Barbara estava atrasada. Chegou ao evento estacionando a sua Lamborghini em frente ao hotel Copacabana Palace. Aquela seria mais uma noite glamorosa entre muitas das quais já estava de saco cheio. Vários fotógrafos na entrada a acertaram com uma chuva de flashes. Ela sorriu para alguns, mesmo sentindo-se plenamente incomodada, enquanto seguia para livrar-se deles. Mas antes de cruzar a porta, olhou desdenhosa para tudo aquilo. Ela não entendia o porquê precisava de tanto luxo para um simples encontro entre empresários. Eles não eram nenhum astro de cinema ou Dalai-lama, eram apenas pessoas com muito dinheiro conhecidas pela minoria do país a qual pertencem.
Ela entrou e viu a quantidade de gente ali. Era um grande exagero. Duvidou que o seu pai conhecesse um terço daquelas pessoas. Embora gostasse do acesso fácil ao dinheiro e de poder ter todos os dias da semana livre, Barbara jamais se curvaria ao dinheiro como muitos naquela festa faziam, vendendo a sua dignidade e caráter. Como, na verdade, até mesmo a sua mãe fazia. Ângela aceitava socos e traições somente para ainda ser a esposa de um milionário. Quanto vale a sua alma? A da Ângela vale variadas bolsas de trinta mil reais.
— Só quero que essa noite termine rápido — disse baixinho para si mesma.
— Senhorita Barbara! — chamou uma mulher vindo ao seu encontro. — O seu pai a aguarda ansioso.
— Preciso de uma bebida antes.
A mulher assentiu com um sorriso congelado no rosto. A sua face era irritante.
— Claro. Só não demore — pediu a assistente do seu pai, antes de se virar indo embora.
Barbara revirou os olhos. Nunca iria conhecer alguém tão puxa saco como aquela mulher. Tinha certeza de que o pai a comia no final do expediente, todos os dias. Suspirou fundo a sua frustração e tédio, e caminhou até o bar.
— Um Martini, por favor. Com duas azeitonas.
O barman sorriu carismático e um tanto sedutor para ela.
— É pra já, senhorita.
Ele se afastou e com muita agilidade e exibicionismo, preparou o seu drinque. Quando o colocou à sua frente, piscou para ela. Barbara mordeu o lábio e sorriu com divertimento. Bebeu do doce Martini sem a menor pressa, enquanto trocava olhares com o homem atrás do balcão. Pensou que deveria ser crime alguém tão gostoso como ele usar uma camisa branca tão justa ao corpo. Quando terminou, acenou em despedida e seguiu para onde o seu pai devia estar, cercado por gente fútil e interesseira.
Por onde ela pisava, as pessoas a olharam: mulheres com inveja e homens com desejo. Ela estava arrasando com aquele vestido longo. A fenda era pura sedução, indo da barra até o quadril, expondo a sua coxa torneada. Adorava exibir a sua dedicação na academia. A cor vinho destacava-se muito bem na sua pele branca. Os seus longos cabelos loiros desciam em ondas macias e fluidas pelas costas nuas, em um decote que ia até quase a base da coluna. O pai, com certeza, não gostaria nada daquele visual. Ele sentia ciúmes e um pouco de vergonha. Queria que a filha se vestisse de modo que julgava mais elegante e correto, como uma moça de família, ele costumava dizer. Barbara levantou um pouco do vestido e subiu os degraus. De longe, o pai a avistou e logo ela viu o seu semblante mudar, ficando um pouco enfurecido.
— Deveria ter vindo mais composta, Barbara — disse ele, que a encontrou no meio do caminho, impedindo que ela chegasse até o seu círculo de amigos. — Como uma moça de família! — Foi um tanto ríspido.
Ela sorriu e revirou os olhos, desgostosa com a pose de família tradicional brasileira que esconde a infidelidade e violência doméstica.
— Ora, não gostou? — perguntou com deboche, colocando as mãos na fina cintura.
— É claro que não! — disse baixo, porém, muito irritado agora.
— Você pagou uma grana por ele, devia gostar. — Sorriu provocante.
O pai contraiu a mandíbula e rosnou raivoso, contendo a fúria dentro de si. Ele não gostava e procurava não brigar com ela, nem mesmo quando o provocava. Ela era a sua única filhinha, uma bela aliança. O ciúmes que Carlos – seu pai – sentia, não era um ciúme bobo que os pais sentem para com suas meninas, mas um sentimento de pura posse. Barbara era sua para negociar da forma que fosse preciso fazer.
— Vem. Não temos como resolver isso agora. Quero te apresentar alguém. Ele é da família Correa e é um ótimo partido, eu diria. — Sorriu convencido.
