofocas.Passaram-se uns dias.— França, – disse Seu Joaquim – eu estou achando a Loura muito estranha. O que está acontecendo co
— Isso é invenção, homem. Minha filha nem sai de casa, nem namorado ela tem.— Olha, Joaquim, eu vou ter que te contar porque você é meu amigo e acho uma covardia o que sua filha está fazendo com você.— Fala logo, homem. O que você sabe que eu não sei?— Ontem no forró do Nei Cabecinha eu vi a Loura com Carlão, filho do Augusto, no maior love. Ela me disse que estava namorando ele. Eu achei que você sabia.Assustado com a cara do Joaquim continuou.— Tudo bem homem? Você está pálido. Fala comigo!— Eu agradeço por me avisar, Paulo. Acho que não estou sentindo bem, vou voltar pra casa – disse ele, catatônico, e se despediu.Joaquim voltou pra casa furioso gritando.—França! França!— O que foi, Joaquim?— Você está sabendo desse namoro da Loura com o filho do Augusto? Responda-me mulher.Ela abaixou a cabeça e disse.—Já faz algum tempo que eles estão se encontrando escondidos. Eu avisei, mas ela está muito apaixonada por esse ho
hoje em casa – disse dona França murmurando. E saiu às pressas para encontrá-la no caminho da lagoa onde ela estava com sua prima.De longe Loura avistou sua mãe e a chamou eufórica.— Mãe, o que está fazendo aqui? Porque a senhora está tão nervosa?— O seu pai, minha filha, já sabe de tudo e não vai dormir enquanto não te pegar. É melhor você dormir na casa da sua prima hoje. Amanhã talvez ele esteja melhor.— Ai, meu Deus! E agora, o que eu vou fazer? – disse Loura chorosa – Como ele soube?— Eu não sei filha, mas contaram pra ele, Eu disse a você que isso não iria dar certo!— Quando ele souber, vai me matar mãe.— Souber o quê? Do que você está falando, minha filha?— Eu não tenho certeza, mãe, mas minhas regras estão atrasadas e sinto muito enjoo. Eu estou com muito medo.— Valei-me, minha Nossa Senhora. Será que você está prenha? Depois de tanto falar, você ainda teve coragem de deitar com esse homem, Loura? Pois o maior me
disso. Você as trata como suas prisioneiras – disse França, nervosa.— Eu faço isso para o próprio bem delas. Não quero que elas fiquem faladas e com fama ruim por aí.E assim o assunto se deu por encerrado. Depois de três dias Loura ainda não havia aparecido em casa.— França, até quando você pretende esconder essa menina de mim? Traga ela agora ou eu mesmo vou atrás dela.Então ele saiu à procura dela em todas as casas vizinhas. Quando descobriu que ela estava na casa do seu irmão, deu meia hora para ela voltar para casa. Ela chegou de mansinho e entrou no quarto chorando. Dona França tentou consolá-la.— Não fica assim, minha filha. Vai dar tudo certo.Logo em seguida seu Joaquim entrou, pegou Loura pelos cabelos e a jogou no chão, chamando-a de vagabunda. E começou a espancá-la.Dona França gritou apavorada e pediu para não bater mais nela, porque ela estava esperando um filho. Ele, fora de controle e cego de raiva, expulsou-a de casa e
Dona Maria, mãe do Carlão, chegou, a viu chorando e perguntou o que estava acontecendo. Loura contou tudo e disse que estava grávida, mas o Carlão não queria assumir o filho que esperava em seu ventre.— Entra para cá, minha filha. Vamos conversar – disse dona Maria um pouco surpresa. – O seu pai pode até ter te expulsado de casa, mas você não vai ficar na rua. Pode ficar aqui em casa. Mesmo que o Carlão não assuma essa criança, não vai faltar nada para vocês. Pode contar comigo.Chorando muito Loura a abraçou e agradeceu.Loura ficou morando na casa do seu namorado, mesmo sendo tratada por ele como se não existisse naquela casa. Saía todas as noites e chegava de madrugada. Ela sofria muito com seu desprezo, pois o amava muito. Inconformada com aquela situação, ela procurou uma velha senhora que se chamava Dona Santa, curandeira que fazia remédios caseiros para todos os tipos de doenças. Loura chegou chorando a pedindo para ajudá-la.— Do que precisa, fil
tentar tirar o nenê. Mas tudo isso era inútil, o máximo que causava era uma cólica e muita dor na barriga.Loura saiu à procura do remédio, até que encontrou a maldita erva. Chegando em casa, preparou erva no copo e foi surpreendida por dona Maria, que questionou pra que servia o remédio. Ela logo deu um jeito de disfarçar.— É pra dor de barriga, dona Maria. Então Loura foi para trás da casa e tomou um gole com nojo, devido ao muito amargo do remédio e, antes de virar o resto do copo na boca, dona Maria chegou, bateu a mão no copo e o jogou no chão, gritando:— Você está doida, Loura? Essa erva pode matar não só essa criança, mas você também.Ela desesperada gritou.— Eu não me importo! Pra que viver assim? Minha família não me quer, o pai dessa criança também não. Seria melhor pra eu e essa criança desaparecer mesmo.Passados alguns minutos, Loura se ajoelhou no chão, sentindo muita dor, e começou a vomitar sangue. Dona Maria chamou o encarregad
uma filha, mãe solteira, aqui com a gente do que as pessoas por aí te chamando de carrasco sem coração. Pros outros você é um bom homem, mas você tem que ser melhor ainda pra sua família. Ela ainda é uma menina, que está pagando pelos seus erros. E somos as únicas pessoas que não podiam abandoná-la. Pensa bem, porque sei que você vai se arrepender de ter feito isso com ela.Seu Joaquim no fundo também sofria no calado. Ele pegou seu chapéu e saiu sem dizer nada.Loura já estava no oitavo mês de gestação e chorava todos os dias com saudade da mãe e dos irmãos. De repente alguém bateu palma. Ela saiu para atender e era seu pai. Apreensiva ela abaixou a cabeça. Ele, com lágrimas nos olhos, abraçou a filha pedindo perdão.— Volta para casa, filha. Eu sei que fui muito cruel te batendo daquele jeito e te expulsando de casa. Sua mãe está sofrendo muito. Todos nós queremos que você volte para casa.Ela olhou para dona Maria e disse:— Eu vou voltar para casa e não sei