Ela o encarou com a sobrancelha esquerda arqueada e um olhar duro. Desde os seus vinte anos isso acontecia em todos os eventos, sejam eles íntimos ou não. Carlos sempre tinha alguém para lhe apresentar. Eram sempre mauricinhos que a tratavam como um objeto de ostentação e olhava para outras bundas na sua frente. Ela estava cansada disso e do fato de Carlos estar sempre tentando casá-la com um babaca rico.
— Não quero conhecer ninguém hoje. — Foi incisiva.
— Querida, sabe que isso faz parte da nossa rotina. — Acariciou a sua face com o dorso dos dedos. — Além disso, eles vão transferir a matriz de São Paulo para o Rio de Janeiro. É uma ótima oportunidade para parcerias de negócios. Ajude o seu pai. Apenas seja gentil e faça companhia ao filho dos Correa essa noite.
Barbara sentiu-se mais uma vez como um objeto nas mãos do seu pai. Respirou fundo vendo que não tinha opção.
— Parcerias, é claro. — Revirou os olhos e respirou fundo. Precisava de fôlego para sorrir e bancar gentileza para com pessoas esnobes.
Eles caminharam até o grupo com quem o seu pai conversava antes. A mulher diante dela a olhou dos pés à cabeça com desdém e uma pitada de inveja. Ela claramente também não havia gostado do vestido da Barbara, que pouco se importava com a opinião alheia.— Barbara, estes são Cássio e Miranda Correa, do Grupo Solos.— É um prazer conhecê-los. — Apertou as mãos de ambos com um mínimo sorriso forçado nos lábios.— O seu pai fala maravilhas sobre você. — Cássio sorriu simpático.A mulher nada lhe disse, ainda a avaliava com uma expressão que diria agora ser de nojo e estranheza.— E este é Edgar, o filho deles.Só então Barbara olhou para o lado. Ela não havia notado o homem à sua esquerda. Ele era alto, branco, cabelo castanho-claro e olhos amendoados. Tinha um belo sorriso que marcava o canto direito dos seus grossos lábios. Era um homem bonito, por assim dizer.— Muito prazer, Barbara. — Estendeu a mão para ela.— Olá, Edgar.Colocou a mão sobre a dele. Edgar a levou até os seus lábios
Os dois levantaram-se, mas antes que fossem embora, Barbara bebeu tudo o que restava do uísque em um só gole. Eles saíram de fininho e, mesmo que alguém na saída os notasse, nada seria dito aos meninos ricos. Barbara o levou até o seu carro no estacionamento privado.— Você dirige uma Lamborghini? — perguntou impressionado, ficando com a boca aberta.— O que esperava?— Uma SVU, talvez.Ela riu do quanto patético Edgar era. Nem de longe é alguém por quem ela sentiria desejo de beijar.— Espere um minuto.Ela entrou no carro e pegou uma bolsa no banco ao lado. Com muita dificuldade, devido ao teto baixo, trocou de roupa. Definitivamente, aquele vestido não era apropriado para um baile na comunidade. Ela o substitui por uma saia de seda branca e um top de lantejoulas prateadas, mantendo a sandália preta. Retirou as joias e colocou um par de brincos de prata. Ajeitando os cabelos com os dedos, saiu do carro.— Uau! — disse Edgar com a mão no queixo, vendo-a mais sensual do que antes.— V
Barbara desceu da moto e logo Edgar chegou. O penteado dele já não estava mais tão alinhado.— Valeu — disse ela ao piloto.— As ordens. — Piscou para ela, que sorriu.Respirou fundo e olhou atentamente ao redor. Por toda parte, homens armados.— Estou começando a achar que tudo isso é loucura — disse Edgar, chegando mais perto dela.— Não surta. Já estamos dentro. O que pode dar errado?Ele suspirou e guardou as mãos no bolso.— E para onde vamos agora, garota favela?— Shhh — fez para ele, o encarando de cara feia. — Se disser essa palavra mais uma vez, será chutado daqui com uma bala na bunda.Sim, ela estava errada. Com Edgar, alguma coisa poderia dar errado. Ele olhou para ela tentando disfarçar a cara assustada.— Vai pra onde, bacana? — perguntou um rapaz ao aproximar-se deles. Ele tinha um fuzil na mão, portava aquilo como quem segurava um celular. Barbara engoliu em seco, percebendo que ele nem sequer tentava esconder a arma. Embora pelo tamanho era impossível prendê-la no có
O homem subiu para parte alta da quadra. Ela entendeu que ali era o camarote e suspeitou que ele devia ser o dono do morro, ou chefe. Não tinha certeza de como o chamavam. Os grandes braços tatuados apoiaram-se na grade do parapeito. Ele não conseguia parar de encará-la com uma feição séria e mandíbula contraída. Barbara desviou os olhos e puxou os braços do Edgar, virando-o para ela.— Vamos embora, está na hora! — gritou no seu ouvido.Ele continuou a dançar e negou com a cabeça a sua intimação.— Nem pensar — gritou de volta.— Edgar, por favor. Nós temos que ir!Negou com um aceno mais uma vez.— E ae, branquinha — disse um homem ao chegar por detrás dela. Barbara virou-se rápido e assustada. — O chefe mandou tu subir.Edgar parou e colocou-se à frente dela.— O que foi, irmão? Ela está comigo. — Puxou Barbara para ele, agarrando-a pela cintura.— Irmão é o caralho! — gritou, empurrando Edgar, que quase foi ao chão. — Vê se não fica no caminho! — Aquilo foi uma ameaça.Segurou fir
— Vai com calma, Fred! — disse Matheus, segurando-o pelo ombro.O homem o respeitou, o que fez Barbara entender que ele não era apenas mais um morador dali. Ele tinha sua hierarquia naquele comando. Talvez isso explicasse o motivo pelo qual eles foram autorizados a entrar com a aprovação dele. Ela puxou Edgar da multidão e escada abaixo, mas ele era teimoso e queria voltar.— Pare! Se voltar para lá, vai sair daqui em um caixão!Edgar parou e a olhou sério. Viu que Barbara não estava brincando e estava brava. Colocou as mãos para cima, rendendo-se, e passou por ela, descendo o morro. Logo eles chegaram à avenida, mas demorou para que passasse um táxi que os levassem de volta para festa onde estavam os pais. Assim que chegaram ao estacionamento, Edgar começou a vomitar, tinha bebido demais. Um homem apareceu e perguntou se estavam bem. Ela pediu que chamassem a secretária do seu pai.— Por que você tinha que beber tanto?Edgar sentou-se no chão, escorando-se a um carro alheio. Barbara
Já fazia dois dias que Barbara ignorava as ligações do Edgar. Ela havia ficado muito brava quando descobriu que o seu pai lhe deu o seu número de telefone. Sentada à mesa de jantar na casa dos pais, com os pés apoiados sobre o tablado de madeira, ela rejeitava mais uma chamada dele, quando Ângela entrou.— Tire os pés da mesa! — ordenou a sua mãe.Ela sorriu e os colocou de volta ao chão, corrigindo sua postura na cadeira. Enfiou mais uma uva na boca e observou a mulher loira à sua frente exigir dos empregados o máximo de cuidado na hora de limpar a prataria.— Quer ir ao shopping? — Barbara perguntou-lhe.— Só se pudermos passar na Chanel. Quero uma bolsa nova.Roubou-lhe uma uva do cacho que tinha nas mãos e foi-se para cozinha.— Vou te esperar no carro — Barbara gritou para que ela pudesse ouvir.Levantou-se e saiu. Lá fora, se acomodou no banco passageiro do carro da sua mãe. Se teve algo que ela aprendeu muito cedo, foi ler o comportamento daquela mulher. Ângela havia se casado
Edgar ofereceu o seu braço a ela com tamanho cavalheirismo. Os dois caminhavam à frente conversando como velhos amigos, enquanto Barbara ia atrás a uns dois passos de distância. Ela não estava nem um pouco a fim da companhia dele e odiava que a sua mãe tivesse aceitado. Sentaram-se no melhor restaurante e tomaram champanhe até que fizessem os seus pedidos. Edgar quis pedir para Barbara, que deixou claro que ela tinha capacidade mental de escolher a própria comida. Ele ficou um pouco constrangido, é claro. Barbara não era fácil como as garotas que conhecia. Um tempo depois, Ângela levantou-se, indo ao banheiro. Os dois ficaram a sós e esse momento era tudo o que ele queria.— Eu lhe devo um pedido de desculpas, não é?— Deve? — Encarou-o.Ele riu um pouco sem graça.— Sim. Não imaginei que eu ia ficar tão louco. É que faz muito tempo que eu não ia a uma boa festa.— Boa festa, ela só foi para você. Eu tive que ficar te cercando e cuidando para que não arranjasse uma confusão onde nós s
O caminho foi feito com pouca conversa resumida em ele fazer perguntas tolas e ela dar respostas curtas e diretas. Até Edgar estava se questionando se deveria mesmo lhe ter convidado para sair. Quando chegaram à festa, desceram juntos do carro. Mais uma vez ela não esperou pela gentileza dele, o que o fez revirar os olhos, descontentes.— Posso pegar na sua mão? — perguntou ele.— Não! — Barbara passou rente a ele indo em direção à entrada da casa noturna, onde acontecia uma festa privada a qual Edgar garantiu que eles tinham nomes na lista.— Edgar Correa e acompanhante — anunciou ele ao homem na entrada, parando atrás da Barbara. Lentamente ela virou a cabeça em direção dele, que forçou um grande sorriso.— Acompanhante, seu cretino? — ela perguntou.— Ué?! Você está me acompanhando essa noite, não está?Ela estreitou os olhos para ele.— Aqui está. Achei. Divirtam-se — disse o homem, que retirou o cordão azul de veludo liberando a passagem.Quando entraram, logo deram de cara com u